Discurso durante a 54ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem ao Dia do Exército Brasileiro, comemorado no dia 19 de abril, em referência à vitoriosa Batalha dos Guararapes.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. FORÇAS ARMADAS.:
  • Homenagem ao Dia do Exército Brasileiro, comemorado no dia 19 de abril, em referência à vitoriosa Batalha dos Guararapes.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/2008 - Página 9906
Assunto
Outros > HOMENAGEM. FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, EXERCITO, DATA, HISTORIA, VITORIA, EXPULSÃO, ESTRANGEIRO, TERRITORIO NACIONAL, INICIO, CONSTRUÇÃO, NACIONALIDADE, UNIÃO, RAÇA.
  • ANALISE, EVOLUÇÃO, ESTABILIDADE, CRESCIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, EFEITO, POSSIBILIDADE, ATENÇÃO, REFORMULAÇÃO, FORÇAS ARMADAS, CONVITE, MILITAR, CONTRIBUIÇÃO, SENADO, DEBATE, MODERNIZAÇÃO, INVESTIMENTO, EQUIPAMENTOS, PESQUISA, CIENCIA E TECNOLOGIA, VALORIZAÇÃO, RECURSOS HUMANOS, IMPORTANCIA, AMPLIAÇÃO, PRESENÇA, FRONTEIRA, REGIÃO AMAZONICA.
  • DEFESA, REFORMULAÇÃO, CONCEITO, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO AMAZONICA, PROJETO, AGRICULTURA, PRODUTO FLORESTAL, PRODUÇÃO, ALIMENTOS, SIMULTANEIDADE, EXTRATIVISMO, INVESTIMENTO, POLO INDUSTRIAL, SEMELHANÇA, SUPERINTENDENCIA DA ZONA FRANCA DE MANAUS (SUFRAMA), BUSCA, CONCILIAÇÃO, DIREITOS, CIDADANIA, INDIO, COMBATE, AMEAÇA, LOBBY, AMBITO INTERNACIONAL.
  • COMENTARIO, RIQUEZAS, MINERIO, REGIÃO AMAZONICA, POSSIBILIDADE, EMPREGO, OCUPAÇÃO, IMPORTANCIA, PRESENÇA, ESTADO, COLABORAÇÃO, FORÇAS ARMADAS.
  • CONCLAMAÇÃO, FORÇAS ARMADAS, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, DEMOCRACIA, ESPECIFICAÇÃO, AMPLIAÇÃO, PRESENÇA, BRASIL, ORGANISMO INTERNACIONAL, CONSELHO DE SEGURANÇA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU).

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Saúdo o Sr. Senador Garibaldi Alves Filho, Presidente do Senado e do Congresso Nacional; o Deputado Arlindo Chinaglia, que acaba de se retirar, Presidente da Câmara dos Deputados; o Senador Romeu Tuma, autor do requerimento de realização desta sessão; quero saudar também o Secretário-Geral da Marinha, o Almirante-de-Esquadra Álvaro Luiz Pinto, representante do Comando nesta cerimônia; o Sr. Comandante do Exército Enzo Martins Peri; o Sr. Exmº Comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro-do-Ar, Juniti Saito; o Exmº Presidente do Superior Tribunal Militar, aprovado por esta Casa, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Flávio de Oliveira Lencastre; saúdo ainda as demais autoridades presentes, comandantes e, sobretudo, os generais presentes a esta cerimônia.

Reunimo-nos hoje para prestar homenagem ao Exército Brasileiro, recordando, nesta oportunidade, uma vez mais, aquele já distante 19 de abril de 1648, o dia da Batalha de Montes Guararapes, onde marcamos o início da expulsão dos holandeses do território brasileiro.

Aquele episódio foi uma pedra angular na construção da nossa nacionalidade, porque ali se construiu uma aliança heróica de índios, negros, mazombos, reinóis, que aqui se instalaram em torno do objetivo comum. Figuras como o índio Felipe Camarão, o negro Henrique Dias, o madeirense João Fernandes Vieira, os lusitanos André Vidal de Negreiros e Antônio Dias Cardoso, para não falar em Barreto de Menezes, que era peruano de nascimento.

É importante registrar que Guararapes não foi uma vitória de Portugal. Não foi porque, desde 1641, D. João IV, ex-Duque de Bragança, havia constituído uma aliança com a Holanda, com Flandres, para poder enfrentar a importância, o peso político e estratégico que a Espanha exercia sobre Portugal. E, nessa aliança, em que Amsterdã financiava o esforço de guerra contra Madri, o acordo firmado em 21 de junho de 1641 - o Tratado das Províncias Unidas dos Paises Baixos -, os territórios ultramarinos, inclusive a presença holandesa no Brasil, foram dados como contrapartida àquele apoio político, financeiro e militar que os holandeses estendiam à Coroa Portuguesa.

Portanto, a Guerra da Luz Divina foi o movimento em que o Brasil defendeu-se a si próprio. Não foi uma vitória das tropas portuguesas; foi uma vitória desse movimento cultural, político, social, que basicamente marca ali, eu diria, a construção da nacionalidade.

A nossa diferença em relação ao que foi a experiência americana de oposição a Jorge III, capitaneada por lideranças como Thomas Jefferson, que fundaram ali, naquele momento, mais cedo, num processo semelhante ao nosso, um estado republicano e a independência americana, é que nós não conseguimos, em função da escravatura, coerir uma base social e política mais ampla que pudesse, já naquele momento da nossa história, antecipar o que viria mais tarde, em 1889, depois da Abolição da Escravatura de 1888: liderados novamente pelo Exército Brasileiro, à frente Deodoro da Fonseca e tantas outras figuras, construímos o estado republicano e reafirmamos os nossos interesses como nação soberana.

Essa história, que todo militar conhece com tanta profundidade, estudando todas as nossas experiências e a construção da nossa identidade, talvez traga algumas luzes sobre o momento que estamos atravessando. Vivemos um momento que, diferente do que foram os últimos vinte anos, quando o País crescia em média 6%. Nos últimos quatro anos, o Brasil cresceu 4,5%, com estabilidade. De 1980 a 1994, este País teve 23 trilhões de pontos percentuais de inflação, a mais longa hiperinflação da História. Era impossível pensar numa Força, num Orçamento, em investimento, em gestão de pessoal em um País que nem moeda tinha.

Nós construímos a estabilidade monetária, é verdade, desde 1994, mas a consolidação da estabilidade econômica se deu pelo trabalho competente que foi feito por nossa diplomacia, de abrir novos mercados, porque, se nós tivéssemos aquela lógica comercial em que os Estados Unidos, por exemplo, representavam sozinhos mais de 25% das nossas exportações, dificilmente nós teríamos a estabilidade comercial que temos hoje, pela ampliação dos nossos mercados para a África, para a Ásia e, sobretudo, para a própria América Latina.

O Brasil triplicou as exportações; tem US$195 bilhões em caixa; cresce com uma inflação de 4,7%, muito próxima do centro da meta do Banco Central; vem crescendo a um ritmo sustentável, porque os investimentos têm crescido duas vezes mais do que o crescimento do nosso PIB; e, o mais importante, cresce distribuindo renda. A renda da metade mais pobre do Brasil cresceu 32% nos últimos quatro anos. Programas como o Bolsa-Família, salário mínimo e aumento de emprego mudaram as perspectivas econômicas do Brasil. O etanol, os investimentos em logística, que é o nosso maior desafio - energia, transporte, portos e aeroportos -, as descobertas recentes da Bacia de Santos, especialmente o pré-sal, que nos colocarão num outro patamar, sob o ponto de vista da nossa matriz energética e da nossa capacidade de gerar riqueza e exportar petróleo, que hoje é um bem não-renovável, extremamente relevante para todas as economias e para o nosso País, recolocam a condição de o Brasil repensar, de uma forma estratégica, as suas Forças Armadas.

A redução da dívida pública, que era de 57% do PIB e, hoje, é de 42%, a capacidade de investimento e de gasto do Estado brasileiro, o êxito das políticas de inclusão social e o crescimento sustentável, com estabilidade, permitem ao Brasil repensar, eu diria, o papel decisivo e estratégico das nossas Forças Armadas.

Compartilho com todo o esforço que deve ser feito não mais apenas pelas Forças. Há de haver o engajamento, uma discussão mais transparente - e os convido para participar dessa discussão nas Comissões de Assuntos Econômicos e de Relações Exteriores - sobre um programa de modernização das Forças Armadas. Precisamos de mais investimentos em equipamento, mais esforço de pesquisa em ciência e tecnologia; precisamos de valorização do corpo profissional das Forças Armadas; e, sobretudo, precisamos de uma presença muito mais decisiva das Forças Armadas Brasileiras na Amazônia.

Acho que esse não é um debate qualquer e não será um debate passageiro. A Amazônia representa mais da metade do território brasileiro. O esforço de construirmos a presença nacional, a história política da Amazônia, sobre como esse território foi incorporado a esta imensa Nação que é o Brasil, não é uma história qualquer; vem das negociações do Tratado de Tordesilhas, em 1499; vem de figuras heróicas como Pedro Teixeira, que subiu o Rio Amazonas a remo e a vela, em 1637, chegando até Quito e registrando, em Portugal e em Madri, que toda aquela área era posse do Império português. E foi, mais tarde, essa atitude heróica daqueles que desbravaram essa região que permitiu que toda essa imensa e rica parte do nosso território passasse a fazer parte desta Nação. E lembro figuras como o Barão do Rio Branco, que souberam, com tanta competência, negociar o que hoje é o Acre.

Todavia, o nosso olhar sobre a Amazônia precisa avançar. Nós temos de derrotar alguns mitos - mitos do atraso, mitos que são incompatíveis com os interesses da Nação - sobre a Amazônia. A idéia de que a Amazônia só pode ser explorada por meio de atividades extrativistas e de coleta é uma idéia totalmente superada na história. Nós já tivemos o ciclo da borracha e tivemos o ciclo do cacau. Nós precisamos do plantio racional de várias espécies na Amazônia, o que dá muito mais produtividade, eficiência e gera renda do que a idéia de uma reserva extrativista, que é um espaço importante que deve ser preservado, mas que é insuficiente para o desenvolvimento econômico daquela região.

A idéia de que os povos da floresta, por si só, são o principal instrumento de preservação da floresta é, também, uma idéia que precisa ser revista. Os próprios seringueiros, é verdade, ajudam a preservar a flora, mas não ajudam a preservar a fauna, porque a proteína animal vem da caça direta a que eles são obrigados por falta de renda e de riqueza. O que vai fazer a Amazônia crescer são os investimentos em áreas estratégicas, são os pólos industriais, porque o movimento migratório para a Amazônia está diminuindo, está se estabilizando, e a concentração de 24 milhões de brasileiros que lá vivem ocorre nas cidades-pólo, que estão crescendo e precisam de serviço e de indústria. A experiência do Pólo Industrial de Manaus é exitosa. O Amazonas é uma região preservada porque nele há investimentos em ciência, tecnologia e produção.

Outra idéia que nós precisamos superar nesse debate franco e aberto do Brasil, até para enfrentarmos pressões internacionais - que não são quaisquer pressões, são pressões estratégicas, e temos de saber exatamente qual o nosso interesse como Nação -, é a idéia de que o solo da Amazônia não é um solo adaptado à agricultura e à pecuária. Isso é insustentável sob o ponto de vista de qualquer análise séria, geológica. A Amazônia, em 8% do seu território, tem terras da mais alta qualidade, terras de grande produtividade, inclusive terra roxa - estamos falando de 40 milhões de hectares. Toda a produção de grãos do restante do Brasil ocorre em 50 milhões. Quer dizer, terra da mais alta qualidade significa, ali - em 8% apenas -, 40 milhões de hectares. E 70% da Amazônia são terras, se corrigidas - a calagem, porque são terras ácidas - e adubadas, com excelente possibilidade de atuação e de produtividade agrícola. Portanto, temos de ter modelo de desenvolvimento para a agricultura.

Compartilho com aqueles que acham que os 220 mil índios que estão na Amazônia devem ter reconhecidos os seus direitos históricos. Pela Constituição Brasileira, eles têm direito à sua identidade cultural e devem ter essa opção como cidadãos, mas esse projeto não pode ser incompatível com o interesse de 24 milhões de brasileiros que lá vivem. Temos de ter a visão de que existem 24 milhões de brasileiros que saíram do Nordeste, por falta de opção na agricultura pela seca, e foram desbravar a Amazônia para alimentar a sua renda e impulsionar este País. Temos de pensar que essa política tem de ser compatível com um projeto, eu diria, mais consistente e mais sustentável de desenvolvimento daquela região.

A Amazônia precisa do Sivam; a Amazônia precisa dos 25 mil militares que estão lá. O meu pai comandou o lado ocidental da Amazônia, e sei o que é cada posto de fronteira, o que são os profissionais que estão lá, isolados, o seu papel estratégico e como cada palmo dessa fronteira vem sendo disputado, sob o ponto de vista da identidade nacional, pela presença do Exército Brasileiro, pela presença de um projeto de Nação. Ali, onde se canta o Hino Nacional, ali, onde se fala Português, essa é a única referência do Estado brasileiro.

Se nós quisermos construir, realmente, um projeto de longa duração e soubermos enfrentar as pressões, que serão crescentes, sobre essa região, que é o pólo mineral mais importante... A mina de Carajás tem o melhor minério de ferro do Planeta, cujo preço aumentou em 70%, em 1º de abril. Só o Projeto Onça Puma tem mais 28 quilômetros de possibilidades de exploração mineral de ferro. Ali, temos ouro, platina, níquel, cobre, com plantas sendo instaladas, gerando divisas, gerando empregos, e temos, em toda a Amazônia, pólos minerais absolutamente fundamentais. Portanto, a ocupação da Amazônia, a presença do Estado Nacional depende decisivamente dos aviões da Aeronáutica, depende fundamentalmente da presença do Estado e do Exército Brasileiro nessa ocupação.

A Amazônia é do Brasil; o Brasil tem governança sobre a Amazônia, tem projeto para a Amazônia, sabe que precisa combater o processo de queima irresponsável de florestas, mas não vai abdicar de produzir agricultura. Há 60 milhões de cabeças de gado na Amazônia, e temos o maior rebanho bovino do Planeta; um Planeta que, em 2050, vai ter 11 bilhões de pessoas - 70% a mais que a população do Planeta hoje. A China tem metade da terra agricultável do Brasil para alimentar 1 bilhão e 350 milhões de pessoas. A Índia tem mais de 1 bilhão de pessoas. O eixo dinâmico da economia mundial, que é a Ásia, não tem terra, não tem produtividade e não terá como alimentar essas grandes massas populares. É por isso que o preço dos alimentos está subindo. É por isso que o Brasil - o maior produtor mundial de carne bovina, o segundo em carne suína, o primeiro em aves, o primeiro em soja, o quarto em algodão, o primeiro em etanol, o primeiro em açúcar, o primeiro em suco de laranja, o primeiro em café - tem que ter na Amazônia um processo de incorporação de plantio racional, de aumento de produtividade, de aumento de eficiência, de aumento de renda, de ciência e tecnologia e de presença decisiva do Estado brasileiro, por meio do Exército nacional.

Os Tiros de Guerra, a formação dos jovens: é isso que vai fazer da Amazônia uma parte estratégica da construção do País. E essa tarefa não será resolvida se nós não discutirmos um projeto de Nação e o papel das Forças Armadas. Creio que o Congresso brasileiro ainda não se deu conta de que o País mudou. Mudou a presença internacional do Brasil, pelo respeito que conquistou. O candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos defende a presença do Brasil no G-8; a Secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, defende o Brasil no Conselho de Segurança da ONU.

Estamos vendo a instabilidade do entorno da Amazônia, a instabilidade política, militar e estratégica. O Brasil é o elemento de estabilidade, de equilíbrio, de racionalidade, de competência diplomática, para preservar a perspectiva de crescimento e de desenvolvimento da América do Sul.

            Por tudo isso, as Forças Armadas têm mais audiência nesta Casa do que imaginam. O que tem faltado é nós pautarmos não uma agenda de apequenar o Brasil, mas de discutir as grandes questões nacionais. E espero que as Forças Armadas venham não apenas para um dia de homenagem, mas para debater um projeto de Nação, o seu lugar nesta Nação, porque os problemas que tivemos no passado estão superados. Este País é um país democrático; as Forças Armadas são essenciais e devem receber um tratamento à altura do projeto da grande Nação que estamos construindo.

Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/2008 - Página 9906