Discurso durante a 58ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso, hoje do Dia da Comunidade Luso-Brasileiro. Necessidade de se avançar na implementação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

Autor
Marco Maciel (DEM - Democratas/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL. POLITICA EXTERNA.:
  • Registro do transcurso, hoje do Dia da Comunidade Luso-Brasileiro. Necessidade de se avançar na implementação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
Publicação
Publicação no DSF de 23/04/2008 - Página 10384
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, DESCOBERTA, BRASIL, COMUNIDADE LUSO BRASILEIRA.
  • COMENTARIO, HISTORIA, NEGOCIAÇÃO, ACORDO INTERNACIONAL, UNIFICAÇÃO, ORTOGRAFIA, LINGUA PORTUGUESA, REGISTRO, DIFICULDADE, APROVAÇÃO, PARLAMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), QUESTIONAMENTO, DEMORA, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL, ASSINATURA, ACORDO INTERNACIONAL, DEFESA, EMPENHO, CONGRESSO NACIONAL, NEGOCIAÇÃO, AGILIZAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, ACORDO.

O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Alvaro Dias, Srªs e Srs. Senadores, boa-tarde.

“Minha pátria é a língua portuguesa”, disse-o muito bem Fernando Pessoa em uma de suas definições magistrais. A lusofonia está entre os grandes blocos lingüísticos e culturais do mundo, maior que os dos falantes de francês, espanhol ou árabe. Mesmo assim, o árabe e o espanhol foram acrescentados aos idiomas oficiais da Organização das Nações Unidas, ao lado do inglês, francês, chinês e russo, línguas faladas nos países dos membros do Conselho de Segurança da ONU. Contudo, o idioma português ainda hoje não está entre eles. Um dos motivos alegados é a diversidade de ortografias.

Desde 1911, Sr. Presidente, se busca uma ortografia atualizada e aceita pelo Brasil e Portugal. Foram feitas três simplificações da língua (em 1911, em 1931 e entre 1945 e 1946) até que em 1990 foi assinado em Lisboa o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, com sua data de entrada em vigor cancelada pelo Protocolo Modificativo num encontro dos países lusófonos, em 1998, na Cidade da Praia em Cabo Verde. Nesse encontro, inclusive, tive a oportunidade de comparecer chefiando a delegação brasileira. Os Parlamentos do Brasil, de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe aprovaram a decisão dos seus Chefes de Governo.

É importante dizer que o Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, a que me refiro, depende ainda de aprovação da Assembléia da República, ou seja, o Parlamento de Portugal.

E o que se percebe - desafortunadamente - é que não há consenso nos círculos culturais e acadêmicos portugueses com relação à aprovação do mencionado acordo.

O ex-Presidente da Academia Brasileira de Letras, Marcos Vilaça, e o atual, Cícero Sandroni, e o diplomata cabo-verdiano Luís Monteiro da Fonseca, secretário-executivo da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), insistem no prazo de dois anos para sua vigência.

Não se entende a dilatação da vigência do Acordo Ortográfico para seis anos, pois o já aprovado não é algo que vá produzir muitas mudanças na Língua Portuguesa. Só para dar exemplo, Sr. Presidente, na realidade só serão modificadas 0,5% das palavras no Brasil e 1,6% das palavras em Portugal. Apesar disso, há muitas vozes discordantes, às quais o escritor João Ubaldo Ribeiro tenta acalmar demonstrando que o Acordo Ortográfico “não faz grandes inovações”, enquanto o acadêmico Arnaldo Niskier lamenta a perda de tempo pelos seus sucessivos adiamentos.

Na mesma direção se manifestou o reputado filólogo brasileiro Evanildo Bechara, pernambucano e membro da Academia Brasileira de Letras. Ele tem o que chamaríamos “a sabedoria do equilíbrio”.

Já que falamos em equilíbrio, o que se recomenda é que acompanhemos o ritmo natural dessas mudanças. Os chefes de Estado e de Governo da CPLP, em sua reunião em São Tomé, em 2004, aceitaram, além da adesão do Timor Leste, que é o oitavo país lusófono, o prazo de seis anos para a implantação do referido Acordo Ortográfico.

O Presidente da República Portuguesa Cavaco Silva endossou esta data ao visitar, em março passado, o Rio de Janeiro para participar das comemorações do Segundo Centenário da vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil.

Na ocasião, afirmou: “As negociações começaram quando eu era primeiro-ministro. Agora o acordo vai para a Assembléia da República, vai ocorrer aí um debate e vai para Belém igualmente”. Quando ele diz que vai para Belém, significa que vai depender também da aprovação do Presidente da República, visto que Portugal pratica um parlamentarismo com viés de presidencialismo, em que ele não somente tem um papel relevante na formulação da política externa portuguesa.

A seguir disse o Presidente Cavaco Silva: “O Conselho de Ministros aprovou ontem a proposta do segundo protocolo modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, de 1991, comprometendo-se a adotar as medidas adequadas para ‘garantir o necessário processo de transição, no prazo de seis anos’”.

O Ministro da Cultura de Portugal, José António Pinto Ribeiro, por sua vez, no jornal O Público, importante diário lusitano, asseverou que “os seis anos previstos para a transição da língua em Portugal não impedirão que o País comece o processo”, e acrescentou: “na minha opinião, nós devíamos ter sido os primeiros”.

Ainda palavras do Ministro da Cultura de Portugal: “O Governo não veio a optar por uma moratória ao definir o período de seis anos para a execução do Acordo. Não foi esse o nosso objetivo, nem desejamos que seja estabelecida nenhuma moratória”.

E justificou esse prazo com a necessidade de organização: “É preciso formar professores, é preciso rever currículos escolares, é preciso fazer livros, há muitas coisas para fazer até estar completamente executada” a reforma.

Os escritores, assim esperamos, não serão prejudicados pelo Acordo Ortográfico, pois a liberdade estilística em nada será afetada. A linguagem literária baseia-se língua gramatical, porém a completa ao enriquecê-la em plena liberdade criativa.

Quanto à substituição dos livros didáticos, eles costumam ter um prazo de três anos no Brasil e de quatro a seis em Portugal. A questão principal, pois, consiste em dar o primeiro passo. Evanildo Bechara, que já citei anteriormente, disse com propriedade que “língua é poder”. Ou mais do que isso. “A troca de sua língua é quase igual à troca de sua própria alma”, disse certa feita o filólogo francês do século XIX Gaston Paris.

Sr. Presidente, já estou concluindo.

O jornal O Globo, em edição de 7 de março passado, publica matéria de autoria de Chico Otávio, em que anota que “Portugal levou 18 anos entre a assinatura do acordo e sua ratificação pelo Conselho dos Ministros na semana passada, para dar o primeiro passo no sentido de implementá-lo. Teoricamente o acordo está em vigor desde o início de 2007, com a assinatura de três dos oito países signatários: Brasil, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe. Na prática, porém, ele não existe sem a entrada de Portugal. Embora as próximas etapas - aprovação pelo Parlamento e pelo Presidente - andem mais rápido, isso não significa dizer que as resistências às mudanças foram debeladas”.

O Ministro José António Pinto Ribeiro considera, porém, o Acordo significativo, pois, “quanto mais profunda é a relação de um povo com a palavra, mais profunda é a sua identidade”. Acredita igualmente, que, se os oito países que formam a comunidade tiverem uma língua portuguesa comum, poderão se globalizar sem medo de perder sua identidade. E, encerra, afirmando: “...quem não tem dissolve-se”.

Sr. Presidente, concluo: é fundamental que o Congresso Nacional se associe ao tema, para que o Acordo Ortográfico não sofra novos adiamentos e consigamos tornar o português um dos idiomas oficiais da ONU. Somos cerca de 250 milhões de luso falantes. O mundo deve - e precisa - ouvir também a nossa voz.

Hoje, convém recordar, registramos a passagem de mais um ano da descoberta do Brasil - o 508º aniversário, certamente uma data que marca a mais notável saga dos navegadores portugueses nos albores do Renascimento. Festejamos também hoje, o Dia da Comunidade Luso-Brasileira. Em nossos dias, o Brasil é a mais populosa das nações lusófonas. Temos especial interesse e também significativa responsabilidade na implantação do Acordo Ortográfico, um documento compreensivo e resultado de longas negociações com toda a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.

Tudo isso conflui para que estejamos atentos à necessidade de avançar na implementação do Acordo Ortográfico, o que permitirá a consolidação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, - instrumento importante na perfusão do português em todo o mundo, o que torna possível, para todos nós, como corolário, maior participação de nossa cultura e maior difusão de nossos valores nestes tempos de mundialização.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/04/2008 - Página 10384