Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a veiculação, pela imprensa internacional, da alta do preço dos alimentos. Repúdio à atitude do coordenador do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Antônio Dantas. (como Líder)

Autor
José Maranhão (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: José Targino Maranhão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. DISCRIMINAÇÃO RACIAL. ENSINO SUPERIOR.:
  • Considerações sobre a veiculação, pela imprensa internacional, da alta do preço dos alimentos. Repúdio à atitude do coordenador do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Antônio Dantas. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/2008 - Página 11186
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. DISCRIMINAÇÃO RACIAL. ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • CRITICA, IMPRENSA, AMBITO INTERNACIONAL, TENTATIVA, PREJUIZO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, ESPECIFICAÇÃO, BRASIL, PRODUÇÃO, COMBUSTIVEL ALTERNATIVO, ALEGAÇÕES, RESPONSABILIDADE, SUPERIORIDADE, PREÇO, ALIMENTOS.
  • DEFESA, RESPONSABILIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, PRODUTOR, PETROLEO, AUMENTO, PREÇO, ALIMENTOS, SUPERIORIDADE, UTILIZAÇÃO, MATERIA-PRIMA, PROCESSO, PRODUÇÃO.
  • REPUDIO, DECLARAÇÃO, COORDENADOR, CURSO SUPERIOR, MEDICINA, UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA (UFBA), ALEGAÇÕES, INFERIORIDADE, CAPACIDADE, APRENDIZAGEM, POPULAÇÃO, ESTADO DA BAHIA (BA), MOTIVO, INSUFICIENCIA, RENDIMENTO, ALUNO, EXAME ESCOLAR, AMBITO NACIONAL.

            O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB. Pela Liderança do PMDB. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. Senadoras e Srs. Senadores, eu trago um discurso escrito, mas, evidentemente, pelo tempo de cinco minutos, vejo a impossibilidade material de lê-lo, de forma que farei alguns comentários na linha do discurso, pedindo a V. Exª que o inclua nos Anais da Casa, dando como lido este pronunciamento.

            Nós estamos querendo analisar esta balela que vem sendo produzida especialmente pela imprensa internacional, mas com ecos na imprensa nacional, sobre o preço dos alimentos.

            Essas versões tendenciosas procuram apresentar os países emergentes, produtores de alimentos e de matérias-primas, sobretudo aqueles como o Brasil, que tem um valiosíssimo plano de produção de biocombustível, como responsáveis pela alta do preço dos alimentos no mundo.

            Por coincidência, os países que promovem, que são as matrizes dessa boataria bem orquestrada na imprensa internacional e com repercussão na imprensa nacional são exatamente grandes produtores de petróleo e países que concedem pesados subsídios - pesados para os outros países - à sua agricultura. Estão à frente deles os integrantes da Europa Ocidental e os Estados Unidos.

            O curioso nisso tudo - aliás, eu não estou inovando ao fazer esta afirmação, pois ela já foi feita por muitas pessoas, por autoridades brasileiras e, inclusive, pelo próprio Presidente da República - é que esses países nunca saíram a público apresentando as verdadeiras causas da elevação dos preços dos alimentos.

            Nunca disseram, por exemplo, que o preço do petróleo saltou de US$30 para cerca de US$120 o barril e que o petróleo influi em todos os custos, porque, inclusive, na agricultura ele é a fonte produtora de muitos insumos que são fundamentais, como os adubos, o combustível gasto na mecanização e os defensivos agrícolas. Enfim, toda uma cadeia produtiva é altamente alterada pelo preço do petróleo. Nunca saíram a público para reclamar contra a alta do preço do petróleo, a não ser naquela invasão injusta do Iraque, que todo mundo, hoje, sabe que não tinha nada a ver com armas de destruição em massa, senão com a ambição dos Estados Unidos de se apropriar de uma fatia maior da produção de petróleo daquele país.

            Então, Sr. Presidente, é este o meu pronunciamento.

            Mais uma vez, as potências desenvolvidas do mundo se articulam contra os países emergentes, contra os países que têm, na sua conta de exportações, os produtos primários. Mas que isso sirva, também, de exemplo aos brasileiros, especialmente àqueles que têm responsabilidade na condução dos negócios públicos, para darem o devido encaminhamento a sua produção.

            Quando eu vejo o Brasil entusiasmado com a grande vitória das safras extraordinárias que nós temos tido, sobretudo estimulado pelos altos preços que a conjuntura internacional tem permitido, fico preocupado, porque sabemos, perfeitamente, que há países que produzem matérias-primas mas que não procuram agregar valores a elas, industrializando-as e permitindo que os produtos que são perecíveis ou que têm um mercado internacional instável sejam mais duráveis e tenham uma melhor remuneração nos mercados internacionais.

            O Brasil precisa cuidar fortemente da industrialização de seus produtos primários, porque a exportação de matérias-primas foi sempre um negócio instável, precário, até, nos mercados internacionais.

            Eram esses os comentários que eu queria fazer, Sr. Presidente. Eu trouxe um discurso escrito, com uma análise mais profunda, mas, infelizmente, cinco minutos são um tempo muito curto e V. Exª já vai sendo tolerante, pois me permitiu que ultrapassasse um pouco o tempo.

            Vou entregar o discurso à Mesa e peço a V. Exª que o faça constar dos Anais da Casa.

            Obrigado.

            O SR. PRESIDENTE (Flexa Ribeiro. PSDB - PA) - A Mesa aguarda o encaminhamento e fará o registro nos Anais. V. Exª teria o tempo necessário para concluir o seu pronunciamento. O tempo regimental de cinco minutos foi-lhe concedido porque V. Exª estava inscrito como Líder do PMDB.

            O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Eu agradeço a generosidade de V. Exª e, aproveitando essa minha presença rápida na tribuna, quero-me associar à ilustre Bancada da Bahia, ao Senador Paim, ao Senador Mesquita e aos demais Senadores que se manifestaram sobre esse desastrado pronunciamento do coordenador do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia.

            É desastrado, é injusto, parece mais uma tentativa, como disse o Senador Antonio Carlos Magalhães Júnior, de fuga da responsabilidade que ele, como coordenador do curso de Medicina, tem sobre os resultados, que não estão em análise aqui. Qualquer crítica poderia ser feita, mas respeitando a dignidade do povo baiano e desprovida de qualquer caráter preconceituoso, especialmente no que diz respeito à questão racial. Isso foge do trivial e vai a uma matéria de Direito Penal. É uma responsabilidade criminal. Certamente, o povo baiano, na sua altivez, na sua coragem e, sobretudo, na sua tradição cultural e de inteligência, vai saber reagir e responsabilizar esse...

(Interrupção do som.)

            O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - ... homem que não dignifica a categoria de professor universitário. Essa é a solidariedade que quero levar aos oradores que se pronunciaram sobre essa questão.

            É lamentável que isso tenha acontecido exatamente no ambiente acadêmico, no ambiente universitário, e que tenha partido de um professor que, inclusive, tem responsabilidades profundas não somente quanto ao respeito racial e ao respeito à inteligência do povo baiano. Sobretudo, ele tem responsabilidades pessoais como dirigente e coordenador de um curso médico.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR JOSÉ MARANHÃO.

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            O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a economia global vive, neste momento, uma conjuntura de aumento acelerado dos preços dos alimentos. O resultado já é percebido, nos países mais ricos e de população bem nutrida, no crescimento dos índices inflacionários, o que tem gerado uma inquietação popular como há muito não se via. Semana passada, os servidores públicos do Reino Unido - um dos países onde o sindicalismo é menos ativo - entraram em greve por reposição salarial, seguindo o movimento de seus congêneres franceses de quinze dias atrás. Na Alemanha, os protestos se repetem. No Haiti e em Burkina Faso, revoltas populares eclodiram.

            As causas desse aumento de preços são diversas. Entre outras circunstâncias, houve quebra da última safra de grãos de grandes produtores, como Austrália e Canadá, e, a partir da escassez relativa, vem operando a lei da oferta e da procura. Por outro lado, o preço do barril de petróleo nos mercados internacionais parece não ter mais teto: anunciou-se, dia desses, a ultrapassagem da barreira dos 110 dólares por barril. Já ameaça chegar a US$ 120. E com o petróleo, lá sobem também os preços de fertilizantes e defensivos agrícolas, para não falar dos custos de transporte - tudo que se reflete no preço dos alimentos.

            Apesar desses fatos óbvios e mais que conhecidos, certas autoridades econômicas internacionais aparecem nos meios de comunicação para anunciar que a alta dos alimentos se deve à utilização, por parte de países como o Brasil, de suas terras agrícolas para a produção de biocombustíveis! Quer dizer: para essa gente, o Brasil é o grande culpado pelo aumento global dos preços dos alimentos. E por conseqüência, culpado do agravamento da fome dos pobres de todo o mundo, sobretudo nas nações mais miseráveis.

            Ora, é de se perguntar, Senhor Presidente, se tal conversa faz algum sentido. Há quantas décadas os países ricos, sob o argumento de garantir sua segurança alimentar, vêm subsidiando suas agriculturas caras e ineficientes, impedindo o crescimento da produção dos países emergentes e pobres, sabotando seu desenvolvimento econômico e bloqueando a redistribuição mundial da riqueza? O subsídio mensal concedido pelo governo da Suíça a uma vaca leiteira, por exemplo, equivale, segundo um documentário do canal Discovery apresentado recentemente, a umas três bolsas-família do Brasil. Uma única vaca vale três famílias! Subsidiam suas vaquinhas sagradas e depois reclamam dos preços dos alimentos…

            Mas esses são e sempre foram os termos do comércio mundial: a lei do mais forte. A produção dos países ricos, seja a de tecnologia de ponta, seja a agroindústria, pode ter seus termos de troca valorizados; a dos países pobres ou emergentes, essa tem de ter preços aviltados, com termos de troca injustos impostos pelos donos da riqueza.

            Naquelas circunstâncias, não tinha choro: era pagar o que eles queriam. Agora, quando acontece de estarem eles com a faca no peito e os tais termos de troca nos favorecem, nós somos os vilões do mercado. Seria engraçado se não fosse vergonhoso.

            Não podemos cair nesse jogo. Não podemos nos deixar enganar pelo discurso demagógico que manipula o argumento da fome como se não tivessem os países ricos responsabilidades pela exploração colonial do Terceiro Mundo e pela imposição de relações desiguais de comércio década após década. E não podemos cair tampouco no jogo dos demagogos de vizinhos nossos, como o coronel Hugo Chávez, que ataca os biocombustíveis não porque causem fome, como tenta fazer crer, mas porque concorre com sua galinha dos ovos de ouro, o petróleo. Evo Morales é outro que, dependente da venda de gás natural, faz eco contra o etanol e o biodiesel.

            Felizmente, nossos governantes não se deixam ludibriar, nem por autoridades internacionais, nem por dirigentes de países desenvolvidos, nem por esse vizinhos pobres, mas amigos da onça. Na XXX Conferência Regional da América Latina e Caribe da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), realizada aqui em Brasília neste mês de abril, o Presidente Lula da Silva, interrogado sobre a relação entre os biocombustíveis e a carestia dos alimentos, declarou: “É sempre mais fácil escolher respostas simplistas por trás de supostas preocupações sociais. O biodiesel não é o vilão na questão do aumento dos preços dos alimentos”.

            O Brasil é, com efeito, o exemplo de país cuja agricultura tem conseguido realizações extraordinárias na produção e alimentos e de biocombustíveis. Ao mesmo tempo, sem que uma exclua a outra. E também sem ser necessário causar nova devastação florestal, ao contrário do que afirmam certas ONGs ambientalistas, que, paradoxalmente, conseguem se mostrar inimigas dos biocombustíveis.

            Trata-se de um paradoxo porque é evidente que os biocombustíveis representam solução para o problema do equilíbrio dos gases reputados causadores do efeito estufa na atmosfera, ao substituir os combustíveis de origem fóssil.

            Os Ministros Celso Amorim e Guido Mantega também deram declarações corretas no sentido de identificar os subsídios agrícolas e o protecionismo comercial dos países ricos como causas maiores da crise dos preços dos alimentos. E até o Presidente do Banco Mundial (Bird), Robert Zoellick, segundo matéria de Nalu Fernandes, do Estado de S. Paulo do dia 13 de abril, mesmo associando biocombustíveis e preços dos gêneros alimentícios, reconheceu que o álcool brasileiro, produzido a partir da cana-de-açúcar, tem menos impacto no mercado de alimentos que o álcool americano, produzido a partir do milho e muito menos eficiente em termos de rendimento energético.

            Disse Zoellick, ainda, que o Brasil é dos países que mais aumentou sua contribuição para o Programa Mundial de Alimentos da ONU.

            Ora, esse reconhecimento, partindo do Presidente do Bird, deveria servir para calar as vozes acusatórias dos que não desejam ver o Brasil aproveitando uma conjuntura internacional favorável a sua capacidade produtiva e a seu perfil de exportações.

            Senhoras Senadoras e Senhores Senadores: a decisão de produzir em escala industrial o álcool combustível, que já data de três décadas, colocou o Brasil em uma posição invejável em termos de segurança energética e de tecnologia alternativa para o petróleo. A tecnologia do agronegócio tornou possível aumentar a produção de alimentos e de biocombustíveis concomitantemente. Não permitamos que toda essa realização de nossa gente se perca por darmos ouvidos à cantilena desses arautos do desastre, que escondem suas verdadeiras intenções imperialistas sob o discurso tão simpático do combate à fome.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/2008 - Página 11186