Discurso durante a 70ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários à proposta feita pelo Governo pelo qual renuncia ao represamento dos recursos da educação pela aplicação da Desvinculação das Receitas da União - DRU.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Comentários à proposta feita pelo Governo pelo qual renuncia ao represamento dos recursos da educação pela aplicação da Desvinculação das Receitas da União - DRU.
Publicação
Publicação no DSF de 08/05/2008 - Página 12368
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, AGILIZAÇÃO, PROPOSTA, AUTORIA, IDELI SALVATTI, SENADOR, APOIO, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), PROIBIÇÃO, GOVERNO, RETIRADA, RECURSOS, EDUCAÇÃO, INAPLICAÇÃO, DESVINCULAÇÃO, RECEITA, UNIÃO FEDERAL, EFEITO, BENEFICIO, SETOR.
  • ANALISE, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, EDUCAÇÃO BASICA, BRASIL, QUESTIONAMENTO, INFERIORIDADE, GASTOS PUBLICOS, ALUNO, ESCOLA PUBLICA, COMPARAÇÃO, PRESO, EFEITO, AGRAVAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, DIFICULDADE, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.
  • COMENTARIO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE, CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INFERIORIDADE, QUALIDADE, ALFABETIZAÇÃO, EDUCAÇÃO BASICA, REGISTRO, RELATORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), REDUÇÃO, COLOCAÇÃO, BRASIL, RELAÇÃO, SITUAÇÃO, EDUCAÇÃO.
  • DEFESA, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, MODERNIZAÇÃO, METODO, ENSINO, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), APOIO, APROVAÇÃO, PROPOSTA, INAPLICAÇÃO, DESVINCULAÇÃO, RECEITA, UNIÃO FEDERAL, EDUCAÇÃO, APRESENTAÇÃO, NUMERO, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, SETOR.

            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há em tramitação nesta Casa uma proposta da Senadora Ideli Salvatti que foi elaborada, em face de um acordo, por ocasião da votação da proposta da CPMF, acordo esse feito com o PDT dos Senadores Jefferson Péres, Osmar Dias e Cristovam Buarque, pelo qual o Governo se obrigaria a renunciar ao represamento dos recursos da educação pela aplicação da DRU (Desvinculação das Receitas da União).

            Essa proposta proporcionará, sem dúvida alguma, um acréscimo substancial nas receitas em favor da educação. Mas, enquanto isso não acontece, isto é, a aprovação dessa matéria, trago, na tarde de hoje, um discurso com informações importantes sobre o estado da educação brasileira.

            Em que pesem os esforços do jovem Ministro da Educação e do Presidente Lula em estabelecer regras de universalização da educação brasileira, principalmente do ensino básico, ainda há muita coisa a se fazer. E um dos mais graves problemas do nosso País, sem dúvida alguma, volto a dizer, que pressupõe desigualdade social, é o da educação. E se pensarmos no problema da educação em termos de ensino fundamental e médio, que, na verdade, constituem as bases de todo ensino, estamos diante de uma situação que oscila entre o grave e o gravíssimo.

            Existe um provérbio popular que diz que abrir uma escola é fechar um presídio. Pois bem, chegamos, hoje em dia, a uma situação tão grave que vou citar uma estatística sobre escolas e presídios, em que os próprios números falam por si.

            Há poucos meses foi divulgado o seguinte dado: o governo de Minas Gerais gasta, em média, R$1.700,00 por mês, por presidiário, ao mesmo tempo em que gasta pouco mais de R$149,00 com cada aluno da rede básica de ensino. Os números são mais do que eloqüentes: R$1.700,00 com um e R$149,00 com outro. É só fazer as contas: um presidiário custa ao Governo de Minas Gerais onze vezes mais do que um aluno da rede estadual de ensino.

            Se quisermos ir mais longe, o custo mensal pago pelo contribuinte para a manutenção de um preso nas penitenciárias brasileiras é equivalente ao preço do aluguel de um flat de luxo aqui em Brasília ou mesmo em uma avenida central de São Paulo. E não se trata de Minas Gerais apenas. Em termos de Brasil, segundo o diretor do Departamento Penitenciário Nacional, a média é de R$1.500,00 mensais. Em resumo, estamos investindo mais em presídios do que em escola pública.

            Ora, para mim está mais do que claro que não construiremos um futuro socialmente justo por este caminho.

            Certamente existem problemas de gestão, problemas de planejamento - tanto na educação quanto na saúde - mas está claro, pelos números acima, que temos, de saída, um grave problema de financiamento. Nosso orçamento aplicado na educação é baixo. E não pode continuar assim, sob pena de fabricarmos uma geração de analfabetos funcionais. E sob pena de não fazermos acompanhar o progresso econômico do avanço no ensino. Progresso econômico só pode encaminhar com os pés da boa educação, da boa escola. Uma coisa não se mantém de pé sem a outra.

            É certo que todos nós temos de reconhecer que, no Brasil, há mais vagas que antes, mais escolas que antes, as estatísticas de inclusão escolar são melhores, mas as escolas - e aqui vou referir-me às escolas públicas do primeiro e segundo grau - ensinam menos, ensinam quase nada. Pelo menos esta é a opinião do presidente do Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro que, depois de constatar que temos quase um milhão de jovens analfabetos, acrescenta o seguinte:

            “Se escola pública ensinasse a ler, escrever e contar nas quatro primeiras séries do primário, os analfabetos não seriam tantos. E atualmente (...) se diz que noventa e tantos por cento dos jovens em idade escolar estão nas escolas, mas, na realidade, a maioria dos concluintes do ensino fundamental aprendeu muito pouco ou quase nada; e uma parcela ponderável dos concluintes do ensino médio também”.

            Em resumo, Sr. Presidente, nós estamos diante de uma situação onde melhoramos muito na quantidade - temos mais alunos dentro da escola - mas pioramos muito na qualidade. A escola está pior, ensina menos. Já li depoimentos insuspeitos, (como os de O Globo no dia 23 de fevereiro) que informavam que há alunos da 8ª série que não sabem localizar no mapa a França ou o Japão; lêem um conto de Machado de Assis sem entender, escrevem um simples bilhete marcado por graves erros de sintaxe e de concordância.

            Portanto, pode-se até comemorar o fato de que 97,4% das crianças entre 7 e 14 anos estão sendo atendidas pelo sistema público de ensino. Isso é uma verdade, assim como também é correto reconhecer que o fato de se ter mais alunos escolarizando-se é uma conquista. Só que se trata de uma conquista que exige de nós um segundo desafio, que é o da qualidade. Lado a lado com mais escolaridade, temos de ter melhores escolas, mais qualidade de conteúdo escolar e muito maior assimilação pelo aluno. E valorização do professor, a começar do seu salário.

            Recente relatório da Unesco - dentre tantos outros relatórios que costumam sair na grande imprensa - nos revela que o Brasil perdeu quatro pontos no ranking da educação, passando do 72º para o 76º lugar. Ficou atrás da Bolívia, do Paraguai e do Equador. Não é novidade, já que esse problema, entre nós, já vem de longa data.

            Já em 2005, ficou demonstrado em pesquisa que, das crianças que chegaram ao final da 4ª série do ensino fundamental, apenas 29,1% tinham aprendido, em termos de língua portuguesa, o que era esperado para esse estágio escolar. Ou seja, a maioria esmagadora dos alunos da 4ª série não compreendia o conteúdo da 4ª série. Na 8ª série do ensino fundamental a situação era ainda pior: esse percentual caía para 19,4%; e, no terceiro ano do ensino médio, caía para 22,2%.

            Portanto, o problema de conteúdo é, como eu já disse, grave.

            Sr. Presidente, por outro lado, as soluções são claras, embora sejam difíceis de ser implementadas dentro dos limites de uma sociedade na qual a educação vem crescentemente se tornando uma mercadoria e não vem recebendo as verbas públicas necessárias. Novamente, nas palavras do presidente do Conselho Estadual de Educação, que já citei antes, o que nós precisamos é:

            “Rever as metodologias e os aparatos didáticos envelhecidos pelo tempo e ultrapassados pela velocidade do progresso tecnológico. A sala de aula deve estar aparelhada para se tornar tão atraente quanto um cybercafé ou um salão de jogos eletrônicos. E uma escola pública não pode funcionar por apenas três horas diárias. Não se pode ter um processo educativo fast food.”

            E aqui voltamos ao ponto de partida deste pronunciamento.

            Já estou terminando, Sr. Presidente. Peço apenas para me conceder mais dois minutos antes do término.

            Alguma coisa está errada com a educação de um país que gasta onze vezes mais com um presidiário do que com um aluno da rede estadual de ensino.

            Para concluir, faço minhas as palavras do atual Ministro da Educação, Fernando Haddad, que, em entrevista, semanas atrás, para a Folha de S.Paulo, disse que é preciso acabar com a DRU (Desvinculação de Receitas da União), esse mecanismo que permite que parte da receita vinculada à educação vá para outras áreas. O próprio Ministro, na mesma entrevista, oferece-nos o dado inquietante: em 14 anos, a educação perdeu quase R$100 bilhões por conta daquele dispositivo da DRU. Ou seja, a Educação vem perdendo uma média de R$7 bilhões por ano, Sr. Presidente.

            Se continuarmos assim, vamos começar a andar para trás na Educação, vamos começar a fazer mais presídios, infelizmente, e menos escolas. Tudo ao contrário do que a sociedade, sobretudo suas camadas mais empobrecidas, exige.

            Por isso, Sr. Presidente, é necessária e inadiável a aprovação, o mais breve possível, dessa proposta de iniciativa da Senadora Ideli Salvatti, mas que teve respaldo no PDT, do Senador Cristovam Buarque, do Senador Jefferson Péres e do Senador Osmar Dias. Em acordo com o Governo, esses Senadores disseram “vamos votar na CPMF”, que terminou sendo derrubada, mas a condição sine qua non é que haja uma proposta que interesse ao Governo no sentido de, definitivamente, acabar com a DRU, que vem praticamente, não digo acabando, mas prejudicando não somente a melhoria do sistema educacional brasileiro, sobretudo as crianças que têm de estar preparadas para o dia de amanhã, para o enfrentamento de um futuro, onde os melhores que concorrem no mercado de trabalho é que chegarão ao topo da sua ascendência profissional.

            Por essa razão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a dizer que é grande o esforço que vem sendo realizado pelo Governo em termos quantitativos, mas, em termos de qualidade, conforme demonstrei com dados irrefutáveis, o esforço despendido não vem alcançando os seus mais elevados objetivos. Temos, então, de dar mais recursos à Educação, porque o trabalho feito de forma edificante no passado pelo Senador do Espírito Santo João Calmon, aquele trabalho de disponibilizar na nossa Constituição recursos certos e determinados para o financiamento público da Educação, aquele esforço que ele fez, infelizmente, não vai alcançar o ideário pelo qual ele tanto se bateu na sua vida política e profissional e que nós endossamos aqui no Senado - a Constituição de 1988, a última Constituição, a chamada Constituição Cidadã, estabeleceu percentuais fixos para a União, para os Estados e para os Municípios em favor da Educação, fixando uma pena política para o administrador que não obedecer esses percentuais constitucionais, ou seja, a pena da intervenção no Estado ou no Município que descumprir os ditames constitucionais.

            Eram essas as minhas palavras, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/05/2008 - Página 12368