Discurso durante a 48ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Debate a respeito das organizações não-governamentais, com destaque à necessidade de sua fiscalização.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG). MEDIDA PROVISORIA (MPV). ELEIÇÕES.:
  • Debate a respeito das organizações não-governamentais, com destaque à necessidade de sua fiscalização.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 10/04/2008 - Página 8516
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG). MEDIDA PROVISORIA (MPV). ELEIÇÕES.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), DEPENDENCIA, FUNDOS PUBLICOS, OCORRENCIA, CORRUPÇÃO, SETOR, ENSINO PROFISSIONALIZANTE, CRECHE, ASILO, SUPERIORIDADE, CUSTO, GASTOS PUBLICOS, VINCULAÇÃO, POLITICA, AUSENCIA, FISCALIZAÇÃO, PUNIÇÃO, DESCUMPRIMENTO, LEI FEDERAL, LICITAÇÃO, IMPROBIDADE, CRIME DE RESPONSABILIDADE.
  • QUESTIONAMENTO, INTERESSE, NATUREZA POLITICA, COMPROMETIMENTO, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), DEFESA, NECESSIDADE, FISCALIZAÇÃO, SETOR, SUGESTÃO, ELABORAÇÃO, RELAÇÃO, ENTIDADE, RECEBIMENTO, SUBSIDIOS, SUSPENSÃO, BENEFICIO, OCORRENCIA, PROBLEMA, AUMENTO, CONTROLE.
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, DIVERSIDADE, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), DEFESA, INSTAURAÇÃO, COMISSÃO, INVESTIGAÇÃO, ANTERIORIDADE, CORRUPÇÃO, COMPARAÇÃO, DIFICULDADE, INQUERITO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), CARTÃO DE CREDITO, MEMBROS, GOVERNO FEDERAL, MOTIVO, DIVERGENCIA, INTERESSE, NATUREZA POLITICA, COMPLEXIDADE, SUPERIORIDADE, NUMERO, INFORMAÇÃO.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), NECESSIDADE, IMPARCIALIDADE, CONGRESSISTA, DECISÃO, INQUERITO.
  • CRITICA, EXCESSO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), DEFESA, AUSENCIA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, OMISSÃO, DELIBERAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, NORMA JURIDICA, DESOBEDIENCIA, PRINCIPIO CONSTITUCIONAL, RELEVANCIA, URGENCIA.
  • ELOGIO, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, FALTA, INTERESSE, REPETIÇÃO, REELEIÇÃO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ultimamente, tenho lido meus discursos, Sr. Presidente. Eu, pessoalmente, estou em uma situação tão delicada, tão difícil nesses dias do meu mandato, que eu prefiro, ainda que acre, escrever a falar livremente como eu gosto, porque eu posso sair do pensamento e entrar onde eu não gostaria de entrar.

Eu venho a esta tribuna para debater sobre um tema que se inseriu como de grande importância para a sociedade, que são as ONGs - organizações não-governamentais, como são conhecidas.

Hoje é impossível, em qualquer lugar do planeta, haver um debate ou manifestação sobre qualquer tema sem a participação dessas entidades, que, muitas vezes, agem como principais motivadores ou protagonistas nessas mobilizações.

Em uma análise profunda, os primeiros registros de entidades sociais que poderiam ser equiparadas ao que hoje chamamos de ONGs seriam as diversas associações comunitárias que efetivamente trabalharam na aplicação do Plano Marshall na reconstrução européia depois da segunda grande guerra. Sem a atuação dessas associações, ou graças a elas, seria difícil imaginar uma correta utilização dos recursos para recuperação daquelas nações, notadamente da Alemanha.

Hoje, quiçá, imprescindível como a organização, Médico sem Fronteiras, incansáveis executores de ações de saúde nos mais desamparados rincões do planeta, surgiram também, apesar de ideologia e comportamentos polêmicos, as ONGs ligadas às questões ambientais, que, quer gostemos ou não, exercem no mínimo uma função de alertar a sociedade e de forçar o debate sobre os problemas ecológicos, tendo em vista nossa realidade.

As pessoas se auto-organizavam e coletavam alimentos, criavam centrais de triagem e uma rede muito dinâmica de distribuição. Isso mexeu com todo o Brasil. Parecia que estava nascendo outro país, feito de gente humana, onde a ideologia era o compartilhamento, a burocracia era a boa vontade e a política era o exercício do mais desprendido altruísmo.

Um grande detalhe de suma importância: não havia o Estado, não se precisava do Estado. Chegou até mais longe: não se queria o Estado. A beleza do movimento aliou-se a um brado do desmonte para a cidadania.

Esse movimento repetiu o espírito inicial das ONGs: independência, liberdade de ação, desvinculação desse ou daquele poder ou desse ou daquele partido político. Infelizmente, essa trajetória de virtudes não está tendo bom prosseguimento em alguns setores hoje.

A partir de um dado momento, estas duas entidades - poder público e sociedade organizada - se aproximaram. Agia-se em nome do setor público face às suas carências e imobilidade para atender a tempo as necessidades de uma sociedade problemática.

Surgiram ONGs para todas as finalidades: educação, incluindo a profissionalizante; assistência às minorias, como homossexuais, índios, remanescentes de escravos; escolas de artesanato; lutas marciais, executar ações de saúde. Enfim, formaram-se organizações para todos os fins. O Estado impregnava essas funções, que justamente são a razão da sua existência.

Era óbvio que, com os nossos precários instrumentos de controle e de fiscalização, haveria logo o avanço dos “espertos” nesse novo campo. A corrupção, que entre nós jamais é punida, moveu-se também na direção das ONGs. Não de todas, é claro. Muitas são íntegras, muitas merecem respeito, mas algumas estão no índex.

O que chamamos Estado-Nação deteriorou-se rapidamente, e, com ele, foram as entidades paraestatais.

Srs. Senadores, só para se ter uma idéia, uma estimativa preliminar sugere que, entre 1998 e 2006, foi repassado às organizações não-governamentais algo em torno de R$32 bilhões - praticamente uma CPMF. Trinta e dois bilhões de reais! Grande parte desse dinheiro, que deveria ter sido utilizado em ações sociais, simplesmente evaporou-se. Foi pilhado por incontáveis organizações de fachada.

O caso mais aviltante parece ser o do pseudotreinamento de mão-de-obra. Bilhões de reais foram gastos destinados a preparar melhor os trabalhadores. Aliás, são tantos bilhões que, se no aprimoramento da mão-de-obra tivessem sido gastos adequadamente, os trabalhadores de nosso País seriam os mais bem qualificados ao longo do mundo.

O que aconteceu, em muitos casos, é que as listas de cidadãos que teriam sido preparados para o mercado de trabalho eram falsas. Houve denúncia até de entidades que simplesmente buscaram na lista telefônica os nomes de seus “treinandos”.

Também chegaram denúncias sobre certas creches e asilos. Muitas delas, que deveriam assegurar o bem-estar de idosos e crianças abandonadas, na verdade só existem para promover o bem-estar dos seus organizadores.

E o que é mais trágico em tudo isso é que, muitas vezes, os diretores dessas “ONGs” são pessoas ligadas a entidades classistas ou políticas, que, por sua vez, são ligadas a grupos políticos.

Aliás, grupos políticos que dominam os órgãos públicos que têm o poder de conceder recursos a essas entidades - poderes públicos e entidades privadas mais conhecidas pelas ONGs.

Considero lamentável, Sr. Presidente, que o Estado delegue totalmente a função de prestação de serviços a entidades privadas que não são auditadas e que não são punidas quando se constata alguma irregularidade.

O conjunto de denúncias de ilegalidades vai desde o descumprimento da Lei de Licitações, da Lei de Improbidade Administrativa, da Lei nº 4.320, da Lei de Crime de Responsabilidade e muitas outras.

Como já disse: avaliações preliminares, conforme divulgado pela imprensa, dão que o total de tais desvios e uso indevido de recursos públicos remontaria à ordem, repito, de mais de 30 bilhões de reais.

Hoje, quero falar de uma comissão que está em andamento e cujo assunto muito mais interessa a nós. Trata-se da importante CPI das ONGs, cujos trabalhos estão sendo observados com muita atenção.

O que se observa hoje no Congresso é que as investigações em curso sobre as ONGs - assim como na comissão que investiga os cartões corporativos - estariam marcadas pela contaminação de conteúdo político, por haver confronto e desconfiança de gestões antípodas.

Acredito que, tendo em vista esse quadro e fora desse debate conflituoso, algumas ações, mínimas, urgentes e imprescindíveis, poderiam ser tomadas.

Inicialmente, é fundamental que todos os mecanismos de fiscalização e controle - o Congresso Nacional, o Tribunal de Contas, a Controladoria-Geral da União, os controles internos dos Ministérios e do Ministério Público - façam a triagem em todos os contratos entre Poder Público e entidades que se apresentam como de interesse público.

Creio que é preciso fazer a triagem, em especial dos contratos feitos pelo Poder Executivo, realizados com ou sem processo licitatório.

Devem ser investigadas todas as entidades sem fins lucrativos, como ONGs, OSCIPs e fundações, inclusive aquelas que têm como objetivo a tutela, a manutenção e a proteção do bem da vida. Mas essas seriam apartadas na triagem e lhes seria dado o benefício da continuidade de suas ações, para que não prejudiquemos os realmente assistidos - como muitas o são, e muitas respeitáveis. Sua inspeção, igualmente rigorosa, ficaria para um momento posterior.

Num segundo momento, meu Presidente, feita essa triagem, em regime de mutirão, todos os contratos e pagamentos firmados pelos governos com entidades, exceto as citadas anteriormente, que apresentem problema seriam imediatamente suspensos.

A seguir, deve ser realizada uma rigorosa inspeção com procedimentos de investigação in loco, colheita de depoimentos e prestação de contas de contratantes e contratados.

Também é indispensável que seja feita essa inspeção nos casos em que há subcontratação - graves, gravíssimos casos.

Os órgãos de controle estatal devem fazer uma devassa especial nos tão badalados contratos para capacitação profissional, repito. É preciso fazer um controle, seja por amostragem ou por entrevistas com os beneficiados desses cursos.

Após essa auditoria, os Poderes Públicos responsáveis devem dar um curso legal à denúncia dos contratos, com o devido processo administrativo ou até judicial, se for o caso, contra os contratantes.

No Brasil, o que deve chamar mais a atenção é o fato de que um grande número de nossas ONGs dependem do Governo. Em outras palavras, dependem de verbas públicas.

Nos meus longos anos de vida pública, meu Presidente, em particular os meus 25 anos aqui nesta Casa, sempre dei grande valor ao mandamento que nos exige uma dura atuação para fiscalizar os atos de governo.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Quando V. Exª julgar apropriado, conceda-me um aparte curto.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já lhe darei, já lhe darei.

Nessa tarefa, nada fácil, de fiscalização e controle, um eficaz instrumento é a Comissão Parlamentar de Inquérito.

Fui um apaixonado defensor das comissões parlamentares de inquérito. Tenho a honra de ter participado de várias CPIs acerca dos mais diversos assuntos e, sobretudo, de ter agido como coordenador e articulador de algumas das mais importantes.

Numa breve digressão, não posso me esquecer da gravidade de alguns temas que enfrentamos: Orçamento, caso PC Farias, Precatórios, Bancos, a do Banestado e tantas outras.

Mas devo destacar que duas Comissões Parlamentares de Inquérito me afetaram de modo especial.

A primeira delas foi a CPI dos Corruptores, dos Empreiteiros, que tive a iniciativa de sugerir, que lutei anos a fio para que fosse criada, mas que acabou não sendo instalada. Nunca, nunca o foi, nem nos oito anos de Governo Fernando Henrique, nem no atual Governo. Ela seria a conseqüência lógica do desenvolvimento da CPI do PC Farias e dos Anões do Orçamento. Ela estava com os elementos prontos, provados para se fazer uma revolução na ética e na dignidade neste País. Não deixaram ser criada.

Parafraseando o nosso atual Presidente da República, nunca na história deste País, ocorreu uma junção do oportuno, do viável e do necessário como aquela. A CPI dos Corruptores tinha tudo para que se fizesse uma verdadeira limpeza na administração pública. Seria nossa operação “mãos limpas”.

A segunda CPI na qual me vi envolvido de maneira irresistível foi a do caso Waldomiro Diniz, assessor do então todo-poderoso Chefe da Casa Civil José Dirceu, que foi flagrado filmado, de maneira ostensiva e escandalosa, pedindo propina a um bicheiro - e isso foi exibido ao vivo na televisão.

Essa segunda comissão, mais conhecida como CPI dos Bingos, só foi concretizada depois de uma questão judicial em que o Senador Jefferson Péres e eu próprio nos vimos envolvidos. Fomos buscar apoio no Supremo Tribunal Federal para que a Presidência do Senado obrigasse os Líderes Partidários a indicar membros para a Comissão. Um ano e meio depois, a decisão foi a nosso favor.

Em raros momentos da vida deste Parlamento, meu Presidente, houve a cooperação de tantos órgãos dos poderes públicos, interessados em investigar o arraigado processo de corrupção e de desrespeito à coisa pública quanto na época em que nós pedimos a CPI dos Corruptores.

A rigor, aquela CPI ainda “paira” pelos tortuosos caminhos legislativos. Sua pendência era a falta de indicação de seus membros pelas Lideranças da Situação e da Oposição, já que os dois lados mudaram de rumo: o que era Governo foi para a Oposição, e o que era Oposição foi para o Governo. Seus fatos específicos e determinados podem estar prejudicados pela extemporaneidade. Porém, sua motivação e temática ainda são atuais, porque a corrupção devasta o País.

Quanto ao fato que gerou a CPI dos Bingos, a obviedade daquele ilícito, filmado, foi tão ostensiva quanto o flagrante do funcionário dos Correios embolsando seus 30 dinheiros. Apesar disso, não quis o Governo autorizar o processo de Inquérito Parlamentar. Ficou decidido, e escancaradamente divulgado em nota pública, que CPI - um direito constitucional da minoria - só iria acontecer se o Governo quisesse. Isso foi dito em nota oficial assinada pelos Líderes do Bloco, do PMDB e do PT. Aqui no Senado só sai CPI se os Líderes quiserem.

Rasga-se a Carta, rasga-se a Constituição, rasga-se a democracia.

Sempre vi, nesse imbróglio da CPI do Waldomiro, um divisor de águas do Governo ...

(Interrupção do som.)

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - ... Lula. Tenho a plena convicção de que, se o Governo tivesse agido imediatamente na apuração do fato e apoiado as investigações do Legislativo, a história do Governo Lula seria outra com relação à ética e com relação à dignidade.

A inação, o bloqueio, as manobras para dissuadir e desacreditar o gritante escândalo, com certeza foram os propulsores de uma infindável seqüência de denúncias, de escândalos envolvendo titulares da mais alta administração, que culminaram no episódio do Mensalão.

O chamado “núcleo duro” do poder foi pulverizado. Penso que, mais por uma somatória de conjunturas favoráveis do que por atuais atos da gestão, o Governo sobreviveu e o País felizmente não entrou em colapso.

Nessas transições de posicionamento por que passou o meu Partido, o PMDB, sempre a reboque do Governo da época, meu nome foi gradualmente jogado para fora dos centros de decisão. As lideranças consecutivas adotaram um padrão em relação a minha atuação parlamentar: nunca mais indique Pedro Simon para nenhuma CPI, nunca mais o indique para o Conselho de Ética. Como membro titular, minha última gestão foi na CPI dos Precatórios, em 1996. Como suplente, minha indicação foi para a CPMI do Banestado em 2003!

Claro que isso é uma situação muito desconfortável, mas, ao contrário do que pretendiam os que queriam e querem inibir o meu trabalho, mesmo não sendo membro, participei, inquiri e investiguei em todas as comissões de inquérito que aqui ocorreram.

Varei madrugadas, pois sempre acabava sendo o último inscrito e, aí sim, apto a falar. Mas isso eu não questiono: é o procedimento regimental.

Agora o que me traz a esta tribuna não é desfiar um rosário de queixas e reclamações. De forma alguma. Considero que o que me tem acontecido é inerente à vida parlamentar e ao jogo político. Não diria que os procedimentos dos meus “adversários” são éticos, mas que são previsíveis.

O meu comportamento em relação às últimas CPIs tem sido mais restrito. Tenho acompanhado mais à distância, pela televisão do Senado, os debates. E a razão disso vai além da óbvia constatação que o embate político central hoje é o enfrentamento entre o Governo atual e o anterior, e, mais precisamente ainda, entre PT e PSDB.

Então, Srªs e Srs. Senadores, quero fazer uma avaliação mais objetiva do que, a meu ver, está ocorrendo particularmente nestas duas CPIs: a das ONGs e a dos cartões. Essas investigações, por seu suposto volume de informações, são, em si, uma das mais complexas já realizadas nesta Casa, seja pelo número expressivo de contratos, do descontrole dos gastos, seja pela natureza e vínculo dos mesmos com os contratantes da administração pública. Isso, como já disse, está gerando uma polarização que está imobilizando seus trabalhos.

Esse tipo de confronto não é novidade. Inclusive, a rigor, é quase impossível imaginar uma CPI que não provocasse e até mesmo estimulasse os confrontos político-partidários. As CPIs, de certa forma, aferem os níveis e a intensidade de poder.

Talvez essa relação só foi assimétrica na CPI que gerou o impeachment. Nas outras houve razoável proporcionalidade na correlação de forças. Só que existe um aspecto que tem que ser respeitado preliminarmente quando se atua numa CPI. Esse aspecto é a transformação excepcional do Parlamentar em Magistrado. Essas atribuições e prerrogativas dadas em caráter extraordinário têm que se constituir no primeiro “norte” da atuação parlamentar numa CPI. Ele é magistrado. Político sim; partidário sim, mas na hora de decidir ele é um juiz e a CPI se transforma num verdadeiro tribunal.

É imprescindível que haja uma troca: a paixão pelo exercício político pela obstinação da imparcialidade judicante, tanto quando possível. Sem essa premissa, acontece o que está acontecendo agora nas CPIs. Apesar de serem contempladas com felizes escolhas de seus membros e dirigentes, não está ocorrendo a prevalência do espírito do exercício da magistratura. Por isso, a função investigatória - que se revela na CPI - não está ocorrendo. O que se observa é que nada avança, nada se aprofunda e a sociedade fica mais uma vez atônita com a inércia desse grande poder que possui uma CPI no combate à ilegalidade e que está se transformando num nada multiplicado por nada.

Faço um apelo para que esse comportamento de magistrado se incorpore na atuação de membros dessas comissões. É importante, Sr. Presidente.

Pois não.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador!

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já estou encerrando, Sr. Presidente. Só um aparte ao Senador.

Obrigado.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Pedro Simon, primeiro, quero dizer da minha concordância com respeito à parte primeira do seu pronunciamento sobre as organizações não-governamentais. Na medida em que estiverem recebendo recursos públicos, sobretudo de vulto, faz-se necessário que os órgãos públicos de controle acompanhem e fiscalizem a destinação desse recurso adequadamente. E avalio que a própria CPI sobre as ONGs pode perfeitamente seguir as recomendações de V. Exª nessa direção. Com respeito ao histórico que faz sobre a sua participação nas CPIs, da qual sou testemunho desde que cheguei aqui em 91, em 92, e também sugestões que formula para as CPIs presentemente, acho importante. Quero transmitir algo relevante diante das observações que fez há poucos dias aqui no Senado no sentido do que está falando. Ainda hoje, conversei com a Ministra Dilma Rousseff, cumprimentei-a pela firmeza, pela disposição de, na sexta-feira, ter dado aquela entrevista e perguntei-lhe sobre a sua eventual visita ao Senado Federal na direção do que V. Exª outro dia ainda afirmava que seria positivo. E ela me disse que está disposta e já está comunicando ao Senador Marconi Perillo, Presidente da Comissão de Infra-Estrutura, da sua disposição de logo atender à solicitação da sua presença aqui, inclusive todos os membros da Comissão de Constituição e Justiça, que hoje estavam considerando também formular o convite para que ela venha. Bom, ela está à disposição de vir aqui dialogar. Acho que será um debate do mais alto nível. Eu até disse, no diálogo que conversei outro dia com o Senador Mão Santa, que acho importante termos aqui um procedimento de civilidade; de não ofensa a uma Ministra como a Ministra Dilma Rousseff. Portanto, o apelo que V. Exª outro dia fez acabará sendo atendido. Obrigado.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Srª Presidente, eu queria que V. Exª concedesse... Na verdade, vou fazer um desabafo. Estou machucado. Estou vendo os rumos que o Senado está tomando e isso me machuca, Srª. Presidente. Estou vendo a repercussão da opinião pública.

Eu recebo uma infinidade de e-mails por hora e eles cobram: “Senador, o que o senhor está fazendo lá? O Senado não tem mais o que fazer.” E essas duas CPIs estão nos deixando muito mal. Estão nos deixando muito e muito mal. Argumentam que foi feito um acordo; que foi feito um arrego e não se quer nada. Não pode ser assim, Sr. Presidente. Não pode ser assim!

Claro que quem é do Governo é do Governo. Claro que quem é da oposição é da oposição! Claro que tem de defender, mas há o momento, Sr. Presidente. Nos meus 25 anos que estou aqui: “Senador, V. Exª fala muito.” Isso acontecia!

Eu lembro aqui de quando o Marco Maciel era líder do Collor. Quando começaram a aparecer as acusações, ele foi para a tribuna e disse: “Eu falei com o Presidente e solicitei ao Presidente que queria as informações. Se as informações que ele me der forem as que eu espero, irei para a tribuna fazer a sua defesa.” Não foi. Ele largou a liderança.

Não no final, mas no início quando ninguém se imaginava que o ia acontecer. Isso aconteceu muitas vezes aqui, muitas vezes. Vejo... O que está havendo lá na questão da CPI nas medidas provisórias. Vamos ser sinceros, Sr. Presidente, está V. Exª chegando brilhante em uma grande atuação no seu Estado. A questão das medidas provisórias é covardia nossa, é nossa. Nós não precisamos mudar nada, nós não temos que fazer nada. É ler a Constituição! E 90% das medidas provisórias que vêm não estão de acordo com a Constituição, não são urgentes. É devolver! É devolver! No momento que nós fizermos isso, uma, duas, dez vezes, terminaria o problema. Mas nós não temos a grandeza de fazer isso. Quando digo nós, refiro-me a todos porque nós não tivemos no tempo do Sarney, não tivemos no tempo do Fernando Henrique e não estamos tendo agora. Nós é que não estamos nos firmando.

Então, as medidas provisórias, se nós analisarmos, são, no máximo, 20% de acordo com a Constituição. O resto nós não temos capacidade para fazer nada!

E agora vem mais uma CPI, que agora criou a nossa do Senado. Olha, nós estamos num debate perante à sociedade muito sério e muito grave.

Felizmente eu quero apenas agradecer a sua tolerância e levar o meu abraço ao Presidente Lula.

Eu dizia desta tribuna que o Lula, hoje, é Deus perante à opinião pública, e pode virar um estadista, se não aceitar a reeleição, acabar o seu Governo, como deve, e poder voltar daqui a dez anos ou se embarcar, tipo Venezuela, tipo Colômbia, tipo Equador, na tese da reeleição permanente, eu não sei o que vai acontecer. E hoje Sua Excelência deu a resposta: “Eu não sou candidato e não aceito. Vou romper com o PT se o PT insistir comigo.” Eu peço ao PT, meus queridos, bravos amigos do PT, respeitem o Presidente! Vocês estão humilhando o Presidente. Vocês estão deixando o Presidente em uma condição clara. Ele foi de uma clareza meridiana: não quer, não aceita, rompe com o PT. Eu acho que o PT deveria respeitar o Presidente Lula.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/04/2008 - Página 8516