Discurso durante a 236ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo à sensibilidade do Governo Federal, no episódio do bispo católico de Barra/BA, Dom Luiz Flávio Cappio, em greve de fome.

Autor
César Borges (PR - Partido Liberal/BA)
Nome completo: César Augusto Rabello Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Apelo à sensibilidade do Governo Federal, no episódio do bispo católico de Barra/BA, Dom Luiz Flávio Cappio, em greve de fome.
Aparteantes
Marco Maciel, Pedro Simon, Raimundo Colombo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2007 - Página 45775
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, SOLIDARIEDADE, GOVERNO FEDERAL, ATENDIMENTO, REIVINDICAÇÃO, GREVE, FOME, BISPO, IGREJA CATOLICA, NEGOCIAÇÃO, RECUPERAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO.
  • APREENSÃO, CONDUTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, ALTERAÇÃO, PARECER, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, ESCLARECIMENTOS, DISCORDANCIA, POPULAÇÃO, POLITICO, ESTADO DA BAHIA (BA), PROJETO.
  • QUESTIONAMENTO, MOTIVO, FALTA, INTERESSE, GOVERNO FEDERAL, RECUPERAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, COMENTARIO, POSIÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, MAIORIA, GOVERNO, AUSENCIA, VOTAÇÃO, PROJETO, AUTORIA, ANTONIO CARLOS VALADARES, SENADOR, DESTINAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, OBRAS, RESTAURAÇÃO.
  • REGISTRO, ELABORAÇÃO, AGENCIA NACIONAL DE AGUAS (ANA), PROJETO, INDICAÇÃO, OBRAS, SUPRIMENTO, AGUA, REGIÃO NORDESTE, CRITICA, TRANSPOSIÇÃO, FAVORECIMENTO, EMPRESA, EMPREITADA.

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, nobre Senador Presidente, Paulo Paim.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acho que estamos vivendo uma questão que a imprensa nacional começa a repercutir. Aqui, no Senado, já dei esta notícia, já falei sobre este assunto. Agora, o Senador Eduardo Suplicy também traz o assunto.

Este não é um assunto que possa ser tratado com insensibilidade. Trata-se da posição do Bispo de Barra, cidade ribeirinha do Rio São Francisco, D. Luiz Flávio Cappio. São 21 dias completados de greve de fome. É uma vida que está em risco, Sr. Presidente. Por isso, digo que este não é um assunto para ser tratado com insensibilidade.

Hoje, a Folha de S.Paulo traz um artigo do Jânio de Freitas muito interessante. Segundo ele, não pode haver um caminho impróprio diante de uma manifestação de alguém que coloca a sua vida em risco por uma causa.

O Bispo D. Luiz Flávio Cappio, que é um franciscano, fez uma greve de fome anterior. Lá estivemos com ele, acompanhados da então Senadora Heloísa Helena. Recordo-me de que o Governador da Bahia à época, Paulo Souto, e o Senador Antonio Carlos Magalhães estiveram prestando solidariedade ao Bispo de Barra.

Agora, assistimos a uma insensibilidade completa e, mais do que isso, a uma falta de compreensão com o fato de, àquela época, ter havido uma proposta do Governo, feita pelo então Ministro das Relações Institucionais do Governo, hoje Governador da Bahia, Jaques Wagner, de abrir um canal de negociação e aprofundar a discussão desse projeto antes do início efetivo da sua execução.

Se não se consideram as razões técnicas, arroladas por tantos cientistas, tantas organizações, inclusive pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, que não aprovou esse projeto, que se leve em consideração pelo menos o direito de o Bispo ver cumprido um compromisso que era de diálogo, de abertura.

Em lugar disso, Sr. Presidente, o que se fez? Colocou-se no Ministério da Integração Nacional, para ser o comandante da obra, um baiano. Veja que contradição, que coisa dolorosa: colocar um baiano, que tinha uma posição contrária à transposição, que é o Deputado Geddel Vieira Lima, para ser agora o comandante, o grande e ardoroso defensor do projeto. Não só mudou de posição, como é um baiano. Mudar de posição, até aceitamos. Mas o que magoou um pouco foi colocar um baiano, porque a Bahia, por meio de seus representantes políticos, de sua população, colocou-se sempre contra essa obra, porque consideramos fundamental a revitalização do rio.

Mas há o contra-argumento: está existindo a revitalização? O projeto está começando. Ora, meu Deus, revitalizar um rio da importância do Rio São Francisco, com a sua extensão, é um programa grandioso, hercúleo, precisa de muitos recursos, e não há esse compromisso do Governo.

Há um projeto de lei do Senador sergipano Antonio Carlos Valadares para se destinar um percentual do Orçamento para a revitalização desse rio. Nós o aprovamos aqui, e ele está dormindo nas carteiras dos Srs. Deputados, na Câmara dos Deputados, onde o Governo tem ampla maioria, sem ser aprovado. Por quê? Porque não há esse compromisso real da revitalização do Rio São Francisco.

O que existe é uma tentativa de acobertar uma situação com pequenas intervenções localizadas, muitas delas até vocacionadas para a área política, como colocação de água e abastecimento nas cidades ribeirinhas do Rio São Francisco. Isso não é revitalização do rio; é um programa muito mais amplo. Isso pode dar voto, pode cooptar prefeitos, isto sim. Mas dizer que vai revitalizar o rio? Lamentavelmente, não.

Nós passamos 500 anos, desde o descobrimento do Brasil, destruindo o Rio São Francisco, as matas ciliares, os seus afluentes, e vamos dizer que vamos revitalizar, iniciar uma transposição? Lamentavelmente, não.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador?

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA) - Eu, inclusive, estava esperando que o Senador Pedro Simon e o nobre Senador Marco Maciel pudessem participar deste debate, porque é a vida de um religioso, de um franciscano. E eu sei que V. Exªs têm uma ligação profunda com a Igreja Católica.

O que eu acho que falta, neste momento, é essa sensibilidade de abrir um verdadeiro diálogo, e não colocar soldados do Exército brasileiro, que têm outra função, para dizer que agora as Forças Armadas vão realizar esse projeto.

            Concedo, com muita honra, um aparte ao nobre Senador Pedro Simon.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - O que me chama atenção, Senador, e agradeço o aparte concedido por V. Exª, é que essa questão está apaixonando quem está de um lado e quem está de outro. Vendo a firmeza do seu pronunciamento, percebo o Ministro baiano, encarregado dessa questão, ocupando um espaço nacional, conclamando a transposição, dizendo que estudou, analisou e, com a maior profundidade, afirmando que essa é a grande solução. Eu gostaria de vê-los debatendo, porque são tão apaixonados um lado e outro... E se analisa que a diferença é porque um é de um Estado mais aqui do centro e o outro é lá de cima, então um vai ser beneficiado, e o outro, não. Mas, no caso, os dois são da Bahia, os dois são grandes pessoas e os dois têm posição apaixonadamente diferente uma da outra. Como se explica isso?

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA) - Explico a V. Exª: nossa posição era coincidente, até o Deputado Geddel Vieira Lima se transformar em Ministro da Integração Nacional, quando passou a ser divergente. Ele passou a ser um ardoroso defensor, o que não era. Ele era um crítico veemente, mas passou a ser um defensor ardoroso do projeto. E eu mantive a mesma posição, porque temos população pobre ao longo do trecho baiano banhado pelo Rio São Francisco. Grandes projetos de irrigação estavam paralisados e ficaram assim durante cinco anos.

Ontem, o Ministro Geddel Vieira Lima, junto com o Governador da Bahia, assinou ordem de serviço para reiniciar esses projetos. Cito dois deles na Bahia: Salitre e Baixo Irecê. Espero que sejam reiniciados e concluídos o mais rápido possível, mas estavam paralisados.

Hoje, nós aprovamos na CAE, Senador Pedro Simon, um empréstimo de US$35 milhões para o Rio Grande do Norte, que é um Estado do Nordeste Setentrional. E foi dito pelo Líder do Democratas, Senador Agripino Maia, que esses recursos servirão para o uso das águas que estão armazenadas nos açudes importantes do Rio Grande do Norte, como o Armando Ribeiro Gonçalves, que não tem ainda as obras a jusante para levar a irrigação e matar a sede da população do Nordeste. Essas obras são importantes.

A ANA, Agência Nacional de Águas, elaborou um Atlas do sistema hídrico nordestino, onde indica todas as obras importantes que devem ser feitas para atender à população difusa no meio rural nordestino. Esta, sim, é uma ação conseqüente. Agora, é uma obra para se gastarem R$6 bilhões, o que vai interessar às grandes empreiteiras nacionais, porque verão aí um filão de recursos públicos.

Neste momento, não estou tratando dessa questão macro. Quero tratar de uma vida que está ameaçada, de um religioso, de um bispo brasileiro, baiano, porque ele é da cidade de Barra, Dom Luiz Flávio Cappio, que está lá, junto a Sobradinho, que está praticamente seca - Sobradinho hoje tem 13% do seu volume -, mostrando que nós temos carência no próprio Rio São Francisco - carência hídrica. E não está havendo a sensibilidade de se paralisar essa obra, de se renegociar, de se conversar, abrindo o diálogo.

Senador Marco Maciel, com muita satisfação.

O Sr. Marco Maciel (DEM - PE. Com revisão do orador.) - Nobre Senador César Borges, vou procurar ser breve. Se não me engano foi o historiador João Ribeiro que chamou o São Francisco de rio da unidade nacional, porque percorre extensa área do território brasileiro, praticamente três macrorregiões, e cumpre papel muito importante não somente no sentido de ofertar água ao Nordeste, mas, se adequadamente aproveitado, para o transporte fluvial de passageiros e de cargas. Se não estou equivocado, o Rio São Francisco tem ou tinha 1.381 quilômetros de trecho navegável. É lógico que agora isso já não mais acontece.

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA) - Está bastante reduzido.

O Sr. Marco Maciel (DEM - PE) - Precisamos fazer eclusas, como existe em Sobradinho, que V. Exª bem lembrou que está com um volume de água muito reduzido, fazendo com que até os moradores da região não consigam se abastecer de água pela baixa acentuada de toda lâmina d’água que se acumula a partir da Barragem de Sobradinho. Então é necessário fazer uma série de obras de aproveitamento do rio e, sobretudo, um correto e sério projeto de revitalização. Como V. Exª salientou, o volume de água do São Francisco está sendo reduzido e muitos de seus afluentes vêm desaparecendo, algo de extrema gravidade. Por isso, quero me solidarizar com a manifestação de V. Exª com relação ao tema e dizer que, a exemplo do que aconteceu na Bahia, durante cinco anos Pernambuco não viu as obras de irrigação do Governo Lula.

Devo até mencionar um fato: em 2002, ainda era Vice-Presidente da República, quando foi elaborado o Orçamento de 2003, alocamos - como fizemos em todos os exercícios no período do Presidente Fernando Henrique Cardoso - verba para o Nordeste. Em 2003, embora houvesse provisão, os recursos não foram liberados e o território de Pernambuco não viu ampliado em sequer um metro quadrado sua área de irrigação, porque não houve liberação de recursos federais. Fazer irrigação é relativamente caro e pressupõe liberação de verbas do Governo Federal, porque os Estados do Nordeste, no caso específico de Pernambuco, não dispõem de meios para obras desse porte. Não conheço Dom Luiz Cappio, mas tenho dele excelente impressão por depoimentos que ouço de todos, da unanimidade. V. Exª mesmo, certa feita, não sei se se recorda, deu um depoimento muito positivo a respeito da atuação dele não somente como religioso, mas também como quem tem entranhado amor ao Nordeste embora lá não haja nascido. V. Exª traz uma contribuição muito importante para o debate sobre esse tema, que interessa ao País em suas múltiplas e variadas dimensões. Espero que a questão seja adequadamente resolvida em função dos valores envolvidos, inclusive o maior que é certamente a vida.

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA) - Concedo um aparte ao nobre Senador Raimundo Colombo.

O Sr. Raimundo Colombo (DEM - SC) - Sr. Senador César Borges, quero prestar o meu apoio ao seu pronunciamento, porque V. Exª trata de uma questão fundamental da nossa integração na caminhada. Conheço Dom Luiz Flávio Cappio há muitos anos. Eu era um jovem do interior de Santa Catarina, líder do movimento da Igreja, e, de repente, ele chegou lá: uma pessoa muito simples, com uma sandália, uma muda de roupa. E sua grande vontade era ir para a Bahia. E foi a pé. Ele é uma pessoa determinada, é um santo. É uma das pessoas com a maior força espiritual que conheci. E mantenho, desde aquela época, contato permanente com ele. Não é em busca de popularidade, não é uma coisa superficial. Ele é um homem de fé e a sua entrega é total. V. Exª traz um assunto para chamar a atenção das autoridades para construir o diálogo, para encontrar uma solução. Ele é um homem muito forte, muito determinado, não é uma pessoa qualquer. Precisamos dar atenção ao que ele enfatiza, porque não é por outro motivo que não o de fazer o bem. Quero apoiar as suas considerações, integrar-me a elas e tentar ajudar naquilo que for possível, porque esse é o nosso papel. Muito obrigado.

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA) - Agradeço o seu depoimento. O meu é idêntico. Conheci Dom Luiz Flávio Cappio na cidade de Barra. Homem desprovido de qualquer vaidade, voltado para sua comunidade, participou conosco de ações lá no Município de Barra, fez pleitos voltados a sua comunidade. Quando Governador, tive a satisfação de atendê-lo, porque os pleitos eram extremamente justos.

Agradeço os apartes. O Senador Marco Maciel conhece muito bem a questão, assim como o Senador Pedro Simon e o Senador Raimundo Colombo. E não vim aqui para discutir o Rio São Francisco, Sr. Presidente; vim aqui para pedir sensibilidade ao Governo Federal, porque agora não se discute se a obra é justa, se não é, se é tecnicamente, economicamente e ambientalmente correta.

É uma vida que precisa ser preservada. E o Governo tem de ter sensibilidade. As razões do Governo, seja quais forem, a autoridade do Governo, nada disso pode estar acima dessa vida que está lá por questão de fé.

Por isso, trago essa questão aqui hoje, nesta tarde. Pretendo, como fiz da primeira vez, ouvir solidariedade a Dom Flávio Cappio e espero - e já encerrando, Sr. Presidente - a sensibilidade do Governo para negociar. Que tenha alguém à frente que trabalhe a questão muito mais com o coração do que simplesmente com autoridade ou até autoritarismo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2007 - Página 45775