Discurso durante a 21ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da passagem, no próximo ano, do centenário de nascimento de Dom Helder Câmara.

Autor
Marco Maciel (DEM - Democratas/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. IGREJA CATOLICA.:
  • Registro da passagem, no próximo ano, do centenário de nascimento de Dom Helder Câmara.
Publicação
Publicação no DSF de 04/03/2008 - Página 4324
Assunto
Outros > HOMENAGEM. IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • EXPECTATIVA, PROXIMIDADE, CENTENARIO, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, HELDER CAMARA, ARCEBISPO, MUNICIPIO, OLINDA (PE), RECIFE (PE), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ELOGIO, VIDA PUBLICA, VOCAÇÃO, SOLIDARIEDADE, ATUAÇÃO, CONCLAVE, DEBATE, DIRETRIZ, IGREJA CATOLICA, PROJETO, ASSISTENCIA SOCIAL, FUNDADOR, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), COMENTARIO, CAMPANHA DA FRATERNIDADE, DEFESA, VIDA HUMANA, PERIODO, NASCIMENTO, MORTE.
  • COMENTARIO, RECONHECIMENTO, VALORIZAÇÃO, IMPORTANCIA, ARCEBISPO, AMBITO INTERNACIONAL, RECEBIMENTO, PREMIO LITERARIO, PREMIO, PROMOÇÃO, PAZ, PAIS ESTRANGEIRO, ITALIA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ALEMANHA, GRÃ-BRETANHA, JAPÃO, DIPLOMA, CONCESSÃO HONORIFICA, UNIVERSIDADE CATOLICA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
  • REGISTRO, INICIATIVA, COMISSÃO NACIONAL, AUTORIDADE RELIGIOSA, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), FORMALIZAÇÃO, SOLICITAÇÃO, IGREJA CATOLICA, ABERTURA, PROCESSO, CONCESSÃO, TITULO, ARCEBISPO, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE).
  • ANUNCIO, PREPARAÇÃO, COMEMORAÇÃO, CENTENARIO, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, ARCEBISPO, REALIZAÇÃO, UNIVERSIDADE CATOLICA, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), CONGRESSO, INAUGURAÇÃO, MEMORIAL.
  • MANIFESTAÇÃO, HONRA, ORADOR, GESTÃO, GOVERNADOR, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), PARTICIPAÇÃO, SOLENIDADE, PRESENÇA, ARCEBISPO, ESPECIFICAÇÃO, VISITA, JOÃO PAULO II, PAPA, BRASIL.

O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobre Senador Alvaro Dias, Srs. Senadores Paulo Paim e Osmar Dias, também saúdo o Senador Geraldo Mesquita Júnior, Srªs e Srs. Senadores, no próximo ano, ocorrerá a passagem do centenário do nascimento de Dom Helder Câmara. Os preparativos, como era de se esperar, já foram iniciados em Pernambuco, posto que ele foi, durante muitos anos, Arcebispo de Olinda e de Recife. Após resignar as funções por implemento de idade, passou a residir na capital pernambucana em modestos aposentos da Igreja da Rua das Fronteiras,como é conhecida a Igreja Nossa Senhora da Assunção.

Sr. Presidente, a passagem da efeméride, como ocorre com as grandes datas, é instante para refletir, a partir das celebrações que ocorrerão, sobre a vida pastoral de Dom Helder Câmara. É, portanto, um convite a todos nós ao diálogo. Aliás, Dom Helder, é bom lembrar, possuía com intensidade o carisma da graça e também o da atividade dialogal.

Não por acaso, ele se projetou como um dos mais ativos participantes do Concílio Ecumênico Vaticano II, encontro que representou notável aggiornamento, um amplo repensar, enfim, sobre os rumos da Igreja de Pedro em período caracterizado por intensas mudanças de paradigma, em que vivia o mundo da segunda metade do século XX, cujos efeitos se prolongam, podemos dizer, nos albores do século XXI, enfim, no terceiro milênio.

O carisma é um dom; mais do que uma profissão, sintetiza uma atitude de vida, condutas e gestos que reverberam sobre toda a comunidade. A vocação de Dom Helder cedo se revelou nos seus tempos de padre no Ceará natal.

Naquela época, ele estava entre os fundadores da Legião Cearense do Trabalho. A preocupação pela “questão social”, por intermédio da ação dialógica, iria acompanhá-lo por toda sua vida. O perpassar do tempo não o fez esmaecer a flama com que exercia o seu pastoreio. “O segredo de ser sempre jovem, mesmo quando os anos passam, deixando marcas no tempo - afirmou certa feita Dom Helder - é uma causa a dedicar toda uma vida”.

Sr. Presidente, no Rio de Janeiro, Bispo Auxiliar do Cardeal Dom Jaime Câmara, Dom Helder fundou a Cruzada São Sebastião, voltada para relocalização dos mais pobres das favelas para condignos conjuntos habitacionais, que se multiplicaram em diferentes bairros cariocas. Além de oferecer casa própria para o pobre, criava escolas e centros de saúde, levava aos beneficiados uma provisão de fé e buscava completar o seu trabalho, estendendo a sua atividade também no combate às drogas e à marginalidade.

É sua a sentença tão válida em nossos dias: “Não queremos a paz dos pântanos, a paz enganadora que esconde a injustiça e a podridão”. A fé, como se sabe, exige ação apaixonada, pois “o limite do amor é amar sem limites, como nos ensina Santo Agostinho”.

Srªs e Srs. Senadores, Dom Helder foi intrinsecamente um pastor: a palavra “oportuna e inoportunamente”, repetida na explicitação do Evangelho, conforme recomenda o Apóstolo Paulo, e a coragem que nunca lhe faltou no atuar em defesa dos perseguidos e dos necessitados.

Sr. Presidente, seu pequeno quarto na Rua das Fronteiras é um exemplo de pobreza e despojamento. Iniciava o dia de madrugada para solitárias vigílias de oração, das quais chegou a escrever nada menos do que sete mil meditações, cujos textos - frise-se - estão disponíveis no centro de documentação que homenageia o seu nome.

Dali saía Dom Helder, transportado por amigos devotados, uma vez que nunca teve um automóvel, para cumprir seus deveres episcopais, porém, não desdenhava também seu trabalho de sacerdote, atento a tudo o que fosse oferta aos carentes de pão, espírito e liberdade.

É de Dom Helder uma frase que encerra uma grande verdade: “Melhor que o pão, é a sua partilha, é a sua divisão”. Ele não era paternalista; queria a justiça social.

Outra característica de Dom Helder era a percepção da importância da ação eclesial, para que a Igreja, mãe e mestra, fosse uma só voz e um só rebanho. Deve-se destacar, a propósito, o fato de ser ele um dos idealizadores da criação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB, fundada em 1962, entidade que há décadas promove, durante a Quaresma, campanhas de fraternidade, abordando assuntos de interesses comunitários e religiosos, sendo alguns de cariz ecumênico, isto é, envolvendo outras confissões religiosas.

A respeito do assunto gostaria de lembrar que este ano o tema da Campanha da Fraternidade é justamente em defesa da vida, desde a sua concepção até o seu declínio. Enfim, o apelo é no sentido de escolha da vida, num mundo que desenvolve, infelizmente, uma cultura da morte.

É bom lembrar que essas campanhas da fraternidade se repetem há mais de 40 anos, trazendo temas a debate e provocando adequadas reflexões.

Sr. Presidente, Helder Pessoa Câmara é um nome que ultrapassou as fronteiras nacionais e passou a desfrutar, não sem razão, de enorme admiração no exterior. Atendia a convites para realizar palestras, apresentar sugestões e lançar livros. Escreveu 23 livros traduzidos para 16 idiomas. O primeiro chamava-se “Revolução dentro da Paz”, editado em 1968, ano paradigmático para o mundo ocidental, tendo em vista os eventos ocorridos na França, especialmente em Paris; o último intitulava-se “Família, Missão do Amor”, em 1997, quando ele já se encontrava doente, conseqüentemente exercendo suas atividades com muitas dificuldades. Esses livros de Dom Helder prosseguem, alcançando grande repercussão e são reeditados, como já tive ocasião de dizer, em muitas línguas. Escreveu também a letra da “Sinfonia dos Dois Mundos”, com música de Pierre Kaelin.

Srªs e Srs. Senadores, Dom Helder recebeu, prêmios que serviam de reconhecimento de sua ação pastoral. Na Itália, em 1974, o prêmio de melhor escritor sobre os problemas do Terceiro Mundo. Nos Estados Unidos, em 1987, o prêmio de melhor produção internacional de livros religiosos. Recebeu também reconhecimento na vida acadêmica. Seu primeiro título de doutor honoris causa lhe foi concedido pela Universidade Católica de São Paulo, em 1982. Ao todo, podemos somar 32 títulos de reconhecimento universitário.

Prêmios da Paz recebeu na Noruega e na Alemanha, em 1974. Na Inglaterra, em 1975, e na Itália, em 1982. Na Ásia, recebeu prêmio, em 1983, outorgado pelo Governo e o povo nipônico.

Nas ausências de Dom Helder, em função das solicitações que recebia, substituía-o Dom Lamartine Soares, seu modelar e discreto bispo auxiliar, que cedo faleceu.

Desejo reportar-me ao fato de que a Comissão Nacional de Presbíteros, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, formalizou a primeira solicitação oficial de abertura de seu processo de beatificação à Congregação para a Causa dos Santos, no Vaticano. Seus contemporâneos testemunharam sua fé associada a uma grande atividade missionária, mesmo porque sabemos que não basta a fé, a Igreja Católica é, sobretudo, também uma igreja missionária.

Dom Helder, Padre Helder ou apenas Dom, como era chamado, expressava a mais profunda expressão do servidor de Deus na pessoa do próximo: “um homem evangélico, modelo de presbítero, reto, justo e profeta”. Assim ele é visto, aqui e alhures, por muitas religiões, desde a sua - a católica. Dom Helder, penso não exagerar, pertence à linhagem espiritual de Mahatma Gandhi, Martin Luther King e Madre Teresa de Calcutá.

Sr. Presidente, venho, ao encerrar, referir-me a eventos relativos à celebração do primeiro centenário de seu nascimento, a iniciar-se com o seminário “O Século de Dom Helder: cristianismo e construção da cidadania no Brasil, ontem e hoje”, que será realizado na Universidade Católica de Pernambuco - Unicap, onde será criada, na ocasião, a cátedra de direitos humanos Dom Helder Câmara. Em seguida, se inaugurará Memorial: centro de preservação do acervo de seu pensamento e atuação.

Dom Helder se auto-definia talvez ao dizer: “quem me dera ser leal, discreto e silencioso como a minha própria sombra”. Pois ele não “temia a utopia”: “Ao sonharmos sozinhos” acrescentava ele, “limitamo-nos ao sonho. Quando sonhamos em grupo, alcançamos imediatamente a realidade. A utopia compartilhada com milhares é o esteio da história”.

O ensejo e a felicidade de conviver com Dom Helder Câmara em diferentes ocasiões, foi-me concedido, inclusive ao tempo em que, como Governador de Pernambuco, participei de atos em que, em muitos momentos, teve a presença de seu Bispo auxiliar, já referido, Dom Lamartine Soares, que espero recordar em posterior ocasião.

Friso, para concluir, um acontecimento de grande expressão que foi a visita, a primeira de uma série de cinco, que o Papa João Paulo II fez ao Brasil.

Tivemos a honra de recebê-lo em Recife, ao lado de minha esposa Anna Maria, meus pais e meus filhos, do então Vice-Governador Roberto Magalhães, do Prefeito de Recife, Gustavo Krause, da Secretária-Chefe da Casa Civil do Governo de Pernambuco, Professora Magistrada Margarida Cantarelli, entre outras autoridades dos poderes do Estado, Federal e da comunidade pernambucana.

Pude testemunhar, por fim, mas não finalmente, o abraço afetuoso e público em Dom Helder Câmara pelo Papa João Paulo II, o João de Deus, em Recife, nos idos de 1980, símbolo de reconhecimento do Chefe da Igreja Católica ao seu fiel servo, incondicional no servir integralmente ao povo de Deus.

Agradeço a V. Exª pelo uso da palavra.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/03/2008 - Página 4324