Pronunciamento de Romeu Tuma em 24/06/2008
Discurso durante a 110ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Análise da atual pressão inflacionária e advertências para os riscos de refrear a procura sem aumentar a oferta das mercadorias através da produção.
- Autor
- Romeu Tuma (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/SP)
- Nome completo: Romeu Tuma
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
- Análise da atual pressão inflacionária e advertências para os riscos de refrear a procura sem aumentar a oferta das mercadorias através da produção.
- Publicação
- Publicação no DSF de 25/06/2008 - Página 22933
- Assunto
- Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
- Indexação
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- APREENSÃO, RETORNO, INFLAÇÃO, PAIS, PRIORIDADE, VITIMA, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, PERDA, PODER AQUISITIVO, ALIMENTOS.
- ANALISE, HISTORIA, ECONOMIA NACIONAL, INEFICACIA, PLANO, CONTROLE, INFLAÇÃO, DEFESA, INVESTIMENTO, PRODUÇÃO AGRICOLA, AMPLIAÇÃO, OFERTA, ALIMENTOS.
O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senadora Marisa, procurarei ser o mais breve possível.
É uma angústia muito grande o crescimento da inflação. Tem se falado muito em educação, em dificuldades de ordem econômica, em crescimento dos juros, mas não nos podemos esquecer do que nos assustou algum tempo atrás.
Senadora Marisa, Senador Heráclito, não sei se V. Exªs se lembram desta “arma” que tanto nos assustava nos supermercados, quando, dia e noite, ficava funcionando para aumentar o preço das coisas. Um cabo da Polícia Militar, meu amigo, passando em um mercadinho da periferia de Brasília, viu a remarcação. Ele me falou disso, e eu lhe pedi que fosse até lá para tomar emprestada a máquina, para que eu, tristemente, pudesse lembrar que esta “arma” trouxe muita intranqüilidade à sociedade brasileira. Aqueles que têm poder aquisitivo baixo realmente sofrem as conseqüências de não poderem mais colocar no carrinho do supermercado metade dos produtos que compravam anteriormente, meu Presidente Papaléo.
Eu trouxe aqui também, Senadora Marisa e Senador Heráclito, um pacote de feijão. O código de barras substituiu a maquininha nos grandes supermercados. O código de barras já traz o controle de estoque e o preço da mercadoria. Hoje, não é preciso mais remarcar; basta, no computador, refazer os preços, que, imediatamente, a pessoa tem de pagar um pouco mais.
Por que trouxe aqui um quilo de feijão, Senadora? Porque nosso Ministro Mantega disse que, se tirasse o feijão dos cálculos, automaticamente cairia o índice de aumento da inflação. Portanto, eu trouxe o feijão. Não há quem deixe de comer seu feijãozinho todos os dias, principalmente aqueles mais carentes e os que recebem a cesta básica.
Lembro-me de que, quando eu era garoto, jovem, Senador, eu tinha um vizinho que era coronel da Polícia Militar. Sua esposa fazia, todos os dias, para os cinco filhos, feijão com arroz. Minha mãe, às vezes, fazia comida árabe e chamava os meninos para comer comida árabe. Já a mãe deles me chamava para comer feijão com arroz. E era um tempero gostoso o dela. Hoje, o feijão com arroz não é uma rotina natural, é um desejo natural do cidadão, não apenas pelas qualidades que tem, mas pelo paladar, pelo sabor e pelo costume do brasileiro de comer feijão.
Fiz aqui uma análise de tudo que vem ocorrendo. Lembro-me de que, um dia, quando eu era da Polícia em São Paulo, estive com o Ministro Delfim, então Ministro da Fazenda, de quem era muito amigo. Hoje, ainda sou seu admirador e gosto do Ministro Delfim. Estava 9% o controle da inflação na época. Ele, em desespero, Senadora Marisa e Senador Heráclito, chegou do gabinete, dizendo: “Nós passamos dois dígitos. Nós estamos perdidos. Temos de tentar segurar, porque, com dois dígitos, vai ser difícil segurar o aumento do preço das mercadorias”. Depois disso, vieram vários planos, que descrevo aqui. Depois, se V. Exª autorizar, meu discurso será publicado por inteiro.
Tivemos de buscar boi no pasto. Quando eu era Diretor da Polícia Federal, passamos por um sacrifício enorme, porque a carne de gado sumiu dos mercados e dos açougues, e, assim, precisamos caçar os bois no pasto. Realmente, houve uma série de fatos, houve o Plano Bresser e outros planos em outros governos, mas não conseguiram estagnar a inflação.
Então, o que estou fazendo agora? Estou apelando ao Governo. V. Exª acabou de falar, na tribuna, sobre o desenvolvimento do agronegócio, da agropecuária. Hoje, como a oferta e a procura é o lema do mercado, se não houver mais produção, a capacidade de compra do cidadão, daqui a pouco, vai cair. Por quê? Porque o preço vai continuar subindo. Se há uma procura maior e não há a oferta necessária para cobrir essa procura, automaticamente, sofremos as conseqüências de uma inflação grave. E esta “arma”, infelizmente, poderá matar muita gente, muita criança.
Vi, numa creche, agora, em Campos do Jordão, um trabalho maravilhoso, com mais de 1,2 mil crianças. Lá é dado o feijãozinho com arroz e com salada. Há um acompanhamento. Isso satisfaz essas crianças, cujos pais, por necessidade, procuraram a creche, para lhes dar não só aptidão para conviver em sociedade, como também alimentação.
Sr. Presidente, peço encarecidamente a V. Exª - não quero tomar muito tempo, porque a Senadora Marisa, de quem sou admirador, ainda vai falar, e seus pronunciamentos são sempre sadios e bem objetivos - que publique por inteiro a análise feita sobre os planos e todas as suas conseqüências e sobre o índice de aumento de cada um dos produtos citados - arroz, feijão, carne e todos os outros -, que está realmente assustando a sociedade brasileira.
Não é uma inflação importada, como dizem. Ela se está alastrando no mundo, porque a produtividade cai em razão do aumento do consumo. É preciso que haja uma oferta maior de mercadoria e que o governo invista em produção agrícola. V. Exª, que mora no Norte do País, sabe das conseqüências quando não há a clarividência de um governo que invista. Não adianta só pensar no Bolsa-Família, que é importante. Se não se investir naquilo que gere a possibilidade da renda, para haver condições de se estabelecer a sobrevivência humana, da família, da pessoa, não vai adiantar nada. Temos de ter fé em que os governos pensem num investimento para a produção, a fim de cuidar do agronegócio e de tudo aquilo que possa produzir bens à Nação, trazendo resultado satisfatório àqueles mais carentes.
Obrigado, Sr. Presidente. Acredito que V. Exª autorizará a publicação do meu discurso, na íntegra.
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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR ROMEU TUMA.
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O SR. ROMEU TUMA (PTB - SP Sem apanhamento taquigráfico.) -
Analisa a atual pressão inflacionária e adverte para os riscos de refrear a procura sem aumentar a oferta das mercadorias através da produção (24/06/2008).
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por mais sofisticadas que sejam as palavras usadas para definir mecanismos da economia moderna, a vitalidade e a estabilidade de qualquer moeda sempre irão depender da lei da oferta e da procura, uma regra tão antiga, imutável e real quanto o próprio mundo. Intentar domá-la mediante controle do Estado é o mesmo que pretender revogar a gravidade por decreto.
Desde que os primeiros seres humanos trocaram alguma coisa por outra para dar início ao comércio através do escambo e, depois, aperfeiçoaram esse processo instituindo o dinheiro como símbolo de valor, só existem duas maneiras de tornar estáveis os preços das mercadorias, assim como de preservar a moeda. Isto é, ou se aumenta a oferta, ou se diminui a procura, caso algum descompasso entre ambas desande a produzir pressão inflacionária e conseqüente desvalorização do dinheiro.
No Brasil, diante dos primeiros sinais de inflação, costuma-se escolher a contenção do consumo através de instrumentos monetários, a exemplo da elevação dos juros e diminuição do crédito. Infelizmente, não se opta pelo permanente incentivo à produção como medida preventiva, pois só a consideram quando as crises já estão instaladas. Isto atrasa o progresso e, depois, acaba gerando desesperadas tentativas de extorquir da indústria, da agropecuária e até do próprio comércio algo muito além de sua capacidade de realização. Envereda-se por caminhos que foram testados ao longo da História e mostraram-se inócuos, quando não catastróficos. Caminhos que, fatalmente, levam à estagnação econômica e convergem para os piores modelos de carestia, os que são os mais penosos e difíceis de debelar quando se inserem no circulo vicioso da queda de produção por falta de consumo e o conseqüente abandono dos investimentos em setores produtivos.
Estes, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, são fatos que devem preocupar-nos porque soam os sinais de alarma ante a investida da inflação que se entendia como praticamente debelada. Assistimos a esse filme várias vezes e ficamos aflitos só por lembrar das maquininhas de remarcação de preços que anunciam repetitivos epílogos, invariavelmente deletérios ao bolso da população. São filmes em que apenas se altera o emaranhado de índices de preços, hoje composto pelas siglas IGP, IGP-DI, IGP-M, IGP-10, IPC-RJ, IPC-Fipe, ICV-Dieese, INPC, IPCA, INCC e CUB. Todas estão a atazanar os chefes de família. Indicam que o custo de vida, especialmente no setor de alimentação, recomeça a devorá-los num País em condições de ser o “Celeiro do Mundo”.
Assim foi na década de 80, quando o Presidente José Sarney precisou aplicar o Plano Verão, também conhecido como Plano Cruzado, numa combinação de juros elevados com medidas intervencionistas para, de um lado, baixar a demanda no mercado varejista e, de outro, obrigar produtores a desovar uma produção que pareciam esconder do atacado.
Lembro-me bem. Estávamos em 1986. Houve até a criação de uma nova moeda - o Cruzado -, acompanhada de medidas de austeridade e do término da correção monetária generalizada. Surgiu o congelamento de preços das mercadorias e o “gatilho salarial”, disparado quando a inflação atingia 20%.
Toda a população brasileira vibrava com as possibilidades de estabilização e muito consumidor sentiu-se em condições de auxiliar o governo na fiscalização de preços e no combate à sonegação. Eu, como Diretor Geral do Departamento de Polícia Federal, vi-me na obrigação de até “caçar” boi gordo nos pastos porque eles haviam sumido dos frigoríficos. Mas, nem o entusiasmo de toda a Nação bastou para estabilizar a nova moeda. E chegou-se à moratória da dívida externa, sem que as maquininhas de remarcação sumissem dos supermercados.
Em seguida, entre 1990 e 1992, o Presidente Fernando Collor de Mello criou o Plano Brasil Novo. Também adotava medidas antiinflacionárias radicais, mas enfocando-as na liberação fiscal e financeira, reforma do comércio exterior, política industrial e desestatização através do PICE e do PND. Na formulação e implementação do Plano Brasil Novo envolveram-se os mais renomados economistas da época, como Antônio Kandir, Ibrahim Eris, Álvaro Zini, Fábio Giambiagi, Venilton Tadini, Luís Otávio da Motta Veiga, Eduardo Teixeira e João Maia.
Anunciado no dia seguinte à posse do Presidente Collor - 16 de março de 1990 - o Plano reinstituiu o Cruzeiro como moeda nacional. Estabeleceu ainda congelamento de bens privados por 18 meses, alta taxa e sua indexação para as transações financeiras, supressão de incentivos fiscais, reajuste de preços por entidades públicas, câmbio flutuante, congelamento dos salários e preços, estímulo à privatização e abertura gradual da economia, entre outras medidas.
Na verdade, em apenas dois anos de governo antes da renúncia presidencial, aconteceram três planos de estabilização, os dois últimos comandados respectivamente por Zélia Cardoso de Mello e Marcílio Marques Moreira, no Ministério da Fazenda. Todo esse esforço decorreu do histórico de hiperinflação anterior a Collor, pois, um ano antes de sua posse, a média mensal era de 28,94%. Em março de 1990, chegava aos 84,32% e continuava subir, apesar do sacrifício nacional para contê-la. Tanto que, ainda nos anos 80, outros planos tinham sido implementados.
Em junho de 1987, surgira o Plano Bresser. Embora sem indexar a economia, o governo havia congelado preços e salários, além de adotar medidas monetárias e fiscais. A contenção de custos durou pouco, apenas alguns meses, até a pressão inflacionária retornar devido aos aumentos provocados pela defasagem dos preços anteriormente congelados. Além disso, a atividade econômica continuou desacelerada e ocorreram as famosas “remarcações defensivas” com as quais as empresas pretendiam precaver-se de novos congelamentos.
No ano seguinte, a produção continuou estagnada. A inflação tornou-se alarmante e insuportável a partir do segundo semestre. Em outubro, houve o “Pacto Social”, um acordo entre empresas e trabalhadores para pré-fixar preços e salários. Mas, parece que apenas as tarifas públicas mantiveram-se nos limites do pacto e, defasadas com a inflação, fizeram crescer ainda mais o déficit público.
Seguiu-se o Plano Verão, em janeiro de 1989, com nova reforma monetária, congelamento de preços e salários, realinhamento dos preços públicos, desvalorização da taxa de câmbio para incrementar o saldo comercial e desindexação da economia. O resultado é que, no bimestre seguinte, cresceram o consumo e o ágio no mercado paralelo do dólar. A inflação escapou do controle totalmente.
Ainda frente a uma inflação alarmante, já nos anos 90, depois do Plano Brasil Novo do Presidente Collor, vimos surgir o Plano Real, implementado por Fernando Henrique Cardoso, então Ministro da Fazenda do governo Itamar Franco. Deu certo. Transformou o ex-ministro em Presidente da República. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva prosseguiu no mesmo caminho de sucesso, mas vemos agora sinais de que a inflação ainda vive e ameaça recrudescer.
Dia 16 do corrente, li no jornal Correio Braziliense oportuno artigo do ex-Ministro do Trabalho e ex-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Almir Pazzianotto Pinto, que deixa patente a preocupação de todos os brasileiros. Ou seja, assinala que “o País vive a expectativa da visita da velha senhora”, a “inflação, maligna bruxa que dominou a vida nacional ao longo de séculos”. Diz ainda:
“A bruxa não morreu. Aguarda o momento de ressurgir com a ajuda de sorrateiros aliados. Quatro séculos criaram uma espécie de apego à inflação, responsável pela recorrência a índices de reposição e de correção, mesmo quando tal prática é proibida. Até o momento o Banco Central tem conseguido frear o processo inflacionário. As demais esferas do governo, porém, permanecem entre os discursos e a cumplicidade. Logo mais conheceremos os vencedores e os derrotados.”
É claro que, atualmente, existem pressões inflacionárias globais que preocupam bancos centrais por todo o Planeta. Por exemplo, no Japão, a inflação atingiu o maior nível em 27 anos e, na China, o mais elevado em quatro anos. É o resultado da elevação de preços das matérias-primas. Mas, aqui, num País continental onde - como verificou Pero Vaz de Caminha - “em se plantando, tudo dá”, ninguém entende o que o feijão, o arroz e outros itens da cesta básica da família brasileira tem a ver com isso. Por exemplo, nosso feijão aumentou 20,95% este mês, depois de queda de 9,89% registrada em maio. Nos últimos 12 meses, teve alta de 145%. Os ovos subiram 12,33%, após uma queda de 10,13% no mês passado. A cenoura aumentou 23,67%, a batata 18,63% e o tomate 11,09%. O arroz subiu 18,27%, e a carne bovina, 5,14%.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é contra isso que precisamos agir antes que o clamor popular se sobreponha aos cliques das cruéis maquininhas de remarcação de preços. Oxalá o governo não retome algum dos caminhos já inutilmente percorridos com tanto sacrifício. Tomara tenha a sabedoria de usar todo o poderio no sentido que me parece o único lógico e eficaz, qual seja o urgente fomento da produção sem estancar o consumo. Só assim respeitará a lei da oferta e procura em benefício da sofrida população brasileira, cansada de planos e teorias que nunca dão certo.
Muito obrigado.