Discurso durante a 236ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao arquiteto Oscar Niemeyer, pelo transcurso dos 100 anos de seu nascimento.

Autor
Romero Jucá (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao arquiteto Oscar Niemeyer, pelo transcurso dos 100 anos de seu nascimento.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2007 - Página 45919
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, OSCAR NIEMEYER, ARQUITETO, ELOGIO, CRIATIVIDADE, OBRAS, RECEBIMENTO, PREMIO, RECONHECIMENTO, AMBITO INTERNACIONAL, REGISTRO, BIOGRAFIA, MODERNIZAÇÃO, ARQUITETURA, DETALHAMENTO, CONSTRUÇÃO, MONUMENTO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, RESPONSAVEL, PLANEJAMENTO, CAPITAL FEDERAL.

O SR. ROMERO JUCÁ (PMDB - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi recentemente lançado um documentário em longa metragem sobre Oscar Niemeyer. O diretor da película, o cineasta Fabiano Maciel, escolheu para seu título uma frase freqüentemente repetida pelo biografado. O filme se chama “A vida é um sopro”.

            Em entrevista ao semanário alemão Der Spiegel, alguns anos atrás, por exemplo, Niemeyer explicava porque não tem qualquer afinidade com sonhos faraônicos, porque não encara as construções que projeta como uma forma de eternizar-se. Dizia ele: “Não creio em nada que pareça eterno. A vida é um sopro, um minuto, e aí tudo se desfaz. Sou realista: o ser humano é tão frágil, tão insignificante; precisamos permanecer humildes.”

            Admirável humildade, Sr. Presidente. Bela lição de simplicidade. No entanto, se a vida de fato é um sopro, ao olharmos para a vida de Oscar Niemeyer, será impossível conter uma exclamação: “Que sopro!”

            É com certeza muito edificante, Senhoras e Senhores Senadores, recebermos uma lição existencial com esse conteúdo de um homem que completa um século de vida tendo percorrido a trajetória que Oscar Niemeyer já cumpriu. A humildade com que se posiciona nosso grande arquiteto é mais um índice da força do seu caráter, e é também, por certo, uma ferramenta valiosa para enfrentar as agruras da vida, as quais todos nós haveremos de sentir, mais cedo ou mais tarde.

            E essa humildade é tanto mais significativa quando justaposta às realizações desse homem, ao conceito de que ele goza em escala planetária.

            No ano passado, o jornal O Globo fez uma pesquisa entre seus jornalistas sobre quem são os cem brasileiros em atividade que podem ser considerados geniais. Oscar Niemeyer foi de longe o mais votado. O motivo principal para essa escolha talvez tenha sido sua persistência de uma vida inteira em torno de uma idéia simples: a de que arquitetura não é construir paredes, mas sim projetar curvas e volumes no espaço. Fiel à sua descoberta modernista, que derrubou um modo de pensar herdado do passado colonial, Niemeyer, aos 100 anos, parece mais jovem do que nunca: fala mansa, mente clara, ele trabalha todos os dias para imprimir a marca de sua arquitetura modernista inconfundível pelo Brasil inteiro, pelo mundo afora.

            Mais recentemente, a empresa de consultoria global Synectics compilou uma lista reunindo os 100 maiores gênios vivos em todo o planeta, considerando fatores como aclamação popular, poder intelectual, realizações e importância cultural, para eleger os vencedores. Oscar Niemeyer ficou em nono lugar nessa lista. Segundo o documento divulgado pela consultoria, Niemeyer é um “dos nomes mais importantes da arquitetura moderna internacional e pioneiro na exploração das possibilidades de construção do concreto armado. Seus prédios têm formas tão dinâmicas e curvas tão sensuais que muitos admiradores dizem que, mais do que um arquiteto, ele é um escultor de monumentos.”

            De fato, a intuição, a liberdade e o prazer de projetar são essenciais para a arquitetura de Oscar Niemeyer. Antes, a forma escolhida para os projetos arquitetônicos tinha de ser a mais funcional. Ele rompeu com a idéia dos prédios-caixotes e instaurou a liberdade na escolha das formas.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma brevíssima e muito parcial recapitulação das realizações de Oscar Niemeyer, ao longo de mais de 70 anos de atividade profissional extremamente profícua, torna fácil compreender os motivos de seu imenso prestígio.

            Na década de 1940, na equipe coordenada por seu professor Le Corbusier, pai da arquitetura moderna, Niemeyer ajudou a projetar uma das primeiras grandes obras modernistas, o prédio do Ministério da Educação e Saúde, no Rio de Janeiro. Com Lúcio Costa, projetou o Pavilhão do Brasil na Feira de Nova York, e esteve, também, na equipe que criou a sede das Nações Unidas, na mesma cidade. Realizou o projeto do conjunto da Pampulha, o primeiro de sua total responsabilidade e que, por seu pioneirismo, projetou a arquitetura brasileira no mundo.

            Em 1955, fundou a revista Módulo, especializada em arquitetura, que viria a ser, durante as quatro décadas seguintes, importante veículo para divulgar a arquitetura brasileira. Em 1951, iniciou o projeto do Parque do Ibirapuera, para o IV Centenário da cidade de São Paulo, que foi um entre vários projetos de grande porte que lhe serviram de preparação para enfrentar o maior desafio imaginado por um arquiteto: inventar a nova capital de um país.

            Declarada Patrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco em 1987, Brasília pode ser considerada a obra prima de Niemeyer. Como ele próprio diz, existe até quem não goste dos magníficos palácios que projetou nesta cidade, mas ninguém poderá dizer que já viu coisa parecida. Nos seus projetos para Brasília, Niemeyer atingiu plenamente aquilo que sempre busca em seu trabalho: a surpresa, a emoção do novo.

            Mais do que isso, criou obras que fazem parte do nosso imaginário, que estão impregnadas de tal modo em nossas mentes que, a partir de meia dúzia de linhas feitas a giz na lousa, somos capazes de reconhecê-las: Palácio da Alvorada, Catedral, Congresso Nacional e tantas outras. São edifícios que surpreendem sempre, quer seja pela clareza, pela solução da estrutura, pelos arranjos dos programas, enfim, pela beleza e invenção que neles parecem não ter fim. Vale sempre lembrar que esse criador de sólidos flutuantes projetou a capital brasileira recebendo seus honorários, durante todo o período, na forma de um baixo salário de funcionário da Novacap.

            Com o advento do regime militar, passa a realizar magníficas obras no exterior, como a Feira Permanente do Líbano, em Trípoli; a sede do Partido Comunista Francês, em Paris; a Editora Mondadori, em Milão; a Universidade de Constantine, em Argel; o Centro Cultural de Le Havre; a Bolsa de Trabalho de Bobigny; e a Fata Engineering, em Turim. É também o período em que começa a receber as primeiras grandes honrarias em outros países. O Instituto Americano de Arquitetos, a Academia Americana de Artes e Ciências e o Instituto Nacional de Artes e Letras o nomeiam membro honorário. A França presta-lhe extraordinária homenagem, autorizando-o a assinar projetos naquele país como arquiteto. No Museu do Louvre é organizada uma grande exposição de sua obra.

            Com o início da abertura democrática, volta definitivamente ao Brasil em 1974. Seus novos projetos incluem o Sambódromo e os Centros Integrados de Educação Popular, no Rio de Janeiro; o Memorial da América Latina e o Teatro do Ibirapuera, em São Paulo; o edifício-sede do jornal L’Humanité, em Paris; o Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba; a Serpentine Gallery, em Londres; o Museu Nacional e a Biblioteca Nacional, em Brasília, compondo o Complexo Cultural da República; e o deslumbrante Museu de Arte Contemporânea, em Niterói, germe do conjunto intitulado “Caminho Niemeyer”.

            Em 1988, recebe o prêmio Pritzker, a maior honraria da arquitetura, pelo conjunto de sua obra e pela excepcional contribuição à área. No ano seguinte, é agraciado com o prêmio da Fundação Príncipe de Astúrias, na categoria Artes, também pelo conjunto da obra. No mês passado, é homenageado pelo Presidente Lula com a Medalha do Mérito Cultural. Na ocasião, o Ministro da Cultura, Gilberto Gil, noticia a intenção do Executivo de encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei com a finalidade de preservar todas as obras do arquiteto em território brasileiro. Dias atrás, recebe a maior honraria civil da República Francesa, a Legião de Honra.

            A diretora da galeria Serpentine, de Londres, qualifica-o como o “Picasso da arquitetura”. Para o jornal The Times, da mesma cidade, Niemeyer é uma “lenda viva do modernismo”, enquanto o Financial Times lembra que “ele permanece ativo e criativo em um grau de envergonhar os jovens arquitetos, com uma obra sem paralelo”. Para muitos, Oscar Niemeyer é o mais importante criador brasileiro vivo, reconhecido em todo o mundo; o único brasileiro que será lembrado nas próximas gerações; o arquiteto que realizou o maior número de importantes projetos construídos na história da humanidade.

            Trabalhador inveterado, sempre com jornadas de 12 horas, inclusive aos sábados e domingos, Niemeyer continua, aos 100 anos de idade, a criar espaços comoventemente democráticos, com soluções totalmente inesperadas, propostas estruturais fora de qualquer compêndio e uso de materiais simples. Para ele, restou praticamente banalizado o significado da expressão “obra importante de arquitetura”, pois quase anualmente produz - e vê construída - uma delas que, para qualquer arquiteto, seria o “projeto da vida”.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, talvez a vida seja apenas um sopro. Mas que exemplo de vida temos em Oscar Niemeyer! Que exemplo de coerência, de fidelidade a seus ideais humanos e artísticos, de amor pelo Brasil e por seu povo! Muito poucos fazem tanto quanto ele para projetar a imagem do País no exterior. Muito poucos têm tanta paixão pela vida, tanto apreço e dedicação aos amigos.

            Oscar Niemeyer certamente merece tudo aquilo que a vida tem-lhe dado. Merece a satisfação de ver crescer netos, bisnetos e trinetos. Merece a alegria de contrair novas núpcias aos 98 anos de idade. Merece porque sabe viver!

            Na ocasião do centésimo aniversário desse grande brasileiro, faço questão de parabenizá-lo, desejando-lhe saúde, felicidade e muitos anos mais de vida.

            Oscar Niemeyer: a vida é um sopro. Mas que sopro!

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2007 - Página 45919