Discurso durante a 95ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo à Câmara dos Deputados em favor da apreciação da Proposta de Emenda à Constituição 524, de 2002, que institui o Fundo para Revitalização Hidroambiental e Desenvolvimento Sustentável da Bacia do Rio São Francisco. Comentários ao pronunciamento do Deputado Federal Rodrigo Rollemberg, sob a denominação "Águas, alimentos e energia: as perspectivas do Brasil".

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Apelo à Câmara dos Deputados em favor da apreciação da Proposta de Emenda à Constituição 524, de 2002, que institui o Fundo para Revitalização Hidroambiental e Desenvolvimento Sustentável da Bacia do Rio São Francisco. Comentários ao pronunciamento do Deputado Federal Rodrigo Rollemberg, sob a denominação "Águas, alimentos e energia: as perspectivas do Brasil".
Publicação
Publicação no DSF de 06/06/2008 - Página 18614
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • OPORTUNIDADE, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, MEIO AMBIENTE, REGISTRO, REQUERIMENTO, SENADOR, SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE, CAMARA DOS DEPUTADOS, PRIORIDADE, TRAMITAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, UNANIMIDADE, APROVAÇÃO, SENADO, CRIAÇÃO, FUNDO ESPECIAL, RECUPERAÇÃO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, BACIA DO RIO SÃO FRANCISCO.
  • COMENTARIO, PRONUNCIAMENTO, DEPUTADO FEDERAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO (PSB), PUBLICAÇÃO, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), CONCLAMAÇÃO, ATENÇÃO, GESTÃO, RECURSOS HIDRICOS, BRASIL, PREVENÇÃO, CRISE, FALTA, ALIMENTOS, ENERGIA.
  • COMENTARIO, DISCURSO, SECRETARIO GERAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), FORO, ECONOMIA, RISCOS, CONFLITO, RECURSOS HIDRICOS, DECLARAÇÃO, ESPECIALISTA, NECESSIDADE, SANEAMENTO, OBJETIVO, ERRADICAÇÃO, POBREZA, FOME, REGISTRO, DADOS, MORTALIDADE INFANTIL, DOENÇA TRANSMISSIVEL, BRASIL, MUNDO, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • QUESTIONAMENTO, MODELO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, EXCESSO, PERDA, AGUA, ENERGIA, IMPORTANCIA, DEBATE, ALTERNATIVA, COBRANÇA, POLITICA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, ESGOTO, AGUA POTAVEL.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aproveito o ensejo da comemoração do Dia do Meio Ambiente para tratar de dois assuntos. Primeiro: de um requerimento, assinado por vários Senadores das mais diversas regiões de nosso País, pedindo ao Presidente da Câmara dos Deputados prioridade para a tramitação da Emenda Constitucional nº 524, de 2002, de nossa autoria, que acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e institui o Fundo para Revitalização Hidroambiental e Desenvolvimento Sustentável da Bacia do Rio São Francisco. Ou seja, é a chamada PEC da Revitalização, que concede recursos certos e determinados, durante 20 anos, para a completa restauração do curso do rio São Francisco, a construção das matas ciliares, as obras de saneamento básico e, enfim, o desenvolvimento sustentável na bacia do rio São Francisco.

Esse projeto, Sr. Presidente, essa PEC, essa proposta de emenda constitucional, é da mais alta importância, visto que os Senadores já se manifestaram, aprovando-a por unanimidade. Aconteceram na Câmara dos Deputados, nas Comissões competentes, na Comissão Especial e na Comissão de Justiça, votações unânimes, o que comprova a importância dessa proposta que nós estamos trazendo à lembrança da Câmara dos Deputados no Dia Mundial do Meio Ambiente.

Sr. Presidente, o Deputado Federal Rodrigo Rollemberg, há poucos dias, fez um pronunciamento que foi publicado, inclusive, no jornal Correio Braziliense sob a denominação “Águas, alimentos e energia: as perspectivas do Brasil”. Foi um artigo que repercutiu na Câmara dos Deputados e na imprensa de Brasília, como também no site do próprio PSB, Partido Socialista Brasileiro.

Aqui nós não só estamos registrando a importância desse pronunciamento como contribuindo para, num gesto de complementação, apresentar as nossas preocupações sobre o risco do estresse hídrico nas nossas cidades e sobre a necessidade de mais atenção para o problema da água.

Concordo plenamente com a tese do Deputado Federal - nosso companheiro do PSB - Rodrigo Rollemberg de que é urgente o impulso do Governo à produção de alimentos e também o apoio a alternativas energéticas limpas como o etanol, além da defesa do uso sustentável da água.

No meu entendimento, Sr. Presidente, se não cuidarmos desses bens, em especial da água e da questão dos alimentos, com toda a certeza marcharemos para graves crises sociais. Poderemos ter em grande escala verdadeiras rebeliões sociais por alimentos e guerras pela água. Esse processo já começou. Mês passado já assistimos a levantes populares em vários cantos do mundo por conta da “inflação dos alimentos”.

Portanto, temos de começar rapidamente a reagir. Como os senhores sabem, venho retomando esse tema em vários pronunciamentos, assim como o dos alimentos. Venho defendendo uma reforma tributária que, entre outras coisas, desonere a cesta básica ao mesmo tempo em que sejam tomadas medidas de apoio creditício e técnico ao pequeno e médio produtor rural, aquele que abastece as nossas cidades.

Mas quero, em particular, chamar a atenção para o problema da água, em especial porque, neste ano de 2008, temos o Ano Internacional do Saneamento e porque hoje é o Dia Mundial do Meio Ambiente. E quero começar relembrando que, em janeiro deste ano, em Davos, na Suíça, quando todos esperavam que o Secretário da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, falasse da crise da economia global, no Fórum Econômico Mundial, ele surpreendeu todo o mundo chamando a atenção para a crise da água, para a crescente escassez desse bem. Ou seja, em pleno Davos, em pleno Fórum Econômico Mundial, o líder de todas as nações chamou a atenção de todos, governantes e homens de negócio, para o problema da água.

Discursando diante dos magnatas dos negócios, o Secretário-Geral da ONU alertou que “a falta de recursos hídricos pode agravar e iniciar conflitos” e continuou argumentando “à medida que a economia cresce, se torna mais sedenta”, aumenta a crise global da água.

Os dados não enganam ninguém. Uma autoridade no assunto, como Anders Berntell, Diretor-Executivo do Instituto Internacional da Água, com sede em Estocolmo, colocou o dedo na ferida ao fazer o seu diagnóstico e chamar por políticas públicas contra a pobreza e a fome. Em suas palavras, nós temos uma crise de manejo da água. Por isso mesmo, ele argumentou que não se trata de uma crise “da água propriamente dita”, mas da “ausência crônica de fundos e incompreensão de que é preciso saneamento e higiene em nível local”.

Esse especialista propôs a solução, ao argumentar que esse problema pode ser “resolvido com a melhoria do gerenciamento, aumento dos recursos e sustentação dos esforços para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio”, como erradicar a pobreza extrema e a fome e adequar a provisão de água e esgoto. Portanto, por intermédio de políticas públicas mais agressivas.

Os números mundiais, Sr. Presidente, são chocantes. Daí o seu argumento contundente: a carência de água potável para mais de um bilhão de pessoas e de saneamento para mais de 2,5 bilhões constitui “uma devastadora crise humanitária”.

Para que se tenha uma idéia, Sr. Presidente, somente a diarréia, segundo dados da Organização das Nações Unidas, ONU, mata quatro milhões de crianças a cada ano. Quatro milhões de crianças a cada ano! E essa crise, se é grave no nosso Continente, passou a ser grave também em outras regiões do mundo, como o Leste Europeu, depois do fim das economias planificadas.

Um estudo divulgado pela ONU, às vésperas do Dia Mundial da Água, celebrado no dia 22 de março, afirma que a escassez ameaça mais de 100 milhões de europeus. Quase 40 meninos e meninas morrem por dia, a maioria da Europa Oriental, vítimas de uma doença ligada à água, a diarréia. No Leste Europeu, quase 16% da população não tem água potável em casa. E nas zonas rurais mais da metade dos habitantes vive sem ela e sem saneamento.

Sr. Presidente, o quadro de saneamento básico e de crise hídrica é bem pior na América Latina. Ora, sem saneamento e com má qualidade da água ou sua escassez aumentam as doenças. Em todo o mundo há uma clara relação inversa entre a mortalidade infantil e o grau de acesso à água limpa. A água contaminada não tratada é veículo para muitas doenças.

A realidade no meu Nordeste não deixa margem a dúvidas. No Brasil, basta que façamos uma comparação entre as diferentes regiões, como ocorre na região mais pobre, o Nordeste, que tem também a menor proporção de domicílios com acesso à água tratada.

Existem atualmente no Brasil, Sr. Presidente, 10,2 milhões de domicílios que não têm serviço de abastecimento de água e aproximadamente 11,5 milhões que não possuem serviço de coleta de esgoto ou fossa séptica. 

De acordo com a Agência Nacional de Águas, apenas 20% do volume de esgoto coletado passam por uma estação de tratamento. E onde é que esse déficit de água tratada vai aparecer, Sr. Presidente? Nas doenças, nas internações, nos óbitos hospitalares, no sofrimento dos mais pobres e pequenos, dos grupos humanos mais vulneráveis.

Precisamos de políticas voltadas para as regiões mais problemáticas, para as regiões que são vítimas do estresse hídrico. Seis Estados brasileiros já se encontram em situação de estresse hídrico periódico e regular e quatro Estados são vulneráveis, enfrentando ocasionalmente falta d’água.

Este conceito, estresse hídrico, baseia-se nas necessidades mínimas de consumo per capita para manter a qualidade de vida adequada em regiões moderadamente desenvolvidas.

Considerando a disponibilidade hídrica daqueles dez Estados e somente a perspectiva de aumento populacional apresentada pelo IBGE, conclui-se que a situação tende a piorar de forma considerável, no médio prazo.

O desafio, Sr. Presidente, que temos é, portanto, colossal, principalmente se levarmos em conta que temos diante de nós um problema grave e planetário, criado pelo capitalismo globalizado da mudança climática.

O tempo, por conta disso, está contra nós. Muitas populações já estão à beira da sobrevivência. A população mundial continua crescendo. O mundo aumentará em mais de três bilhões de pessoas até o ano de 2050. A demanda hídrica tende a crescer. Por sua vez, a contaminação por esgotos, agrotóxicos e resíduos industriais.

É claro que o quadro é preocupante. Só que não podemos - já estou encerrando, Sr. Presidente - nos esquecer do seguinte: tudo ficará muito mais grave e desesperador se não tomarmos medidas já e se não dermos os passos concretos, necessários, desde já.

Especialistas estão advertindo que muitos rios de países em desenvolvimento e de potências emergentes sofrem uma contaminação próxima do colapso. Alerta a esse problema, tenho lutado incessantemente pela revitalização do nosso Velho Chico, que conheço bem de perto e que não pode esperar indefinidamente - o Rio São Francisco.

Mas, além disso, temos de ter políticas públicas que realmente dêem cobertura às populações mais atacadas pelo estresse hídrico e pela falta de saneamento. E precisamos também, Sr. Presidente, como parte de uma boa política, procurar compreender as comunidades locais na administração hídrica, no cuidado direto com os problemas que afligem diretamente. Afinal, temos de seguir o exemplo do Secretário da ONU: colocar a água de forma muito mais enfática na agenda internacional. A ONU declarou 2008 como o Ano Internacional do Saneamento e com isso, certamente, chamou a atenção para questões críticas como essa da água e do saneamento.

Existe também outro debate urgente: a necessidade de se questionar o modelo de desenvolvimento adotado por nações mais ricas, baseado no uso de grandes quantidades de água e energia.

Se nada disso for detido e transformado a tempo, entraremos na era das guerras pela água. Guerras que podem envolver nossa Amazônia, da mesma forma que já começam a despontar em determinadas regiões do mundo. No Golfo Pérsico, por exemplo, as ameaças à paz surgem não só das disputas que envolvem o petróleo mas também de problemas relacionados à água.

E, se estamos diante de um problema que no mundo inteiro só tende a crescer, tenho que insistir que ele não apenas faça parte da nossa agenda, do nosso debate, mas também da nossa cobrança por políticas públicas mais fortes, mais intensas, mais incisivas que garantam a água de qualidade para todos e o saneamento para todos, a começar das regiões mais pobres e carentes.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, no Dia Mundial da Água e no Ano Internacional do Saneamento, também em homenagem a V. Exª, que é um defensor da Amazônia e está presidindo neste momento a sessão do Senado Federal.

Agradeço a tolerância de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/06/2008 - Página 18614