Discurso durante a 98ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem à memória do intelectual e ex-Senador Artur da Távola.

Autor
Flexa Ribeiro (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando de Souza Flexa Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à memória do intelectual e ex-Senador Artur da Távola.
Publicação
Publicação no DSF de 11/06/2008 - Página 19005
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ARTUR DA TAVOLA, EX SENADOR, EX-DEPUTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), JORNALISTA, ESCRITOR, VITIMA, EXILIO, GOVERNO, DITADURA, REGIME MILITAR, FUNDADOR, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), ELOGIO, VIDA PUBLICA, VALORIZAÇÃO, CULTURA.

O SR. FLEXA RIBEIRO (PSDB - PA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda que certa, paradoxalmente a morte tem o dom de surpreender e, não raro, de emocionar. Quando alguém muito especial se afasta de nosso convívio, é inevitável a sensação de perda, de uma espécie de vazio que custa a ser superado. Ver Artur da Távola partir reitera em todos nós esse sentimento, mas, por tudo o que ele foi e fez, também nos obriga a refletir sobre nosso ofício, nossa atividade, nossa própria presença no mundo.

Nascido em 1936, Paulo Alberto Moretzsohn Monteiro de Barros foi um ser iluminado. Muito jovem, já demonstrava a personalidade carismática que o acompanharia até o fim da vida. Aluno do curso de Direito da prestigiosa Pontifícia Universitária Católica do Rio de Janeiro, na segunda metade da efervescente década de 1950, em pouco tempo distinguiu-se entre os colegas, sendo por eles alçado à condição de líder estudantil, à frente do Centro Acadêmico Eduardo Lustosa. Nesse período, entre 1956 e 1957, assumiu a redação do “Metropolitano”, órgão oficial de divulgação da União Metropolitana dos Estudantes. Ali começava seu contato direto com a atividade jornalística, algo que jamais abandonou.

Em tempo de crescente polarização ideológica, que desaguaria na ruptura institucional de 1964, Paulo Alberto tornou-se o mais jovem constituinte do recém-criado Estado da Guanabara, após a transferência da Capital para Brasília. Eleito pela legenda do Partido Trabalhista Nacional (PTN), cumpriu com brilhantismo o papel que lhe coube de elaborar a primeira Constituição daquela verdadeira cidade-estado.

Nas primeiras eleições que se seguiram à Constituinte Estadual, Paulo Alberto foi mais uma vez eleito, agora Deputado Estadual e abrigado no valoroso Partido Trabalhista Brasileiro, o PTB de Getúlio, Jango e Brizola. Com posição ideológica claramente definida, comprometido com as mudanças sociais de que o País tanto carecia, as chamadas reformas de base, destacou-se na oposição ao Governador Carlos Lacerda, baluarte da União Democrática Nacional, a UDN.

A violência do autoritarismo também caiu sobre ele. Com o mandato cassado e os direitos políticos suspensos, Paulo Alberto também seguiu o destino imposto a tantos outros, o amargo exílio. Em nossa América Latina, encontrou abrigo, proteção e reconhecimento. Esteve inicialmente na Bolívia, mas foi no Chile que se fixou por mais tempo. Lá, em contato com outros exilados, que se transformariam em amigos para sempre, como Fernando Henrique Cardoso, José Serra e Paulo Renato Souza, entre muitos outros companheiros de fé política e de sonhos generosos, Paulo Alberto aprimorou sua formação acadêmica.

Já em 1965, Paulo Alberto especializou-se em educação, tendo estudado no Centro Latino-Americano de Formação de Especialistas em Educação, da Universidade do Chile, instituição na qual chegou a lecionar. De volta ao Brasil, quatro anos após ter partido, esperou a reconquista dos direitos políticos para retomar sua vitoriosa carreira parlamentar. Em 1976, abrigou-se na trincheira da oposição consentida ao arbítrio, o velho MDB. Com a reestruturação partidária determinada pelo regime militar, filiou-se, coerentemente, ao PMDB.

A essa altura, Paulo Alberto se transmutara em Artur da Távola. O pseudônimo, adotado quando escrevia para o valoroso jornal “Última Hora”, integrou-se tão perfeita e vigorosamente nele que nunca mais pôde ser deixado de lado. Assim, ele chegou à Câmara dos Deputados, eleito pelo povo fluminense para, pela segunda vez na vida, ser Deputado Constituinte, agora em escala nacional.

Como em tudo o que fazia, Artur da Távola foi um brilhante Constituinte. Nela, foi indicado Relator-Geral da Comissão de Educação, Família, Cultura, Menor, Idosos, Comunicação, Esporte, Ciência e Tecnologia. O homem certo no lugar que lhe era de direito. Aliás, nunca é demais enfatizar que Artur da Távola notabilizou-se, como parlamentar, pela defesa da alteração na legislação que regulava as concessões de canais de televisão. Para ele, elas deveriam deixar de ser prerrogativa do Poder Executivo e serem concedidas por um Conselho em que tivessem assento representantes do empresariado do setor, dos Poderes Executivo e Legislativo, além dos trabalhadores da área.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ogulho-me por pertencer a um Partido, o PSDB, fundado por pessoas como Artur da Távola, que o liderou na Câmara e que, já no Senado, assumiu sua Presidência. Para sermos dignos de seu legado e de sua memória, outra coisa não há a fazer senão lutar para que os mais elevados princípios doutrinários da social-democracia jamais esmoreçam, e sua bandeira, comprometida com a transformação social, permaneça de pé. Artur da Távola foi, na contemporaneidade, provavelmente, o mais belo exemplo de homem renascentista. Múltiplo, foi único em dignidade e correção. Homem de letras, amante da música como poucos, doce no falar e firme no agir, engrandeceu a política pela correção, pelo caráter e pelos propósitos dignificantes. Ninguém, como ele, melhor entendeu o papel da televisão e sobre ela discorreu. Ninguém, como ele, compreendia o valor da cultura como elemento humanizador do próprio homem.

Serenamente, como convém a alguém como ele, Artur da Távola partiu. Fica o vazio, por certo. Fica a tristeza da perda, como é natural. Mas fica, acima de tudo, o exemplo, o legado, a lição.

Que sejamos dignos de sua memória!

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/06/2008 - Página 19005