Discurso durante a 221ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Previsão de turbulência financeira internacional em 2008. Defesa da prorrogação da CPMF.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL. TRIBUTOS.:
  • Previsão de turbulência financeira internacional em 2008. Defesa da prorrogação da CPMF.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/2007 - Página 42670
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL. TRIBUTOS.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, DISCURSO, PEDRO SIMON, SENADOR, DEFESA, APROVAÇÃO, SUBSTITUTIVO, SENADO, PROJETO DE LEI, COMBATE, LAVAGEM DE DINHEIRO, CRIME ORGANIZADO, MODERNIZAÇÃO, ESTADO.
  • AVALIAÇÃO, HISTORIA, ECONOMIA NACIONAL, SAUDAÇÃO, CRESCIMENTO, ATUALIDADE, CORRELAÇÃO, ESTABILIDADE, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, VIGENCIA, LIBERDADE, DEMOCRACIA.
  • JUSTIFICAÇÃO, POPULARIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATENDIMENTO, URGENCIA, COMBATE, POBREZA, APROVEITAMENTO, ESTABILIDADE, ECONOMIA, INFRAESTRUTURA, PERIODO, HISTORIA, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • JUSTIFICAÇÃO, PRORROGAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), MANUTENÇÃO, POLITICA SOCIO ECONOMICA, GOVERNO, ADMINISTRAÇÃO, DIVIDA PUBLICA, REDUÇÃO, JUROS, INCENTIVO, CRESCIMENTO ECONOMICO, POSSIBILIDADE, GRADUAÇÃO, AJUSTE, TRIBUTAÇÃO.
  • ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), IMPEDIMENTO, IRREGULARIDADE, CONTABILIDADE, EMPRESA, ENRIQUECIMENTO ILICITO, PESSOAS, INSTRUMENTO, RECEITA FEDERAL, COMBATE, SONEGAÇÃO.
  • PREVISÃO, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, ORIGEM, SISTEMA PENITENCIARIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ANUNCIO, RECESSÃO, NECESSIDADE, ATENÇÃO, BRASIL, PRESERVAÇÃO, POLITICA FISCAL, SUPERAVIT, RISCOS, INFLAÇÃO, CONCLAMAÇÃO, COMPROMISSO, CONGRESSISTA, APROVAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), SAUDAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, BANCADA, APERFEIÇOAMENTO, PROPOSTA, AMPLIAÇÃO, RECURSOS, SAUDE, EDUCAÇÃO, GRADUAÇÃO, REDUÇÃO, ALIQUOTA, ISENÇÃO, FAIXA, RENDA, ELOGIO, APOIO, GOVERNADOR, ESTADOS.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero também parabenizar a Presidência pela iniciativa e a advertência do Senador Pedro Simon. Em particular, desse projeto de lavagem de dinheiro, fui um dos Relatores, assim como o Senador Pedro Simon.

Trata-se de um projeto que prevê aumento de multa de até 200%, dependendo da natureza do crime, e o juiz tem a possibilidade de impor multas de R$20 milhões - uma dessas opções. Isso significa a possibilidade concreta de se reaver recursos que são roubados, expropriados, objetos do narcotráfico, do contrabando e da corrupção e é um instrumento muito importante para modernizarmos o Estado brasileiro.

Portanto, lutarei aqui pela aprovação desse projeto, que reputo da maior relevância, assim como o projeto da tipificação do crime organizado, que prevê até vinte anos a mais de cadeia quando há identificação do chefe de quadrilha.

Mas quero entrar no debate da CPMF - e tenho feito isso com certa recorrência -, porque sinto que essa é uma decisão fundamental para o futuro da economia brasileira e também para a consistência das políticas sociais.

Se fizermos um breve histórico do que aconteceu com a economia brasileira neste pós-guerra, podemos nos reportar a sucessivas conjunturas, mas duvido que alguém possa apontar um cenário econômico, político e social que consiga encontrar crescimento econômico como estamos tendo neste momento, em torno de 5% do PIB. A indústria, por exemplo, em São Paulo, nos últimos 12 meses, cresceu mais de 11% - eu diria que em ritmo chinês de expansão da indústria -, sustentada por vários indicadores. A produção de computadores, de automóveis, de tratores, de caminhões bate recorde histórico no Brasil. Uma conjuntura em que a inflação do Brasil está abaixo da inflação mundial.

Foram raros os momentos, no cenário do pós-guerra, em que isso aconteceu - ainda que tenha acontecido. Também tivemos taxas de crescimento superior à atual. Uma conjuntura em que geramos, em quatro anos e meio, oito milhões e meio de empregos com carteira de trabalho assinada, o que proporcionou inclusão social e diminuiu a taxa de desemprego. Uma conjuntura em que o Brasil alcança o alto desenvolvimento humano - um indicador do Pnud e da ONU que existe desde 1972, mas só agora o Brasil atinge essa condição, com melhorias na área da saúde, da educação, da renda per capita e da distribuição de renda.

Uma conjuntura em que a distribuição de renda aparece nos principais indicadores. A renda per capita média da população cresceu 20% nos últimos quatro anos, mas, em relação aos 50% mais pobres, cresceu 32% - 1/3 a mais de poder de compra; e, em relação aos 10% mais ricos, cresceu apenas 16%.

É compreensível entender que há setores da sociedade que não aceitam essa mudança de lógica econômica e social, mas a maioria do povo a quer e esperou durante muitos anos que isso pudesse acontecer.

E há a mais ampla liberdade política, transparência, funcionamento das instituições republicanas; a imprensa é livre, critica; há protestos sociais; o Ministério Público desempenha seu papel, o Ministério Público, o Tribunal de Contas, a Polícia Federal; há independência entre os Poderes. É só ver o entorno da América Latina para se observar o que isso representa como avanço democrático e como consolidação do Estado de Direito e dos valores democráticos em nosso País.

Portanto: crescimento, estabilidade, democracia, distribuição de renda e inclusão social. Não há nenhum momento, analisando-se a conjuntura do pós-guerra, em que esses elementos estivessem presentes com a intensidade com que estão agora, neste período da história do Brasil.

Alguns poderiam se reportar ao período Getúlio Vargas. É verdade, Getúlio foi um grande estadista. Ainda ontem, estávamos discutindo parte da herança getulista, como a estrutura sindical, que está aí até hoje e que precisa ser modernizada, mas ela é indispensável à história dos trabalhadores.

Getúlio constituiu o Estado brasileiro: o Ministério do Trabalho, o Ministério da Educação, o Ministério da Saúde. Foi no governo de Getúlio que instituiu-se a CLT, o salário mínimo; foi no governo de Getúlio que se criou a Petrobras, a Vale do Rio Doce - que, parece, vai passar a se chamar Vale. Mas foi ali, na negociação da guerra, que voltamos a ter controle do subsolo e da mineração, o que não tínhamos desde o início da colonização. A criação da CSN, a maior siderúrgica da América Latina ainda hoje; a criação do BNDE, um banco maior que o Banco Mundial e o BNDES para financiamento dos países em desenvolvimento. Todos esses instrumentos do Governo de Getúlio foram muito importantes para a industrialização e para o crescimento. Mas, sobretudo de 1937 a 1945, tivemos a ditadura do Estado Novo e não tínhamos liberdades democráticas; não tínhamos, portanto o ambiente político que temos no Brasil hoje.

O Governo Dutra não merece um balanço mais aprofundado, porque o Plano Salte - Saúde, Transporte e Educação - queimou as divisas cambiais que tínhamos acumulado no pós-guerra, comprou sucata de guerra que os americanos nos empurraram para financiar o Plano Marshall, tivemos de pagar à vista várias dívidas que tínhamos com a Inglaterra, de ferrovias, do Viaduto do Chá e outras, e queimamos uma oportunidade política. Em dois anos, estávamos, de novo, com crise de balanço de pagamentos.

Podemos falar do Governo Juscelino Kubitschek, novamente um estadista da história brasileira, estadista que conseguiu pensar na integração nacional, com a construção de Brasília; estadista que conseguiu construir um grande pacote de investimentos, que foi o Plano de Metas - cinqüenta anos em cinco -, com o qual demos um salto na industrialização e na indústria da construção civil pesada. Está aí a indústria automotiva, hoje uma plataforma importante da produção mundial no Brasil. Começa ali, em Juscelino Kubitschek.

Se tivemos crescimento econômico, projetos industrializantes, projetos estruturantes, não tivemos estabilidade econômica. A inflação, já no final do Governo Getúlio, volta com muita intensidade. Tivemos uma grave crise de balanço de pagamentos pela forma como financiamos aquela expansão, e a herança de Juscelino no pós-Plano de Metas é uma grave instabilidade econômica e social, cujos desdobramentos, a última tentativa organizada de estabilizar a economia, foi o Plano Trienal, no Governo João Goulart, de Celso Furtado e San Tiago Dantas, que fracassa porque os movimentos sociais não foram capazes de entender o que estava em jogo. O que estava em jogo era a democracia, naquele momento. Radicalizavam nas reformas de base, de um lado, enquanto a direita se preparava, mais uma vez, para governar. Tem sido assim muitas vezes na história do Brasil: a esquerda sempre sonhando com o futuro, para deixar a direita de plantão mandar no Brasil.

Com o fracasso do Plano Trienal, temos o PAEG, em 64, Plano de Ação Econômica do Governo, a ditadura, os tanques na rua, dois mil sindicalistas presos e afastados dos sindicatos, censura, repressão, fim das liberdades individuais, das garantias, que começa em 64 e se intensifica em 68.

A partir do segundo semestre de 67, com a saída de Roberto Campos e de Bulhões e a entrada de Delfim Netto, há uma guinada na política econômica e o Brasil volta a crescer. Volta a expandir o gasto público, volta a acreditar que aquela inflação não era de demanda, era de custos; portanto, havia espaço para o crescimento econômico. E o Brasil, de 1968 a 1973, tem um fortíssimo crescimento econômico. De 70 a 73, ocorre o chamado “milagre econômico” do Brasil, com taxas de crescimento do PIB superiores a dois dígitos. É um momento excepcional de crescimento, de expansão de todas as frentes da economia brasileira, especialmente a indústria de bens de consumo duráveis, a indústria automotiva, a indústria imobiliária, mas não houve distribuição de renda. Não houve distribuição de renda porque não havia liberdade e democracia, porque não havia participação dos sindicatos, porque não havia negociação entre trabalhadores e empresários, com a liberdade que é indispensável para que os trabalhadores aumentem sua participação na renda.

Em 1974, nós tivemos o segundo PND, o último Plano Nacional de Desenvolvimento verdadeiramente relevante. Ali estão Tucuruí, Ferrovia do Aço, Carajás, Itaipu, grandes projetos estruturantes do Brasil. No momento em que o voluntarismo do regime militar - porque não havia debate democrático - permite impulsionar esses grandes projetos, conduz o Brasil a uma grave crise de balanço de pagamentos, à crise do petróleo, que começa em 73 e se agrava em 77. O Brasil, novamente, tem problemas de balanço de pagamentos e instabilidade política, com volta da inflação e baixo crescimento.

Em 1982, por ironia da história - Delfim Netto era Ministro da Fazenda, esse economista com quem tenho, ao longo da minha vida, debatido tanto, e tantas vezes nós tivemos as mesmas posições, como temos hoje -, o Brasil vai para o Fundo Monetário Internacional e vai passar praticamente 25 anos sem conseguir se libertar para retomar os instrumentos de política econômica.

A crise, a moratória de 82 do Brasil inicia um longo período de baixo crescimento, de ausência de projetos estruturantes, de falta de planejamento estratégico, e o Brasil atravessa todos os anos 80 num cenário em que, de 1980 a 1994, teve 23 trilhões de pontos percentuais de inflação, a mais longa hiperinflação da história documentada da humanidade. Nenhuma nação viveu com a intensidade que nós vivemos o processo de hiperinflação.

Houve vários planos econômicos e tentativas fracassadas. Talvez o mais articulado, o mais importante, o mais generoso socialmente, mas inconsistente, tenha sido o Plano Cruzado. Quase não merece atenção o Plano Collor I, o Plano Verão, ou ainda o Plano Collor, o primeiro que foi devastador do ponto de vista da liquidez da economia, num quadro em que a inflação mensal era de 84% ao mês.

O que nós tivemos nesses 25 anos? Basicamente, um longo esforço para recuperar, minimamente, as condições das contas externas.

O Plano Brady, a repactuação da dívida externa do Brasil, permitiu ao País retomar as condições de financiamento mínimas, o que deu lugar, em 94, ao Plano Real e, aí, sim, ao processo de estabilização monetária, com uma inteligência criativa na forma de desindexar a economia, que não era o congelamento: o uso da URV. Nesse período, o governo insiste em um âncora cambial, especialmente a política do Banco Central, uma aventura, um populismo cambial, e vai financiando esse endividamento externo crescente do País. Há perda, déficits comerciais ao balanço comercial, endividamento externo.

Financiando esse processo com as privatizações, vendemos a mineração, a petroquímica, a química, a siderurgia, o setor elétrico, o setor de telecomunicações. Fomo-nos desfazendo do patrimônio público todo construído no pós-guerra e aumentando a carga tributária para poder, com as privatizações e o aumento dos impostos - inclusive a CPMF, que nasce ali, com Fernando Henrique, e se mantém durante todo o Governo de Fernando Henrique Cardoso -, tentar administrar a grave crise financeira e as dificuldades de balanço de pagamento, que ficam visíveis a partir da crise de 1998.

No início de 99, a desvalorização do real coloca o País em um cenário de grande turbulência, de grande instabilidade, e a muito custo conseguimos preservar a estabilidade da moeda.

Precisamos olhar para a História do Brasil com um mínimo de profundidade, ao menos para essa história do pós-guerra. Vou repetir, desta tribuna, e convido qualquer outro parlamentar para subir e demonstrar o contrário; apresentem-me argumentos, dados, e vamos fazer um debate mais aprofundado, pelo menos coerente e consistente com a história recente do Brasil: não há, na história recente do Brasil, um momento como este que estamos vivendo. O crescimento, seguramente, não é o maior da história do pós-guerra, mas é um crescimento de 5% do PIB, e, nos últimos três anos, foi de 4,2. É pelo menos o dobro dos últimos 25 anos. Não é o período de menor taxa de inflação, mas são raríssimos os momentos em que tivemos inflação abaixo da inflação mundial, abaixo de 4%. E é um momento excepcional, porque é uma das poucas vezes, nesses 40 ou 50 anos de história, em que a distribuição de renda se move, o índice do Coeficiente de Gini se move, os mais pobres ganham mais do que os mais ricos. A metade mais pobre deste País, nos últimos quatro anos, aumentou a sua renda real em 32%: um terço a mais de poder de compra.

Não há manchete de jornal, não há discurso panfletário, não há ataque político ao Governo que vá revogar da História essa condição. Para aqueles que não entendem por que os pobres, os despossuídos, os excluídos deste País são Lula, explico que são Lula porque é Lula quem veio deles e é Lula quem traz para eles o que os governos anteriores não foram capazes de trazer.

A obra que estamos vivendo, de estabilidade da economia, de crescimento econômico, de distribuição de renda, de ter US$175 bilhões em caixa é muito rara na história econômica. Não é uma obra apenas deste Governo, não. A estabilidade veio do governo anterior. Parte da infra-estrutura que está aí veio lá de trás, dos governos militares, e é o que suporta ainda esse crescimento econômico, porque há muito tempo não investimos em infra-estrutura.

Mas esse cenário tão especial não é invulnerável. É um engano achar que podemos tomar uma decisão simplesmente fazendo um discurso mais demagógico para o eleitorado. Nunca vi alguém subir à tribuna e dizer que pagar imposto é bom. Isso é uma coisa absolutamente elementar. Imposto chama imposto porque é imposto, imposto pelo Estado à sociedade. O problema é que não há como governar sem impostos. Não há como administrar uma dívida de R$1,12 trilhão, que não foi este Governo que fez, sem tributos. E não há como baixar os juros sem carga tributária elevada, porque são os juros altos que alimentam o endividamento do Estado. E, quanto menores os juros, maior chance teremos de reduzir carga tributária hoje e no futuro. O crescimento econômico e os juros baixos abrem uma pequena janela para reduzir carga tributária. Mas nós não podemos reduzir carga tributária num único dia, numa aventura política, retirando R$40 bilhões do Orçamento da União. Digam-me em que momento da história econômica isso aconteceu?

Agora, populismo fiscal, nós já reproduzimos muitas vezes na história: gastar mais do que se arrecada, endividar o Estado e financiar depois, com o sacrifício do povo, vendendo o patrimônio e aumentando a carga tributária. Não vamos repetir erros tão elementares, pelo menos os erros que nós já conhecemos! Acho que há espaço para reduzir impostos. E nós devemos reduzir impostos, mas reduzir com racionalidade, reduzir com inteligência.

A pergunta que faço ao Senadores: por que não há empresários, aqui, com bandeira para reduzir carga tributária sobre cesta básica? Ou alguém já viu aqui as entidades empresariais, batendo à nossa porta, dizendo: “Reduzam a carga tributária da cesta básica!”. Eu nunca vi.

Esse entusiasmo contra a CPMF não é pelo peso da CPMF no faturamento das empresas. Pelo amor de Deus, façam um cálculo elementar! Se a carga tributária do Brasil está em torno de 35%, a CPMF representa 1% dessa arrecadação. É o que ela representa, em média, no preço dos produtos. Um automóvel tem 42% de carga tributária, 1% de CPMF, Senador Tião Viana. O que verdadeiramente incomoda - e incomoda dizer isto a alguns - é que a CPMF mexe no caixa dois; a CPMF impede que o empresário receba por fora, ele tem dificuldades de legalizar esse dinheiro, seja no comércio, seja na indústria, seja no contrabando, seja no tráfico, seja na corrupção, ela faz aparecer uma riqueza oculta, ela desvenda um ato ilícito; e, ao ser assim, ela orienta a polícia e orienta, sobretudo, a Receita Federal a combater a sonegação, a elisão e a evasão.

Portanto, tem razão, sim, o Presidente quando diz: “Os sonegadores não querem a CPMF”. Tem toda a razão em dizer, porque é o único imposto que atinge o sonegador. É o único imposto que cobra da economia informal. É o único imposto que cobra de quem sonega. Portanto, se é assim, e se, de outro lado, é verdade, temos espaço para reduzir carga tributária, vamos reduzi-la com racionalidade, vamos reduzi-la de forma progressiva e responsável.

Não sei por quantas vezes vou repetir, mas vou registrar - e me cobrem daqui a 15, 20 dias, dependendo do que for a evolução dessa decisão: nós vamos viver, até o final deste ano, uma turbulência financeira crescente internacional. O rombo no sistema financeiro americano, no mercado subprime americano, é de US$400 bilhões. Por enquanto, o Banco Central americano colocou isto no mercado, US$400 bilhões; tapou o buraco. Só que esse buraco vai aparecer. Vai aparecer quando os bancos publicarem os seus balanços até o final do ano. É por isso que o maior banco do mundo, o Citibank, esta semana, recebeu US$7,5 bilhões para poder atravessar esse período, e teve um aporte de capital árabe, porque não tinha condições de administrar as suas finanças. O mercado interbancário está cada dia mais difícil. A União Européia tem um buraco no sistema financeiro de US$200 bilhões, que vai aparecer. Os grandes bancos, praticamente, não emprestam recursos uns para os outros nessa conjuntura.

E vejam as projeções de crescimento: a União Européia, o Japão e os Estados Unidos, nos últimos três meses, reduziram em mais de 10% a previsão da taxa de crescimento da economia. O que significa que os Estados Unidos estarão entrando no cenário de recessão, com o PIB americano projetado para 1,5% o ano que vem. O Japão aprofundando a desaceleração e a recessão, e a Europa com um patamar baixíssimo de crescimento. O que mantém ainda uma perspectiva de crescimento e o preço das commodities é o nível de atividade da Ásia, da China, da Índia e de países como o Brasil, que, até o momento, não foram atingidos por esse cenário. Aqui, até o momento, o sistema financeiro não está contaminado por essa crise do subprime.

Mas, Senador Tião Viana, dependendo da decisão que tomarmos, de, num momento de risco internacional, num momento de instabilidade financeira crescente, o Brasil, simplesmente, tirar R$40 bilhões da receita - é como tirar o Ministério da Saúde do Orçamento -, e sinalizar para os investidores, um País que tem uma dívida de R$1,20 trilhão, que pode abrir mão de R$40 bilhões, com o argumento precário que tivemos excedente de arrecadação este ano... Tivemos porque a economia está crescendo, a inflação está sob controle, porque entraram US$35 bilhões em investimento externo, que não estão garantidos para o ano que vem. Como é que vamos retirar R$40 bilhões e imaginar, nesse cenário internacional, que o Brasil não será atingido? Será atingido em qualquer cenário no ano que vem. O que estamos discutindo é qual a intensidade dessa crise internacional para um País que tem US$175 bilhões, e que tem, hoje, uma certa blindagem. Parte dessa blindagem são as reservas. A outra parte da blindagem é a situação fiscal do País, é um superávit primário de R$100 bilhões, que é o que permite que a dívida pública não cresça, que é o que permite que a taxa de juros caia, que é o que permite que este País cresça, que gere emprego, que gere salário! Se retirarmos essa consistência da política fiscal, vamos dar menos liberdade ao Banco Central para baixar os juros. E vamos, seguramente, prejudicar o crescimento e agravar a instabilidade financeira.

Parece que este País é ciclotímico. Não é que parece, ele é. Parece que o tempo da turbulência financeira, da instabilidade, da inflação, do que vivemos 25 anos, parece que não voltará mais. Voltará! Voltará se a irresponsabilidade prevalecer; se os homens públicos não tiverem coragem e estatura política de tomarem decisões responsáveis! Voltará! E voltarei a esta tribuna para dizer que voltou. Lamentavelmente, voltou.

Espero, sinceramente, do fundo da minha alma, que eu não tenha mais que viver o que eu vivi, e muitos aqui viveram, por 25 anos. Não é apenas como economista, mostrando que o País não cresce, que tem inflação, que tem perda de renda; mas é fazendo campanha na periferia e o trabalhador apertando a sua mão e falando que a única coisa que ele quer é uma carteira de trabalho, e você não tem como prometer e muito menos dizer que terá chance. Ou indo à periferia e vendo a pobreza, a miséria, a exclusão social que vimos ao longo das nossas vidas públicas.

Portanto, este País não tem o direito de perder o momento que vive. Não têm o direito, os homens públicos, de jogarem pela janela o esforço de tantos anos para chegarmos aonde estamos!

Senador Tião, tenho falado sempre com uma certa emoção e peço licença porque atravessei o tempo. Mas vou subir todos os dias que puder a esta tribuna para dizer, com profundidade, a irresponsabilidade que poderemos cometer se não tivermos maturidade política.

Dá para reduzir impostos? Dá. Dá para reduzir a CPMF? Dá. Dá para aumentar a receita para a saúde? Dá. Dá para aumentar a receita para a educação? Dá. Estamos aumentando R$24 bilhões para a saúde. Estamos aumentando a verba para a educação, nessa negociação com o PDT - acho que foi uma grande mensagem que essa bancada e, em particular, o Senador Cristovam Buarque deram -, de avançarmos na educação, que é o maior desafio estrutural deste País. Estamos desonerando quem ganha até R$2.342,00, e vou repetir: 6% dos contribuintes são responsáveis por 57% da arrecadação da CPMF! São os de cima, sim, que pagam muito mais. Finalmente, estamos reduzindo a alíquota da CPMF. Se fizermos isso, aprimorarmos essa proposta, poderemos, no dia seguinte, discutir antecipar o pagamento do PIS/Cofins para os exportadores, desonerar bens de capital, melhorar a tabela do Imposto de Renda, aumentar o salário mínimo, que vem crescendo consistentemente - e vamos ter de votá-lo logo em seguida -, e continuar reduzindo impostos ou melhorando o serviço público, porque o Estado vai ter alguma capacidade de fazer isso progressivamente e com racionalidade.

Espero que esse bom senso, que essa coragem cívica, que essa responsabilidade pública prevaleça no diálogo, na negociação. Quero aqui elogiar os Governadores do PSDB que trabalham nessa direção, outros Governadores que sabem que é preciso trabalhar nessa direção, figuras da oposição que estão sem espaço para falar, mas que pensam como eu penso. Espero que prevaleçam o bom senso, a negociação e a responsabilidade pública.

Não sei se tenho tempo para o aparte... (Pausa.)

Não tenho, Senador Garibaldi Alves Filho, mas agradeço a V. Exª a iniciativa de participar desta discussão.

Agradeço a tolerância da Mesa, e continuaremos este debate ao longo da semana.

            Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/2007 - Página 42670