Discurso durante a 110ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Repúdio pela utilização indevida das Forças Armadas do Brasil. A questão da criminalidade no País.

Autor
Demóstenes Torres (DEM - Democratas/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Repúdio pela utilização indevida das Forças Armadas do Brasil. A questão da criminalidade no País.
Aparteantes
Eduardo Azeredo, Raimundo Colombo.
Publicação
Publicação no DSF de 25/06/2008 - Página 22957
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, DESVIO, FUNÇÃO, EXERCITO, OPERAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), OCORRENCIA, CRIME, MEMBROS, ALEGAÇÕES, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, EFEITO, PREJUIZO, REPUTAÇÃO, FORÇAS ARMADAS, INEFICACIA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, SEGURANÇA PUBLICA.
  • ANALISE, RESISTENCIA, APERFEIÇOAMENTO, DIREITO PENAL, EFEITO, IMPUNIDADE, CRITICA, AUSENCIA, INVESTIMENTO PUBLICO, SISTEMA PENITENCIARIO, FAVORECIMENTO, CRIMINOSO, PREJUIZO, CIDADÃO.
  • COBRANÇA, GOVERNO, PROVIDENCIA, COMBATE, VIOLENCIA, SIMULTANEIDADE, INCENTIVO, CIDADANIA, COMENTARIO, DADOS, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, CONTINUAÇÃO, AUMENTO, CRIME.

            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho aqui hoje falar de um problema gravíssimo que aconteceu no Brasil, mais especificamente no Rio de Janeiro.

            Que problema é esse? A utilização indevida das Forças Armadas do Brasil para projetos absolutamente desrespeitosos e que têm levado, pela conseqüência e pela gravidade, a terem alguns membros do Exército brasileiro agido de forma criminosa. Isso tem gerado ilações as mais estapafúrdias.

            Começam a comentar: “Estão vendo?! Olhe aí! Não é mais caso de usar o Exército para nada.” Ou: “Está provado que o crime só se resolve com ações de cidadania”. E nós sabemos que isso é uma grande balela.

            Primeiro, agiram criminosamente os membros do Exército brasileiro. Entregaram pessoas, seres humanos, a uma facção que morava em outro morro, com o único objetivo de criar constrangimento. E, mais que constrangimento, causaram crimes. O Exército brasileiro, aquelas pessoas são responsáveis pelo desvio. E aqueles que cometeram o crime são responsáveis pelo crime que cometeram. Agora, daí a começar a se levantarem vozes absolutamente incompetentes e despreparadas, em nome de filosofias já sepultadas, com o único objetivo de macular a imagem das Forças Armadas, isso é inaceitável.

            A grande responsabilidade, Senador Colombo, que hoje tem o Brasil para com os seus cidadãos é resolver o problema da segurança pública. Há muito tempo, começou a surgir no Brasil uma filosofia calcada no fim do regime militar que diminuiu sensivelmente o Direito Penal. Com razão, o regime militar, de triste lembrança, que está sepultado, torturou, escamoteou a Justiça, pugnou pela ilegalidade e se transformou num dos regimes mais odiados da história do Brasil.

Mas a conseqüência disso tudo foi que especialmente a Esquerda brasileira tem verdadeiro arrepio quando se fala em aprimorar o Direito Penal, quando se fala em utilizar a repressão, quando se fala em punir, porque a ilegalidade está no DNA desse Governo.

            Não querem, de forma alguma, que o crime seja combatido. E é preciso dizer à Nação brasileira: punir é democrático, prender é democrático. Se nós não levarmos ao cumprimento da lei, o que é que vai acontecer? Um cidadão mata um; no outro dia, passa na porta do pai da vítima para provocá-lo, e nada acontece. O que está acontecendo com este País?!

            Se nós não começarmos a aplicar a lei, aplicar decentemente a lei, o que é que vai acontecer? Amanhã surgirão os esquadrões da morte. Amanhã surgirão aqueles que procuram a sua tranqüilidade à beira da ilegalidade. Por que estão florescendo as milícias? Porque, no Brasil, alguns membros das Forças Armadas, alguns policiais militares, alguns policiais civis já estão pedindo à delinqüência permissão para subir o morro, permissão para entrar em determinada área.

            Não pode haver local segregado no País. O Estado tem que ocupar... E não será com aqueles trabalhos dos presos - quando nós chegamos a uma delegacia, ou melhor, quando chegamos a uma penitenciária, o diretor do presídio nos apresenta o trabalho que o preso está fazendo para se recuperar: artesanato com pauzinho de picolé, ou estão costurando bola. Que atividade vão encontrar aqui fora?

            Querem educar o preso? Querem nada! O sistema penitenciário é péssimo. E existem reportagens mostrando? Sim. Por que o Governo não investe no sistema penitenciário? O Governo não quer investir em sistema penitenciário porque aí sustenta um discurso de horóscopo, uma linguagem de horóscopo. Primeiro discurso de horóscopo: “Vamos investir em educação; a educação é fundamental para o Brasil”. É óbvio que é. Discurso de horóscopo é aquele em que a pessoa abre o jornal e lê: “Dia maravilhoso; vai encontrar um namorado sensacional, um sujeito rico, bonito...” Quem é contra investir em educação? Quem é contra estabelecer a condição de crescimento de qualquer pessoa? Quem é contra investir em cidadania, construir casas, melhorar a rede de esgoto, colocar água para todos os brasileiros? Todos nós somos a favor disso. Agora, isso implica ausência de punição? Não se deve punir no Brasil? Todos devem ficar soltos porque as cadeias não recuperam? As cadeias não recuperam; e as ruas? As ruas recuperam? É melhor ter uma pessoa não recuperada na cadeia ou nas ruas?

            Aliás, a recuperação para determinados crimes é muito difícil em qualquer lugar do mundo. No Brasil se aplica isso como regra absoluta. Estão destruindo o Direito no Brasil. Estão desviando a atuação das Forças Armadas. Forças Armadas não podem ser utilizadas para fiscalização de enfeite de fachada de casas em morros, com o único objetivo de privilegiar alguns, com o único objetivo de fazer propaganda para o Governo. Como é que assinam um termo de convênio criminoso como esse?! O Brasil não pode aceitar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que as Forças Armadas sejam utilizadas politicamente.

            As Forças Armadas têm um papel importante, sim, inclusive na segurança! Não serão três desmiolados que causaram uma chacina, que fizeram uma desgraça no Brasil que vão conseguir fazer com que o discurso prevaleça sobre a prática. Temos de fazer com que a prática seja efetivada. Como é que vamos cuidar da Amazônia? As Forças Armadas não serão utilizadas para isso, não, Senador Geraldo?! E as fronteiras do Brasil? O Brasil, que não produz um grama de cocaína, é um dos maiores exportadores do mundo, porque nossas fronteiras não são fiscalizadas, e a droga entra livremente aqui. O Governo despenalizou o uso de drogas no Brasil e até o plantio; o portar, hoje, indiretamente não é crime mais. Por quê? Porque não há nenhuma possibilidade de a pessoa cumprir a pena. Se o juiz estabelece uma interdição, um curso, e a pessoa não cumpre, ela faz o quê? Comete um crime de desobediência. Até tentamos resolver isso no Senado, mas o projeto já tinha saído daqui há muitos anos e não podia ser modificado mais.

            Então, o que está acontecendo no Brasil, Senador Colombo -concederei um aparte a V. Exª -, é um verdadeiro desmonte do Direito, é um verdadeiro desmonte da punição. Cada vez mais leis mais frouxas; cada vez mais julgadores mais preocupados com o delinqüente do que com o cidadão; cada vez mais o cidadão deixando de ter confiança na política e na polícia, principalmente, nas autoridades, e passando a adotar soluções alternativas, ainda que ilegais e criminosas.

            A culpa é nossa, da sociedade; não é culpa só desse Governo também, não, porque o Governo passado foi mestre, useiro e vezeiro em escamotear do Direito. E hoje estamos na seguinte situação: qualquer que seja o crime punido com reclusão, qualquer que seja o crime, com o tamanho da pena que tiver, a pessoa fica apenas alguns minutos na cadeia. Se não alguns minutos, alguns dias; se não alguns dias, alguns meses. Raramente ficam alguns anos. A cadeia se transformou em local de rodízio, por mais perigoso que seja o delinqüente. A pena só é aplicada de uma maneira muito leve, de forma que o crime começou a compensar.

            Então, temos, sim, de tomar o cuidado devido, e não estamos falando de todos os crimes. Há crimes de pequeno potencial ofensivo, há crimes em que a pessoa não deve passar nem na porta da cadeia; tem de haver toda espécie de punição. Estamos falando daqueles crimes que levam a sociedade a ter uma sensação permanente de insegurança. E o grande responsável por isso é o Governo, que não quer punir, não quer fiscalizar e não quer vigiar; não quer dar tranqüilidade ao cidadão.

            Concedo um aparte ao Senador Raimundo Colombo.

            O Sr. Raimundo Colombo (DEM - SC) - Senador Demóstenes, faço este aparte para cumprimentá-lo. V. Exª é uma das maiores autoridades no campo da segurança pública do nosso País e fez um trabalho extraordinário no Estado de Goiás, reconhecido por todo o Brasil. Lá mesmo em Santa Catarina, há um grupo muito forte que faz um estudo e tem V. Exª como referência. Pela primeira vez ouvi a abordagem correta. Quer dizer, trata-se da questão do relativismo, que se estabeleceu na França, na Sorbonne, em 1968, quando se abandonou a meritocracia, essa linha muito da esquerda, e escolheu-se o relativismo: vamos dar um jeitinho; eu não sei, eu não vi; isso aqui não é comigo; eu não quero apurar. Essa posição enfraquece as instituições, enfraquece o sentido das leis e dá para as pessoas uma percepção de que tudo podem, de que se está perdendo limite. O Brasil não tem hoje, de fato, uma crise econômica; tem uma oportunidade que perde porque cresce muito menos que os outros, mas cresce. Porém, tem uma crise moral. E essa crise moral é um problema de atitude das lideranças, o que está muito claro na forma como se faz no Governo. É evidente que se usou o Exército de forma errada, equivocada. O Exército não é treinado nem está preparado para subir nos morros, para combater daquela forma, muito menos para reformar casas. Parece até que terceirizou o serviço. Mas o resultado está aí: uma instituição fundamental da Nação, com uma história como a que tem o Exército, acabou sendo prejudicada por tudo isso. Mas V. Exª faz hoje um discurso que precisa ficar registrado na Casa, porque este é o maior desafio da sociedade: a falta de segurança, a situação que se agrava cada vez mais e o conflito que se estabelece entre a sociedade... Então, você pega um grupo de uma facção, entrega para outra, e eles são assassinados? Olhem onde nós estamos! Olhem a situação que está aí. É realmente uma situação extremamente grave, e V. Exª é uma das esperanças. Parabéns pelo pronunciamento. Quero associar-me a ele, porque é exatamente nessa linha que V. Exª aponta que acredito seja a solução. É dessa forma que me posiciono. Parabéns.

            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO) - Agradeço a V. Exª, Senador Raimundo Colombo, as gentis palavras. Finalizo o meu discurso, dizendo que espero desse e de qualquer governo que não tenham medo da modificação das leis. Muita gente teme a modificação das leis com medo de ser apanhado depois, com medo de que o Estado de direito não seja evidentemente observado.

            Temos de observar o Estado de direito. Fui secretário de segurança pública, prendi policiais militares torturadores e policiais civis corruptos. E a polícia só melhorou. Hoje, temos um grupo de policiais militares e de policiais civis no Estado de Goiás que fazem inveja ao Brasil. Há muito problema? Sim, mas não podemos ficar varrendo o lixo para debaixo do tapete. Temos de agir na legalidade. Também não sou favorável a essas ações quase clandestinas, que levam ao escândalo e à ribalta muitas vezes pessoas que não devem coisa alguma, mas são consideradas criminosas e devedoras naquele momento em que são execradas.

            Mas temos de reconhecer: a ação da Polícia Federal hoje é exemplar. A ação do Supremo Tribunal Federal é das mais elogiáveis, e temos de colocar o nosso País nos trilhos da legalidade. E a legalidade consiste também em prender; a legalidade consiste também em punir. Tem que haver distinção entre o bom e o ruim, porque, senão, o que vai acontecer? Ora, é como dizia o Barão de Itararé, mais ou menos assim: ou consertemos isso ou nos locupletemos todos! Não é verdade? Então tem que haver uma distinção, tem que haver uma recompensa para o homem de bem e tem que haver uma punição, uma vez que a lei considera crime matar, uma vez que a lei considera crime estuprar, uma vez que a lei considera crime a extorsão mediante seqüestro.

            Concedo um aparte ao Senador Eduardo.

            O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador Demóstenes, o Senador Colombo foi muito feliz ao lembrar que V. Exª tem, na verdade, autoridade moral para falar sobre essa questão, pelo seu passado, pelo seu conhecimento. Essa questão da arrogância que, por vezes, acontece em algumas ações realmente assusta, porque temos que defender o Estado de direito. Nenhuma democracia existe de verdade se não houver respeito à lei, e essa lei tem que ser, evidentemente, igual para todos. Temos que ter uma atenção muito especial a essa questão que aconteceu no Rio de Janeiro. Não é à toa que muitos membros do Exército sempre viram com cautela essa participação em ações urbanas. E o que aconteceu lá, que foi realmente uma barbaridade, tem que ser visto sob o prisma do tipo de ação de defesa nacional, ao mesmo tempo buscando realmente a punição de quem for culpado, evitando a generalização, evitando exatamente essa questão que coloquei da arrogância de alguns e olhando, em primeiro lugar, o respeito às leis. Não podemos ter realmente o atropelo da lei, às vezes, para executar uma ação. Esse atropelo, essa ansiedade não pode, de maneira alguma, ser prioritária em relação ao respeito aos direitos humanos, aos direitos prioritários do cidadão.

            O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO) - Agradeço a V. Exª, Senador Eduardo Azeredo, a intervenção.

            Encerro o meu pronunciamento justamente nessa linha, para dizer que não adianta imaginar que as soluções em favor da cidadania por si só diminuirão a criminalidade.

            São mais de cem as causas conhecidas do crime. Isso desestimula as ações de cidadania? Não. Temos que fazer as ações de cidadania; temos que privilegiar o cidadão; temos que tomar todas as medidas para ter uma educação de grande nível.

            O meu primeiro projeto nesta Casa foi obrigar a dar educação em tempo integral a todas as crianças do Brasil que estão no ensino fundamental. Infelizmente, cinco anos depois, isso continua na gaveta, com a justificativa do Governo de que teria de gastar mais R$20 bilhões por ano. Vinte bilhões por ano para o Governo é troco, Senador. Vinte bilhões por ano para o Governo não é nada, para ter as crianças o dia todo na escola.

            O que quero dizer com todas as letras: não serão as bolsas que vão resolver o problema de segurança. O Governo agora criou o “Bolsa Mãe de Família”. Muito bem, se o Governo quer dar bolsa para mãe de família de morro, ou de áreas críticas, para líder comunitária, ele tem o direito de dar. Mas não com a ilusão de que isso vai resolver os problemas de crime.

            O Governo criou o que nós chamamos de “Bolsa Maconha”. O que é o “Bolsa Maconha”? O Governo resolveu dar para o jovem que está em situação de risco, que cometeu um ato infracional, portanto cometeu um crime, uma bolsa de até R$193,00 para que ele saia da delinqüência. E isso significa o quê? Significa que uma pessoa está fumando maconha e o Governo resolve dar R$190,00 por mês para ela parar de fumar maconha. Pode ser que ela resolva também fumar mais os R$190,00 por mês de maconha que o Governo lhe deu, não é verdade? Então, essas ações utópicas não resolverão o problema do crime. O Governo quer dar o dinheiro? Eu até coloquei minha posição, não criei problemas com o Governo, porque acho que o Governo foi eleito e ele tem que ter a oportunidade de implantar o seu ideário. Mas o fato é o seguinte: está ou não está reduzindo a desigualdade social no Brasil? Atestado por quem? Pelo Ipea. Se está reduzindo a desigualdade social, a tese do Governo é que o problema do crime é a desigualdade social. Verdade ou mentira? Então, o crime teria que estar diminuindo no Brasil. Por que o crime está aumentando? É a questão, Sr. Presidente, de o Governo estudar um pouco mais e implantar as medidas corretas. Que implante as suas filosofias, mas implante também as medidas corretas para dar tranqüilidade ao brasileiro.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/06/2008 - Página 22957