Discurso durante a 52ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, envolvendo toda a polêmica sobre a Lei de Imprensa no Brasil.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA.:
  • Considerações sobre artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, envolvendo toda a polêmica sobre a Lei de Imprensa no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/2008 - Página 9405
Assunto
Outros > IMPRENSA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DEFESA, APERFEIÇOAMENTO, LEI DE IMPRENSA, GARANTIA, LIBERDADE DE IMPRENSA, AUMENTO, RESPONSABILIDADE CIVIL, RESPONSABILIDADE PENAL, PRESERVAÇÃO, INTERESSE PUBLICO, DEMONSTRAÇÃO, EXISTENCIA, LEIS, IMPRENSA, PAIS ESTRANGEIRO, ESPANHA, PORTUGAL, ITALIA, FRANÇA, BENEFICIO, DEMOCRACIA.
  • EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ALTERAÇÃO, LEI DE IMPRENSA, RELEVANCIA, PARCERIA, SENADO, CONSELHO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, ATUAÇÃO, DEFESA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, PRESERVAÇÃO, LIBERDADE DE IMPRENSA.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Alvaro Dias, Srªs e Srs. Senadores, no dia 11 de março deste ano, os juristas Miguel Reale Júnior e René Ariel Dotti publicaram artigo no jornal Folha de S.Paulo sobre toda a polêmica recente envolvendo a Lei de Imprensa no Brasil.

Antes de entrar no mérito do artigo, é preciso afirmar, desde já, que o texto, escrito por dois dos mais eminentes pensadores do Direito deste País, já se tornou uma das principais referências nos debates sobre o tema, tendo sido citado em vários outros textos sobre a questão da Lei de Imprensa. Alberto Dines, por exemplo, um dos jornalistas mais experientes do País, chamou o artigo de Dotti e de Reale Júnior de “corajoso - porém solitário”. Dines fez essa observação em seu site, Observatório da Imprensa, uma semana após a publicação do artigo dos juristas na Folha, e ainda não tinha, portanto, a dimensão nada solitária que ele viria a ter nos dias seguintes, quando foi republicado e debatido em diversos outros veículos de comunicação, sobretudo na Internet.

A tese de Reale Júnior e de Dotti, no artigo que se intitula “Um estatuto da liberdade de imprensa”, é a de que uma lei que trate especificamente da imprensa é benéfica e necessária. Deixar, por exemplo, os crimes cometidos por meio da imprensa serem tratados pelo Código Penal seria um erro, pois as particularidades envolvidas no universo dos meios de comunicação, que são fundamentais em certos tipos de situação, estariam sendo ignoradas.

Somente uma lei específica, segundo os autores, seria capaz de tratar de temas como, por exemplo, a responsabilidade civil e penal dos crimes cometidos por meio da imprensa; o exercício dos direitos de resposta e retificação com aspectos peculiares; os direitos, as garantias e os deveres inerentes à fundação, à administração e ao funcionamento das empresas de jornalismo e de radiodifusão; as concessões, as permissões e as autorizações para os serviços de radiodifusão de som e imagem, além dos casos de suspensão e de cancelamento; a aplicação efetiva das determinações da Constituição Federal sobre a produção e a programação das emissoras de rádio e de televisão, entre outros temas que somente uma lei específica teria capacidade de disciplinar.

Os dois juristas discutem ainda, no artigo referido, outros temas não menos importantes. A Lei de Imprensa, por exemplo, leva em consideração a figura do interesse público, fundamental na questão da liberdade de imprensa, mas inadmissível para o crime comum. Da mesma forma, a peculiaridade de certos crimes cometidos por intermédio da imprensa, como a injúria, a calúnia e a difamação, são tratados de maneira diversa no âmbito da imprensa. Isso se justifica pelo fato de que um ataque à honra de alguém, lançado pela TV ou pelo rádio, tem alcance muito maior do que se o mesmo ataque fosse desferido em uma sala ou por carta.

Sr. Presidente, a discussão sobre a necessidade ou não de uma Lei de Imprensa é mais importante do que pode parecer a muita gente. Liberdade de imprensa e democracia são dois conceitos que, no mundo moderno, são profunda e intimamente relacionados. E as condições para que haja uma imprensa efetivamente livre requerem, do Estado, a confecção de regras específicas para as diversas peculiaridades envolvidas no universo dos meios de comunicação.

Tanto é assim que, na grande maioria dos países, normas específicas são destinadas a tratar dos crimes cometidos por meio da imprensa. É assim na Espanha, em Portugal, na Itália, na França. Há leis tão antigas como a francesa, surgida em 1881, e, evidentemente, alterada ao longo dos anos; há leis mais modernas, como a portuguesa, de 2007, que alterou o Estatuto do Jornalista de Portugal, de 1999. Na Itália, a primeira lei é de 1948. Nos Estados Unidos, uma série de instâncias regulatórias analisa e julga os casos envolvendo jornalistas e veículos de comunicação.

A idéia, Sr. Presidente, é a de que o Brasil não possui nenhuma particularidade que nos diferencie das demais democracias modernas, no sentido de nos eximir de contar com uma legislação específica para a imprensa. A retirada da Lei de Imprensa de nosso universo jurídico seria um grave erro, pois o Código Penal brasileiro, por melhor que seja, não está equipado para tratar das complexas questões colocadas pelos crimes cometidos por meio da imprensa. Como afirmou René Ariel Dotti, “não se pode pretender que o universo da informação jornalística fique limitado ao campo do Código Penal, pois a liberdade de crítica será prejudicada”.

É com grande atenção, portanto, que acompanhamos, no Supremo Tribunal Federal, a tramitação da ação movida pelo Deputado Miro Teixeira. A decisão preliminar de suspender vinte artigos da atual Lei de Imprensa mostra que os Ministros do Supremo Tribunal Federal não se furtarão a usar os instrumentos de que dispõem para buscar corrigir os aspectos da lei que, em seu julgamento, não mais refletem o estágio atual das relações entre sociedade e imprensa em nosso País.

Sou o primeiro a admitir, Srªs e Srs. Senadores, que a Lei de Imprensa brasileira contém dispositivos que refletem a postura que o governo militar tinha perante os meios de comunicação, mas a pura e simples extinção dessa Lei, sem sua substituição por uma norma alternativa, não resolverá o problema.

Precisamos - isso, sim - de uma norma mais condizente com a maturidade alcançada por nossa democracia. Precisamos de uma Lei de Imprensa que reflita nosso compromisso com a liberdade de expressão, salvaguardada pela Constituição Federal, e que, ao mesmo tempo, também estabeleça as responsabilidades decorrentes da atividade jornalística, as punições para os casos de abuso, entre outras questões.

Não seria má idéia, também, dispormos de uma instância que, no âmbito do poder público, tivesse a atribuição de concentrar os esforços de reflexão a respeito dos meios de comunicação no País. No meu entendimento, o Conselho de Comunicação Social (CCS), como sugerido por Alberto Dines, teria plenas condições de cumprir esse papel. Criado para funcionar como órgão auxiliar do Poder Legislativo, o CCS anda esquecido, não se reúne, mesmo porque, neste ano, seus membros não foram sequer indicados. Acredito que, se perseverarmos nessa atitude, estaremos perdendo a oportunidade de contar com um espaço qualificadíssimo de debate, no qual, tenho certeza, questões da maior relevância seriam colocadas em discussão. Não será fugindo ao enfrentamento dessas questões, muitas delas delicadas, que aperfeiçoaremos a atuação da mídia e as relações entre imprensa, Estado e sociedade civil neste País.

Portanto, Sr. Presidente, apelo às Srªs Senadoras e aos Srs. Senadores que incluam esses temas em suas reflexões. As discussões já foram retomadas na Câmara dos Deputados, e logo, tenho certeza, o debate chegará ao Senado. Tenhamos em mente, acima de tudo, a importância fundamental que uma lei específica para a imprensa tem em praticamente todas as democracias do mundo.

Sr. Presidente, era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/2008 - Página 9405