Discurso durante a 79ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

A questão da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol. A dificuldade de se abrir a "caixa preta" das ONGs.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • A questão da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol. A dificuldade de se abrir a "caixa preta" das ONGs.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2008 - Página 14830
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • ANALISE, CARACTERISTICA, INTEGRAÇÃO, POPULAÇÃO, INDIO, ESTADO DE RORAIMA (RR), RESIDENCIA, ZONA URBANA, OPINIÃO, SUPERIORIDADE, AREA, RESERVA INDIGENA, CRITICA, POLITICA INDIGENISTA, FALTA, ATENÇÃO, GOVERNO, PROTEÇÃO, FRONTEIRA, EXCEÇÃO, GETULIO VARGAS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, IMPORTANCIA, DIVULGAÇÃO, INFORMAÇÃO, SITUAÇÃO, LOCAL, DENUNCIA, MANIPULAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, IGREJA CATOLICA, OBJETIVO, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, ATENDIMENTO, INTERESSE, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), VINCULAÇÃO, CAPITAL ESTRANGEIRO, CONTROLE, RIQUEZAS, MINERIO, SUBSOLO.
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, ANTERIORIDADE, PUBLICAÇÃO, PERIODICO, ISTOE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CONFLITO, INDIO, ESTADO DE RORAIMA (RR), CONLUIO, SACERDOTE, IGREJA CATOLICA, EXPLORAÇÃO, OURO, DIAMANTE, CONTRABANDO, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA.
  • DETALHAMENTO, IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, ESTADO DE RORAIMA (RR), ENTIDADE, IGREJA CATOLICA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), AMBITO INTERNACIONAL, RECEBIMENTO, FUNDOS PUBLICOS, ALEGAÇÕES, ATENDIMENTO, SAUDE, INDIO, COMPROVAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), AUSENCIA, APLICAÇÃO, REGISTRO, OPOSIÇÃO, MAIORIA, COMUNIDADE INDIGENA, PROTESTO, GOVERNO FEDERAL, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), EXPECTATIVA, DECISÃO JUDICIAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REVISÃO, DEMARCAÇÃO, ATENÇÃO, RELATORIO, COMISSÃO EXTERNA, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, AGRADECIMENTO, COBERTURA, IMPRENSA.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, OBRIGATORIEDADE, APROVAÇÃO, SENADO, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS.
  • ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, SENADO, AUDIENCIA PUBLICA, DIVERSIDADE, ENTIDADE, IGREJA EVANGELICA, ESTADO DE RORAIMA (RR), OBJETIVO, IMPARCIALIDADE, ANALISE, PROBLEMA, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, DOCUMENTAÇÃO.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Mão Santa, que, com muita grandeza, preside a sessão de hoje, quero cumprimentá-lo e agradecer as palavras elogiosas.

Srs. Senadores, Srªs Senadoras; brasileiros e brasileiras que nos ouvem pela Rádio Senado e que nos assistem pela TV Senado; senhores que estão aqui na galeria do Senado, nos abrilhantando com sua presença; Sr. Presidente, V. Exª abordou um tema que eu não poderia deixar de trazer hoje no meu pronunciamento, que é justamente a questão da reserva indígena Raposa Serra do Sol no meu Estado, a 35ª reserva que é demarcada no meu Estado.

É bom que se diga que não é a primeira reserva indígena que está sendo demarcada não, mas a 35ª, Senador Mão Santa. Atinge cinqüenta e poucos por cento da área do meu Estado. E qual é a população indígena do meu Estado? Dez por cento apenas da população do Estado. E quais são os índios do Estado de Roraima? Como são eles? São prefeitos, vice-prefeitos, vereadores, funcionários públicos, moradores. A maior quantidade desses índios está morando na capital ou nas sedes dos Municípios. Índios aldeados mesmo, Senador Mão Santa, sem erro, sem preocupação de errar, não chegam a 20% dessa população. As aldeias indígenas funcionam, para a maioria dos índios de Roraima, como uma espécie de sítios: eles moram nas cidades e têm as aldeias onde eles plantam e colhem os produtos que vendem depois nas cidades.

E a culpa é deles? Não, a culpa não é deles. A culpa é do Governo Federal, a quem compete realmente a política indigenista, de assistência ao ser humano chamado indevidamente de índio. Por que os chamamos de índios? Porque, naquela época, quando Cristóvão Colombo e, depois, Cabral chegaram aqui, acharam que estavam chegando na Índia. Cristóvão Colombo achou que estava chegando na Índia e chamou os habitantes daqui de índios. Então, na verdade, nem índios são, nem indianos são, mas pegaram esse rótulo.

Muito bem, eu tenho muito orgulho dos índios do meu Estado. Eu nasci no meu Estado, não fui para lá para exercer uma profissão e me eleger político, Deputado ou Senador - pois já fui Deputado e agora sou Senador. Eu não fui para lá por acaso, para uma função pública e, a partir daí, fiz carreira política. Eu nasci lá, saí para estudar, voltei formado em Medicina, trabalhei catorze anos como médico e resolvi entrar para a política para dela fazer um instrumento de luta contra as injustiças que via no meu Estado, inclusive essa de querer transformar o meu Estado, que, embora sendo da Amazônia, não tem nada parecido com a Amazônia que aparece na televisão e nos filmes, só de matas. Lá, temos os campos naturais, que chamamos de lavrados, e que correspondem, mais ou menos, aos pampas do Rio Grande do Sul ou ao cerrado do Centro-Oeste. Também temos regiões montanhosas, na fronteira com a Venezuela e com a Guiana, que não são comuns na chamada Planície Amazônica. Na verdade, estamos encravados dentro da Venezuela e da Guiana. Mais da metade do Estado está encravado nesses dois países.

O que tem feito o Governo brasileiro ao longo dos tempos? Tirando Getúlio Vargas, que, em 1943, com sua visão de estadista e de Brasil, via a importância de nossas fronteiras serem vivificadas com a presença de brasileiros, o Governo brasileiro vem fazendo muito pouco. Getúlio Vargas criou, naquela época, o então Território do Rio Branco, que depois passou a se chamar Território de Roraima e, depois, na Constituinte, inclusive por um trabalho, com muito orgulho, meu e de outros parlamentares do Território, foi transformado em Estado da Federação em 1988, junto com o Amapá. Getúlio Vargas, naquela época, também criou Pontaporã, Iguaçu e Guaporé, que hoje é o Estado de Rondônia. Getúlio Vargas, em 1943, preocupava-se com o território brasileiro, com a soberania nacional, com a integração do Brasil como um todo.

De lá para cá, Senador Mão Santa, com raríssimas exceções, raríssimas exceções, os Presidentes brasileiros têm se preocupado pouco com a Amazônia, muito especialmente com o meu Estado, que é o mais distante a partir dos grandes centros. Basta dizer que, para ir de Brasília a Roraima, são quatro horas e meia dentro de um avião: três horas e meia voando e uma hora parado em Manaus, numa escala. É uma viagem transcontinental praticamente.

Além disso, somos quatrocentos mil habitantes, dos quais 10%, ou trinta e poucos mil, são índios. Os outros são brasileiros de todos os lugares do Brasil, inclusive descendentes dos índios de lá, os mestiços, a quem chamamos caboclos.

Como somos poucos habitantes - poucos eleitores, portanto -, o Presidente Lula, por exemplo, nunca foi lá. Nem nas campanhas políticas, nem na primeira, nem na segunda. Nunca foi lá! Outros não foram. Jânio Quadros, uma vez, candidato a Presidente da República, chegou a Manaus e seus aliados foram a essa cidade pedir para ele ir a Roraima. Ele disse: “Não, não estou fazendo campanha para vereador”.

A cidadania de quem mora em Roraima é medida pelo número. E aí pergunto: o que o Presidente Lula vai fazer na Guiana, na ex-Guiana Inglesa, que tem oitocentos mil habitantes? O que ele vai fazer no Suriname, que tem setecentos mil habitantes? Mantidas as proporções, não deveria gastar dinheiro do Brasil para ir a esses países, porque têm pouca gente.

Não se julga um povo pela quantidade de pessoas; julga-se um povo pela qualidade das pessoas e pelo direito à dignidade que cada um tem. E, por isso mesmo, com o meu Estado, o Presidente Lula tem sido muito ruim. Muito ruim mesmo! Nem vou dizer padrasto, porque há muitos padrastos bons. Ele não é padrasto, não. Ele é muito ruim. Mas o povo de Roraima já deu o troco para ele: na eleição passada, o Presidente Lula perdeu no primeiro turno e perdeu no segundo turno lá. No primeiro turno, o adversário dele, Geraldo Alckmin, teve cinqüenta e poucos por cento; e, no segundo turno, quando não houve nem campanha, Geraldo Alckmin teve 63% dos votos. Portanto, o povo de Roraima já deu o troco ao Presidente Lula.

Eu estou dizendo isso, Senador Mão Santa, como filho, como um homem de lá, porque, como médico, eu andei por todas as comunidades indígenas da região, tratando os índios com o pé no chão. Não era dentro de gabinete com ar condicionado, não. Era lá, nas malocas, como se chamavam antigamente as aldeias indígenas - hoje, a Igreja católica mudou o nome para comunidades indígenas.

Eu quero falar um pouquinho sobre a minha experiência, principalmente para os brasileiros do litoral do Sul e do Sudeste, e até mesmo do litoral do Nordeste, que não conhecem a Amazônia e ficam, muitas vezes, desinformados ou informados inadequadamente, porque o grande sistema de informação é contra essas coisas.

A propósito, quero aqui fazer justiça às nossas emissoras. A TV Globo promoveu três reportagens seguidas, no Jornal da Globo, sobre essa questão, e mostrou aspectos importantíssimos que sempre foram ocultados da opinião pública. Menciono também o trabalho da TV Bandeirantes, da TV Record e da TV Senado, que foi lá e fez uma cobertura completa.

Mas quero explicar, Senador Paim, por que há essa falsa preocupação tão grande com 740 mil índios. Ora, são 740 mil índios! Se a Nação brasileira quisesse de fato, como se diz, fazer com que vivessem muito bem, dava para pagar um salário muito bom para cada um deles. Mas, não.

Como é que se montou o esquema da questão da política indigenista e do movimento indigenista no País? V. Exª foi constituinte, não foi, Senador Paim? Lembra-se, naquela época, do Sting, andando com Raoni, com aquele seu vistoso botoque? O Sting, um cantor inglês, veio aqui defender nossos índios, porque nós, brasileiros, somos muito ruins com eles. Portanto, precisava que ele viesse aqui fazer uma campanha, durante a Constituinte, em favor dos índios. E foi incluído - e não foi só por causa do Sting, não; houve outros movimentos, como a Igreja Católica e outros que se envolveram - na Constituição o art. 231, que diz que as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são de seu usufruto exclusivo.

Ora, “tradicionalmente ocupadas”! Mas esse artigo nunca foi regulamentado, Senador Paim. O que é uma terra tradicionalmente ocupada pelo índio? No caso da Raposa Serra do Sol, existe uma mentira total. Pegou-se uma comunidade indígena que tinha 30 famílias, levou-se cinco para um lugar, mais cinco para outro lugar e foram criando falsas comunidades indígenas, que não ocupavam tradicionalmente aquelas áreas. Mas quem fez isso, Senador Paim? Perguntam-me muito: por que os sucessivos Presidentes da República vêm demarcando terras indígenas no Brasil? E sabe quantos por cento há hoje demarcados, Senador Paim? Treze por cento do território nacional. Ora, se fosse assim, devíamos demarcar mais terras para os quilombolas, para os negros, porque há muito mais negro do que índio no Brasil.

Qual é a visão, qual é a justificativa desses antropólogos que moram em Ipanema, que moram na Avenida Paulista, ou que moram no exterior para o problema? Qual é a visão deles? É ocupar o máximo de terra possível. E como é que isso foi montado? Com as ONGs internacionais. Na verdade, a maioria delas, sob esse manto de proteção ambiental, de proteção indigenista, está a serviço do grande capital internacional, do G-7, que é Estados Unidos, mais Canadá, mais Europa. Querem controlar o quê? As riquezas do mundo, Senador Paim. Basta ver que, onde há mapa de uma reserva indígena, há, coincidentemente, um mapa das riquezas minerais. No meu Estado, então, é uma coincidência fabulosa. Fabulosa! Até na reserva ianomâmi demarcaram de um jeito e, depois, descobriram que havia reserva de um mineral fora do que eles haviam demarcado. Eles, então, fizeram um biquinho para encaixar a reserva mineral.

Mas quero falar aqui como é que esses movimentos foram formados. Houve empenho de várias instituições, sob o comando das internacionais. Aqui, o grande baluarte na questão indigenista foi a Igreja Católica, por meio do Conselho Indigenista Missionário, que criou, em cada Estado, um Conselho Indígena e, em algumas regiões, certas instituições, como a Coiab, que reúne teoricamente os índios da Amazônia.

E quem são esses dirigentes, Senador Paim? São eleitos mesmo pelos índios? Representam mesmo a maioria dos índios? Não, Senador Paim. É um conluio.

Aqui, quero ler algumas coisas. Primeiro, a respeito de uma reportagem de 1996, Senador Paim, publicada na Revista IstoÉ naquela época, em 96. Agora, a coisa veio à tona, e já estamos em 2008.

Em 1996, a Revista IstoÉ publicou a seguinte matéria, escrita por Mino Pedrosa e Ricardo Stuckert. Eles foram a Boa Vista, no Estado de Roraima.

Roraima em Pé de Guerra.

Padre italiano é acusado de ensinar tática de guerrilha a índios de Roraima e ficar com ouro e diamante extraídos nas reservas.

No extremo norte do País, próximo à fronteira com a Guiana, há uma área rica em minérios, ouro e diamante, onde índios macuxis estão em pé de guerra contra os fazendeiros da região. Sob o comando do cacique Jacir e do padre italiano Giorgio Dall Ben, que vive no Brasil desde a década de 60, os índios têm invadido propriedades rurais.

Durante anos, padre Giorgio formou dupla com outro cacique macuxi, Terêncio Luiz da Silva, da aldeia Ubaru, que dava as cartas no Nordeste de Roraima. Bem afinados, os dois [quer dizer, o cacique e o padre Giorgio Dall Ben] chegaram a ser recebidos juntos pelo Papa João Paulo II. Mas há dois anos [essa matéria é de 96; então, quando me refiro aqui há dois anos, quer dizer, portanto, em 94] eles romperam. Enquanto o padre, com o apoio da Igreja Católica e da Fundação Nacional do Índio (Funai), insiste na defesa de uma demarcação contínua das reservas indígenas de Raposa e Serra do Sol, seu ex-aliado prega a criação de ilhas de preservação, proposta enfaticamente apoiada por fazendeiros, garimpeiros e pelo governo de Roraima. A dissolução dessa parceria acabou resultando em denúncias de utilização dos indígenas como massa de manobra numa guerra de interesses envolvendo o desvio de minério brasileiro pela Igreja Católica e o ensino de táticas de guerrilhas aos índios. Em entrevista à IstoÉ, o cacique Terêncio Luiz acusa padre Giorgio de ser o pivô dessa estratégia agressiva da Igreja. “Ele anda armado e usa os índios na exploração de ouro e no garimpo de diamante. Antes isso era feito com máquinas, e hoje o trabalho é todo manual, feito pelos índios”, conta Terêncio [isso em 96]. O cacique afirma que o padre troca mantimentos e roupas com os índios por diamantes e ouro [Isso consta da revista Istoé de 96, Senador Paim]. “Enquanto estivemos juntos, sempre vi o padre pegando ouro e diamantes. Não sei o que ele fazia com aquilo, para onde mandava. Só sei que ficava com ele.” 

(...) Padre Giorgio tornou-se uma figura lendária em Roraima. Transformou a aldeia Maturuca em um verdadeiro bunker [e é mesmo; até mesmo o Exército brasileiro, que foi lá, recentemente, fazer uma visita com Ministros do Tribunal Regional Federal e do STJ foram agredidos; a desembargadora federal do TRF recebeu inclusive agressões verbais e quase físicas], onde só permite o acesso da Funai, de missionários e de representantes de Organizações Não-Governamentais, especialmente as estrangeiras. Protegidos pelos índios que o seguem, há anos não é mais visto pelos fazendeiros da região, que o teriam jurado de morte. Há cerca de um ano, em uma de suas últimas aparições, foi reconhecido saindo rapidamente de um posto de gasolina na capital do Estado... (...) Nas vezes em que se sente ameaçado [vejam que este dado aqui é interessante] em território brasileiro, atravessa a fronteira e se esconde na Guiana.

Para isto é que tenho chamado a atenção, e a Rede Globo mostrou: para passar do Brasil para a Guiana, é só pegar uma canoa, atravessar um riozinho estreito e já se está do outro lado, na Guiana.

A Guiana é uma das grandes exportadoras de diamante. Mas sabem onde o diamante é colhido? No Brasil! Coloca-se uma balsa no meio do rio, Senador Mão Santa, a mangueira está do lado de cá, sugando o material. O diamante é colhido, levado para o lado de lá, para a Guiana, onde não há proibição de exploração de diamante - no Brasil, há uma falsa proibição de exploração dos diamantes, porque o mineral encontra-se nessa reserva indígena - e o diamante é vendido lá na Guiana.

Um brasileiro me mostrou recibos selados, com o pagamento dos tributos na Guiana. Portanto, o diamante do Brasil, da reserva indígena Raposa Serra do Sol, está saindo para a Guiana e está sendo exportado pela Guiana. Mas isso também se dá na reserva Roosevelt, em Rondônia, onde há o melhor diamante, a maior quantidade de diamante do Brasil. O Brasil não pode explorar, mas esse diamante é contrabandeado todo dia. Do lado dessa reserva, do lado do Mato Grosso, há até uma bolsa de diamante. Compram diamante de onde? De lá; depois, ele vai para o exterior. O Brasil não exporta, e o que é contrabandeado sai como produto do Paraguai. O Paraguai é um produtor grande de diamante do Brasil.

Então, essas coisas, que aparentemente são simplórias ou muito pequenas, não o são, não! Essa falsa defesa dos índios é uma molecagem que se está fazendo com o Brasil. O mais importante a se dizer é que os índios de lá, na sua maioria, não querem essa demarcação - a maioria. Mas a Funai nunca quis fazer, lá, um plebiscito. Eu o propus e disse: “Façam um plebiscito só entre os índios e vejam se os índios de lá querem isso”. Não querem, mas a Igreja Católica é acostumada com isso. Ela fez a Inquisição, fez as chamadas Santas Cruzadas para impor o ponto de vista dela. Então, quando ela tem um ponto de vista, principalmente nessa área da Teologia da Libertação, bota na marra mesmo.

E vai, aqui, em frente:

O projeto original do Governo Federal prevê a demarcação contínua, com o argumento de que os índios são nômades.

Ora, essa região tem seis etnias indígenas que não se bicam, que não se entendem. Alguns, como os do CIR, Conselho Indígena de Roraima, são da Igreja Católica; outros, como, por exemplo, os da Sodiur, da comunidade do Contão, são evangélicos. O interessante é que, na identificação para se retirarem os não-índios dessa reserva, estão incluídas as igrejas evangélicas. Elas terão de ser retiradas de lá, mas as igrejas católicas, não. O que é isso? O Governo brasileiro não é laico? O Governo brasileiro é ligado a alguma religião? Não, mas lá está acontecendo isso. Estão listadas pela Funai, eu tenho o documento.

Essa postura que o Governo adotou, e está adotando ainda, agrada os organismos internacionais, as organizações não-governamentais e, principalmente, a Igreja Católica.

Sr. Presidente, não vou ler todo o texto, mas faço questão de trazer esse artigo, que foi escrito em 1996, para mostrar que, na verdade, essa história não é desconhecida para ninguém. Ela não é desconhecida para os órgãos de informação do Governo Federal, ela não é desconhecida para a Funai, ela não é desconhecida para o Ministério da Justiça, mas, apesar disso, há, realmente, um conluio muito grande. Não consigo entender por que o Governo brasileiro se submete a isso.

Aqui, há uma outra matéria sobre o Padre Giorgio, publicada, recentemente, em 2008: “O piedoso Padre Giorgio Dall Ben”. Esse Padre Giorgio disse-me, uma vez, que se desse para rezar um Padre-Nosso, tudo bem, mas que o mais importante mesmo era fazer esse apartheid étnico em Roraima - que não beneficia os índios, porque nem eles querem que seja assim.

Mas quem é o mentor principal, hoje, Senador Paim, dessa guerra em Roraima, que a comanda e é o único a ser ouvido? É o Conselho Indígena de Roraima, criado pelo Conselho Indígena Missionário.

No site do próprio CIR, na página na Internet, para não dizer que estou inventando, são especificados os parceiros do CIR: Alianza Amazonica, uma ONG italiana; Cafod, uma instituição da Igreja Católica da Inglaterra - a Igreja Católica, na Inglaterra, é minoritária, e a Anglicana é majoritária, mas essa Cafod é uma instituição da Igreja, e vou mostrar isso mais à frente -; Cese, também italiana; Cimi, da Igreja Católica do Brasil; Coiab, um braço do Cimi; CCPY, instituição que criou a reserva ianomâmi, um outro departamento pior do que o da reserva Raposa Serra do Sol. A única coisa que se pode dizer a favor é que, realmente, lá existem índios em estágios mais primitivos, que vivem aldeados mesmo, mas a grande mentira é que se demarcaram 4,5 milhões de hectares, dizendo-se que eram para um tipo de índio só, quando, na verdade, há várias etnias que vivem em guerra, Senador Paim, inclusive, por causa da falta de mulheres. As mulheres engravidam muito cedo, têm o primeiro filho muito cedo; a mortalidade neonatal é muito alta; há carência de mulheres; e eles se atacam uns aos outros para terem condições de haver mulheres nas tribos. Então, até isso é uma desumanidade que se pratica contra esses índios, mas esse é outro departamento.

Quais são os outros parceiros do CIR? O Greenpeace, uma entidade transnacional; o Instituto Socioambiental, do ex-Presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Santilli; a Movimondo, italiana novamente; a Norad; a Opan; a Oxfam; a Pro Indios di Roraima, italiana; a Pro Regenwald, inglesa; a Rainforest Foundation; a Survival International; a TNC; e a Urihi, criada pela CCPY e pela Igreja Católica.

Diz-se: “Sim, mas qual é o problema de haver uma instituição que defenda os índios?”. Em tese, não há problema, não fossem as maracutaias que são feitas por essa instituição.

Senador Paim, já falei - e V. Exª aquiesceu, como Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa - que V. Exª ouviu um lado dessa questão, ouviu o CIR, portanto, e seus aliados. Já conversei com V. Exª, e vamos fazer um requerimento, para que V. Exª possa ouvir o outro lado, que são as outras entidades indígenas, como Sodiur, Alidecir e Arikon, e também os outros envolvidos.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Mozarildo, permita-me dizer que V. Exª, com justa razão, procurou-me diplomaticamente, como é a sua forma de agir, e me solicitou: “Senador Paim, hoje, você teve a visão de um lado. Nós queremos que a Comissão, simplesmente, ouça também a outra parte.”. O requerimento que V. Exª disse que vai encaminhar será votado já nesta quarta-feira.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Muito obrigado, Senador Paim. Tenho certeza disso. Conheço a isenção com que V. Exª defende os seus pontos de vista e com que conduz a Comissão.

Como eu estava dizendo, o CIR foi criado com o objetivo específico de provocar essas demarcações. Está aqui:

        Nasce o CIR com o propósito de aglutinar forças em defesa dos povos indígenas de Roraima. Em 1987, é registrado com o nome de Conselho Indígena do Território Federal de Roraima e, com a promulgação do Estado, passa a denominar-se Conselho Indígena de Roraima.

Agora, veja um exemplo de como esse Conselho Indígena de Roraima é, realmente, meio sacrossanto, Senador Mão Santa: só do Governo Lula, esse Conselho recebeu, em 2003, R$6,7 milhões; estavam empenhados R$7.758.889,50, e foram recebidos R$6,7 milhões. Em 2004, recebeu R$5.676.846,46; em 2005, recebeu R$7.576.018,26; em 2006, recebeu R$8.755.130,98; em 2007, recebeu R$10.207.500,34. Portanto, só do Governo Lula, já recebeu R$38.915.496,04. Para quê, Senador Paulo Paim? Aqui, diz-se que é para fazer assistência à saúde indígena no Distrito Sanitário Leste de Roraima, mas, na verdade, como constatou o Tribunal de Contas da União (TCU), em que menos se aplica esse dinheiro é em saúde. Aplica-se na manutenção de um esquema de propaganda, de um esquema de escritório, de movimentação de guerrilhas etc. Com esse dinheiro, é feito isso. O Tribunal de Contas já constatou isso, não fui eu que constatei.

Eu, como médico, digo que, se esse dinheiro fosse aplicado, realmente, na saúde indígena, Senador Mão Santa - somos médicos -, mesmo não admitindo a terceirização - essa é uma terceirização dos serviços de saúde; o Governo brasileiro está terceirizando um serviço de saúde para uma instituição que não tem capacitação técnica para prestar serviços de saúde -, eu diria: “Parabéns!”. Mas não é, não. Não é aplicado nisso, não; isto aqui é roubado. O coordenador da Fundação Nacional de Saúde de Roraima foi preso pela Polícia Federal, e, na casa dele, havia dinheiro disto aqui. Mais de R$36 milhões foram desviados da Fundação Nacional de Saúde em Roraima, e, no meio, estava esse dinheiro do CIR.

Mas sabe como o CIR gasta dinheiro também, Senador Paim? A sua advogada, Drª Joênia, que esteve na Comissão, vive viajando. Há uma notícia no site do CIR de que, no dia 28 de fevereiro de 2007, a advogada Joênia estava em Washington, na Organização dos Estados Americanos (OEA), para denunciar o Brasil, e foi paga com dinheiro do CIR e, portanto, com dinheiro do Governo brasileiro.

Na OEA, também esteve presente, em audiência, um grupo de pessoas ligadas ao CIR. A Organização das Nações Unidas (ONU) já recebeu denúncia feita pelo CIR contra o Brasil. Essas entidades são mantidas com dinheiro público, com dinheiro dos brasileiros, numa região de fronteira com a Venezuela e com a Guiana, preparando, portanto, todo o ingrediente, porque, se valer essa demarcação de área contínua e a expulsão, o desterramento das cerca de 400 famílias que moram lá... Novamente, aqui, essas ONGs distorcem e dizem apenas que a questão é relativa a um grupo de arrozeiros contra os índios, o que é mentira. Por isso, quero que a Comissão de V. Exª os ouça. Na verdade, existem cerca de 400 famílias que vivem lá há mais de cem anos. Aliás, os antepassados desses índios, a grande maioria deles, Senador Paim, vieram do Caribe para o Brasil, expulsos pelos espanhóis, e se erradicaram por ali, em torno das vilas e das propriedades que se formavam, em busca de trabalho e de sobrevivência. Inclusive, lá não é uma região de caça e de pesca, não; é uma região montanhosa e de campos naturais. Até a caça e a pesca não existem. Então, eles, hoje, são os maiores criadores de gado existentes em Roraima. E de onde veio o gado? Parte do Governo do Estado, parte da Igreja Católica. É uma realidade.

Trouxe aqui outra coincidência, Senador Paulo Paim. Poucos dias depois que o Presidente Lula demarcou a região Raposa Serra do Sol, aquela entidade que se diz parceira do CIR fez um ofício à Funai, Senador Mão Santa, nos seguintes termos, dirigido à direção da Funai:

Assunto: Ingresso de Terra Indígena.

Cumprimentando-o, vimos informar sobre a solicitação da autorização para ingresso nas terras indígenas Raposa/Serra do Sol e Anaro [uma outra, Senador Mão Santa, que estão demarcando; ainda não a demarcaram, mas já vão entrar lá], por parte de Cecilia Iorio, Gerente, no Brasil, da Organização Oficial de Cooperação da Igreja Católica da Inglaterra, denominada Cafod, em nome de Anna Marie Hanlori, Anthony Joseph Sheen, Christine Lappine, Simon Giarchi e Louise Victoria Etheridge [todos estrangeiros, pertencentes a uma ONG estrangeira; até nem pronuncio direito o nome deles, mas a Funai deu-lhes autorização para eles entrarem], com o objetivo de conhecer alguns povos indígenas e o trabalho do CIR, com quem estão estabelecendo parceria, conforme correspondência encaminhada ao Presidente da Funai e à Coordenação-Geral de Estudos e Pesquisas, datada de 07/09/2006 (cópia em anexo).

Aqui está o documento.

A Cafod, criada em 1962, é a organização oficial de cooperação da Igreja Católica da Inglaterra e do País de Gales. Cafod apóia projetos de desenvolvimento em vários países de três continentes: Ásia, África e América Latina. O apoio da Cafod contempla grupos de base, comunidades indígenas, rurais e urbanas que, através de suas organizações, buscam ter acesso a direitos e melhorar seus níveis de vida.

Especificamente, diz: ”Solicitamos ainda que o CIR seja consultado a respeito da presente solicitação para os encaminhamentos devidos”. Quer dizer, um ofício dirigido à Funai pede que aquela Fundação consulte o CIR a respeito da presente solicitação para os encaminhamentos devidos: “Para quaisquer dúvidas e esclarecimentos, indicamos o assessor Luciano Padrão, para que preste informações necessárias (...) Em anexo à programação da visita.”.

Então, vejam: as instituições, as ONGs, já estão lá dentro. Quando presidi a primeira CPI das ONGs aqui, Senador Mão Santa, havia uma organização italiana chamada Associação Amazônia, que “comprou”, lá no sul do meu Estado, de ribeirinhos, o título de propriedade de uma área equivalente a 175 mil hectares no meu Estado e criou uma associação. E o que ela faz? Turismo, sem dar satisfação ao Governo brasileiro, além de exploração das riquezas e biopirataria. Não conseguimos ouvir o dirigente dessa associação, a Associação Amazônia, que tem sede na Itália; ele é até um conde.

Mas, com relação à ONG Cafod, que é uma agência da Igreja Católica da Inglaterra, só em 2006, Senador Mão Santa, ela destinou ao Brasil R$2.235.774,00, inclusive para projeto numa reserva indígena ianomâmi lá no meu Estado - está aqui a foto do cacique Davi, ianomâmi, que vive viajando, por sinal, para cima e para baixo, está sempre na ONU e na OEA denunciando o Brasil.

Então, quero mostrar que, na verdade, o que existe nessa questão, Senador Paim e Senador Mão Santa, é muito interesse escuso, muito interesse que nada tem a ver com os interesses nacionais. Nada há de preocupação real com a pessoa do índio, com a qualidade da pessoa do índio; nada há de preocupação com a saúde, com a educação, com o desenvolvimento, mesmo que seja ao modo que eles queiram, e, no caso dessa região, todos eles...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mozarildo,...

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Em seguida, dou o aparte a V. Exª.

Todos eles são perfeitamente miscigenados. O Vice-Prefeito de um dos Municípios atingidos, que é o de Pacaraima, é um índio; a Prefeita do Município de Uiramutã, que está no miolo dessa reserva, é neta de índio - seu Vice-Prefeito é um índio; o Prefeito de Normandia, que está na outra ponta da Reserva, é um índio; vários Vereadores são índios; outros índios são policiais militares, funcionários públicos, pequenos empresários, comerciantes, produtores etc. Eles não querem essa demarcação, que quer transformá-los num retrocesso.

O Ministro Márcio Thomaz Bastos fez uma molecagem com o Supremo Tribunal Federal (STF) quando revogou uma portaria contra a qual existiam várias ações, para que elas perdessem o objeto, e editou outra no mesmo dia, com base no mesmo laudo antropológico, que, por sinal, é falso, é criminoso, não pode servir para gerar direitos. Agora, o Ministro Tarso Genro é o gauchão bravo da parada, o xerife, que nunca foi a Roraima discutir esse problema nem conversar com ninguém, mas que foi para lá prender o Prefeito do Município de Pacaraima, que agora a Justiça libertou. Não estou aqui defendendo o modo de fazer ou de não fazer do Sr. Paulo César. Reconheço nele um homem trabalhador. Ele foi do Rio Grande do Sul para Roraima com recursos próprios, investiu, casou com um mulher de Roraima, tem seus filhos lá, trabalha lá, não vive à custa do Governo, foi eleito Prefeito com a votação dos índios, porque, no Município em que ele foi eleito, a maioria é índio. No entanto, lá está se dizendo, ao modelo da Inquisição de antigamente, que quem não é índio é morador de uma propriedade pequena.

Repito: há mais de 400 famílias; multiplicando isso por cinco, pelo menos, são mais de duas mil pessoas que o Governo brasileiro quer desterrar daquela região. E se está ocupando, militarmente - a Polícia Federal mais a Força Nacional -, aquela região. Até acho que isso se justifica, para não haver exagero. Mas eles não podem fazer nada contra, por exemplo, os índios do CIR, lamentavelmente, que ou invadem as propriedades de todo mundo, tanto as casas nas vilas, quanto as propriedades pequenas e as fazendas de arroz, ou bloqueiam as estradas, para não sair a produção de arroz.

Temos de colocar ordem naquilo. Lamento que o Presidente Lula não tenha autoridade e conte com um Ministro que é descompensado. Eu o chamo de “Ministro da injustiça”. É homem desqualificado para exercer o papel de Ministro da Justiça, cargo que exige serenidade, seriedade e capacidade de observar o direito de todos, não os direitos de apenas um lado. Se toma posição, não pode ser Ministro da Justiça.

Senador Mão Santa, com muito prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mozarildo, atentai bem, penso - e o Paulo Paim está aí - que tudo é desrespeito à lei e à Constituição. Nossa Constituição foi beijada por Ulisses Guimarães em 5 de outubro de 1988. E ele disse que desobedecer à Constituição é rasgar a Bandeira do Brasil. Já vimos isso dar certo. Veja o que diz a Constituição:

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

...

XVI - autorizar a demarcação de terras indígenas, bem como a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais em seu interior;

XVII - aprovar, previamente, a alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares.

Atentai bem! Território passou a Estado, e Estado tem Governador. O Luiz Inácio tem de compreender que esse problema tem de ser resolvido pelo Governador do Estado. Darei um exemplo muito claro. No Piauí, não há índio. Um tal de Domingos Jorge Velho, um português, matou os índios. Na minha região, havia os Tremembés, uns índios louros, de quem acho que sou descendente. Mas há quilombo. Governei o Estado do Piauí e dirigi os quilombos no amor, porque são próximos, na cidade de Porto, e o Prefeito era Dó Bacelar. Convivi com os quilombos, em Amarante. E há um lugar mais distante, Assunção. Quem administrava e convivia com eles era Adalgisinha, que tomava conta deles. Então, o Governador está próximo, nasceu do povo e do voto, como o Luiz Inácio. Esse fato de o Ministro da Justiça ir lá sem o acompanhamento do Governador do Estado é um desrespeito maior. E aí está: um erro atrás do outro. A meu ver, isso deveria estar aqui. O que significa isso? No começo do mês, irei à Suíça, Genebra - eu e o Senador Dornelles -, representar esta Casa, o Direito Internacional. Nessa área, dá para colocar 40 Suíças dentro. A Suíça é a capital universal do direito, do respeito e da convivência. É uma área muito grande. Isso tinha de ser discutido aqui, e, obviamente, todos tínhamos de seguir V. Exª, porque, como se diz, V. Exª nasceu lá, vive lá e sabe a história. É assim que funciona a democracia: poderes eqüipotentes. E um dos construtores dessa democracia é Franklin Delano Roosevelt, que, no momento mais difícil, quando estavam voltando os totalitaristas Hitler e Mussolini, deu um ensinamento que passo de bandeja ao Luiz Inácio. Acho que eu o ajudo mais. Franklin Delano Roosevelt foi quatro vezes Presidente dos Estados Unidos, que estavam em guerra, e disse: “Toda pessoa que vejo é superior a mim em determinado assunto, e, nesse particular, procuro aprender”. Mostrou humildade. Então, todos nós nos curvamos a V. Exª, que nasceu lá. Se se queria falar dos quilombos do Piauí, da história dos mascates, eu é que saberia contar, ou o Heráclito ou o João Claudino. Os quilombos é o mesmo fenômeno. Aliás, acho que já evoluímos para isso tudo. Lá no Piauí, há três. É o mesmo problema. É o mesmo respeito que temos de dar. Em Porto, o Prefeito era Dó Bacelar. Em Amarante, nasceu nosso poeta Costa e Silva, que disse “Piauí, terra querida, filha do sol do Equador” e que nem entrou no Itamaraty. Tirou primeiro lugar, mas o Barão do Rio Branco disse que ele parecia um macaco e que não iria colocá-lo ali. Ele era descendente de negro. Convivi com eles quando era Governador do Estado, mas na boa: almoçava com eles e com o Prefeito. Em Amarante, tenho amigos íntimos. Adalgisa tomava conta dos outros quilombos mais distantes, porque o Piauí é grande. Mas, nessas terras dos índios, cabem oito Piauís lá dentro. É isso. O Presidente Luiz Inácio deveria ter a humildade de Franklin Delano Roosevelt e chamar V. Exª, o que seria uma solução sábia.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Mão Santa, primeiro, agradeço o aparte a V. Exª, sempre generoso. Como ex-Governador de um Estado, reconhece esse drama.

A ida do Ministro da Justiça a Roraima sem a presença do Governador é uma intervenção federal no Estado. Foi lá determinar, inclusive, a prisão de pessoas. Eu o considero, realmente, uma pessoa não isenta para estar no Ministério da Justiça, até porque expressa seu ponto de vista a respeito das coisas. É um ideólogo, e um ideólogo não pode ser Ministro da Justiça.

Senador Paulo Paim, para finalizar, quero dizer que a questão está no Supremo. Confio plenamente que o Supremo encontrará todas as falcatruas feitas nessa demarcação. Vai analisar o laudo antropológico, que é falso, é mentiroso. A Justiça Federal de Roraima, por meio do Juiz Hélder Girão e de uma comissão de peritos, detectou todas as falsidades. Isso nos alerta para o fato de como foram feitas as outras demarcações. São todas elas também fraudulentas? É um grande e importante aviso.

Em segundo lugar, por que o Presidente Lula, por intermédio do então Deputado Aldo Rebelo, Líder do Governo na Câmara dos Deputados, no Congresso, sugeriu que criássemos uma Comissão Temporária Externa no Senado e outra na Câmara para encontrar uma fórmula factível, que chegasse a um consenso, que não agredisse, que pacificasse? Formamos, em 2003, essa Comissão Temporária Externa. Seu Relator no Senado foi o Senador Delcídio Amaral. Apresentamos ao Presidente Lula a proposta que, em resumos matemáticos, era o seguinte: retirar desses 1,74 milhão de hectares demarcados 320 mil hectares. Isso resolveria o problema, mas, não, como houve radicalização do Conselho Indígena de Roraima e do Conselho Indígena Missionário e pressão de ONGs parceiras deles, o Presidente Lula preferiu demarcar como eles queriam.

O alerta feito em 1996 pela revista IstoÉ está se comprovando agora, em 2008. Mas o Supremo, com certeza, saberá muito bem analisar todos os detalhes. Existe a proposta da Comissão Temporária Externa do Senado, a da Comissão Temporária Externa da Câmara, o relatório do Ministro Nelson Jobim, que foi fraudado no Ministério da Justiça e que fez com que o Ministro Renan cometesse um equívoco. Há ainda a maracutaia feita pelo Ministro Márcio Thomaz Bastos. Tudo isso o Supremo vai analisar, com certeza.

Mas, Senador Mão Santa, com relação a vir para o Senado, tenho uma emenda à Constituição, de 1999, que propõe que toda demarcação de terra indígena e de reserva ecológica passe pela apreciação do Senado. Na prática, o que representa demarcar uma reserva indígena, uma unidade de conservação, seja ela qual for? Retirar terras de um Estado membro da Federação para o Governo Federal. Ora, então, o Senado tem de se pronunciar a respeito. Nós nos pronunciamos sobre concessão de rádio, sobre concessão de televisão, sobre nomeação de embaixador, de presidente de Banco Central e de dirigente de agência reguladora e não nos pronunciamos sobre demarcação de terras indígenas e de reservas ecológicas, em que se retiram terras do nosso Estado! Meu Estado, Senador Mão Santa, tem apenas 8% de terras que não são federais. Todas as outras são federais: 57% são de indígenas, e 38%, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), restando para o Estado cerca de 8% a 10%. Com certeza, esse conflito federativo o Supremo vai resolver.

Minha emenda à Constituição, que agora vamos retomar, e espero o apoio de V. Exªs, vai simplesmente fazer com que essas decisões passem pelo Senado, para que as analisemos aqui, não apenas pelas mãos de uma meia dúzia de burocratas, sejam eles quem forem, antropólogos ou não. Um burocrata dá um laudo, outro burocrata do Ministério da Justiça faz uma portaria, o Ministro a assina, o Presidente assina o decreto, e pronto! E o Congresso Nacional, o Senado Federal não é sequer chamado.

Então, quero finalizar, agradecendo à imprensa brasileira, que, realmente, tem dado cobertura isenta sobre essa questão. Agradeço, especialmente, à Rede Globo, que fez uma cobertura de três dias seguidos no Jornal da Globo; à Globo News; à Bandeirantes; à Record. Agora, estão mostrando para todo o País uma realidade que eu vinha denunciando desde 1996 e na qual vinha trabalhando, aqui no Senado, desde 2003.

Senador Mão santa, finalmente, quero dizer que fui Presidente da primeira CPI das ONGs e vi o quanto é difícil abrir essa caixa-preta - o Presidente Lula gosta de falar em “caixa-preta” - das ONGs. Está aí essa outra CPI das ONGs! Não se consegue avançar, porque a maioria do Governo não deixa investigar as ONGs. Por quê? Porque essa caixa-preta financia muita coisa neste País: campanha política, partido, movimentos sociais. Então, não se pode abrir essa caixa-preta. Mas o Tribunal de Contas está trabalhando muito seriamente nisso.

Quero fazer um apelo ao Ministério Público, tanto estadual quanto federal, para que se debruce sobre isso, que é a maior das corrupções que se praticam no País. É pegar dinheiro público. Noventa por cento delas nada têm a ver com organizações não-governamentais, pois vivem à custa do dinheiro do Governo, portanto, do dinheiro do povo, para desviar e roubar.

Quero, portanto, Senador Paim, concluir, pedindo a transcrição das matérias aqui referidas e também dizer a V. Exª que, realmente, encaminharei, na segunda-feira ou terça-feira, um requerimento à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, que V. Exª preside.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - A Comissão vai-se reunir na quarta-feira, pela manhã.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Não sei se vai dar tempo de deslocar as pessoas para quarta-feira. Mas, na quarta-feira, será aprovado o requerimento.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Na quarta-feira, pela manhã, aprovaremos o requerimento.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Perfeito.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Aí marcamos a data, conforme a conversa que faremos.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Perfeito. Acho isso importante, porque V. Exª e os membros da Comissão terão oportunidade de ouvir os índios que não são do CIR, os índios que são da Sodiur, da Alidecir, da Arikon. Terão a oportunidade de ouvir a associação dos excluídos dessa reserva, mas também os arrozeiros, que são brasileiros que pagam impostos, produzem e são importantes para Roraima.

Então, tenho a certeza de que V. Exª colocará em votação na quarta-feira esse requerimento que lhe será encaminhado. Marcaremos a data.

         Espero que possamos passar dessa página triste para Roraima, para as pessoas de lá e, especialmente, para o Brasil para uma página que seja escrita por nós e pelo Supremo, de maneira digna.

Muito obrigado.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“O piedoso padre Giorgio Dal Bem” - Última Hora.

“OEA mantém recomendações ao Estado Brasileiro” - Anexo 2.

“Raposa Serra do Sol será tema de debate na ONU amanhã” - Anexo 3.

CAFOD.

“Raposa Serra do Sol em pauta na OEA” - Anexo 1.

Tabela dos recursos recebidos pelo CIR.

“Organização indígena começou na década de 70” - CIR.

“Parceiros do CIR”.

“CAFOD: quem somos” e anexos.

“Roraima em pé de guerra” - Istoé Online.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2008 - Página 14830