Discurso durante a 229ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração da abertura da Semana de Valorização da Pessoa com Deficiência.

Autor
Magno Malta (PR - Partido Liberal/ES)
Nome completo: Magno Pereira Malta
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Comemoração da abertura da Semana de Valorização da Pessoa com Deficiência.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/2007 - Página 44653
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, CONCEITO, DEFICIENCIA, MOTIVO, CAPACIDADE, SUPLANTAÇÃO, LIMITAÇÃO, HOMENAGEM, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, VALORIZAÇÃO, VIDA, SERVIÇO, ELOGIO, INICIATIVA, SENADO, DEBATE, BENEFICIO, INCLUSÃO.

O SR. MAGNO MALTA (Bloco/PR - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente César Borges, Srªs e Srs. Senadores e todos que nos assistem e ouvem pelos veículos de comunicação do Senado Federal, como a TV Senado e a Rádio Senado, esta sessão se reveste de uma importância tão grande que nem nós somos capazes de calcular.

Ao cumprimentar as pessoas que vieram, aqueles que militam nos movimentos, e abraçar o Senador Flávio Arns e Dona Verônica Calheiros, abraço a todos.

Para quem conhece a Bíblia, como a senhora, o exercício da misericórdia deve ser alguma coisa muito presente na vida. Mas fico me perguntando: o que é o deficiente? Quando a gente fala numa sessão para portadores de deficiência, quem são os deficientes? Acho que esse é o nosso grande problema.

Um dia, fui a uma casa, nos Estados Unidos, e vi uma moça sem braços. Ela pintava com os pés, fazia tudo com os pés. E uma senhora, que me acompanhou, falou assim: “Tadinha! Chega a me dar agonia vê-la se mexendo e tal”. Falei: “Olha, ela nasceu sem os braços. Acho que ela também sente a maior agonia ao ver você se movimentando com esse monte de braços pendurados. Ela não sabe para que isso”.

Quem é o deficiente? Não gosto nem de falar “pessoas portadoras de deficiência”, porque deficiência se tem no caráter, deficiência se tem aqui dentro da cabeça, deficiência se tem no trato, na maneira indigna de se relacionar e de tratar com a coisa alheia e até com a coisa pessoal. Onde é que está, Senador Eduardo Suplicy, essa deficiência?

Tenho uma amiga, Glícia, no Município de Presidente Kennedy, um Município pequenininho no interior Estado do Espírito Santo. Põem-na na cadeira de rodas e tem-se que encostar a cabecinha dela, porque a cabeça é solta. Glícia, na cama, bebe café, escreve, entra na Internet; é professora, com dois cursos superiores. E conheço gente que estraga sua própria existência com drogas, no alcoolismo, pessoas que tiveram oportunidade e a jogaram fora. Fico olhando para Glícia - e, como Glícia, tantos outros - e perguntando quem é o deficiente de nós.

Por isso, não estou participando e não vim participar de uma sessão para homenagear pessoas portadoras de deficiência. Quando vejo o Pré-Pan, a Paraolimpíada, fico fascinado, porque quem gosta de esporte gosta de ver. Eu, que tive lesão de medula, Senador Cristovam Buarque! Há oito anos, fiquei paralítico. Minha coluna é um enxerto, completamente desmontada, enxertada. Um tumor dentro da medula me roubou o fio condutor lá embaixo, que é o receptor do cérebro, que não tenho. Ando sem o comando do cérebro. O meu caso é um milagre muito à parte. E faço duas horas de boxe por dia. Quando pensei que não podia nem mais brincar de futebol, as pessoas me vêem andando e me perguntam: “Mas como você faz?” Eu desenvolvi uma base. A minha mente conseguiu trabalhar uma base, e consigo treinar boxe. Consigo fazer até quatro, cinco rounds com meu amigo Popó. Quem é o deficiente?, fico perguntando. Aquele que não tem vontade de viver, vontade de viver para os outros.

Minha mãe, Dona Dadá, analfabeta profissional, dizia: “A vida só tem um valor, e o único valor que a vida tem é quando nós investimos a nossa vida na vida dos outros”. E quem não tem essa disposição é o deficiente, por não investir a vida na vida dos outros.

Necessariamente, essa pessoas não precisam da nossa pena nem da nossa misericórdia. Acho que a importância desta sessão é mostrar a importância que esta Casa tem, porque, como criminalizaram a política no Brasil, políticos são todos ladrões, todos bandidos, todos vagabundos que só pensam nos seus interesses. E, na verdade, não é nada disso. São homens e mulheres com sensibilidade.

Há 27 anos, tiro drogados das ruas, das cadeias. A sociedade não sabe disso. Tenho 150 drogados, desde meninos de oito anos a pessoas de setenta, que estão me ouvindo agora. E gente deficiente aos olhos da sociedade, mas completamente eficiente naquilo que faz. Quem sabe muito mais eficiente do que aqueles que não têm disposição para colocar a sua vida à disposição daqueles que necessitam. São aqueles que precisam ser incluídos, que estão excluídos. Não estamos falando de deficiência física, mas daqueles que precisam ser incluídos.

Então, esta sessão serve para mostrar que tem gente com sensibilidade, gente com o coração voltado. A Nação não pode abrir mão dessas inteligências raras, dessas disposições raras que, ainda por conta de preconceito, entendemos como gente portadora de deficiência, mas que não têm deficiência alguma.

Há uma empresa em meu Estado que contrata pessoas que eles chamam de portadores de deficiência. Só eles são contratados. Que coisa bonita! A Gol emprega nos aeroportos aquelas pessoas portadoras de deficiência; na nossa cabeça, eficientes! São anões, pequeninos, correndo no aeroporto para lá e para cá, que resolvem a vida das pessoas, dão dimensão, dão volume, dão cadência à vida das pessoas. Quem são os deficientes?

Então, Sr. Presidente, este momento é muito importante para mim, é muito importante para minha vida, é muito importante para a minha alma, muito importante para a minha cabeça.

Eu quero abraçar o Senador Flávio Arns mais uma vez. Quero abraçar essa sociedade valorosa que presta serviços mais significativos, com a sua inteligência, à sociedade brasileira.

Temos aqui servidores desta Casa que são de suma importância para o seu funcionamento e que se movimentam numa cadeira de roda. E eles valem muito mais do que aquele que morcega, embora tenha braço e perna. Acho que a discussão não é essa.

Parabéns a vocês, que servem ao Brasil, às suas famílias, e que são absolutamente normais, porque cada qual é normal dentro da sua normalidade. E não ter uma mão não quer dizer, absolutamente, que não há normalidade. Não ter uma perna não quer dizer que não tem normalidade. Normalidade começa no caráter, na mente, na disposição de se colocar à disposição de todos na sociedade.

Eu estou grato a Deus pela oportunidade de participar deste momento tão significativo da vida brasileira.

Obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/2007 - Página 44653