Discurso durante a 32ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração do Dia Mundial da Água e o lançamento da Campanha "SOS H2O".

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Comemoração do Dia Mundial da Água e o lançamento da Campanha "SOS H2O".
Publicação
Publicação no DSF de 19/03/2008 - Página 6131
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, AGUA, REGISTRO, ANTERIORIDADE, CRIAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), OBJETIVO, CONSCIENTIZAÇÃO, REDUÇÃO, QUANTIDADE, RECURSOS HIDRICOS, MUNDO, PRETENSÃO, APOIO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, COMENTARIO, RELEVANCIA, INICIATIVA.
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), COMPROVAÇÃO, SUPERIORIDADE, CRESCIMENTO, CONSUMO, AGUA, MUNDO.
  • ANALISE, CIRCUNSTANCIAS, REDUÇÃO, QUANTIDADE, AGUA, PAIS, MUNDO, INEFICACIA, ADMINISTRAÇÃO, RECURSOS HIDRICOS, SUPERIORIDADE, PERDA, FALTA, IGUALDADE, DISTRIBUIÇÃO.
  • COMENTARIO, DOCUMENTO, SANEAMENTO BASICO, AUTORIA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), DEMONSTRAÇÃO, EXISTENCIA, MUNICIPIOS, BRASIL, FALTA, SERVIÇO, ABASTECIMENTO DE AGUA, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, COMPROVAÇÃO, DESEQUILIBRIO, INVESTIMENTO, REGIÃO, PAIS, INSUFICIENCIA, ABASTECIMENTO, AGUA, ESTADO DO PARA (PA), DEFESA, COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, TRANSPOSIÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, DEBATE, ASSUNTO.
  • LEITURA, ARTIGO, DECLARAÇÃO, DIREITOS, AGUA, ELABORAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), NECESSIDADE, RESPONSABILIDADE, UTILIZAÇÃO, RECURSOS HIDRICOS, GARANTIA, PRESERVAÇÃO, VIDA, FUTURO.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Osmar Dias, Srªs e Srs. Senadores, Srªs e Srs. Deputados, quero cumprimentar todos que estão ou estiveram à Mesa.

            Sr. Luciano Zica, representante do Ministério do Meio Ambiente e Secretário de Recursos Hídricos, representando o Brasil na FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), Srªs e Srs. representantes da Agência Nacional de Águas, Srªs e Srs. Convidados para esta sessão especial, solene, em homenagem ao Dia Mundial da Água e ao lançamento da campanha de responsabilidade da FAO, ao estabelecer, no ano de 1992, o dia 22 de março como o Dia Mundial da Água, a Organização das Nações Unidas tinha como objetivo chamar a atenção para a questão da escassez da água e, conseqüentemente, buscar soluções para o problema.

            Essa iniciativa foi, sem dúvida, importantíssima, especialmente quando saímos das meras especulações e alcançamos a robustez e a austeridade dos números sobre a questão da água em todo o mundo.

            Números, gráficos, planilhas, contas de matemática, normalmente não são suficientes para explicar e dar a dimensão correta dos grandes problemas da humanidade. Eu, que sou geógrafo por formação, sei bem que a geografia contemporânea já deixou, de há muito, de se pautar apenas por esses fatores.

            Entretanto, Srªs e Srs. Convidados, Srªs e Srs. Senadores, hoje, especialmente, quero pedir permissão para me valer um pouco mais da matemática; sei que números não falam por si, mas, a verdade é que, em relação ao problema da água no mundo e também no Brasil, os números, os percentuais especialmente, são muito reveladores.

            Que explicação, por exemplo, convenceria diante do fato de que apenas um bilhão de pessoas em todo o mundo têm acesso a fontes de águas melhoradas, enquanto dois bilhões e meio vivem sem saneamento básico? O que podemos argumentar diante da inacreditável realidade de que a falta de abastecimento de água potável é responsável por nada menos que 80% das mortes nos países em desenvolvimento?

            Segundo dados divulgados pela ONU, o uso da água triplicou de 1950 para cá e, para o futuro, a expectativa é ainda mais desalentadora.

            Embora muitos pensem que os problemas afeitos à água estejam relacionados precipuamente à escassez natural, a verdade é que eles são resultados muito mais da má administração de recursos, do enorme desperdício e da ambição desmedida de alguns, que impedem a igualdade da distribuição desse precioso bem, tão imprescindível a todos os habitantes do planeta.

            Quero me permitir, Sr. Presidente, Senador Alvaro Dias, autor do requerimento que deu origem a esta sessão, aliás, Senador Osmar Dias - a condição de irmãos faz com que façamos essa confusão, perfeitamente compreensível -, quero me valer e, dessa vez, abusar um pouco mais da matemática para revelar, em números, a desigualdade da distribuição de água e do saneamento básico em nosso País.

            Como Senador, representante do Estado do Pará, não poderia deixar de fazer não uma denúncia, já que esses dados são de amplo conhecimento e divulgação, mas uma queixa indignada com relação à verdadeira discriminação sofrida, em vários aspectos, pela nossa região, mas, sobretudo, no que diz respeito ao abastecimento de água e ao saneamento básico.

            Segundo o Atlas do Saneamento, documento elaborado pelo IBGE, e lançado justamente no Dia Mundial da Água, no ano de 2000, havia 116 Municípios brasileiros sem serviço de abastecimento de água por rede geral, a maior parte dos quais situada nas Regiões Norte e Nordeste. De acordo com esse documento, “nestas regiões, embora tenha havido redução do número de Municípios sem abastecimento desde 1989, registrou-se, em 2000, um aumento de seu peso proporcional: passaram de 50% para 56% no Nordeste, e de 21,7% para 23,3% na Região Norte, indicando que o investimento aí realizado na expansão da rede geral de abastecimento de água não ocorreu na mesma proporção que nas demais regiões”. Sr. Presidente, esses são dados de um documento oficial da maior credibilidade no País: o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

            Ainda segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), o Pará, Estado que tenho a honra de representar nesta Casa, apresenta o menor percentual de cobertura de abastecimento de água no País em 2006, apenas 48,2%, ao passo que em Estados como São Paulo e Distrito Federal, por exemplo, esse percentual é superior a 90%. É essa desigualdade, essa discriminação, essa injustiça, que quero enfatizar, quando insisto, hoje, em apresentar esse festival de números - infelizmente, números tristes -, que, sabemos, não são apenas ou simplesmente números, já que por detrás de cada um deles há uma criança que morre desidratada, intoxicada; há um lar assombrado por enfermidades e doenças, as mais diversas; há um pé descalço que atola na lama da indiferença e do descaso daqueles que poderiam mudar esse quadro.

            Nesta semana, em que as discussões sobre os mais diversos problemas que envolvem a água em todo mundo estão muito mais acaloradas, quero destacar também o Projeto de Transposição do Rio São Francisco e solicitar, mais uma vez, insistir junto ao Governo Federal e aos órgãos responsáveis pela execução do projeto, que sejam ampliados os espaços de debate com as entidades e pessoas diretamente afetadas pelo projeto. É fundamental garantir que todas as partes envolvidas, inclusive aquelas mais fragilizadas, como é o caso dos pequenos produtores e dos pescadores, que tiram seu sustento dos peixes do Rio São Francisco, sejam ouvidos e levados em conta nesse processo. É imprescindível caminharmos para a realização de um debate que se caracterize pela honestidade, pela transparência e pela sensibilidade às reivindicações dos movimentos sociais, dos ambientalistas e, sobretudo, da população ribeirinha, cujos anseios, como sabemos, acabam sendo...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - ... os menos considerados em projetos dessa natureza.

            Para finalizar, Srªs e Srs. Senadores, quero ler aqui os arts. 5º e 10 da Declaração Universal dos Direitos da Água, documento também elaborado pela ONU, quando da criação do Dia Mundial da Água.

            O art. 5º remete-nos à nossa responsabilidade perante as futuras gerações e a nossa obrigação moral de preservar o planeta para aqueles que estarão aqui muito depois que já tivermos cumprido a nossa missão.

            Diz o art. 5º:

A água não é somente uma herança dos nossos predecessores; ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores. Sua proteção constitui uma necessidade vital, assim como uma obrigação moral do homem para com gerações presente e futuras.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Convidados, diante de dados oficiais que demonstram que grande parcela da população brasileira, especialmente no Norte e no Nordeste, são privadas desse bem absolutamente necessário à manutenção das condições de vida e à reprodução da vida, não é demais constatar, como tenho constatado, que em vários Municípios do meu Estado cercados por rios, por igarapés, pelas melhores fontes de água...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - ... populações de vilas e de cidades não têm direito a esse bem. Inclusive, recentemente, quando em visita ao Município de Barcarena, o maior pólo industrial do alumínio da Companhia Vale do Rio Doce, no Pará, presenciamos uma cena digna do Nordeste seco, região da qual sou originário. Mas ver caminhões-pipas transportando água para residências, porque, além de não haver uma rede de água pública para distribuição às populações de bairros pobres e de distritos...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Sr. Presidente, peço um pouco mais de tempo para concluir.

            ... distritos, no Município de Barcarena, que não têm a água captada do subsolo ou a água que poderia ser tratada e que é abundante nos rios da região... Mas, naquele esforço feito, é muito importante assinalar que, ao escavarem um poço profundo, artesiano, para abastecer as suas residências, na região do complexo industrial de Vila do Conde, esses moradores são igualmente privados desse direito, porque o subsolo está contaminado por resíduos das companhias de caulim e de produção de alumínio naquela região e ficam impedidos, sob todas as formas, do acesso à área...

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Osmar Dias. PDT - PR) - Senador José Nery, já são 15h31min. Às 16 horas, começa a Ordem do Dia. E há ainda quatro oradores inscritos, com dez minutos. Então, peço a V. Exª a conclusão.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Sr. Presidente, concluo em um minuto, mas não sem antes fazer referência à denúncia bastante grave, apresentada por uma ONG, organização não-governamental.

            Ontem, fazendo balanço do uso da água no País, o Diretor Leonardo Morelli, dizia que, sobre a questão relacionada ao consumo da água, o agronegócio é responsável por 70% do consumo; a indústria, por 20%; e a população em geral, por apenas 10%. E apresenta o conjunto de denúncias e de questões que devem levar não só a Agência Nacional de Águas, mas o Congresso, o Governo e a sociedade a pensarem medidas eficazes que tenham ampla discussão e participação popular quanto à gestão dos recursos hídricos e ao seu bom aproveitamento.

            Que tenhamos todos a oportunidade e a possibilidade de construir um processo em que todos possam ter direito à água como um bem universal necessário à reprodução e à garantia da vida. Que o Congresso Nacional, o Senado em particular, trate de aqui discutir medidas, leis e mecanismos que ajudem a garantir a captação, a distribuição e o atendimento às populações, especialmente das regiões mais pobres do País.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/03/2008 - Página 6131