Discurso durante a 79ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao artigo do jornalista Mauro Santayana, publicado no site Tribuna Online, de 14 de abril último, intitulado "Globalização Unidirecional". Apelo ao Presidente do Senado, no sentido de exercer o papel de guardião de interesses maiores da economia brasileira.

Autor
João Durval (PDT - Partido Democrático Trabalhista/BA)
Nome completo: João Durval Carneiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA INTERNACIONAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Comentários ao artigo do jornalista Mauro Santayana, publicado no site Tribuna Online, de 14 de abril último, intitulado "Globalização Unidirecional". Apelo ao Presidente do Senado, no sentido de exercer o papel de guardião de interesses maiores da economia brasileira.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2008 - Página 14804
Assunto
Outros > ECONOMIA INTERNACIONAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, DESIGUALDADE REGIONAL, AMBITO INTERNACIONAL, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, INTERNET, DENUNCIA, PROTECIONISMO, PAIS, PRIMEIRO MUNDO, MANUTENÇÃO, DOMINIO, EXPLORAÇÃO, TERCEIRO MUNDO, CONTRADIÇÃO, DISCURSO, LIBERALISMO, ECONOMIA, REGISTRO, DECISÃO, GOVERNO, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA, CRIAÇÃO, COMITE, CONTROLE, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO, SEMELHANÇA, GOVERNO ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ALEGAÇÕES, SEGURANÇA NACIONAL.
  • DEFESA, AUMENTO, CONTROLE, BRASIL, ENTRADA, CAPITAL ESTRANGEIRO, CAPITAL ESPECULATIVO, COMENTARIO, ESTUDO, ESTATISTICA, VENDA, EMPRESA NACIONAL, APREENSÃO, DESNACIONALIZAÇÃO, CONCLAMAÇÃO, SENADO, PROTEÇÃO, INTERESSE NACIONAL.

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fala-se tanto em desigualdades sociais e em má distribuição de renda, mas se esquece de observar que as mesmas relações exploratórias existentes entre as pessoas ocorrem, em escala muito mais ampla, entre os países que, por sua própria natureza e constituição, deveriam ser soberanos, isto é, sem nenhuma forma de sujeição a outros pares.

O mundo está, cada vez mais, conformado à famigerada economia globalizada, mas os grandes sempre pretendem ser “mais iguais” e implantam mecanismos de resguardar sua posição de dominadores e exploradores dos mais pobres.

Essa situação é desmascarada pelo jornalista Mauro Santayana, em artigo publicado no site Tribuna Online, em 14 de abril, que tem por título “Globalização Unidirecional”. Aí o autor desnuda a postura hipócrita dos países ricos, que pregam a liberdade econômica, mas que contradizem seu próprio discurso por meio de atos protecionistas, impondo limitações tanto à produção como aos investimentos de estrangeiros em seus respectivos territórios.

Esse conceituado jornalista inicia seu texto com a informação de que “o governo alemão decidiu controlar a entrada de investimentos estrangeiros - sobretudo dos fundos soberanos de países emergentes - e criar órgão semelhante ao Committee on Foreign Investment in the United States (CFIUS), Comitê para Investimentos Estrangeiros nos Estados Unidos, que regula o ingresso de capitais externos nos Estados Unidos”. Para seu artigo, o autor se baseou em informações do Financial Times, referência inquestionável em assuntos de economia, do dia 10 de abril passado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os países ricos criaram um organismo que, a pretexto de contribuir para o desenvolvimento econômico em geral, serve para aumentar ainda mais o potencial de crescimento de seus membros. Esse organismo é a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Fazem parte da organização basicamente os países de alguma forma ligados à União Européia, os da América do Norte, a Coréia do Sul, o Japão, a Austrália e a Nova Zelândia. É possível afirmar mesmo que se trata de um “clube dos ricos”. Onde estão os países da América do Sul e da América Central? E os da África? A grande maioria dos asiáticos? São apenas 30 países que, juntos, produzem mais da metade de toda a riqueza do mundo.

E foi nessa Organização que, em maio de 1995, iniciaram-se negociações secretas para um Acordo Multilateral de Investimentos, que abolia a soberania dos Estados em favor das empresas multinacionais. Foi a reação popular nos próprios países ricos que abortou a iniciativa. Mesmo assim, muitas de suas cláusulas foram impostas, mediante convênios bilaterais, a alguns países, entre eles o Brasil.

Creio que já passou da hora de o Brasil controlar a entrada de investimentos externos. No mínimo, considero necessário preservar determinados setores, considerados estratégicos, da ação geralmente perniciosa dos capitalistas estrangeiros, em sua maioria especuladores, que só visam ao lucro irrefreável e que acabam remetendo para o exterior uma grande parte dos lucros que seriam benéficos para o desenvolvimento do País se fossem reinvestidos aqui mesmo.

Os Estados Unidos podem ser considerados o principal líder da globalização neoliberal. Naquele país, desde 1950, e dentro dos marcos da Guerra Fria, conforme comenta Mário Santayana, “a legislação confere ao Executivo o direito de vetar a entrada de capitais externos, seja para a aquisição de empresas nacionais, seja para a fusão com companhias domésticas. A idéia é de proteger as corporações nacionais e garantir a segurança ao país”.

Recentemente, no ano de 2006, o Comitê para Investimentos Estrangeiros, que mencionei há pouco, impediu que a empresa estatal portuária de Dubai, que havia adquirido a Oriental Steam Navigation Company, cuja sede está localizada em Londres, assumisse as operações de terminais nos maiores portos americanos, como os de Nova Iorque e de Baltimore. Além disso, vetou a compra da empresa de petróleo californiana Unacol por uma empresa chinesa. E, no início deste ano, proibiu a participação da chinesa Huawei na 3Com, uma das grandes empresas americanas produtoras de componentes eletrônicos para uso em informática.

O que observamos, portanto, é a mais contundente demonstração do “faça o que digo, não faça o que faço”. Que liberalismo é esse, Srªs e Srs. Senadores? Ressalte-se que tudo isso é feito com a desculpa esfarrapada de cuidar da segurança nacional.

É bastante esclarecedor, nesse sentido, um estudo elaborado por Sérgio de Oliveira, em 2004, para o Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC), denominado “Globalização e Desnacionalização das Empresas Brasileiras: 1990 a 1999”. Esse estudo apresenta um retrato assustador, que mostra como o Brasil vem entregando suas empresas para os investidores estrangeiros.

Em 1992, as participações das empresas nacionais e das estrangeiras nas vendas das 500 maiores empresas brasileiras eram: nacionais, 68,7%; estrangeiras, 31,3%. Entretanto, em 1999, essa relação havia se alterado de forma preocupante: as nacionais tiveram 55,3%, enquanto as estrangeiras, 44,7%. Percebe-se que houve um crescimento de mais de 40% na participação de vendas pelas empresas estrangeiras.

Isso nos leva a pensar:

Houve um esforço enorme desde o tempo de Getúlio em favor da industrialização para a substituição das importações. Agora, estamos entregando de bandeja para os estrangeiros a nossa economia, para que eles se enriqueçam mais às nossas custas, porque o lucro das empresas, pelo menos em grande parte, tende a deixar o País!

O autor do estudo ressalta que, no ano de 1999, o setor de telecomunicações já estava predominantemente nas mãos dos estrangeiros. E é evidente que se trata de um setor estratégico e muito sensível. Destaca também que passou a haver predominância do capital estrangeiro no setor de eletrônicos e de alimentos.

Os fatos demonstram que o jornalista Mauro Santayana está colocando diante dos nossos olhos uma necessidade crucial: é preciso controlar a entrada de capital externo no País.

Devemos nos precaver, pois a globalização foi projetada como um meio de recolonizar o mundo, por meio do capital financeiro. Em que pese o fato de termos sido beneficiados pelo preço elevado das commodities, o que fez com que os países emergentes acumulassem saldos comerciais e melhorassem sua situação em termos de mercado externo, não podemos ficar à mercê de investidores que não passam de sanguessugas da nossa economia.

Se, como disse Juracy Magalhães, “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”, então, temos de colocar aí a defesa do interesse nacional. Se eles criaram um Comitê para Investimentos Estrangeiros nos Estados Unidos para controlar a atuação de empresas estrangeiras em território norte-americano, principalmente em setores considerados estratégicos, endosso as palavras do jornalista que me motivou a fazer este pronunciamento, quando ele afirma: “Em lugar de tantas ‘agências reguladoras’, que surgiram para beneficiar os capitais de fora, convinha-nos uma só: a Agência Nacional de Controle dos Investimentos Estrangeiros no Brasil”.

E ao Senado, Sr. Presidente, caberia envolver-se mais como guardião dos interesses maiores da nossa economia, visto que já detém a competência relativa a toda a movimentação financeira externa dos entes públicos.

Esse é o apelo que faço hoje, aqui, a V. Exª, como Presidente, neste momento, desta Casa, e a todos os membros do Senado Federal.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - V. Exª me permite um aparte, Senador João Durval?

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA) - Pois não, Senador Paulo Paim.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador João Durval, primeiro, cumprimento V. Exª por trazer a esta Casa essa reflexão sobre a economia globalizada. Confesso que, em certos momentos, fico preocupado com a expressão de um ou outro Senador dizendo que esta Casa não está debatendo os grandes temas. Estamos debatendo, sim, os grandes temas. Este é um exemplo: V. Exª na tribuna. Debatemos grandes temas quando estamos, há 120 anos da abolição, discutindo políticas que concedam o mínimo de recuperação à situação dos milhões de brasileiros escravizados durante 500 anos. Neste momento, V. Exª, em seu discurso, inspirado no artigo de Mauro Santayana, faz uma reflexão sobre a especulação no País não apenas financeira, mas também de outros grupos, como na área da própria indústria de transformação. V. Exª, em nenhum momento, pensa em barrar investimentos aqui. Que ninguém pense isso! V. Exª quer que haja um fórum para a reflexão sobre esses investimentos, como nos Estados Unidos, que, como todos sabem, são o eixo principal da economia capitalista no mundo. Cumprimento, portanto, V. Exª por fazer essa reflexão em torno do tema da economia globalizada, num momento em que se fala tanto que vai haver falta de alimentos, em que há o debate do etanol, do biodiesel. V. Exª vai à tribuna e faz essa grande reflexão, preocupado, inclusive, com a especulação financeira, com a situação dos mais pobres. Esse é o eixo do seu pronunciamento, e, por isso, fiz questão de aparteá-lo, Senador João Durval, pela importância do seu discurso. O Senado da República cresce com pronunciamentos como o de V. Exª. Meus cumprimentos!

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA) - Muito obrigado, Senador Paulo Paim, pela excelente intervenção, pelo aparte que acaba de fazer. É tão importante o seu aparte, que o incorporo ao meu pronunciamento! Agradeço a V. Exª.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2008 - Página 14804