Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso dos oitenta e sete anos do jornal Folha de S.Paulo. Alerta para ingerência do governo sobre a produção do Poder Legislativo.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. DIREITOS HUMANOS. PODERES CONSTITUCIONAIS.:
  • Registro do transcurso dos oitenta e sete anos do jornal Folha de S.Paulo. Alerta para ingerência do governo sobre a produção do Poder Legislativo.
Aparteantes
Gerson Camata, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 20/02/2008 - Página 2877
Assunto
Outros > HOMENAGEM. DIREITOS HUMANOS. PODERES CONSTITUCIONAIS.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ELOGIO, ATUAÇÃO, RELEVANCIA, AMBITO NACIONAL.
  • CRITICA, DIVERSIDADE, GOVERNO, DESRESPEITO, PRERROGATIVA, SENADO, EXCESSO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), TENTATIVA, PREJUIZO, ATUAÇÃO, LEGISLATIVO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), IMPORTANCIA, DECISÃO, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, LOBBY, CARTORIO, CONCESSÃO, PODER, INSTITUIÇÃO PUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, EXERCITO, CADASTRAMENTO, CIDADÃO, GARANTIA, REGISTRO DE NASCIMENTO, POSSIBILIDADE, ACESSO, ESCOLA PUBLICA, ESCOLA PARTICULAR, HOSPITAL, BOLSA FAMILIA.
  • QUESTIONAMENTO, DEMORA, EXECUTIVO, INERCIA, JUDICIARIO, FALTA, VONTADE, LEGISLATIVO, COMBATE, LOBBY, CARTORIO, ESPECIFICAÇÃO, ADIAMENTO, CONGRESSO NACIONAL, APRECIAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, MÃO SANTA, SENADOR, SOLUÇÃO, PROBLEMA.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, APRESENTAÇÃO, ORADOR, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ABERTURA, POSSIBILIDADE, DIVERSIDADE, INSTITUIÇÃO PUBLICA, EXECUÇÃO, REGISTRO DE NASCIMENTO, CRIANÇA, ADULTO, PAIS, AUSENCIA, APRECIAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, CRITICA, CONDUTA, EXECUTIVO, USURPAÇÃO, PROJETO, CONGRESSISTA.
  • IMPORTANCIA, EMPENHO, CONGRESSO NACIONAL, CONTENÇÃO, INTERVENÇÃO, EXECUTIVO, ATUAÇÃO, LEGISLATIVO.

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Alvaro Dias, Srªs e Srs. Senadores, antes de ferir o assunto que me traz hoje à tribuna, eu queria parabenizar o jornal Folha de S.Paulo, que hoje completa 87 anos de atuação, de atividade, suprindo não só o Estado de São Paulo como grande parte do País de informações qualificadas, com um corpo profissional do maior gabarito, da maior qualidade. E é um prazer imenso para nós registrarmos esse fato.

            Há dias, fiz aqui referência aos 80 anos do jornal O Povo, do Ceará. Poucos jornais no nosso País, Senador Camata, ostentam uma longevidade como essa. Isso é prova de que passaram por tantos tormentos, por tantos momentos difíceis e souberam se haver com profissionalismo e com dignidade. E está aí o jornal Folha de S.Paulo, hoje completando 87 anos de atuação.

            O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - V. Exª me permite?

            O SR. GERALDO MESQUITA FILHO (PMDB - AC) - Rapidamente, Senador Camata.

            O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Rapidamente, gostaria de dizer que me solidarizo com V. Exª em todas as palavras que disser de apoio ao jornal Folha de S.Paulo e de exaltação ao trabalho que faz pelo Brasil e, assim, torno minhas as palavras de V. Exª.

            O SR. GERALDO MESQUITA FILHO (PMDB - AC) - Muito obrigado, Senador Camata.

            Mas venho hoje a este Plenário falar de um assunto que particularmente me incomoda muito e creio que a esta Casa também. Trata-se da postura que o Governo - e não é só este, mas qualquer governo - assume em relação ao Poder Legislativo de vampirizar a nossa produção legislativa.

            Vivemos hoje um tempo de elevado prestígio do Presidente da República e de rarefeito reconhecimento do Poder Legislativo por parte da população. É o que dizem as pesquisas. Esse negócio de pesquisa é complicado, porque abro a minha caixa de e-mail, Senador Mão Santa, e não vejo relação com o que é produzido nessas pesquisas. Sinceramente, estou falando com toda a honestidade. Tomara que, com relação ao Presidente da República, essa pesquisa retrate exatamente o sentimento da população. Mas, abrindo a minha caixa de mensagens - porque hoje recebemos centenas, milhares de mensagens -, não vejo essa correspondência. Mas tudo bem!

            Creio que nos aproximamos rapidamente do culto do governo forte em detrimento da atrofia do Poder Legislativo.

            Eu acho que não é só entupindo o Congresso Nacional com medidas provisórias, Senador Papaléo Paes, que o Governo fragiliza o Legislativo. Ele faz isso também quando atua como vampiro em relação à nossa produção legislativa. Eu vou exemplificar isto.

            O jornal O Globo publicou, recentemente, a informação de que o Governo resolveu, finalmente, enfrentar o lobby dos cartórios. Está aqui - como faz o Senador Mão Santa, peço à TV Senado que foque aqui. A matéria está aqui, jornal O Globo: “Governo decidi enfrentar lobby dos cartórios”. E faz isto para atribuir a outras instituições, como o Exército, o poder de emitir certidões de nascimento para pôr fim à situação vexatória que ainda vive o País de conviver com a realidade de que mais de três milhões de brasileiros, jovens, adolescentes e adultos, vivem indocumentados. Trata-se de uma palavra sutil para mascarar a dolorosa realidade em que, em pleno século XXI, não possuindo esse documento que comprova a existência de pessoas físicas, cidadãos de um país de muitas leis - como o nosso - a despeito da existência de pelo menos cinco delas, não conseguem matricular-se nas escolas públicas ou particulares nem têm acesso ao Bolsa-Família e não conseguem atendimento nos hospitais públicos por não portarem uma certidão que ateste o seu nascimento.

            Que coisa dramática!

            Quase um quarto dos que nascem em nosso País, exatos 23%, para sermos mais exatos, não são registrados no primeiro ano de vida. Isto não ocorre só nos ínvios e perdidos caminhos da imensidão das florestas que ainda resistem à sanha dos predadores, mas também nos grandes centros, nos grandes e pequenos Estados. Só no Rio de Janeiro, ex-capital do País, são 60 mil que se encontram nessa situação. Nada menos que 90% dos 1.394 jovens atendidos pela Pastoral do Menor daquela cidade, em 2003, eram, como se afirma no jargão cartorário “indocumentados”.

            Este, como os governos anteriores, sempre acorda tarde para os muitos desafios da nossa precariedade econômica e social, sistematicamente denunciados nas duas Casas do Congresso, ante a inoperância do Executivo, a inércia do Judiciário e a nossa própria inapetência para assuntos que transcendem os limites do interesse individual das autoridades, dos partidos e das instituições públicas e privadas.

            Este ano, passada a metade da duração de nossos mandatos, a PEC 62, de 2003, Senador Mão Santa, que propõe solução para o assunto, completará cinco anos de tramitação no Senado. E tal como se tornou praxe entre os usos e costumes de nosso sistema político, o Executivo anuncia que vai, finalmente, enfrentar o lobby dos cartórios. São milhares de proposições que a cada Legislatura são apresentadas, sem que o Congresso seja capaz de decidir sobre seu destino, até que caiam no limbo do arquivamento a cada quatro anos.

            Não há entre nós uma agenda capaz de separar o joio, que é o interesse pessoal de grupos e lobbies das mais variadas extrações que atuam nas duas Casas do Congresso, do trigo do interesse coletivo que dormita nas Comissões da Câmara e do Senado. Por isso, todas as idéias aventadas sob as cúpulas e as grossas paredes que nos impedem de ouvir o clamor das ruas, terminam ecoando nas pesquisas de opinião pública que, a cada ano, colocam os Poderes do Estado, os partidos políticos e a nós, que nos dedicamos a essa atividade, entre as entidades e instituições de menor credibilidade para a maioria dos brasileiros.

            Tratei dessa matéria no primeiro ano do meu primeiro mandato aqui. Tomei a iniciativa que, a meu ver, poderia solucionar de vez esse assunto doloroso, que tão duramente atinge mais que a vida, o destino e a sina de milhões de pequenos brasileiros que nascem, vivem e morrem, já não digo à margem da lei, mas da mais elementar condição do mundo, depois de sessenta e um séculos de civilização: a cidadania, Senador Paim. É inacreditável!

            Faço votos, Sr. Presidente, de que a notícia veiculada pela imprensa não seja apenas mais um dos muitos e sucessivos factóides que sustentam a popularidade do Presidente da República, mestre na arte de encantar os bancos, embair a opinião pública e dissimular nossas carências com vagas e vãs promessas que nunca se cumprem.

            Faço esse protesto, talvez até veemente, porque cheguei aqui em 2003 e apresentei essa PEC, Senador Paim, que disciplinava a questão, abria o compasso, abria para outras instituições, como Forças Armadas, escolas, hospitais e muitas instituições no País inteiro, a responsabilidade de registrar crianças ao nascer, adultos, seja quem fosse, pelo menos o registro da certidão de nascimento. Propus isso em 2003. O Congresso Nacional não apreciou, não deliberou, não decidiu. O que faz o Governo? Altaneiramente, vampiriza o nosso projeto. Em vez de mobilizar sua base aqui para apreciar, votar e aprovar o projeto, o Governo toma para si a idéia e, como vampiro... Isso já aconteceu aqui, de forma traumática, com o Senador Osmar Dias, no final do ano passado. Foi um reboliço aqui nesta Casa, e é comum que isso aconteça sob a nossa placidez, sob a nossa conformação.

            E depois reclamamos que o Poder Legislativo desce a ladeira nos índices de reconhecimento pela população brasileira. Reclamamos à toa, reclamamos que o Poder Executivo entope esta Casa com medidas provisórias. Deixe entupir! Nós é que temos de reagir a elas, Senador Mão Santa...

(Interrupção do som.)

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Obrigado, Senador Alvaro Dias.

            Concluo. Eu também, se fosse Executivo, me valeria desse instrumento, da mesma forma. Mandaria muito mais. Agora, cabe ao Poder Legislativo, de forma altaneira, reagir.

            Disse aqui, um dia desses, o ex-líder do Governo nesta Casa, em pronunciamento há pouco mais de um ano, que pelo menos metade das medidas provisórias enviadas ao Congresso Nacional não tem razão de ser; pelo menos, não deveria chegar ao Congresso Nacional revestida dessa forma.

            Então, por que não reagimos? Por que não apreciamos, nas medidas provisórias, a inexistência dos pressupostos de urgência e relevância?

            O Congresso Nacional tem que deixar de ficar agachado. O Congresso Nacional tem de reagir, não só para se reconciliar com a população brasileira - e isso já seria um grande feito! Mas tem que reagir para restaurar, mais uma vez, neste País, uma coisa que é sagrada: o equilíbrio entre os poderes, Senador Mão Santa. O equilíbrio entre os poderes é uma coisa da qual não podemos abrir mão. E a nossa postura, ao lado da postura do Poder Executivo, contribui para que o Congresso Nacional, acentuadamente, caia no gosto da opinião pública. Eu não sei onde vamos parar.

            Senador Mão Santa, rapidamente, concedo-lhe um aparte.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Geraldo Mesquita, V. Exª é firme e brilhante. Não foi sem razão que ontem eu convidava V. Exª para dar uma palestra de Direito no Piauí, na OAB, e de política, pois somos do mesmo Partido. V. Exª trouxe à tona isso, ô Camata. Quanto a essa pesquisa, ninguém contesta o carisma de Luiz Inácio, que foi eleito Presidente - os meios ninguém vai discutir. Mas ninguém é idiota, pois eles querem fazer aqui o que fizeram ali em Cuba. Na pesquisa lá, dá Fidel Castro 98%; do Chávez, dá 95%; do Morales, dá 94%; do Correa, dá 90% e do Ortega também dá 90%. Agora, ontem, o nosso símbolo da ética, da decência da história, no seu lugar aí, Pedro Simon advertia que, na anterior, o Congresso tinha 1,6%; agora, diminuiu para a metade, menos de 1%. Nós não aceitamos isso, porque temos homens como V. Exª. Ali está na Presidência Alvaro Dias, eleito Governador majoritário; aqui está o Camata, ô Luiz Inácio. Ajeita aí o teu Goebbels, Duda Mendonça, que ninguém... Um Camata... Cafeteira! Eu era menino: fé, certeza. Tinha escrito no muro. Prometeu e cumpriu. Como podemos ter menos de 1%? Ali está o Paim, um símbolo do trabalhismo. V. Exª, o seu pai Governador histórico. Eu mesmo, eleito várias vezes. O nosso Presidente do Senado, de dez eleições que disputou - eu não tenho essa performance -, ganhou nove. Então, esta Casa aqui é dos queridos do povo. Eu fui aplaudido de pé em São Paulo outro dia, no Holiday Inn, no encontro político. Não sinto isso não. Que nós temos de melhorar, temos de melhorar, mas desse jeito não. Aqui é a Casa dos continuadores de Rui Barbosa, dos pais da Pátria, e V. Exª atentou bem: não aceitamos isso não. Nós estamos aqui porque somos necessários. Nós somos a última sentinela para o aprimoramento da democracia. Nós somos o povo. Nós somos iguais ao Luiz Inácio. Nem um milímetro ele é a mais. Nós estamos até sendo generosos, humildes. Nós somos filhos da democracia, do voto. Não existe isso não, Luiz Inácio. Some os votos aqui que dá mais do que os seus 50 milhões. Nós somos filhos da democracia e do voto. V. Exª nos representa bem e engrandece este Senado.

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Muito obrigado, Senador Mão Santa. Para não abusar da boa vontade e gentileza do Senador Alvaro Dias, concluo clamando e conclamando o Congresso Nacional para que trabalhemos forte, Senador Paim, no sentido de estabelecermos, mais uma vez, neste País o equilíbrio entre os Poderes. Este é um pilar que não podemos deixar ser derrubado no nosso País: equilíbrio entre os poderes. Não podemos admitir o atrofiamento do Congresso Nacional sob hipótese alguma.

            Senador Alvaro Dias, muito obrigado pela tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/02/2008 - Página 2877