Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reiteração de apelo para que as FARCs liberte a ex-Senadora colombiana Ingrid Betancourt.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Reiteração de apelo para que as FARCs liberte a ex-Senadora colombiana Ingrid Betancourt.
Publicação
Publicação no DSF de 25/04/2008 - Página 10767
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • REITERAÇÃO, SOLICITAÇÃO, GRUPO, GUERRILHA, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, LIBERDADE, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, REFEM, INFORMAÇÃO, SUSPENSÃO, NEGOCIAÇÃO, POSTERIORIDADE, CONFLITO, MORTE, LIDER, TERRORISMO, APRESENTAÇÃO, DISPONIBILIDADE, ORADOR, VISITA, REGIÃO, AUXILIO, ENTENDIMENTO.
  • DIVULGAÇÃO, PENSAMENTO, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, VITIMA, SEQUESTRO, LEITURA, ANTERIORIDADE, ENTREVISTA, PUBLICAÇÃO, PERIODICO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Gerson Camata, inúmeros Srs. Senadores e Srªs Senadoras têm aqui feito um apelo para que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia libertem a Senadora Ingrid Betancourt bem como todos aqueles que estão seqüestrados.

Ingrid Betancourt está seqüestrada desde fevereiro de 2002 e, conforme muitos aqui já ressaltaram, se encontra em condições extremamente precárias de saúde.

Então, quero hoje renovar o apelo, já assinado por tantos Senadores, inclusive por todos os presentes, e pela Senadora Kátia Abreu, pela Líder Ideli Salvatti, pelo Senador Mão Santa, pelo Senador Tasso Jereissati, pelo Senador Jarbas Vasconcelos, pelo Senador Pedro Simon e também pelo Senador Gerson Camata. Todos temos apelado pela libertação da Senadora Ingrid Betancourt.

Para dar maior substância ao tema, eu gostaria, hoje, de trazer aqui ao conhecimento de todos alguma coisa do pensamento de Ingrid Betancourt, uma vez que o sociólogo e jornalista Guillermo Solarte Lindo publicou, recentemente, um livro e um artigo.

Numa entrevista publicada pela Terra Magazine estão as próprias palavras de Ingrid Betancourt. E eu gostaria, Senador Mão Santa, para que nós todos pudéssemos conhecê-la melhor, de transmitir ao Senado brasileiro o pensamento da Senadora Ingrid Betancourt.

Quero ressaltar que ainda há pouco conversei com o pessoal do gabinete da Senadora Piedad Córdoba, que voltou da Espanha hoje, nesta madrugada, e me informaram os seus auxiliares que, infelizmente, desde a morte do Sr. Raúl Reyes, ali naquele episódio em que as Forças Armadas da Colômbia adentraram o território do Equador, não tem havido mais diálogo com as FARC. Assim, estão suspensas, congeladas as negociações, seja com o governo francês, seja com o Presidente Hugo Chávez, seja com o Governo Álvaro Uribe. E é importante que sejam retomadas essas negociações.

O Senador Mão Santa há pouco me disse que gostaria até que fôssemos lá, que eu próprio fosse... Então, quero aqui dizer, Senador Mão Santa - e até já o transmiti à Senadora Piedad Córdoba -, que, se avaliarem que eu possa ser útil, disponho-me, sim, a ir à Colômbia ou aonde puder, para auxiliar mais nessa causa, seja em Bogotá, seja na Floresta Amazônica, seja entrando pela fronteira do Brasil-Colômbia ou aonde for. Mas não adiantará ir para lá sem saber onde ou com quem conversar, porque, senão, me perderei na selva, sem utilidade. E o trabalho aqui precisa continuar. Então, se houver alguma indicação precisa de aonde ir ou como colaborar, disponho-me a seguir a sua sugestão.

Mas eis as palavras de Ingrid Betancourt, Senador Gerson Camata:

A política é o exercício que todo ser humano faz quando trata de sonhar um entorno ideal, portanto é um exercício coletivo, histórico, de melhoramento das condições. Creio que os sonhos são o que finalmente moldaram a história do mundo, penso que o mundo chegou onde está precisamente porque existiram homens que o sonharam tal como o conhecemos hoje, não somente no âmbito tecnológico, médico ou de comunicações; mas também no político. Considero que a política é o instrumento para fazer com que esses sonhos históricos se tornem realidade. Meu sonho é a possibilidade de viver em uma Colômbia que está latente, que sinto que vive, mas que se encontra completamente asfixiada e seqüestrada por uma gerência obsoleta, anacrônica, com todas as características dos Séculos XVIII e XIX, apesar de já estarmos no Século XXI. O salto para a reestruturação de nossa sociedade deve ser dado, ou seja, devemos redistribuir o poder em particular.

Sobre Ecologia e humanismo, diz Ingrid Betancourt:

A destruição do planeta implica a destruição do ser humano, ou seja, para salvar o ser humano e para salvar a história da humanidade, a condição primordial é salvar o planeta. A Colômbia tem uma responsabilidade imensa nessa matéria, porque a primeira potência ecológica neste assunto é a América Latina e, dentro desse bloco ecológico, a Colômbia tem uma missão particular, obviamente pela riqueza que temos no âmbito da biodiversidade: águas, terras, bosques, picos nevados e tudo o que significa a riqueza colombiana. Dentro dessa riqueza também temos uma imensa culpa. Quando falamos de ecologia, estamos falando da ecologia imersa em um sistema que contempla a liberdade de empresa, a liberdade de mercados, ou seja, uma ecologia dentro de um sistema capitalista, mas obviamente uma ecologia que é humanizante e que, de fato, se aproxima mais do reflexo de um novo socialismo, um socialismo capitalista. Portanto, para mim, a ecologia é a bandeira humanista do princípio do milênio.

Manifestando-se “contra o capitalismo ascendente”, diz ela:

Uma coisa é o capitalismo e outra coisa é o neoliberalismo. Esta é uma reflexão que deve ser feita, porque o que está legitimando o neoliberalismo é um capitalismo ascendente que sustenta o consumismo, e o consumismo é a produção do desperdício. O neoliberalismo planetário, ou melhor, as características de uma globalização neoliberal não são democráticas, justamente por levarem implícitas a imposição do mais forte, não existindo para muitos a possibilidade de atuar. A Colômbia tem que buscar, dentro dessa globalização, poder atuar, mas com regras nas quais o sentir democrático se faça valer. A maioria dos povos do mundo, incluindo a Colômbia, está jogando com regras desequilibradas a favor dos países do norte; essas regras devem ser equilibradas. O consenso internacional aponta as estruturas onde se tomam as decisões da globalização, estruturas que devemos começar a reformar. Um planeta onde a metade da população vive com menos de mil dólares por ano e outros, com 14 mil dólares por ano de renda per capita - isso nos está dizendo que aqui há algo que temos de organizar, e acredito que isso deve ser realizado por meio de um processo de democratização das estruturas da sociedade internacional.

Sobre a corrupção na Colômbia, diz Ingrid Betancourt:

Nada do que propusemos tem a possibilidade de ser aplicado dentro de um Estado corrupto. Mas o que é o Estado? O Estado não é nada diferente dos indivíduos que trabalham para ele. O Estado é uma enteléquia, salvo no caso em que se personaliza através de quem o representa: os funcionários, os servidores públicos. Na Colômbia persiste um clientelismo que matou o país, porque nenhuma das decisões foi tomada com o rigor que pode se pressupor de um Estado que funcione em termos de honestidade. Então, qual é a nossa reflexão? Que não vale a pena defender nenhuma tese econômica no país.

Sobre “mudar as estruturas”, diz Ingrid Betancourt que:

Na Colômbia pegamos no pé da história durante cem anos, quero dizer, nos vestimos de uma roupagem retórica, vendemos tudo de bom e de mau, fazendo com que os colombianos acreditassem que estávamos fazendo reformas de estrutura. Nunca fizemos reforma de estrutura, já que temos a mesma estrutura de poder que na colônia, com uma oligarquia fechada na tomada de decisões, uma exclusão sistemática, uma exploração do humilde e relações de poder excessivamente arbitrárias. A Colômbia é um país onde não conseguimos desatar a energia das pessoas para que elas produzam. É um país que não se liberou das correntes de um sistema econômico completamente arcaico. A Colômbia é um país de rendas, não é um país produtivo. É especuladora, é um país onde as coisas se fazem através do tráfego de influência, e não através da competitividade, ou seja, na Colômbia temos que desmascarar as decisões que foram tomadas para poder encará-las e denunciá-las. Por que insistimos tanto no tema da corrupção como prioridade? Porque finalmente nos damos conta de que, há mais de 100 anos, aqueles que vêm gerindo o país puderam esconder todas as suas artimanhas para manter seus privilégios e afogar e asfixiar a Colômbia com discursos progressivos em nível social, quase revolucionários, sem ter tocado as estruturas.

            Quanto à visão de Ingrid Betancourt sobre a guerra na Colômbia:

Na Colômbia, com nossa estrutura ainda colonial, o poder político divide os demais poderes. Creio que existe um fator importante, o de fazer uma identificação das estratégias daqueles que não desejam que as coisas mudem. Explico: seria possível dizer que na Colômbia existe uma guerra civil, mas não creio que seja contra os bandos a que estamos acostumados. A guerra se trava entre aqueles que têm o poder do dinheiro, da política, das armas, e os demais cidadãos que são vítimas dos abusos de poder que esses homens cometem. Por que considero que seja preciso desmascarar essas estratégias? Porque, de alguma maneira, na Colômbia, sempre que procuramos realizar uma reforma estrutural que toque o poder, seja político, econômico ou social, imediatamente os meios de comunicação apresentam uma visão de casos, como se estivessem interessados na defesa de uma suposta ordem. E a cada vez que tentamos tocar esse espaço, a cada vez que tentamos resolver esse problema, que é aquilo que está gerando o caos, a violência, o empobrecimento, a falta de oportunidades na Colômbia, nos dizem que vamos causar uma crise econômica, que vamos incentivar e fortalecer a guerrilha.

Sr. Presidente, eu teria aqui mais duas páginas para ler do pensamento de Ingrid Betancourt, mas sei que V. Exª, exigente que foi com o Senador Demóstenes Torres, comigo o será também.

Mas quero, então, reiterar o apelo, que é de todos nós, Senadores, para que as FARC e também o Governo Álvaro Uribe, que inclusive está sendo objeto de investigação, segundo ele próprio reconheceu, a respeito de pessoas muito próximas a ele - até a Presidente do Senado Federal da Colômbia está sendo objeto agora de investigação muito séria de ligações com os grupos paramilitares, ligações as mais diversas... E é importante que, neste momento, essa palavra de Ingrid Betancourt possa ser colocada para toda a América Latina ouvir, que inclusive cheguem a nossa palavra e o nosso apelo ao meio da Floresta Amazônica; que possam os membros das FARC, assim como os membros do Governo do Presidente Álvaro Uribe, chegar ao entendimento, porque isso interessa à humanidade, interessa a todos nós da América Latina, a todos nós que amamos a democracia e a liberdade.

            Sr. Presidente, eu gostaria então, já que seria difícil colocar aqui tudo o que a Ingrid Betancourt disse, de requerer que seja transcrita toda sua palavra aqui resumida. Somente, então, o último parágrafo, se me permite V. Exª:

Ingrid e o sacrifício

Sou uma dama de ferro em meu trabalho, mas na verdade sou fruto de minha vida familiar, ou seja, não poderia conduzir minha luta nem exibir meu radicalismo, nem atuar como atuo se não tivesse o respaldo absoluto não só daqueles com quem divido minha vida, como também o de meus filhos, que são vítimas desse processo. A equação é simples: considero-me uma pessoa muito dura, muito firme, muito batalhadora e esforçada, no âmbito de minha profissão e no âmbito social, mas sou completamente mulher no âmbito familiar, e, portanto, em minha casa os papéis são bastante convencionais. A relação com meus filhos é muito intensa, porque evidentemente nem eu, nem eles poderíamos viver as separações e riscos sem que houvesse uma comunicação mais forte que o normal; existe uma necessidade de comunicação exacerbada, já que são crianças que sofreram e continuam sofrendo muito. A vantagem é que as tomam como sacrifício construtivo.

E aqui pergunta então o sociólogo Antonio Morales Riveira: “Onde está a distância entre as posições políticas de Ingrid e as dos homens que a seqüestraram? Na verdade, elas parecem bem próximas. E, no entanto, ela continua prisioneira”.

Sr. Presidente, quero dizer, com muita franqueza e sinceridade, aos membros das FARC que seqüestraram, que torturaram pessoas, que cometeram atividades com as quais de maneira alguma posso concordar, mas eles são seres humanos e precisam verificar que libertar a Senadora Ingrid Betancourt constitui hoje uma necessidade inelutável. É algo que toda a humanidade espera que aconteça e que ainda ela esteja com vida para que possa logo retornar ao carinho de seus filhos, de seu marido e do povo da Colômbia.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

- “Ingrid Betancourt mantém a palavra” (Antonio Morales Riveira. De Bogotá, Colômbia).


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/04/2008 - Página 10767