Discurso durante a 92ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem aos 200 anos da Imprensa Brasileira e a seu Patrono, Hipólito José da Costa.

Autor
Romeu Tuma (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. IMPRENSA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Homenagem aos 200 anos da Imprensa Brasileira e a seu Patrono, Hipólito José da Costa.
Publicação
Publicação no DSF de 04/06/2008 - Página 17848
Assunto
Outros > HOMENAGEM. IMPRENSA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, IMPRENSA, BRASIL, OPORTUNIDADE, SAUDAÇÃO, HIPOLITO JOSE DA COSTA, CRIADOR, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, PERIODO, EXILIO, PAIS ESTRANGEIRO, GRÃ-BRETANHA, PRETENSÃO, CONDENAÇÃO, DEFEITO, ADMINISTRAÇÃO.
  • COMENTARIO, HISTORIA, VIDA, HIPOLITO JOSE DA COSTA, JORNALISTA, EMPENHO, GARANTIA, LIBERDADE DE IMPRENSA.
  • HOMENAGEM, JORNALISTA, JORNAL, TELEVISÃO, AGENCIA DE NOTICIAS, SENADO.
  • COMENTARIO, GESTÃO, ORADOR, DIREÇÃO, POLICIA ESPECIAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GARANTIA, LIBERDADE DE IMPRENSA.
  • ADVERTENCIA, IMPOSSIBILIDADE, UTILIZAÇÃO, PODER DE POLICIA, AMEAÇA, VIOLENCIA, IMPRENSA, ESPECIFICAÇÃO, OCORRENCIA, SEQUESTRO, JORNALISTA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), TENTATIVA, IMPEDIMENTO, DIVULGAÇÃO, SITUAÇÃO, TRAFICO, DROGA, EXTORSÃO, RESTRIÇÃO, LIBERDADE DE IMPRENSA.

O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, ilustre Senador Pedro Simon, primeiro signatário do pedido desta sessão solene, tão importante para o País, em homenagem à imprensa e ao seu criador, o jornalista Hipólito; Dr. Paulo Tonet Camargo, Diretor do Comitê de Relações Governamentais da Associação Nacional de Jornais; e nosso amigo Roberto Wagner Monteiro, Presidente do Conselho Superior da Abratel - Associação Brasileira de Radiodifusão, Tecnologia e Telecomunicações, é muito difícil contentar todos ao instituir-se a data comemorativa de algum acontecimento histórico. O dia 1º de junho, por exemplo, provocou discussões durante mais de uma década até encontrar aceitação inconteste como Dia da Imprensa Brasileira. Mesmo assim, ainda hoje existe quem prefira a data anterior, estabelecida para lembrar o dia 10 de setembro de 1808, quando D. João VI criou a Gazeta do Rio de Janeiro, órgão de divulgação oficial do governo português em solo brasileiro.

Tal não aconteceu na escolha de Hipólito José da Costa como Patrono da nossa imprensa. Sua posição permaneceu imune à polêmica, tamanha a proeminência desse insigne brasileiro em arrojo e trabalho para conseguir, a 1º de junho daquele ano, durante exílio na Inglaterra, lançar o jornal Correio Braziliense. Quero, por isso, felicitar o nobre Senador Pedro Simon pela iniciativa de nos proporcionar esta sessão especial, em que o Senado da República reverencia o bicentenário da imprensa verde-amarela e seu Patrono.

Graças a Hipólito José da Costa, surgiu realmente um órgão em português com feição e conteúdo que podemos aceitar como jornalísticos. Até no logotipo afirmava a brasilidade, apesar de editado e impresso noutra nação.

Por sua vez, a Gazeta do Rio de Janeiro, nascida em função dos desígnios da Coroa, limitava-se a “noticiar” natalícios, odes e panegíricos da família reinante, assim como “o estado de saúde de todos os príncipes da Europa”. No mais, divulgava éditos do rei e coisas que tais. Um autêntico panfleto oficial.

Ao mesmo tempo, embora destinado a ser “doutrinário muito mais do que informativo”, como disse o fundador, o Correio Braziliense seguia a linha editorial fixada em sua criação para reprovar “os defeitos da administração do Brasil”.

Srªs e Srs. Senadores, história que muda não faz parte da verdadeira História. O fato histórico, límpido e imutável, quase sempre contraria versões que se revezam ao sabor de interesses do momento.

Assim, seria ousadia minha - por sinal descabida - querer acrescentar alguma versão pessoal ao que os meus antecessores nesta tribuna já disseram com total propriedade. Vimos aqui Cristovam Buarque, por exemplo, envolver a educação na formação da cultura brasileira e o apoio que a imprensa pode dar, e o Presidente Garibaldi Alves, em um protesto contra a escravidão do Parlamento às medidas provisórias; o Parlamento tem dificuldade de cumprir sua missão constitucional de legislar por impedimento do excesso de medidas provisórias. Então eles conseguem contornar a importância da imprensa na participação efetiva da visão do interesse da população brasileira. Todavia, tenho a esperança de poder ressaltar um ou outro aspecto de suas falas para reafirmar isso.

Seguindo os próprios sentimentos, Hipólito José da Costa intitulou de “Braziliense” o Correio, que louvamos como primeiro jornal brasileiro 200 anos depois. Circulava mensalmente no Brasil e em Portugal, a salvo das forças que haviam encarcerado o seu criador por mais de três anos em Lisboa devido apenas a ocupar posição de destaque na Maçonaria, então um dos alvos prediletos da Inquisição.

Mas nem D. João VI privou-se de ler suas críticas, que tomava por “conselhos”, segundo registram nossos livros de História. E assim mesmo deve ter sido, pois temos visto reações iguais entre governantes de diferentes matizes políticos, porém, prudentes. Preferem absorver idéias novas e receber informações isentas a sufocá-las. Ainda mais se quiserem exercer o poder em moldes verdadeiramente democráticos.

Esta festa do Senado tem legítimo sabor gaúcho. Afinal, Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça carreava em si o espírito indômito dos pampas por ser natural de Sacramento, a antiga colônia portuguesa depois absorvida pela República Oriental do Uruguai.

Nasceu em 13 de agosto de 1774 e faleceu em Londres a 11 de setembro de 1823. Uma vida breve, mas que lhe permitiu, em apenas 49 anos, realizar projetos ainda estudados e cada vez mais admirados dois séculos depois.

Fez os primeiros estudos na porção de solo rio-grandense-do-sul onde hoje se localiza Pelotas. Em 1798, formou-se pela Universidade de Coimbra (Portugal) em Ciências Naturais, Direito e Filosofia. Tamanho gabarito intelectual fê-lo ser designado pelo Ministro da Marinha e Ultramar de Portugal, D. Rodrigo Domingos de Souza, para sua primeira missão no exterior, que resultou no livro “Diário de Minha Viagem para Filadélfia (1798 -1799)”, completo estudo dos usos, costumes e estrutura socioeconômica dos Estados Unidos da América. Nessa viagem, tornou-se admirador da “liberdade de imprensa”, isto é, da franquia para veicular quaisquer idéias e informações por meio de impressos.

Além disso, o ingresso na Maçonaria robusteceu-lhe o senso, até então empírico, da prevalência do espírito sobre a matéria, bem como a conduta inflexível em direção à liberdade, igualdade e fraternidade, fins supremos dessa fraternidade filosófica, à qual o Brasil tanto deve. Mas, quando exercia a administração da Imprensa Real Portuguesa, sua condição de maçom acabou descoberta. Em 1802, valeu-lhe a ira do Santo Ofício. Preso, evadiu-se do cárcere para exilar-se em Londres, onde se pôs a comerciar para sobreviver e a escrever preciosas obras literárias para satisfazer sua incomum inteligência. Também daí veio o empenho em criar uma imprensa livre, em língua portuguesa, a partir do Correio Braziliense que circulou até dezembro de 1822.

Parece até que o Jornal aguardou a concretização do sonho de 7 de Setembro para poder desaparecer em paz. No editorial da penúltima edição, comemorou a proclamação de um Brasil “independente e unido”.

Os despojos de Hipólito José da Costa repousam na Igreja de Santa Maria de Hurley, no Condado de Berckshire, Inglaterra. As inscrições apostas à tumba elidem qualquer dúvida que possa ter quem ali comparece com o intuito de cultuar o jornalista que nos legou o ideal de uma imprensa tão independente quanto o seu País.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no momento em que comemoramos o bicentenário da Imprensa Brasileira e reverenciamos o seu Patrono, quero focalizar minha homenagem a todos os jornalistas que militam no Jornal, na TV e na Agência noticiosa desta Casa e da imprensa geral do Brasil.

Sr. Presidente, antes de finalizar, eu queria dizer que pedi ao Líder do PTB para usar da palavra hoje. Por quê? Porque se trata de um agradecimento de ordem pessoal da minha vida profissional.

Durante quase 50 anos, militei numa profissão em que era difícil ser um vencedor: a segurança pública. Momentos difíceis se passaram neste País durante o período em que dirigi um órgão policial na cidade de São Paulo. A primeira coisa que fiz quando assumi a direção foi tirar as grades e abrir as portas que impediam a imprensa de acessar o departamento para, na busca da verdade, informar à população o que realmente acontecia naqueles tempos. Não me arrependo nunca. Jamais poderia me arrepender por saber que uma imprensa livre dedicada à busca da verdade traz à sociedade brasileira uma tranqüilidade maior.

Recebi uma vez uma missão de relatar um projeto que inibia, proibia a fala de autoridades e dificultava o acesso da imprensa à realidade de fatos que estavam sendo apurados. Fui à televisão e à rádio e disse que proporia o voto contra aquilo. Fui substituído na relatoria. Não podia aceitar, em hipótese alguma, que alguém, por qualquer motivo, pudesse impedir a liberdade de imprensa que tanto nos ajudou em momentos difíceis desta Nação.

E hoje, mais do que nunca, provavelmente a imprensa se encontre angustiada. E a OAB aqui representada também, pelo fato ocorrido recentemente. Tivemos o lançamento pelo Presidente Lula, no Morro do Alemão, no Rio de Janeiro, do PAC visando a melhoria da situação da população local, a exemplo do que se fez na Colômbia, quando se descobriu que o social é muito mais importante que uma repressão permanente; e a vigilância, sim - aqui temos representantes da Polícia Militar que nos honra com sua presença -, pois sabemos da importância de se manter a tranqüilidade e a segurança da população. Mas não podemos aceitar, em hipótese alguma, que entes públicos seqüestrem jornalistas para, através da violência, do medo e da ameaça, silenciá-los na apuração de fatos que possam trazer à sociedade a verdade do que está ocorrendo em alguns lugares, principalmente quando se trata do tráfico de drogas, da extorsão, da violência e daquilo que nenhum cidadão brasileiro pode aceitar. Não faço como protesto, faço como alerta aos meus companheiros de Polícia.

Temos que nos unir para respeitar a sociedade. É dela e em nome dela que vivemos, é para ela que precisamos existir para proteger os seus direitos e seus bens. Não podemos nos servir do poder de polícia para ameaçar, violentar a segurança daqueles que precisamos, que é uma imprensa livre, correta e que tem a dignidade naquilo que escreve, naquilo que fala, naquilo que televisiona.

Que Deus proteja este País e que a imprensa permaneça constantemente livre em busca da verdade.

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/06/2008 - Página 17848