Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Anuncia a presença de diversas autoridades no Senado Federal para esclarecimentos sobre a transposição das águas do rio São Francisco. Votos de recuperação plena ao Presidente do Timor-Leste, José Manuel Ramos-Horta.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CARTÃO DE CREDITO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Anuncia a presença de diversas autoridades no Senado Federal para esclarecimentos sobre a transposição das águas do rio São Francisco. Votos de recuperação plena ao Presidente do Timor-Leste, José Manuel Ramos-Horta.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Heráclito Fortes, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 12/02/2008 - Página 1125
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CARTÃO DE CREDITO. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, APOIO, REALIZAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, APURAÇÃO, IRREGULARIDADE, UTILIZAÇÃO, CARTÃO DE CREDITO, MEMBROS, EXECUTIVO, ELOGIO, INICIATIVA, ROMERO JUCA, SENADOR, LIDER, GOVERNO, ENTENDIMENTO, UNIFICAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • ANUNCIO, PRESENÇA, AUTORIDADE, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, TURISMO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, SENADO, OBJETIVO, ESCLARECIMENTOS, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, DETALHAMENTO, PARTICIPAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, POLITICO, PESQUISADOR, PROFESSOR, MEMBROS, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), BISPO, IGREJA CATOLICA, EXPECTATIVA, PRESIDENTE, CONGRESSO NACIONAL, ABERTURA, REUNIÃO.
  • SOLIDARIEDADE, PRESIDENTE, PAIS ESTRANGEIRO, TIMOR LESTE, VITIMA, ATENTADO, EXPECTATIVA, EFICACIA, RECUPERAÇÃO, SAUDE, DETALHAMENTO, BIOGRAFIA, POLITICO, JURISTA, RECEBIMENTO, PREMIO, AMBITO INTERNACIONAL, PAZ, REGISTRO, VISITA, BRASIL.
  • SOLIDARIEDADE, ALOIZIO MERCADANTE, JONAS PINHEIRO, SENADOR, INTERNAMENTO, HOSPITAL, EXPECTATIVA, RECUPERAÇÃO, SAUDE.

O SR. EFRAIM MORAIS (DEM - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, em homenagem ao Piauí, quero agradecer tanto ao Senador Mão Santa pela cessão do tempo como ao seu correligionário e companheiro do Piauí, Senador Heráclito Fortes. Pelo entendimento entendimento.

Srªs e Srs. Senadores, vive a República brasileira, neste triste episódio da farra dos cartões corporativos, um dos seus momentos mais constrangedores do ponto de vista ético e moral.

Sei, Sr. Presidente, que essa afirmação que faço é grave, na medida em que, ao longo da nossa história, têm sido abundantes os episódios de improbidade administrativa, de desprezo pelo bem comum.

Para que algum acontecimento se destaque em meio a tantos e tantos similares, é porque se trata de algo particularmente grave. E é o caso, Srªs e Srs. Senadores.

O País ainda tinha presente na memória os múltiplos escândalos do mensalão quando foi surpreendido, neste início do ano, por mais esse episódio, de proporções equivalentes, que expõe as vísceras morais da República.

Na verdade, ambos os episódios, mensalão e farra dos cartões corporativos, compõem um único e mesmo cenário de degradação moral das instituições de que fazem parte ainda os sempre crescentes gastos de gabinete e a verba secreta da Presidência da República.

Tudo isso parece fora de controle, crescendo em escala geométrica a cada ano que passa. Senão vejamos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

O jornal O Estado de S. Paulo, edição de sábado, dia 9, informa que as despesas sigilosas do Governo Lula dobraram em quatro anos e superam uma casa dos R$35 milhões.

Em 2004, essas despesas foram de R$16,9 milhões - menos da metade. O que justificaria tal aumento se a inflação está estabilizada desde o Plano Real e o País não vive nenhum tipo de emergência administrativa?

Em 2006, esses gastos foram de R$25 milhões. Um ano depois, em 2007, são acrescidos de mais R$10 milhões. Por quê? Essa é a pergunta que o Brasil inteiro faz ao Governo. Por que de um ano para o outro, um aumento dessa magnitude sem explicação plausível a não ser esta: desperdício do dinheiro público, ação predatória e delinqüente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esses gastos de verba secreta envolvem alguns órgãos cujas atividades têm natureza estratégica, como Abin e Polícia Federal, mas incluem também gastos com a Casa Civil da Presidência da República e com o gabinete pessoal do Presidente.

Nessa contabilidade, incluem-se os cartões corporativos. É aí que está o tumor maligno.

Sabe-se que, além de aumentar expressivamente o número de cargos de confiança, o Governo não estabeleceu regras para o uso dos cartões. Tem-se aí a convergência de duas anomalias para a construção desse escândalo: de um lado, o aparelhamento descarado do Estado por um partido político; de outro, o ambiente de permissividade em que tudo isso se opera.

Vejamos o aparelhamento. Em nota pública do final do ano passado, a de número 304/2007, veiculada então pela imprensa, o Ministério do Planejamento informou que o número de cargos comissionados da administração federal, neste segundo mandato do Presidente Lula, cresceu 7,6 vezes em relação ao primeiro mandato. Vejam bem, Srªs e Srs. Senadores, estou falando que o número de cargos comissionados aumentou, do segundo mandato até agora, 7,6 vezes.

O número médio mensal de postos criados saltou de 23,8 no primeiro mandato para nada menos que 179,7 até julho de 2007 - aumento de mais de 7,5 vezes.

Somados os dois mandatos, o Governo Lula bateu um recorde administrativo: nada menos que 22.345 cargos comissionados.

O partido do Presidente da República, o PT, ocupa mais de cinco mil desses cargos, o que, além de proporcionar o comando da máquina administrativa, gera polpuda renda mensal para seus cofres. Cada “companheiro”, nomeado para um cargo de confiança, contribui compulsoriamente com uma parcela de seus ganhos para o dízimo partidário. Já no primeiro mandato de Lula, o aparelhamento do Estado rendeu ao PT aumento de receita de nada menos que 545%, segundo publicaram abundantemente os jornais.

Essa cifra, Srªs e Srs. Senadores, seguramente cresceu, pois, só no ano passado, primeiro ano do segundo mandato do Presidente Lula, foram criadas duas secretarias especiais com status de Ministério: a dos Portos e a de Longo Prazo. Mais cargos, mais cartões, mais farra e mais prejuízo para o contribuinte, sem qualquer ganho ou contrapartida no incremento desses setores. 

Em resumo, enquanto o Governo Fernando Henrique Cardoso, em oito anos, acrescentou quatro órgãos à administração pública, o Governo Lula, em cinco anos, gerou o triplo: doze órgãos.

Calcule-se aí o número de cargos em comissão, cartões corporativos, viagens, hotéis, motéis, tapiocas - e todo o aparato que compõe a mordomia desses cargos - e tem-se, então, a explicação da constante multiplicação dos gastos públicos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como se não bastasse, há mais. Enquanto os servidores de carreira são submetidos a uma dieta de reajustes salariais - há pouco, todos sabemos, foram os militares as vítimas. Os titulares de cargos comissionados, os “companheiros” que aparelham o Estado, figuram entre os funcionários públicos mais bem pagos.

Ano passado, esses servidores foram contemplados, por meio de medida provisória, com reajustes que chegaram a até 140%. Falo dos cargos comissionados, do reajuste concedido através de medida provisória, de até 140% dos seus salários. Enquanto isso, os funcionários de carreira estão em dieta de aumento salarial.

Desço a esses detalhes, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, porque tudo isso, como já disse, compõe um único e mesmo cenário. A filosofia do aparelhamento é a de se apoderar do Estado. Tropas de ocupação.

O fundamento básico da democracia, que é a alternância no poder, está excluído dessa política. A idéia é lotear o Estado para usufruto da facção circunstancialmente eleita para exercício do governo. O aparelhamento é a véspera da tirania.

Basta ver o que acontece na Venezuela, em que o ditador já não tem escrúpulos de propor sua permanente reeleição. Com o Estado ocupado por seus correligionários, basta usá-lo para garantir resultados eleitorais favoráveis. Essa a lógica, esse o objetivo. Cá, como lá.

A farra dos cartões é só mais um capítulo dessa trágica novela de destruição do Estado brasileiro, pelo uso predatório que dele se faz, sob o comando de pessoas despreparadas, que ali foram postas para o cumprimento da missão de perpetuar no poder dos atuais governantes.

Tão logo as denúncias vieram à tona, os porta-vozes do Governo limitaram-se a condená-la - não o seu conteúdo, mas o fato de ter sido formulada. Mostraram-se assim cúmplice - e de fato o são, já que se empenham em ocultar a verdade.

O ato seguinte foi o de se opor uma CPI. Mais adiante, num truque de marketing que não engana ninguém, cuidaram de propor a CPI que antes haviam recusado.

Claro, Srs. Senadores, queriam se antecipar, indicar relator e presidente, compor uma fachada de transparência para impedir a transparência. É mais ou menos como indicar, Senador Heráclito Fortes, o conde Drácula para investigar roubo num banco de sangue. É mais ou menos isto o que querem: mais uma CPI faixa branca, ou seja, relator e presidente do lado do Governo.

Senadora Rosalba, com muito prazer escuto V. Exª.

A Srª Rosalba Ciarlini (DEM - RN) - Senador Efraim, V. Exª faz uma brilhante apresentação dos gastos supérfluos, do desperdício, da farra que se está fazendo com o dinheiro suado do povo trabalhador brasileiro, que paga seus impostos para que a Nação possa retribuir em ações que venham melhorar sua vida. Mas, se estamos indignados, imaginem aquele cidadão que, neste instante, pode estar necessitando de um medicamento que falta no posto de saúde, necessitando de uma cirurgia que lhe é negada pelo SUS, de um exame que nunca chega. São situações como essas que nos deixam realmente preocupados, porque o Governo diz que não tem os recursos, mas tem dinheiro para usar nos cartões corporativos de forma não muito recomendável, desperdiçando o dinheiro do povo. Então, vejo que o Governo tem de entender que ele está aí para servir e não para ser servido. Da forma como vem agindo, está usando da boa vontade, da boa-fé do povo brasileiro, fazendo com que o nosso dinheiro, o dinheiro do povo, saia pelo ralo e assim fique faltando, como falta, para a saúde, para salvar vidas e para a educação. Parabéns pelo seu pronunciamento, Senador!

O SR. EFRAIM MORAIS (DEM - PB) - Agradeço a V. Exª, Senadora Rosalba. Tenho certeza de que nós, que fazemos oposição ao Governo, teremos muito o que fazer já neste início do ano, fiscalizando esses gastos, para torná-los público. Nós queremos a transparência, o Brasil inteiro, o povo brasileiro está cobrando essa transparência, que só vem com a divulgação dos papéis pelo governo, que não tem coragem sequer de abrir o espaço que tanto deseja o povo brasileiro.

Sr. Presidente, Srª Senadora, Srs. Senadores, outra tentativa de escamotear a verdade é a de tentar envolver o Presidente Fernando Henrique no presente escândalo. Estabeleceu-se uma chantagem que é tão escandalosa quanto o escândalo que se quer com ela ocultar: se a Oposição insistir em investigar o gabinete pessoal do Presidente Lula, o Governo vai investigar os gastos do gabinete pessoal do Presidente Fernando Henrique.

Ora, ora, Sr. Presidente, Srs. Senadores e Srª Senadora, o que está impedindo que isso aconteça? Se o Governo Federal dispõe de indicações de que o governo anterior (ou qualquer outro) fez gastos irregulares, tem não só os meios, mas o dever de promover essa investigação. Não pode torná-la opcional ou instrumento de chantagem política.

A probidade administrativa impõe a quem está no poder que promova a responsabilização de quem quer que seja que tenha atentado contra o interesse público.

Portanto, o governo Fernando Henrique Cardoso não está fora disso - e nós, da Oposição, que integramos aquela administração, queremos que essa investigação seja feita, de maneira ampla, geral e irrestrita.

Temos certeza de que o próprio Presidente Fernando Henrique não se oporá de modo algum a isso. Ao contrário, tenho convicção de que é quem mais a quer.

Outra manobra oblíqua do Governo Lula foi a de tentar lançar lama sobre o governo paulista de José Serra. Não há, porém, medida de comparação. Lá, Srs. Senadores, os cartões funcionam dentro de critério bem mais transparente, sendo cartões de débito - e não de crédito - destinados apenas aos ordenadores de despesas.

Mesmo assim, Sr. Presidente, não há por que não investigá-lo. Só não é admissível que se peça isso em nome de uma estratégia diversionista, que busca disseminar suspeitas generalizadas - jogar lama no ventilador, tão popular nós sabemos -, para confundir o público e impedir o esclarecimento do escândalo dos cartões corporativos.

É disso que se trata.

O uso dos cartões corporativos, no âmbito do primeiro escalão governamental, teve início no governo Fernando Henrique Cardoso.

O objetivo era estabelecer controle e dar transparência aos gastos, já que os cartões registram hora e natureza das despesas.

Desburocratizava-se, assim, a prestação de contas, tornando-a mais precisa e menos sujeita a manipulações. Agilizava-se ao mesmo tempo o processo administrativo. O extrato mensal dos cartões detalha as despesas do usuário, o que se torna bem mais confiável do que a clássica prestação de contas dos relatórios burocráticos.

Eis, porém, que esse objetivo saneador e simplificador foi malversado por um truque indecente, que se disseminou em grau epidêmico no Governo atual: o saque em dinheiro por meio de cartão, impedindo que se saiba a natureza das despesas.

Sr. Presidente, os saques em espécie deveriam constituir exceção - e não regra. Mas, tornaram-se regra - e esse é o ponto mais grave de tudo isso, que evidencia má-fé.

Segundo dados da Controladoria Geral da União, nada menos do que 77,6% dos R$75,6 milhões gastos em 2007 com cartões corporativos - mais de dois terços das despesas! - representam saques nos caixas eletrônicos, num montante de R$58,7 milhões.

Srs. Senadores, Srªs Senadoras, sabe o que isso representa? O equivalente a mais de dez vezes o investimento governamental no programa de eletrificação rural Luz para Todos! E essa quantia foi sacada na boca do caixa pelos companheiros!

Essa modalidade de uso dos cartões inverte o sentido de transparência administrativa que justificou sua adoção. Como se não bastassem os danos financeiros, esse episódio - que, como eu já disse e vou concluir, Sr. Presidente - não é isolado, deixa marcas profundas na imagem das instituições do Estado brasileiro, aprofundando o descrédito de que já desfruta perante o público.

Quando um administrador público, em nível de primeiro ou segundo escalão, utiliza-se de um instrumento de trabalho (no caso, os cartões corporativos), para pagar uma tapioca, uma conta de chope num barzinho da Vila Madalena ou um motel, está demonstrando que desconhece o sentido mais elementar da palavra “República” - e que algo de podre a está comprometendo.

O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. PMDB - RN) - Senador Efraim Morais.

O SR. EFRAIM MORAIS (DEM - PB) - Vou concluir, Sr. Presidente. Não vou precisar de nem mais um minuto. Vou agradecer a tolerância de V. Exª e dizer às Srªs e aos Srs. Senadores que é preciso, com urgência, salvá-la. E isso começa pela responsabilização política e penal dos que a dilapidam.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vamos à CPI já! Mas a uma CPI séria, que não seja igual à das ONGs, que não estão deixando a Oposição investigar.

É preciso que a palavra “transparência” se transforme, nessa CPI, acima de tudo, num símbolo de responsabilidade do Poder Legislativo.

Vamos, sim, investigar todos. Todos que estiverem errados merecem, daqui para frente, ser investigados por este Poder, pelo Poder Legislativo. 

Sr. Presidente, vamos para a CPMI, para que o Brasil tome conhecimento dos acontecimentos. Espero que a maioria, que é o Governo, não faça como estão fazendo com as ONGs, não deixando apurar os fatos, fazendo da transparência apenas uma palavra usada na televisão, no rádio ou nos jornais. É preciso transparência, mas é preciso, acima de tudo, verdade.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/02/2008 - Página 1125