Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Contrário ao regime semi-aberto para crime hediondo.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Outros:
  • Contrário ao regime semi-aberto para crime hediondo.
Publicação
Publicação no DSF de 28/02/2008 - Página 3774
Assunto
Outros
Indexação
  • COMENTARIO, OMISSÃO, CONGRESSO NACIONAL, FUNÇÃO LEGISLATIVA, PROVOCAÇÃO, INTERFERENCIA, EXECUTIVO, JUDICIARIO, LEITURA, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PROIBIÇÃO, ANISTIA, FAVORECIMENTO, CRIME HEDIONDO, PROTESTO, MANUTENÇÃO, REGALIA, PERDÃO, PARTE, PENA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), INCONSTITUCIONALIDADE, LEGISLAÇÃO, TENTATIVA, REGULAMENTAÇÃO, MATERIA.
  • REGISTRO, CARACTERISTICA, CRIME ORGANIZADO, IMPEDIMENTO, RECUPERAÇÃO, EX-DETENTO, COMENTARIO, OCORRENCIA, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), NECESSIDADE, ADAPTAÇÃO, LEGISLAÇÃO PENAL.
  • REGISTRO, CARACTERISTICA, CRIME ORGANIZADO, IMPEDIMENTO, RECUPERAÇÃO, EX-DETENTO, COMENTARIO, OCORRENCIA, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), NECESSIDADE, ADAPTAÇÃO, LEGISLAÇÃO PENAL.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, INCLUSÃO, PROIBIÇÃO, PROGRESSÃO, PENA, CRIME HEDIONDO.

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é raro ouvir queixas nesta Casa acerca da interferência de outros Poderes na atividade legislativa. Freqüentes são os clamores contra o excesso de medidas provisórias, que mutilam e deturpam o processo legislativo.

            Todavia, Sr. Presidente, isso acontece, na maioria das vezes, em conseqüência da omissão do próprio Congresso, ao deixar lacunas nos textos legais. E são esses claros que levam o Executivo ou o Judiciário a decidir sobre determinados assuntos que deveriam ser deliberados pelo Legislativo brasileiro.

            Uma dessas lacunas, por exemplo, está no inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal.

            Reza esse dispositivo que:

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

            Embora o legislador constituinte não tenha deixado dúvida quanto ao objetivo de evitar favores a criminosos de grande potencial ofensivo, algumas regalias sobreviveram e nos causam profunda indignação.

            A principal delas é que delinqüentes que cometem crimes com requintes de perversidade são julgados e condenados, mas dificilmente cumprem, na integralidade, suas penas. São beneficiários da chamada “progressão da pena” - que, aliás, não deveria ter esse nome; deveria chamar-se “redução da pena”.

            Graças a esse privilégio, bandidos repulsivos, criminosos que seqüestram, assaltam e matam com frieza e crueldade, ganham as ruas antes de terminar suas penas. E voltam para delinqüir, para roubar, voltam para traficar.

            Em 1990, Sr. Presidente, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 8.072, cujo texto regula a figura do crime hediondo, tornando obrigatório o cumprimento integral da pena para os condenados por tais delitos. No entanto, o Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional o art. 2º, § 1º, dessa lei, exatamente o texto que obrigava o condenado a permanecer recolhido até o término de sua pena!

            Pontificou aquela Corte que a norma constitucional “afasta apenas a fiança, a graça e a anistia”. E se ela, a regra constitucional insculpida no inciso XLIII do art. 5º da Carta Magna, não incluiu a progressão da pena no rol das restrições, a lei ordinária não poderia fazê-lo.

            Para contornar o problema, o Congresso aprovou outro projeto, que resultou na Lei nº 11.464, de 2007.

            Esse novo diploma legal, Sr. Presidente, manteve a regalia da progressão de regime, mas com maior rigidez que a Lei de Execução Penal, exigindo o cumprimento de três quintos da pena para autorizar o condenado por crime hediondo a livrar-se do regime fechado.

            Mesmo assim, a transferência de condenados perversos para o regime semi-aberto é um privilégio que causa grande indignação e antecipa novos riscos à sociedade. Afinal, eles voltam às ruas a fim de cometer novos crimes, de delinqüir; voltam para roubar, para traficar.

            A ressocialização, em nome da qual esses benefícios são concedidos, a cada dia que passa torna-se mais ficção.

            Contam-se nos dedos os condenados por crimes hediondos que deixam os presídios e procuram se reintegrar ao convívio social. E não é apenas pelos defeitos do sistema carcerário que a ressocialização tem ficado mais distante, tem ficado mais no campo da ficção: o modus operandi da criminalidade tem influído profundamente no comportamento de presidiários e, sobretudo, ex-presidiários.

            Nos anos passados, nas décadas passadas, o crime era obra de delinqüentes, de indivíduos que optavam por essa modalidade de vida; hoje os delitos são, predominantemente, comandados por organizações criminosas. Ontem, seguiam meros impulsos da delinqüência; hoje, executam ações planejadas, decididas e determinadas por aqueles que detêm o poder na organização, na chamada organização criminosa.

            Esses agrupamentos se sustentam não só pela adesão voluntária de delinqüentes, mas também pela força, pelo autoritarismo e pelo medo que espalham. Os que caem na sua rede transformam-se em verdadeiros soldados, soldados de um grande exército, exército de delinqüentes.

            Para ilustrar melhor o que digo, Sr. Presidente, eu gostaria de relatar aqui um caso ocorrido no meu Estado de Mato Grosso do Sul.

            Recentemente, depois de mais uma fuga na Colônia Penal de Campo Grande - e essas fugas estão se tornando rotina em Campo Grande -, parentes de um dos fugitivos foram procurar a ajuda de uma autoridade amiga, de uma autoridade municipal. Quando essa autoridade lhes informou que a solução seria retornar ao estabelecimento de custódia, a surpresa: o foragido queria voltar, mas queria duas garantias. A primeira era a de que seria recolhido ao presídio de segurança máxima e a segunda era a de que não seria liberado antes de ter cumprido integralmente a pena.

            (O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Eu gostaria que V. Exª me desse o tempo necessário.

            Sabe por que, Sr. Presidente, o detento pedia essas garantias? Sabe por que pedia a garantia de ficar na segurança máxima e pedia a garantia de que iria cumprir a pena integral? Porque o presídio de segurança máxima era, na verdade, o único lugar em que ele poderia se livrar das ordens da organização criminosa, das ordens que recebia para empreender novas fugas, com o objetivo de assaltar, de produzir recursos para a hierarquia da organização, para a hierarquia do crime. E ele sabia que a única condição para romper de vez com a organização criminosa era cumprir integralmente a pena.

            Só assim ele poderia fugir da própria organização criminosa.

            Essa é uma das eloqüentes evidências de que não se pode lidar hoje com o crime e com a pena da mesma forma que lidávamos no passado. Não podemos ser inocentes, sob pena de sermos coniventes com o crime organizado.

            Consciente dessa nova realidade, Sr. Presidente, decidi apresentar uma proposta de emenda à Constituição propondo que seja incluída a progressão do regime de cumprimento da pena no rol das proibições do inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal.

            Sei que vai gerar muita controvérsia na CCJ e neste Plenário, mas, se aprovada, os condenados pela prática de tortura, pelo tráfico de drogas, por terrorismo e por crimes hediondos de maneira geral terão de cumprir integralmente a pena, como a sociedade está cobrando de todos os Congressistas. Perdendo a chance de voltar mais cedo às ruas, vão molestar menos os que cumprem o semi-aberto e refletir mais sobre a crueldade de seus atos.

            Ademais, Sr. Presidente, quem usa requintes de crueldade para delinqüir não pode ter o mesmo prêmio concedido àqueles que cometeram transgressões menos graves.

            A sociedade brasileira não merece continuar a ser vítima de criminosos implacáveis, sanguinários, que todos os dias ceifam vidas, muitas delas, a maioria delas inocentes, e escandalizam os homens e as mulheres de bem deste País.

            Por isso, eu gostaria de contar com o apoio indispensável desta Casa, para que possamos, enfim, ouvir os clamores do nosso povo, os clamores das ruas, que pedem justiça.

            Encerro minhas palavras agradecendo a V. Exª pela tolerância, pois se trata de um tema de tamanha importância e tamanha gravidade. Sei que, no ano passado, a temática da criminalidade rondou, ocupou esta tribuna, e neste ano não vai ser diferente. Precisamos continuar a cumprir com o nosso dever.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/02/2008 - Página 3774