Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações a respeito da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Autor
Mão Santa (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Francisco de Assis de Moraes Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Considerações a respeito da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2008 - Página 21791
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, EXPERIENCIA, ORADOR, PREFEITO, GOVERNADOR, ESTADO DO PIAUI (PI), ELOGIO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA PUBLICA, FAVORECIMENTO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DISCRIMINAÇÃO, ESTADO DO PIAUI (PI).
  • DEFESA, NECESSIDADE, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS, IMPEDIMENTO, RETROCESSÃO, ECONOMIA NACIONAL, COMBATE, RETORNO, INFLAÇÃO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, EXCESSO, NOMEAÇÃO, CARGO DE CONFIANÇA, FAVORECIMENTO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), AUMENTO, POSSIBILIDADE, RETORNO, INFLAÇÃO.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Jefferson Praia, que preside esta sessão; Parlamentares presentes; brasileiras e brasileiros aqui presentes e que nos assistem pelo sistema de comunicação do Senado; Senador Antonio Carlos Magalhães Júnior, V. Exª fez um extraordinário pronunciamento. Quero crer que, durante esses 508 anos de Brasil, este País foi construído gradativamente. É triste dizer que praticamente o Brasil evoluiu há 200 anos, quando para cá veio o rei de Portugal e se instalou com a sua burocracia européia. Antes, a evolução foi pequena como Colônia.

Mas quero dizer que ao longo desses anos todos, mesmo no sistema de Governo Geral, eles já adotavam as Câmaras Municipais, às quais eles chamavam “Câmara dos Bons”, mostrando a qualificação dos que se destinavam a fazer política. Mas, dessas leis todas que surgiram, acho que uma das mais eficientes foi a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Quero dar aqui o testemunho, Senador Antonio Carlos Júnior, pelo fato de eu ter sido Prefeito. No início da Constituição, ainda não existia essa Lei de Responsabilidade Fiscal, que passou a vigorar a partir de 2000, quando a peguei no Governo do Estado. Presidente Jefferson Praia, era uma zorra, ninguém sabia o que devia, quanto devia, e assim funcionava o Brasil.

Eu vivi esse episódio como Prefeito antes da Constituição.

Houve uma inspiração ao longo da História, quando um grande brasileiro, Graciliano Ramos, que foi um escritor laureado - Memórias do Cárcere, Vidas Secas -, foi o primeiro Prefeito a adotar uma responsabilidade fiscal, a prestar contas públicas, antes da ditadura Vargas. Senador Expedito Júnior, Graciliano chegou a ser preso, quando escreveu o romance histórico Memórias do Cárcere. Bastaria esse livro para vermos que, embora tivéssemos um ditador estadista e bom, a ditadura não é boa.

Depois, vivemos o período militar, e Elio Gaspari descreve a ditadura militar, em três volumes.

Mas veio a Lei de Responsabilidade Fiscal, e eu era Governador do Estado. Era uma zorra. O Brasil começou aí, Presidente Luiz Inácio. Estou dando o testemunho, porque fui Prefeito antes dela e Governador depois dela.

Quero render homenagem ao estadista Fernando Henrique Cardoso e a um dos mais probos homens públicos que eu conheci: Pedro Malan - nunca mais o vi. O seu auxiliar, Pedro Parente, depois de um apagão, tal a sua credibilidade, tornou-se Ministro para resolver o problema do apagão. Então, eles nos chamavam para renegociar a dívida. Olha, era uma confusão! Ninguém sabia sequer para que Estado devíamos.

Aí, sim, vamos dizer, foi hasteada a Bandeira brasileira na administração pública: “ordem e progresso”. Então, fomos chamados, todos os Governadores de Estado, a renegociar as dívidas, e a pagar, o que variava de acordo com a dívida, de 13% a 11% de sua receita líquida. Lembro-me muito bem, Antonio Carlos Júnior - pois o meu estilo parecia muito com o do pai de V. Exª -, quando fui chamado para assinar a negociação do Piauí, que os técnicos burocratas, que nunca viram um pobre, um soldado desarmado, uma professora com o salário atrasado, colocaram o Piauí na renegociação para descontar 13% da sua receita líquida. Antes, porém, tinham feito a renegociação do Estado de São Paulo, que pagaria 11% de sua receita, ao passo que o Piauí, 13%. E eu, com o espírito combativo do seu pai, disse: “Eu não vou assinar isso!” Por isso, enalteço a justeza, a firmeza, a dignidade, a grandeza de Pedro Malan e Pedro Parente! Olha, aqueles técnicos nunca viram um pobre. O mundo deles, Senador Jefferson Praia, é outro - nunca viram um pobre, um faminto -: é Tóquio; é Washington; é Nova York; é Banco Mundial...

Eu disse que não assinava e argumentei o seguinte: “Olha, acabei de ver o contrato de São Paulo e eles vão pagar 11%. Como que o Piauí vai pagar 13%?” No meu entendimento, os economistas só pensam em dinheiro.

Então, trago a noção da minha mãe que, quando via os filhos mais enfraquecidos, doentes, é que ela dava mais força, mais carinho, gemada à noite, proteção e tudo. “Como é que o Piauí vai pagar 13% da sua receita líquida e São Paulo, 11%? Não assino.” E a confusão foi tão grande! Olha, o burocrata, o técnico, disse que não refazia, que os cálculos eram aqueles, e acho que baixou um espírito quando eu disse que não assinava e tal. E foi parar na mão de Pedro Malan, que mandou Pedro Parente reestudar, e o Piauí, então, passou a pagar 11% da sua receita líquida.

Mas o fato é que todos os Estados... Mas eles tinham sensibilidade. Muitas vezes, eu cheguei lá com as contas para mostrar ao Ministro Pedro Malan e ao Pedro Parente e para lhes dizer que não dava para cumprir, e mostrava-lhes as receitas e as despesas. Ele puxava a caneta dele, pacientemente - e iria morrer porque não dava para pagar -, e fazia um gráfico, e dizia: “Essa aqui você vai pagar daqui a seis meses; essa outra, à prestação”. É como eu dizia: ele dava ali uma novalgina para acabar a convulsão. “Navegar é preciso; viver não é preciso”, e governar significa o navegar de grego, pelas tempestades. E assim fomos.

E, hoje, os Estados estão equilibrados e conscientes. E melhor ainda foi o espírito que se irradiou numa austeridade administrativa. A Bahia, pela experiência dos administradores, não teve muitos problemas, vivia nos trilhos, era um dos Estados economicamente equilibrados, mas todos nós sofremos com os ajustes.

Então, Luiz Inácio, é este o momento em que vivemos. Quem planta colhe. Foi plantada essa austeridade fiscal, com a qual agora se preocupa o Senador Antonio Carlos Júnior, que mostra preocupação com os que querem as facilidades para o endividamento.

Então, hoje, vivemos essa condição de êxito na economia por que houve a responsabilidade fiscal, a austeridade do Governo Fernando Henrique Cardoso, interpretada por Pedro Malan e por Pedro Parente. Nós, Governadores, atravessamos essa fase e a cumprimos. Então, não podemos voltar atrás.

Como o Senador que nos antecedeu disse, naquele instante, foi colocada a palavra “ordem” na Administração Pública, com a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Parabenizo pela preocupação o Senador da Bahia, que repete aqui o zelo administrativo do seu pai, Antonio Carlos Magalhães!

Este Senado Federal tem justamente o poder para analisar e aprimorar qualquer lei oriunda da Câmara Federal. Devemos estar atentos para que não haja retrocesso na economia.

Atentai bem, Luiz Inácio! A inflação está aí. Vamos acabar com a vaidade, que este País é grandioso, tem 508 anos de administração. Este País, descoberto apenas oito anos depois dos Estados Unidos, sofreu influências enormes. Aquele país conseguiu sua independência muito antes da nossa, em 1750; nós a conseguimos somente em 1822. Daí a dianteira, quando se instalou o processo democrático.

O que queremos deixar claro aqui é que ninguém escolhe o momento de governar. Cada governante teve seu problema.

D. João VI, diferentemente do que a história humorística do Brasil relata - há até a novela “O Quinto dos Infernos” -, como era normal, foi preparado, como o foram todos os reis da aristocracia. Talvez, ele tenha sido o único a vencer Napoleão Bonaparte. Napoleão consolidou a República. Depois do grito “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”, de 14 de julho de 1789, rolaram muitas cabeças, muitas injustiças, e ele soube consolidar esse processo, fazendo, sobretudo, o Código Napoleônico, que é admirado ainda hoje. Fez o Código Civil Napoleônico, além de suas obras físicas que fizeram de Paris a mais bela cidade do mundo.

Mas o que queremos afirmar neste instante é que D. João VI, em treze anos, conseguiu um avanço muito grande. Logo que aqui chegou, houve a abertura dos portos. O Brasil só comercializava com a metrópole, Portugal. Sei que foi interesse da Inglaterra, que já protegia Portugal da França, mas foi um avanço. Na mesma chegada, quando saltou ainda em Salvador, fez, Antonio Carlos Magalhães, a primeira faculdade de Medicina deste País, que comemora 200 anos. Depois de poucos meses, não ficando em Salvador, foi ao Rio de Janeiro e construiu um modelo administrativo assemelhado ao de todas as monarquias da Europa, bem avançado. Se não era uma corte de Luís XIV, o L’État c’est moi de Versailles, houve um avanço no modelo administrativo e burocrático deste País. Foram treze anos de muito êxito, de muito avanço, de muita organização.

Deixou seu filho, que fez a Independência, e seu neto, Pedro II, que garantiu a unidade deste País grandão. Foram 49 anos de administração. Seguiram-se as Repúblicas. E a República só chegou aqui cem anos depois de ter chegado à França. E fomos até avançados, aqui não rolaram cabeças. Houve duas exclusões: uma civil, a Ditadura de Vargas, e a outra recente, a dos militares. Mas soubemos recuperar a democracia, o governo do povo, pelo povo e para o povo, e aqui estamos.

Getúlio Vargas teve sua participação como estadista, construiu leis trabalhistas. Juscelino simbolizou o desenvolvimento pela atividade industrial, por Brasília. Justamente, queremos dizer que cada um tem sua missão: o Presidente Sarney, na redemocratização; o Presidente Collor, na reabertura de uma comercialização, de uma globalização, mostrando sua grande visão; e os Presidentes Itamar e Fernando Henrique, no combate ao monstro da inflação. E aí estamos com Luiz Inácio. E a inflação está voltando.

Uma das causas da inflação, Luiz Inácio, quero deixar aqui claro, Governador Marconi Perillo, é a falta de austeridade. Deve haver a diminuição do gasto público. Bill Clinton, depois de quatro vezes governar seu Estado de Arkansas, viu que seria difícil ser Presidente da democracia e mandou os melhores técnicos, Ted Gaebler e David Osborne, reestudarem, e eles fizeram o livro Reinventando o Governo, que o governo não podia ser grande demais, tinha de ser menor. Não podia ser grande como o Titanic, que, quase perfeito, afundou; tinha de ser menor, versátil.

E eis que o Luiz Inácio errou. Tornou o Governo grande. Foram 25 mil nomeações e DASs. Senador Marconi Perillo, os que recebem DAS 6 - que, no seu Estado, não existe; só há DAS 4, como o que governei - ganham R$10.448,00. Vinte e cinco mil entraram pela porta larga, sem concurso. Bush, o “Sr. Guerra”, só nomeou 4,5 mil pessoas nos Estados Unidos. Sarkozy, o famoso e fogoso, nomeou 360 pessoas. Ô Marconi Perillo, o sucessor de Tony Blair nomeou 160 pessoas, e nosso Governo nomeou 25 mil pessoas. Eis que clama o terceiro mandato. E entraram sem concurso, pela porta larga da vadiagem, da malandragem. São quarenta Ministros! Nos Estados Unidos, há 14 Secretários de Estado, e aquele país é maior e mais rico. Então, isso é que causa a inflação.

Sou médico. Às vezes, dá certo. Juscelino era médico-cirurgião como nós. Damos valor à etiologia: a causa da inflação é a falta de austeridade, é a falta de responsabilidade. É isso que queremos aqui advertir.

Presidente Luiz Inácio, Vossa Excelência foi feliz. Esta Pátria teve iluminados dirigentes, e seu antecessor teve a coragem de fazer a estabilidade fiscal. Quem planta colhe. Eles plantaram, e estamos colhendo os frutos da economia. Não nos deixe apodrecer essa economia com a volta da inflação!

Essas eram nossas advertências.

Estou agradecido ao Presidente Jefferson Praia por ter concedido este instante para usarmos da palavra.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2008 - Página 21791