Discurso durante a 73ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem à memória do ex-Senador Artur da Távola, falecido no último dia 9 de maio. Leitura de publicação de autoria do jornalista Luiz Paulo Horta, do O Globo, a respeito do papel do ex-Senador Artur da Távola na difusão da chamada música erudita. Necessidade de rever a questão das medidas provisórias, inclusive abolindo-as do texto constitucional.

Autor
Marco Maciel (DEM - Democratas/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. MEDIDA PROVISORIA (MPV).:
  • Homenagem à memória do ex-Senador Artur da Távola, falecido no último dia 9 de maio. Leitura de publicação de autoria do jornalista Luiz Paulo Horta, do O Globo, a respeito do papel do ex-Senador Artur da Távola na difusão da chamada música erudita. Necessidade de rever a questão das medidas provisórias, inclusive abolindo-as do texto constitucional.
Publicação
Publicação no DSF de 13/05/2008 - Página 13685
Assunto
Outros > HOMENAGEM. MEDIDA PROVISORIA (MPV).
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ARTUR DA TAVOLA, EX SENADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MANIFESTAÇÃO, PESAMES, FAMILIA.
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), HOMENAGEM, ARTUR DA TAVOLA, EX SENADOR, RELEVANCIA, ATUAÇÃO, DIFUSÃO, MUSICA ERUDITA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, REVISÃO, VIABILIDADE, RETIRADA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), TEXTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, INDEPENDENCIA, PODERES CONSTITUCIONAIS, AUSENCIA, LIMITAÇÃO, COMPETENCIA, CONGRESSO NACIONAL, ELABORAÇÃO, ALTERAÇÃO, REVOGAÇÃO, LEIS, IMPEDIMENTO, PARALISAÇÃO, ANDAMENTO, ATIVIDADE, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • CRITICA, EXCESSO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), AUSENCIA, ATENDIMENTO, REQUISITOS, URGENCIA, RELEVANCIA, SOBRESTAMENTO, TRAMITAÇÃO, VETO (VET), PARALISAÇÃO, PAUTA, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, EXPECTATIVA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, ACOLHIMENTO, POSSIBILIDADE.

            O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, venho à tribuna nesta tarde para dois registros.

            O primeiro, Presidente Senador Papaléo Paes, diz respeito ao falecimento do ex-Deputado e ex-Senador Paulo Alberto Monteiro de Barros, Artur da Távola, pseudônimo que ele usava não somente no exercício das suas atividades intelectuais e culturais, mas de igual forma na atividade política.

            Tive oportunidade de conviver durante longo período com Artur da Távola e aprendi, desde cedo, a admirá-lo. Ainda que estivéssemos, às vezes, em campos opostos, como, por exemplo, no plebiscito presidencialismo versus parlamentarismo - ele era parlamentarista e eu, presidencialista -, sempre nos entendíamos e apreciei-lhe a cultura, o talento, a inteligência.

            Quero ler um pequeno trecho de autoria do jornalista Luiz Paulo Horta, de O Globo, a respeito de Artur da Távola, sobretudo do papel que ele teve para uma maior difusão da chamada música erudita. Diz Luiz Paulo Horta:

“Um dos aspectos da atuação cultural de Paulo Alberto foi o seu amor pela música clássica.

Começou como um interesse profundo, transformou-se num hobby, mas, a partir de um determinado momento, ele pôs a serviço da música os seus dons notáveis de comunicador”.

            Prossigo lendo mais uma frase do artigo:

“Ele era didático sem vulgarizar, e trazia para o assunto uma soma de paixão e de conhecimento. Por causa dele, muita gente deve ter deixado de achar que a música clássica é uma coisa “erudita”, para eruditos”.

            Gostaria de apresentar meus sentimentos de pesar à viúva, D. Miriam, com quem Anna Maria e eu algumas vezes estivemos juntos em eventos sociais; também a toda sua família e às instituições que integrou, não somente o Senado Federal, a Câmara dos Deputados, mas uma série de outras culturais e cívicas do Estado de seu nascimento, o Rio de Janeiro.

            Lamentamos muito o seu falecimento.

            Há uma expressão latina que diz: Eheu! Fugaces labuntur anni. Ou seja: “Ai de nós, fugazes correm os anos”. O tempo corre muito rápido e, assim, foi rápida a passagem de Artur da Távola entre nós.

            O segundo registro, Sr. Presidente, diz respeito à momentosa questão das chamadas medidas provisórias.

            Conseguimos, semana passada, na quinta-feira, aprovar uma série de matérias, posto que a pauta do Senado não estava trancada pela existência de medidas provisórias. É importante dizer, Sr. Presidente, que, ao mesmo tempo em que a Câmara e o Senado conseguiram votar praticamente quase todas as medidas provisórias que estavam trancando a pauta, logo a seguir, o Presidente da República já havia baixado quatro outras, o que significa dizer que novamente a pauta do Senado está trancada e, ao mesmo tempo, muito em breve, igualmente vai acontecer na Câmara dos Deputados.

            O Senado tem oito medidas provisórias sobre as quais terá que se pronunciar e a Câmara, nove. É importante destacar que, dessas quatro medidas provisórias que baixou o Chefe do Poder Executivo, duas são de abertura de crédito extraordinário. Há uma grande polêmica sobre se o Chefe do Poder Executivo possui tais poderes. Tanto isso é verdade que tramita uma ADIN no Supremo Tribunal Federal; a decisão está prestes a ocorrer e tudo indica que o Supremo tende a não acolher o uso da medida provisória para abertura de crédito extraordinário.

            Muitas vezes, ademais o Presidente da República baixa medidas provisórias sem que estejam caracterizados os pressupostos de urgência e relevância.

            Qual é a conseqüência disso? É que tanto a Câmara quanto o Senado não conseguem votar projetos de iniciativa parlamentar, inclusive propostas de emendas constitucionais, e outras de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, dos tribunais superiores, impedindo assim que o Congresso possa ter sua agenda legislativa. O Congresso não possui mais a sua agenda legislativa. Estamos praticamente circunscritos a votar medidas provisórias.

            Outro fato que também impede a existência da nossa agenda é que, além das medidas provisórias, os vetos passaram também a ter a sua tramitação sobrestada, porque se adotou com relação aos vetos o mesmo procedimento que se adota com as medidas provisórias, ou seja, trancamento de pauta. Como os vetos são apreciados em sessão conjunta, isto é, do Congresso Nacional, Câmara e Senado reunidos, isso faz com que tenhamos mais de mil vetos pendentes de apreciação, muitos dos quais de Governos anteriores: 1994, 1995 etc.

            Isso tudo nos faz dizer que convém que reexaminemos a questão das medidas provisórias. Pode parecer algo radical o que vou afirmar, mas estou chegando à conclusão de que é a única saída. Devemos aprovar emenda expugindo do texto constitucional o instituto das medidas provisórias. Por quê?

            Por vários motivos. O Presidente já tem - e isso não somente na Constituição de 1988, mas também nas anteriores, já havia essa prerrogativa de o Poder Executivo de encaminhar matérias reputadas relevantes em regime de urgência constitucional, limitando a tramitação das matérias em 90 dias, ou seja, 45 dias em cada uma das duas Casas. É, aliás, o que preceitua o § 1º do artigo 64 da Constituição.

            Então, isso obviamente já dá ao Presidente poderes - quando isso lhe convier - para mandar projetos com a chamada urgência constitucional. 

            As medidas provisórias autorizam o Poder Executivo a praticamente legislar sobre todas as matérias. Tenho aqui uma tabela que demonstra que as medidas provisórias têm uma abrangência maior do que os decretos-leis durante a vigência do AI-5, do chamado período revolucionário, que no seu art. 55, dizia:

Art. 55 - O Presidente da República, em casos de urgência ou de interesse público relevante, e desde que não resulte em aumento de despesa, poderá expedir decretos com força de lei, sobre as seguintes matérias:

I - segurança nacional;

II - finanças públicas; e

III - criação de cargos públicos e fixação de vencimentos.

            Só esses três pontos. E mais:

§ 1º - Publicado o texto, que terá vigência imediata (assim como acontece com a medida provisória), o Congresso Nacional o aprovará ou rejeitará, dentro de sessenta dias, não podendo emenda; se nesse prazo não houver deliberação, o texto será tido como aprovado.

§ 2º - A rejeição do decreto-lei não implicará a nulidade dos atos praticados durante a sua vigência.

            Os decretos-leis tinham um universo, como se vê, muito reduzido de matérias que podiam ser objeto de natureza extraordinária. Já as medidas provisórias, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001, têm uma ampla abrangência. Isso significa dizer que o Congresso não tem mais a sua agenda.

            Sabemos - e isso não começou agora - que há muito tempo cabe ao Congresso o poder de elaborar leis. E também que a democracia reside praticamente na soberania popular. Os que aqui chegam são eleitos para que possam exercer o papel de parlamentar; deputados federais ou senadores da República, com a incumbência de promover a elaboração de leis, a sua alteração, a sua revogação - e não somente leis ordinárias e complementares, mas também emendas constitucionais. Essa atividade não está sendo exercitada, pela pletora de medidas provisórias que perturbam o andamento das atividades tanto da Câmara - insisto - quanto do Senado Federal.

            Verifica-se, sem muita dificuldade, que, além de a medida provisória ser um instrumento que limita muito o papel do Congresso Nacional, temos sido lenientes quando autorizamos que se legisle praticamente sobre todo e qualquer assunto. Algumas são de nenhuma relevância e sem nenhuma urgência. É bom lembrar, como disse há pouco, que a tarefa de elaborar leis é do Congresso Nacional, Poder exercido em nome do povo e que caracteriza haver no País uma verdadeira democracia, posto que representação popular é sinônimo de democracia.

             Isso não é algo que se opere apenas no Brasil. Sabemos que, já em 1215, na Inglaterra, no tempo do rei João Sem Terra, ficou estabelecido que não é possível legislar sem ser por meio dos representantes do povo. Inclusive, não se podia aumentar ou criar tributos sem o assentimento do parlamento. Cunhou-se naquela ocasião uma expressão que dizia: "Nenhuma taxação sem representação". No taxation without representation. Isso vem da Inglaterra desde o Séc. XIII. Está na essência da própria função legislativa.

            As medidas provisórias estão contribuindo igualmente para afetar a harmonia e a independência dos Poderes e geram um contencioso com o próprio Executivo. Desse contencioso, há um deslocamento que culmina com a propositura de Ação Direta de Inconstitucionalidade, o que em nada está concorrendo para o fortalecimento das instituições, para a governabilidade.

            Precisamos gerar nesta Casa uma consciência cívica sobre a importância da instituição e do seu papel como Poder Legislativo, ou seja, como Casa da representação. O Congresso Nacional não tem monopólio da iniciativa de elaborar as leis; em alguns casos, além do Poder Executivo, o Poder Judiciário possui também a prerrogativa de propor projetos de leis. 

            Sr. Presidente, se fizermos um levantamento, vamos verificar que há mais de 50 proposições na Ordem do Dia ainda sem apreciação há vários meses, por conta das medidas provisórias. A Ordem do Dia do Senado para a sessão de amanhã contém 81 itens pendentes de apreciação.

            Tempos atrás, fiz um levantamento, de julho até dezembro do ano passado, e verifiquei que, em muitos e muitos meses desse período, as sessões deliberativas não o foram, pela existência de medidas provisórias trancando pauta, paralisando a atividade do Senado Federal, produzindo conseqüências graves no que diz respeito ao interesse público e ao bom andamento das atividades do Congresso Nacional, do processo de elaboração das leis essenciais ao desenvolvimento do nosso País.

            Portanto, Sr. Presidente, precisamos rever essa questão de medidas provisórias. Trata-se de instituto importado da Itália, que pratica um regime diferente do nosso. A Itália é, desde o pós-guerra, desde 1946, parlamentarista. E a medida provisória no Parlamento italiano se chama provvedimenti provvisori com forza di legge. Depois migrou também para a Espanha, com o título de decreto-legge, decreto-lei.

            Ocorre que uma coisa é a medida provisória no sistema parlamentarista, outra coisa é a medida provisória no que diz respeito ao sistema presidencialista, produzindo uma paralisia da atividade do Legislativo por conta do trancamento das pautas, o mesmo, como disse, se aplicando por extensão aos vetos que são apostos pelo Poder Executivo.

            Sr. Presidente, está na hora de gerarmos uma consciência na Casa para que possamos retirar do texto da Constituição as chamadas medidas provisórias. O País vive plena estabilidade institucional, o Executivo dispõe de meios para legislar em caráter de emergência e, inclusive, em caráter de urgência sem que haja necessidade de se recorrer às famigeradas medidas provisórias.

            Concluo, portanto, as minhas palavras, fazendo votos de que possamos pensar a questão das medidas provisórias sob uma nova ótica. Ou seja, no sentido de eliminá-las do contexto da Constituição e criar condições para que tanto Câmara dos Deputados como o Senado Federal possam funcionar correta e adequadamente.

            Muito obrigado a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/05/2008 - Página 13685