Discurso durante a 96ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Transcurso, ontem, do Dia Mundial do Meio Ambiente. Comentários à Carta de Santa Maria, elaborada por ocasião do Fórum Mundial de Educação, realizado de 28 a 31 de maio último, na cidade de Santa Maria/RS.

Autor
Fátima Cleide (PT - Partido dos Trabalhadores/RO)
Nome completo: Fátima Cleide Rodrigues da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS.:
  • Transcurso, ontem, do Dia Mundial do Meio Ambiente. Comentários à Carta de Santa Maria, elaborada por ocasião do Fórum Mundial de Educação, realizado de 28 a 31 de maio último, na cidade de Santa Maria/RS.
Publicação
Publicação no DSF de 07/06/2008 - Página 18844
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, CONFERENCIA NACIONAL, HOMOSSEXUAL, ELOGIO, PARTICIPAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RATIFICAÇÃO, COMPROMISSO, GARANTIA, RESPEITO, DIREITOS HUMANOS, IGUALDADE, DIREITOS.
  • REGISTRO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, MEIO AMBIENTE, COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, DESRESPEITO, NATUREZA, MUNDO, MOTIVO, EXCESSO, ATENÇÃO, CAPITALISMO, NECESSIDADE, RETORNO, PRESERVAÇÃO, ECOLOGIA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, LEONARDO BOFF, ESCRITOR, PROFESSOR, INFORMAÇÃO, VISITA, PRESIDENTE, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), CONSELHO, AMBITO INTERNACIONAL, IGREJA, PEDIDO, APOIO, AGILIZAÇÃO, BUSCA, SOLUÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, MEIO AMBIENTE.
  • REGISTRO, CARTA, BISPO, IGREJA CATOLICA, PAIS ESTRANGEIRO, CANADA, DEFESA, NECESSIDADE, SOLIDARIEDADE, POPULAÇÃO, MUNDO.
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, CONGRESSO INTERNACIONAL, EDUCAÇÃO, MUNICIPIO, SANTA MARIA (RS), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), LEITURA, TRECHO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, AMBITO INTERNACIONAL, PROVOCAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL.

A SRª FÁTIMA CLEIDE (Bloco/PT - RO. Pela Liderança do PT. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em virtude da realização, na noite de ontem, da abertura da Conferência Nacional GLBT, venho a esta tribuna ainda muito emocionada pela participação efetiva do Presidente Lula, não apenas afirmando, mas reafirmando os compromissos do Governo brasileiro e da nossa sociedade, que muito avança no sentido de garantir direitos humanos a todos e a todas, independentemente de suas diferenças.

É com muita alegria, Sr. Presidente, que venho a esta tribuna na manhã de hoje também para fazer um registro sobre a ocorrência, no dia de ontem, 5 de junho, do Dia Mundial do Meio ambiente.

A civilização que somos hoje agoniza sob grave crise socioambiental global, que enfrentamos entre perplexos e anestesiados pela fé absoluta nos desígnios do Capital - que tudo pode e em seu nome tudo se justifica.

Criamos, Sr. Presidente, a abstração do capital como engenhosa ferramenta para nos facilitar a vida. Mas nos confundimos no caminho.

Hoje, somos os únicos seres do mundo a acreditar que “sem dinheiro não se vive” e, cegos por esta fé absurda, julgamo-nos superiores a tudo que existe sem ela. A ela nos submetemos e, por ela, insistimos em submeter todo o mundo criado.

Sob a fé absoluta nos poderes que nós e somente nós atribuímos ao capital; que, por sua vez, foi criado por nós a partir de algum momento recente no longo caminho da humanidade; e que existe apenas porque nós pactuamos entre nós mesmos a sua existência; acreditamos que nós somos produto dele e não ele de nós; que estamos criados para ele e não ele para nós; que, portanto, ele é tudo e tudo pode contra nós - e que, sem ele, a vida é inviável e não tem sentido.

Mais que um arranjo econômico, o capitalismo também é uma espécie de religião - cujo deus é o capital e seu evangelho as leis de mercado. De tal modo que, enquanto descrevo este quadro, devotos fiéis desdenham ou impacientam-se, como se a realidade que descrevo fosse algum sacrilégio ou delírio, resultante de ignorância ou de inocência pagã.

Srªs e Srs. Senadores, esse, felizmente, não é o fim da história. Ou, ao menos, Sr. Presidente, não precisa ser.

Uma antiga canção de Chico Buarque de Holanda diz: “Você, que inventou a tristeza, agora tenha a fineza de desinventar”.

O mundo se mobiliza para “desinventar a tristeza” que temos constituído com nossa displicência contra a vida.

Em artigo publicado nesta semana, intitulado “Agir rápido, agir juntos”, Frei Leonardo Boff nos informa que, em março passado, o Secretário-Geral da ONU, Ban Ki Moon, visitou o Conselho Mundial das Igrejas em Genebra e disse: “Um problema global exige uma resposta global: nós precisamos da ajuda das igrejas”.

E elas responderam prontamente com uma conclamação aos milhões de cristãos dispersos pelo mundo afora com estas palavras: “agir rápido, agir juntos porque não temos tempo a perder”.

Por sua vez, recentemente, uma carta pastoral dos bispos católicos canadenses adverte: “Precisamos libertar-nos da obsessão consumista. O egoísmo não é somente imoral, ele é suicida; desta vez não temos outra escolha senão uma nova solidariedade e novas formas de partilha. Agora estamos colhendo os frutos envenenados da dessacralização da vida induzida pelo poder da tecnociência a serviço da acumulação de uns poucos”.

É necessário, Sr. Presidente, nos reeducar para a vida.

Por isso, na ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente de 2008, quero saudar a recente realização do Fórum Mundial de Educação, realizado de 28 a 31 de maio último, na cidade querida de Santa Maria, no Rio Grande do Sul - no seu Estado, Sr. Presidente -, desta feita, sob o tema geral Educação: Economia Solidária e Ética Planetária.

E quero fazê-lo comprometidamente, repercutindo, desta tribuna do Senado Federal, a Carta de Santa Maria (que encaminho à Mesa como parte de meu pronunciamento), porque creio que é necessário nos curvarmos às evidências da insustentabilidade e trabalhar na conversão possível.

Neste sentido, sobretudo como profissional de educação, trago a Carta de Santa Maria ao conhecimento desta Casa, como informação, testemunho do resgate possível e, sobretudo, como convocação ao grande mutirão pela vida que se articula em todo o mundo e, no Brasil, germina em solo fértil - como se pôde ver no exemplo recente na pequena Santa Maria, no Rio Grande do Sul.

Ali reuniram-se 35 mil participantes: mulheres, homens, crianças e idosos, trabalhadores e trabalhadoras, estudantes, entidades sindicais, movimentos sociais, organizações governamentais e da sociedade, igrejas, universidades e escolas. Gente vinda de diferentes regiões brasileiras e de mais 14 países: Uruguai, Paraguai, Chile, Colômbia, Bolívia, Alemanha, Suécia, Peru, Estados Unidos, China, Portugal, Coréia do Norte e Argentina.

Entre esses, 130 empreendimentos solidários integraram a Mostra Mundial de Economia Solidária; 1.500 pessoas estiveram envolvidas no Fórum Gerações em Movimento; 84 jovens organizaram-se no Acampamento da Juventude - além de centenas de outras atividades.

Destaco aqui, Sr. Presidente, alguns trechos da Carta de Santa Maria, como contribuição a esta Casa e à sociedade brasileira por ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente:

As relações sociais capitalistas, atualmente materializadas através da globalização neoliberal, têm se mostrado incapazes de promover condições de vida digna para a maioria da população mundial.

Fundamentadas na propriedade privada dos meios de produção, na exploração do trabalho dos povos, na divisão da sociedade em classes e na degradação do meio ambiente, têm tido, entre suas conseqüências fundamentais, a prática da guerra como meio para a solução de problemas, o individualismo, a xenofobia, a homofobia e a perseguição às minorias e a mercantilização da vida.

Com essa leitura da realidade, o Fórum Mundial de Educação aponta princípios norteadores da transformação possível, tais como:

- economia solidária - não apenas como alternativa à falta de trabalho e renda, mas também como um agente de desenvolvimento que promova a sustentabilidade ambiental, a justiça social, a cidadania e a valorização da diversidade cultural, articuladas às atividades econômicas;

- solidariedade;

- soberania e segurança alimentar dos povos;

     - construção de redes de cooperação e autogestão no processo produtivo;

- produção, comércio justo e consumo consciente e ético;

- universalização dos bens da humanidade: ar, água, terra e sementes;

- valorização da cultura e saberes populares;

- educação que possibilite relações de igualdade, diversidade étnica, respeito às diferenças e à livre orientação sexual;

- educação para uma consciência socioambiental;

- ecoalfabetização e ecopedagogia;

- inclusão digital das pessoas e não dos instrumentos;

- integração e comprometimento das diferentes gerações com atitudes éticas e humanas;

- defesa da ética planetária como uma política do bem comum universal.

Com base nesses e outros princípios, a Carta de Santa Maria propõe que concentremos nossos esforços e atenção no sentido de:

- fortalecer políticas públicas que incentivem espaços de formação para os trabalhadores e trabalhadoras da economia solidária e criem oportunidades de geração de trabalho e renda, como maneira de atender às necessidades dos explorados e oprimidos;

- formar empreendimentos nos princípios de economia solidária, como: autogestão, cooperativismo, associativismo, respeito ao meio ambiente, solidariedade e trabalho organizado em redes e cadeias produtivas;

- agregar valor aos produtos da economia solidária;

- efetivar a construção do marco regulatório legal para empreendimentos de economia solidária;

- construir e socializar tecnologias adequadas ao processo de trabalho, à economia solidária;

- criar redes de produção, socialização e sistematização dos conhecimentos produzidos nos empreendimentos solidários;

- priorizar o ensino, a pesquisa e a extensão como instrumentos de aproximação entre o movimento da economia solidária e às universidades;

- ampliar o debate nos espaços educativos sobre a livre orientação e violência sexual;

- ressignificar valores para a vivência da cidadania;

- estimular programas educativos que transformem a mentalidade da competição para a construção de uma cultura de cooperação.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, não apenas este outro mundo é possível, como também sua construção está em marcha e há sinais concretos do seu vigor. Um outro mundo que será possível se tivermos uma outra educação que veja o ser humano como sujeito e não como objeto. Um outro mundo que se avizinha para todos e todas que acreditam nos valores que constroem a humanidade e, juntos, buscam a superação dos erros que nos levam às grandes catástrofes ambientais e sociais de hoje.

Muito obrigada, Sr. Presidente.

 

******************************************************************************

DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA FÁTIMA CLEIDE EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do inciso I, § 2º, art. 210 do Regimento Interno.)

*******************************************************************************

Matéria referida:

Carta de Santa Maria.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/06/2008 - Página 18844