Discurso durante a 216ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com o episódio ocorrido no Pará, onde uma menor foi presa em cela junto com 20 homens. Considerações sobre a política prisional do nosso País.

Autor
Marisa Serrano (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Marisa Joaquina Monteiro Serrano
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PENITENCIARIA.:
  • Indignação com o episódio ocorrido no Pará, onde uma menor foi presa em cela junto com 20 homens. Considerações sobre a política prisional do nosso País.
Aparteantes
Expedito Júnior, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 27/11/2007 - Página 41865
Assunto
Outros > POLITICA PENITENCIARIA.
Indexação
  • REPUDIO, GRAVIDADE, OCORRENCIA, INTERIOR, ESTADO DO PARA (PA), VIOLENCIA, PRISÃO, MENOR, MULHER, PENITENCIARIA, EXCLUSIVIDADE, DETENTO, HOMEM.
  • QUESTIONAMENTO, INCOERENCIA, DECLARAÇÃO, CONDUTA, MULHER, GOVERNADOR, SECRETARIO, SEGURANÇA PUBLICA, JUIZ, DELEGADO, ESTADO DO PARA (PA).
  • REGISTRO, ANTERIORIDADE, APROVAÇÃO, SUBSTITUTIVO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ALVARO DIAS, SENADOR, DEFINIÇÃO, NORMAS, DESPESA, SEGURANÇA PUBLICA, GOVERNO FEDERAL, PROIBIÇÃO, REDUÇÃO, VERBA, SETOR, AUSENCIA, CUMPRIMENTO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, CUMPRIMENTO, LEIS, ESPECIFICAÇÃO, CODIGO PENAL, PROIBIÇÃO, PRISÃO, MENOR, MISTURA, HOMEM, MULHER, PENITENCIARIA.
  • COBRANÇA, PROVIDENCIA, CONSELHO NACIONAL, POLITICA PENITENCIARIA, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), REFORMULAÇÃO, ESTABELECIMENTO PENAL, BRASIL, GARANTIA, DIGNIDADE, PRESO.

A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

Até por ter sido eleita Vice-Presidente do meu Partido, sendo tão difícil às mulheres galgarem um cargo público na política e, principalmente, um cargo de comando, venho falar hoje aqui.

Há coisas que magoam as pessoas, há coisas que inquietam e que, principalmente, não nos deixam calar. Mais do que isso, quero analisar dois aspectos dessa questão de uma jovem menina ter sido encontrada numa cela com homens, numa cidade do interior do Pará. A indignação tomou conta da sociedade, a indignação que percebemos quando acompanhamos um ato de vandalismo, de terrorismo, de maus tratos, algo que possamos abominar.

Eu vi desta tribuna inúmeros Parlamentares falarem do caso do João Hélio, no Rio de Janeiro, quando ele foi arrastado por um delinqüente que roubava um carro. Todo o Brasil se indignou. Ficamos indignados ao ver esse caso que aconteceu no Pará, por várias razões: por ser uma mulher, por ser uma jovem menina, menor de idade, por estar no amparo da lei. Ela não podia estar lá por várias razões. Não podia estar lá porque é uma mulher e a lei proíbe. Não podia estar lá porque é menor, e o Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe. Então, ela não podia estar lá. E o Senador Papaléo Paes se referiu a algo que nos entristece mais ainda: a razão da questão de gênero, o que nos bate mais fundo ainda.

Uma Governadora mulher, uma Secretária de Segurança Pública mulher, uma Juíza mulher e uma Delegada mulher são as responsáveis pela parte jurídica, pela parte operacional e pela determinação de quem tem o poder na mão.

Isso tudo nos preocupa, mas não acredito e continuo não acreditando que seja uma questão de gênero, principalmente porque nós mulheres temos o sentimento da maternidade. Nós que sempre defendemos os nossos filhos e os nossos jovens; que vamos à luta, às ruas, em qualquer situação para defender aqueles a quem demos à luz e, por conseguinte, nos espelhamos nos filhos dos outros, acho difícil que possamos levar esse caso na questão de gênero.

Penso: como isso pôde acontecer num Estado em que as mulheres estavam relacionadas com esse caso? Cheguei a pensar: será...? Não sei se há estudos a respeito, mas concito a academia a estudar essa questão. Será que a mulher, quando chega ao poder com que ela não tem tanta familiaridade, será que essa mulher se embrutece a tal ponto? Será que ela acredita que se, de alguma forma, proteger mais as mulheres, os outros, os homens vão pensar que ela está sendo discricionária, que ela está se apartando daquilo que ela deve fazer, que ela está privilegiando um segmento do seu Estado, da sua cidade, do seu País?

Esta é uma questão que também deve muito ao instituto falido da política prisional do nosso País. Mesmo que nos reportemos ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que é ligado ao Ministério da Justiça, um Conselho que tem vários deveres, entre os quais: propor diretrizes da política criminal; promover uma avaliação periódica do sistema criminal; elaborar um programa nacional penitenciário de formação e aperfeiçoamento do servidor que trabalha nos nossos presídios; inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, se nós temos o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, está na hora de fazer com que esse Conselho venha a público e diga o que está fazendo para que as nossas prisões sejam estabelecimentos prisionais que guardem seres humanos, e não bestas-feras!

Hoje, por conta disso, conversei com o Secretário de Segurança Pública do meu Estado, que é um profissional de carreira: é da Polícia Federal. Conversei com o Dr. Jacini sobre a questão prisional, e ele me falou de algo que diz respeito ao Senador Alvaro Dias, porque ele disse que é necessária uma reformulação geral nas penitenciárias brasileiras. Ele disse - e quero fazer esta colocação - que Mato Grosso do Sul, meu Estado, tem 4.200 vagas para criminosos nas penitenciárias mas tem 11.500 presos. Se há 4.200 vagas, como encarcerar 11.500 presos? Essa equação não fecha; não tem como fechar.

Quero perguntar: será que é só em Mato Grosso do Sul que acontece isso? Não; em todo o País, homens são amontoados em celas como animais. Portanto, eles respondem também como animais, porque nós os tratamos assim. Não é porque eles agem como bestas-feras que nós vamos agir também.

Senador Alvaro, procurei hoje acompanhar - e, se não me engano, em 13 de fevereiro deste ano, nós aprovamos um substitutivo ao PLS nº 134, que é da sua autoria, que define regras para as despesas de segurança pública por parte do Governo Federal, proibindo o contingenciamento de verbas para essa área. Eu pergunto: avançamos? Não avançamos, Senador. Houve o caso do menino João Hélio; houve o caso dessa moça, e infelizmente haverá inúmeros outros casos. Mas nós estamos aqui de mãos amarradas.

Pergunto: será que temos o que comemorar? Não temos.

É chegada a hora de fazer com que as coisas comecem a andar neste País, a começar por esta Casa.

Eu propus um levantamento de todos os projetos de lei que tramitam nesta Casa a respeito de segurança e das penitenciárias que temos neste País. Não adianta a Governadora Ana Júlia - isso está em todos os jornais hoje - vir para cá pedir mais penitenciárias. Isso importa e ajuda, mas precisamos muito mais do que isso, muito mais do que isso. Precisamos trabalhar com a consciência do povo brasileiro; garantir que o povo brasileiro tenha mais educação e mais consciência principalmente de atos absurdos e bárbaros como os que estamos vendo neste País. Está aumentando tanto o número de presos no Brasil que, algum dia, nós vamos chegar, como narra Machado de Assis no seu conto O Alienista, a ter mais pessoas dentro do que fora. Essa é uma preocupação que tem de ser de todos, dos homens e mulheres de bem deste País, para que olhem para o que está acontecendo e não permitam mais essas barbaridades.

Haverá, na próxima quarta-feira, dia 28, às 10 horas, uma sessão solene do Congresso no plenário da Câmara. Para comemorar o quê? O Dia Internacional da Não-Violência contra as Mulheres. Vamos comemorar na quarta-feira, aqui, neste Congresso.

Ainda mais: ontem foi aberto no Rio de Janeiro, pela Ministra Nilcéa Freire, um show de músicas para comemorar um ano da Lei Maria da Penha.

De que adianta termos leis se não mudarmos a estrutura policial e carcerária deste País? Podemos comemorar leis, mas, se elas não são aplicadas, de que adianta?

A Senadora Ana Júlia criou um decreto que proíbe que mulheres fiquem encarceradas junto com homens e também proíbe que crianças fiquem em penitenciárias. Só que existe lei: o Código Penal é muito claro. Já está lá, não há necessidade de decreto. A lei é superior ao decreto. De que adianta ter Código Penal se não o cumprimos?

Sr. Presidente Senador Alvaro Dias, neste discurso eu digo que fiquei muito estarrecida com o que aconteceu no Pará. Perguntei ao Secretário de Segurança Pública de Mato Grosso do Sul se ele tem conhecimento de casos como este no meu Estado. Ele disse que de jeito nenhum, que isso não acontece. Então isso não deve ser comum nos Estados brasileiros. Eu não sei. Acredito que estão fazendo agora esse levantamento.

Se quem tem de fazer cumprir a lei vai contra ela, como vamos acreditar na lei? Quem é que vai acreditar numa lei se as próprias pessoas que devem fazê-la cumprir, como a juíza e a delegada, não o fazem? Como nós, que estamos aqui, vamos acreditar?

Termino, Sr. Presidente, mostrando a minha indignação e dizendo que é preciso, sim, que o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária nos proponha algo para mudar essa questão. E é função deles fazerem isso.

Precisamos fazer com que as leis sejam cumpridas e, além disso, não pensar como a Governadora do Pará, Ana Júlia, que disse ser essa uma prática lamentável, mas que, infelizmente, acontece há algum tempo.

Não podemos aceitar, em hipótese alguma, violência contra quem quer que seja, principalmente nós que lutamos contra a violência principalmente sobre o gênero feminino.

Deixo aqui as minhas palavras de alerta e de indignação.

Senador Expedito Júnior, ouço V. Exª.

O Sr. Expedito Júnior (Bloco/PR - RO) - Senadora Marisa, é lamentável a declaração da Governadora. Há mais de 20 anos sou Parlamentar - Deputado Federal, Senador da República -, representante do povo e do Estado de Rondônia, e nunca ouvi dizer que lá no meu Estado os presos iam todos juntos para a mesma cela. Lá sempre existiu o presídio feminino. É lamentável isso. Eu comentava ainda há pouco com o Senador Mão Santa que o Pará está muito atrasado. Que me perdoem os Parlamentares do Pará, por eu estar falando do Estado deles; perdoe-me a ex-Senadora e Governadora, que, repito, disse que isso vinha acontecendo há muito tempo. Em Rondônia, isso nunca aconteceu. Quando eu cheguei aqui perguntei qual seria a tônica do discurso de V. Exª e indaguei se no Estado de V. Exª acontece isso. E V. Exª me disse: “Não; isso é um absurdo!” Realmente isso é um absurdo. Parabéns pelo pronunciamento de V. Exª. Pode ter certeza de que o Brasil inteiro está nos acompanhando, não somente por causa da CPMF. O pessoal diz que é devido à CPMF que o povo brasileiro está acompanhando as sessões. Não. A TV Senado tem uma audiência muito grande. Quando eu retorno ao Estado de Rondônia, para onde vou todas as sextas-feiras, ou seja, toda semana, escuto o povo que vem ao meu encontro falar sobre o que eu discursava na tribuna do Senado, às vezes cumprimentando-me, às vezes criticando-me ou pedindo-me uma ação mais enérgica. Meus parabéns. Não seria diferente o posicionamento de V. Exª, que conheço desde os tempos da Câmara dos Deputados. Tenho certeza de que V. Exª defende o seu Estado com muito orgulho.

A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Obrigada.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senadora Marisa Serrano, primeiro quero cumprimentá-la pela brilhante vitória no PSDB. Fui à reunião representando o PMDB autêntico, porque temos um grupo qualitativamente muito forte. Eu, Pedro Simon, Jarbas Vasconcelos e Geraldo Mesquita Júnior comparecemos, representando o PMDB histórico, autêntico. Queremos cumprimentá-la. V. Exª enriquece o PSDB. Quanto a esse negócio de o PT pensar que intimida, negócio de cartão amarelo... Eu sou é do Piauí. Não existe isso na história do mundo - eu sei da história universal. Nunca existiu nem em época medieval - Demóstenes errou -, muito pelo contrário; o que eles faziam era rezar, havia monges, havia São Tomás de Aquino... No Brasil, está aí o nosso companheiro Paulo Duque, mas quem tratou de presidiário na literatura foi Graciliano Ramos, em Memórias do Cárcere. Não há isso. Assis Brasil, escritor piauiense, foi laureado com o prêmio Walmap, pela obra Os que Bebem Como os Cães. O Carandiru nem isso teve. Isso é uma imoralidade, uma ignomínia. O Presidente da República tem que pegar sua esposa, que representa a mulher, como V. Exª, e pedir a essa jovem, à família dela, perdão. Isso é a maior barbárie na história da humanidade. Então, cartão vermelho para a administração da insensibilidade, da incompetência, da insanidade, do PT.

A SRª MARISA SERRANO (PSDB - MS) - Quero agradecer os apartes e dizer ainda uma coisa que eu acho importante dizer depois das falas dos Senadores Mão Santa e Expedito Júnior: esta Casa tem que voltar a discutir os grandes problemas nacionais. A solução desses problemas deve e pode mudar a feição deste País. A questão prisional é uma delas.

É necessário que discutamos, sim, em profundidade, como fazer para que o nosso País não apareça no Relatório da ONU, como saiu dias atrás, como um País que não respeita os direitos humanos, como um País que tortura, como um País que aceita todas as ignomínias. É um absurdo. Eu não quero viver num País que seja visto não só por nós, mas também pelos outros como o País da barbárie.

Então, questões como essa têm que ser debatidas nesta Casa. Temos que voltar a ter grandes debates aqui sobre questões de fundo, que possam realmente começar a mudar o Brasil, porque só assim vamos contribuir para fazer um País melhor.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/11/2007 - Página 41865