Discurso durante a 214ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Questionamento sobre o aparelhamento do Estado, com a máquina pública sendo inflada com apaziguados, e repúdio ao afastamento de técnicos do Ipea. Comentários sobre livro de autoria de Fábio Giambiagi.

Autor
Antonio Carlos Júnior (DEM - Democratas/BA)
Nome completo: Antonio Carlos Peixoto de Magalhães Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA FISCAL.:
  • Questionamento sobre o aparelhamento do Estado, com a máquina pública sendo inflada com apaziguados, e repúdio ao afastamento de técnicos do Ipea. Comentários sobre livro de autoria de Fábio Giambiagi.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2007 - Página 41719
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA FISCAL.
Indexação
  • CRITICA, CONDUTA, GOVERNO FEDERAL, EXCESSO, COLOCAÇÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), SERVIÇO PUBLICO, REPUDIO, AFASTAMENTO, TECNICO, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), MOTIVO, OPOSIÇÃO, MODELO ECONOMICO, GOVERNO, ESCLARECIMENTOS, COMPETENCIA, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, ISENÇÃO, ANALISE, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, NECESSIDADE, DIVERSIFICAÇÃO, OPINIÃO, GARANTIA, EFICACIA, ESTUDO.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ESTUDO, AUTORIA, ECONOMISTA, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), REFERENCIA, POLITICA FISCAL, BRASIL, DEMONSTRAÇÃO, AUMENTO, TRIBUTAÇÃO, ANALISE, TRANSFORMAÇÃO, SETOR PUBLICO, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DEFESA, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, MELHORIA, APLICAÇÃO, FUNDOS PUBLICOS, IMPORTANCIA, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA.
  • EXPECTATIVA, COMPARECIMENTO, PRESIDENTE, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, SENADO, ESCLARECIMENTOS, AFASTAMENTO, PESQUISADOR, EXTINÇÃO, GRUPO, RESPONSAVEL, ANALISE CONJUNTURAL, ECONOMIA NACIONAL, QUESTIONAMENTO, OPINIÃO, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, CARGA, TRIBUTOS.

            O SR. ANTONIO CARLOS JÚNIOR (DEM - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - É difícil, Sr. Presidente.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esses dias, o atual governo deu novas demonstrações de que o aparelhamento do Estado é uma meta a ser cumprida de forma metódica, implacável, mesmo que traga sérios prejuízos para o País.

            Quisera eu estar me referindo ao aparelhamento do Estado no sentido positivo, sadio: de trazer equipamentos aos hospitais, computadores às escolas, aos laboratórios de pesquisa e às universidades, de dotar o Estado de bons e bem treinados servidores.

            Não, Srs. Senadores! Infelizmente, refiro-me ao aparelhamento do Estado no sentido mais nefasto, com a máquina pública sendo inflada com apaniguados, militantes partidários, sem o devido compromisso com a qualidade e correção do serviço, desses sendo exigido somente que se mostrem devotos do pensamento único.

            E pior, em alguns casos, deliberadamente estão privando o Estado de contar com profissionais competentes apenas porque não se ajustam ao rígido figurino ideológico, à estrita corrente de pensamento estabelecida pelo poder.

            Se não é assim, como entender a decisão do Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - Ipea, Márcio Pochmann, de afastar daquele órgão os economistas Fábio Giambiagi, Gervásio Resende, Regis Bonelli e Otávio Tourinho?

            Curiosamente, todos eles são críticos da administração econômica do Governo. Todos eles, Sr. Presidente, contrários aos aumentos cada vez mais acentuados dos gastos com o custeio da máquina pública.

            Foi um expurgo.

            Por tudo que se vê, pelas razões apresentadas pelo Presidente do Ipea para o afastamento, mais do que aparelhamento do Estado, o que presenciamos foi, repito, um expurgo.

            De tão primárias, as explicações dadas para o afastamento sequer merecem ser comentadas.

            Infelizmente, a política do pensamento único, tão comum em regimes antidemocráticos, mas que se esperava não mais existir no Brasil, voltou a mostras suas garras nesse episódio.

            Causa perplexidade onde aconteceu desta vez.

            No Ipea... que, em mais de 40 anos, jamais tinha conhecido perseguição a seus pesquisadores. Inclusive foi fundado pelo então Ministro João Paulo dos Reis Velloso - seu conterrâneo - e que deu o exemplo, primeiro, ao acolher economistas de todas as matizes ideológicas e de pensamento, na época. Portanto, foi um exemplo que, dentro do governo militar, deveria ter sido um exemplo perene, mas que, infelizmente, agora está sendo quebrado.

            O Ipea... uma instituição que tradicionalmente abrigou economistas das mais diferentes tendências, o que sempre conferiu isenção e credibilidade.

            Surpreende-nos, principalmente, ela ocorrer justamente quando o Instituto passou a subordinar-se ao Núcleo de Assuntos Estratégicos, comandado por Roberto Mangabeira Unger - o tal Sealopra, Secretaria Especial de Ações de Longo Prazo.

            Um homem ligado à vida acadêmica; um estudioso cuja formação certamente recebeu referências e influências plurais.

            Sr. Presidente, a medida adotada é deplorável sob todos os aspectos.

            Seria recriminável em qualquer outra circunstância.

            E é ainda mais grave por ter-se dado em uma instituição da importância estratégica do Ipea, vital para o planejamento de políticas públicas de médio e longo prazo no Brasil.

            Difícil aceitar o que aconteceu.

            A qualidade desses quatro economistas não é questionada sequer pelos que discordam deles.

            Eu, mesmo concordando em muito com eles, devo dizer que, como professor e democrata, saúdo a existência dos que discordam deles, adepto do que sou do embate de idéias.

            Quanto mais penso nas razões que levaram à fundação do Ipea, pelo Ministro Reis Velloso, há mais de quarenta anos, mais incompreensíveis me parecem essas demissões.

            O Ipea não é um órgão de execução do que quer que seja!

            O Ipea foi criado para pensar o Brasil!

            Senhores, uma das finalidades do Ipea é avaliar e acompanhar as políticas públicas. Para isso, ele deve ter condições de analisar, com isenção, e diagnosticar os problemas estruturais e conjunturais da economia e das políticas públicas implementadas pelo Governo.

            Ora, Sr. Presidente... É impossível analisar e, principalmente, propor reformulações sob o império do pensamento único! Olhe Chávez!

            É impossível praticar a isenção com a ameaça de expurgo ao menor sinal ou manifestação que desagrade o feitor de ocasião.

            Sr. Presidente, trago aqui comigo um estudo publicado pelo Ipea há poucos dias. Chama-se “Dezessete anos de política fiscal no Brasil: 1991-2007”. Seu autor é o economista Fabio Giambiagi, um dos quatro expurgados pelo Ipea. O trabalho apresenta a trajetória da política fiscal no Brasil desde 1991. Quase vinte anos...

            Nesse tempo, o gasto primário do Governo passou de 14% do PIB, em 1991, para uma estimativa de 22% do PIB em 2007. Nesse mesmo período, a receita saltou de 15% do PIB para 24% do PIB. E a carga tributária - olhem só! - de 24% para 35% do PIB.

            Com dados como esses - todos inatacáveis - ficou mesmo difícil ao Governo gostar do que iria ler.

            Srs. Senadores, trata-se de um trabalho extenso, denso, de excelente conteúdo, bem fundamentado e propositivo, e que - vejam a coincidência! - foi publicado neste mês de novembro.

            Certamente não vou comentá-lo em sua integridade, razão pela qual peço ao Presidente que autorize sua transcrição nos Anais da Casa. Contudo, permito-me destacar alguns pontos que, certamente e infelizmente, dão uma pista das razões pelas quais esse economista integrou a lista dos expurgados do Ipea.

            Hoje, o articulista Merval Pereira, de O Globo, faz menção a esse trabalho, que é da mais alta importância.

            Giambiagi lista as grandes transformações pelas quais passou o setor público brasileiro nas últimas duas décadas. Ele cita, entre outros marcos:

     a privatização das estatais;

      a venda de bancos estaduais;

     o Plano Real;

     as três reformas parciais da Previdência;

     o ajustamento fiscal pelo qual passaram Estados e Municípios;

     a adoção de metas de resultado primário para o setor público; e

     a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal.

            Mais adiante, Fábio Giambiagi relaciona os desafios que o Governo deve enfrentar na área fiscal.

            Entre esses desafios, cita o aumento do investimento público - estamos gastando em custeio, estamos desperdiçando dinheiro e não investindo no que deveríamos investir; a diminuição da carga tributária - olha a CPMF aí, pois temos o dever cívico de barrar esse aumento de carga tributária; e, claro, para viabilizar esses dois, um terceiro: a contenção dos gastos correntes.

            O Governo está sendo perdulário com o dinheiro público. Os gastos correntes aumentam a taxas exponenciais. Com isso, diminui a capacidade de investimento do próprio Governo, inclusive em infra-estrutura. A infra-estrutura do Governo está sucateada, e o Governo não investe porque gasta onde não deve gastar.

            Como se vê, ele se alinha com a enorme maioria, quase totalidade, dos economistas das mais diversas correntes de pensamento, que apontam esses três fatores os principais responsáveis pelo fato de o Brasil não ter alcançado taxa de crescimento de sua economia compatível com os demais países em estágio similar de desenvolvimento.

            Nossas taxas são abaixo da média dos países em desenvolvimento.

            Queria chamar atenção para a expressão que utilizei - “diversas correntes de pensamento” -, que, parece-me, talvez tenha sido o detonador da ação persecutória no Ipea.

            Sr. Presidente, como disse, o trabalho é longo e não pretendo comentá-lo todo agora.

            Claro está que alguns, no Instituto e fora dele, vinham se irritando, há tempos, com as análises, conclusões e recomendações dessa turma.

            Vamos aguardar a presença do Presidente do Ipea, Marcio Pochmann, na Comissão de Assuntos Econômicos, em face do requerimento apresentado pelo Senador Arthur Virgílio.

            Lá, poderemos conhecer as razões para o Ipea ter decidido abrir mão de pesquisadores da qualidade de Fabio Giambiagi, Gervásio Rezende, Régis Bonelli e Otávio Tourinho.

            Será uma oportunidade para o presidente do Ipea confirmar se de fato decidiu, e por que razões decidiu, extinguir o Grupo de Acompanhamento Conjuntural daquele órgão, que dava estatísticas periódicas do desempenho da economia brasileira. Este é outro ponto que preocupa, um outro problema: o Boletim de Conjuntura do Ipea agora não será mais divulgado. Ainda mais: se é verdade que as pesquisas do Instituto, a partir de agora, tramitarão sob regime de confidencialidade, ou seja, não serão mais divulgados, sendo que estavam na Internet. A cada trimestre, o boletim estava disponível para qualquer pessoa que o quisesse consultar.

            Se for verdade, terá sido mais uma decisão que, somada às demais, empobrecerá mais a ação e a importância estratégica do Ipea.

            Lá, na CAE, também poderemos conhecer melhor sua opinião, Dr. Márcio, sobre outros temas. Saber o que pensa Márcio Pochmann da reclamada (por muitos) diminuição dos gastos correntes e da carga tributária...

            Compreender melhor como ele entende deva ser o grau desejável de participação do Estado na economia, o tamanho ideal da máquina pública...

            Saber como avalia a política monetária e o papel desempenhado pelo Banco Central no Governo Lula.

            Tenho certeza de que o Sr. Márcio Pochmann é absolutamente avesso a uma série de posições com relação ao ajuste fiscal. Ele é favorável à expansão dos gastos. No entanto, temos de sabatiná-lo, de discutir com ele essas questões, que são muito importantes.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vamos aguardar a vinda do Sr. Márcio Pochmann.

            Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. ANTONIO CARLOS JÚNIOR EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Dezessete Anos de Política Fiscal no Brasil:1991-2007”. Fábio Giambiagi.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2007 - Página 41719