Discurso durante a 111ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Protesto contra o Presidente do Ipea, Sr. Márcio Pochmann. Comentários sobre frase do Ministro da Justiça, atinente às causas da violência no País.

Autor
Demóstenes Torres (DEM - Democratas/GO)
Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. LEGISLAÇÃO PENAL. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Protesto contra o Presidente do Ipea, Sr. Márcio Pochmann. Comentários sobre frase do Ministro da Justiça, atinente às causas da violência no País.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2008 - Página 23174
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. LEGISLAÇÃO PENAL. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, CONDUTA, PRESIDENTE, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), NECESSIDADE, ESCLARECIMENTOS, MOTIVO, MANIPULAÇÃO, DADOS, PESQUISA, FAVORECIMENTO, GOVERNO FEDERAL, ESPECIFICAÇÃO, DIVULGAÇÃO, ESTUDO, PREVISÃO, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, BRASIL, ADVERTENCIA, ORADOR, CONFIANÇA, ORGÃO PUBLICO.
  • COMENTARIO, PRONUNCIAMENTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), NECESSIDADE, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, VIABILIDADE, CONTROLE, VIOLENCIA, QUESTIONAMENTO, ORADOR, INCOERENCIA, DADOS, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), AUMENTO, NUMERO, CRIME.
  • DEFESA, REFORMULAÇÃO, POLITICA, SEGURANÇA PUBLICA, PROMOÇÃO, EFICACIA, COMBATE, CRIME, MELHORAMENTO, LEGISLAÇÃO PENAL, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA.
  • QUESTIONAMENTO, INCOMPETENCIA, GOVERNO FEDERAL, SOLUÇÃO, PROBLEMA, VIOLENCIA, PAIS, CRITICA, ALEGAÇÕES, MOTIVO, POBREZA, POPULAÇÃO.
  • ANALISE, AUMENTO, RENDA, POPULAÇÃO, FALTA, POLITICA, CONTROLE, GOVERNO, FACILITAÇÃO, OCORRENCIA, CRIME, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, INSUFICIENCIA, ATENÇÃO, POLICIA.
  • ELOGIO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), EFICACIA, COMBATE, CRIME, VALORIZAÇÃO, CAPACIDADE TECNICA, POLICIAL, DESENVOLVIMENTO, SISTEMA DE INFORMAÇÃO, ESTRUTURAÇÃO, SISTEMA PENITENCIARIO, VIABILIDADE, REPRESSÃO, TRAFICO, CRIME ORGANIZADO.

O SR. DEMÓSTENES TORRES (DEM - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores:

As causas da violência estão menos na desatenção do setor público para com a violência e mais relacionadas à falência do Estado brasileiro em prover o processo de modernização econômica combinado com inclusão social. Ministro Tarso Genro.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicou, na última segunda-feira, um estudo, com base nos dados do IBGE, que mostra a queda da desigualdade de renda no Brasil nos últimos seis anos. A estabilidade monetária, o crescimento econômico, a política salarial e os programas sociais e previdenciários permitiram um aumento de renda de até 22% entre os brasileiros mais pobres.

Mantidas as condições atuais de desenvolvimento, projeta o Ipea, daqui a aproximadamente uma década, o Brasil vai deixar de ter um indicador de desigualdade primitivo de República bananeira. Isto é, o Brasil poderá alcançar um Índice de Gini abaixo de 0,5, o que representará, Senador Geraldo Mesquita, inegável salto de qualidade em um País historicamente caracterizado pela perversidade das injustiças sociais.

O documento do Ipea era a boa notícia que faltava, para consagrar esta Pátria amada, que ora nada em petróleo imaginário e que precisava de um conforto no plano da falada cidadania, para completar a sua grande quimera.

E é preciso registrar a ação pouco democrática e desqualificada do Presidente do Ipea, Sr. Márcio Pochmann, que, simplesmente, transformou o Ipea em um órgão de Governo. Isso, porque, ao realizar a pesquisa e divulgar os resultados dela, simplesmente quis falar que, num passe de mágica, sem que tenha havido qualquer processo de transformação, o Brasil começou a livrar-se das desigualdades sociais.

O próprio estudo do Ipea mostra que isso aconteceu, a partir do momento em que a inflação começou a ser controlada no Brasil e que, expressivamente, de 1999 a 2003, o Índice de Gini, que era de 0,6 no Brasil, caiu para 0,54 e, de 2004 para cá, de 0,54 para 0,5. Ou seja, a queda foi mais expressiva de 1999 a 2003, do que no período atual. Mas há queda.

Temos de reconhecer que não entendemos por que o Sr. Presidente do Ipea, Márcio Pochmann, resolve fazer a divulgação, como se fosse uma ação do Governo atual. O Ipea está aparelhado? Qual a razão por que demitiram as pessoas que eram independentes ali dentro?

Começo a sentir vergonha de utilizar os estudos do Ipea. Será que o Ipea está aparelhando-se, para, em vez de dizer o que é realidade no Brasil, em vez de projetar o futuro... Será que vamos ter de utilizar, de agora em diante, estudos forjados, ou será que vamos ter que apreciar as conclusões de um Presidente que não se qualifica como o corpo daquela instituição, mas que vem a público para arrostar uma mentira, uma inverdade, as suas conclusões? E mais: o que ele expôs é completamente diferente do que está escrito ali, porque ele omitiu uma parte substancial.

Lavro meu protesto contra o Sr. Márcio Pochmann. Ele não pode imaginar que este seja um País republiqueta de banana. Aqui há pessoas que prezam a instituição. Ele deve ao Brasil uma explicação: por que veio a público trazer uma conclusão verdadeira, fazendo uma análise equivocada, ele que, infelizmente, preside a instituição governamental mais qualificada neste País para estudos.

Sr. Presidente, observem que espetáculo: nunca antes este País alcançou patamar de desenvolvimento sustentável, conquistou posição de vanguarda no mercado internacional e promoveu tamanha inclusão social. Excedemos, se for considerado o receituário prático-filosófico do Exmº Ministro da Justiça, Dr. Tarso Genro, sobre as causas da violência. Nos últimos seis anos, o Brasil cresceu, distribuiu renda, ampliou o emprego de qualidade, eventualmente diminuiu a taxa de pobreza, no entanto, pesarosamente, viu os índices de criminalidade e violência crescerem na mesma escala dos tempos em que vivíamos sob sistemáticas crises econômicas e sem o amparo das dádivas petistas.

O que deu errado? Certamente, na primeira parte da frase do Ministro da Justiça - que eu mencionei - está a resposta. A desatenção do setor público para com a segurança pública explica o porquê da reunião das tais condições socioeconômicas favoráveis não ter surtido o efeito automático de redução da violência, tantas vezes propugnado pelos jurisconsultos do queridismo penal.

Os números do Ipea, embora não digam respeito diretamente ao tema, são um desmentido cabal da teoria canhestra que imputa aos pobres o ônus da criminalidade. Deveria ser estímulo para que o Governo Federal, Sr. Presidente, se despisse dessa falácia consagrada e adotasse a responsabilidade política no trato da segurança do brasileiro.

Ainda que desmoralizados, não acredito que os próceres da criminologia crítica, às expensas do contribuinte, venham refluir dessa idéia fixa. Primeiro, porque fazem de tamanha estupidez instrumento ideológico de sobrevivência. Depois, a admissão do equívoco deveria significar a mudança de rumo, a reorientação da conduta administrativa, o provimento de políticas objetivas de combate ao delito por intermédio de ampla reforma da segurança pública; e isso é pedir demais para quem é avesso à boa governança.

Srªs e Srs. Senadores, há mais de uma centena de causas que explicam a propagação da violência. No caso brasileiro, é correto dizer que a pobreza é um indutor concorrente. A razão primordial reside, no entanto, no caráter pusilânime e incompetente do Estado na prestação de um serviço essencial. Desde a Nova República, a segurança pública vem sendo negligenciada, enquanto inúmeros expedientes de afrouxamento do poder estatal foram editados para compensar as práticas detestáveis do regime de exceção.

O Brasil, Sr. Presidente, criou a tolice de que a democracia prescinde das instituições policiais, que o dever punitivo do Direito Penal trama contra os direitos humanos e que a pena de restrição da liberdade é uma atrocidade social. A combinação, Sr. Presidente, do ordenamento legal leniente com o delito e o desmonte do aparato estatal de segurança criou as condições necessárias para que a criminalidade explodisse. Podem vir o crescimento econômico chinês ou o padrão social da Noruega. Nada vai adiantar, caso o Brasil não assimile como paradigma um sistema regulatório penal rigoroso como o da Alemanha, por exemplo. Sr. Presidente, não é a pobreza, mas a impunidade que impulsiona a criminalidade, seja ela organizada ou desorganizada.

Ao contrário do que se apregoa, é justamente a fraqueza estatal que cria os mecanismos facilitadores do enriquecimento ilícito que movem a engrenagem delituosa. Sem uma política de combate ao uso e ao comércio ilegal de entorpecentes, é natural que o crescimento econômico implique mais poder para o tráfico de drogas. Sem monitoramento das atividades na Amazônia, é explicável o incremento do crime ambiental à medida que a fronteira agrícola se expande. Sem um Governo comprometido com a moralidade, é rigorosamente previsível, como vem ocorrendo, que as obras do PAC ensejem escândalos de corrupção. Os crimes de acidente de transportes explodiram porque motoristas que conquistaram o sonho do carro próprio, justamente com os antigos delinqüentes do volante, sabem que podem abusar da lei que nada vai acontecer além do pagamento de uma cesta básica ou da prestação simulada de serviço comunitário. Como o controle é débil, o aumento de renda é sentido positivamente no mercado do contrabando e da pirataria.

O Governo Federal, Senador Jarbas Vasconcelos, vendeu a ilusão de que o Estatuto do Desarmamento traria uma queda extraordinária do índice de homicídios. Houve, de fato, um pequeno recuo em 2005, mas a falta de efetividade das polícias, do sistema judicial e do regime carcerário fez com que os números de 2006, último dado disponível pelo Datasus, voltassem praticamente ao mesmo patamar de 2002. A pequena queda verificada, tem explicação mais convincente. Basta observar as estatísticas.

O Estado de São Paulo influenciou decisivamente no declínio do indicador, uma vez que conseguiu reduzir em 38% o número de homicídios entre os anos 2002 e 2006. E não o fez com o receituário prático-filosófico do Sr. Genro. Em vez do placebo ideológico, os últimos governos de São Paulo conseguiram baixar a criminalidade com a capacitação das polícias, principalmente no que se refere ao desenvolvimento do sistema de informação, com a repressão dura ao tráfico de drogas, com o combate das organizações criminosas, com a estruturação do melhor e mais bem equipado sistema penitenciário, entre outras medidas.

Sr. Presidente, o maior desserviço que o Governo Federal presta à segurança pública do Brasil é o abandono das instituições policiais. Deveríamos tratar de construir modelo estadual autônomo, mas nacionalmente integrado, que tivesse na unificação das corporações civil e militar o conceito básico de estruturação. Não se trata de unir banda podre com abuso de autoridade, mas de depurar as instituições e fazer do lado sadio paradigma de serviço estatal efetivo. É bonito, sempre que ocorre um crime de grande repercussão, autoridades do primeiro escalão do Governo filosofarem que o crime prospera onde há falta do Estado. Perfeitamente, só que eles são o Estado. Falta mesmo um Estado capaz de usar da sua legitimidade repressora, combater e derrotar o tráfico de drogas.

Em vez de jogar a sociedade contra as polícias e imaginar que obrinhas com o carimbo da cidadania vão resolver a crise de segurança, deveriam estar em dia com a obrigação estatal de não permitir que a corrupção contaminasse as corporações a ponto de o crime operar na cúpula das instituições policiais. Definitivamente, não há saída para o problema da criminalidade e da violência no Brasil que passe ao largo das policiais. É um trabalho duro e até asqueroso, pois se trata de pôr a mão na imundice para extirpar corpos rançosos.

Fui Procurador-Geral de Justiça do meu Estado e Secretário de Segurança Pública e Justiça de Goiás e posso garantir que a pressão coorporativa dos bandidos de farda ou distintivo é enorme, mas não supera a vontade geral da maioria dos membros, dos policiais dessas corporações, de desempenhar trabalho honrado, eficiente e digno da confiança da sociedade a que servem.

O Governo Lula, Srs. Senadores, começou cheio de retórica, mudou duas vezes o slogan do programa de Segurança Pública do Ministério da Justiça. Vai terminar com a indefectível marca da incompetência gerencial do setor e, infelizmente, legar ao sucessor um Brasil mais pobre de Estado e muito mais violento, corrompido e criminoso do que recebeu no pacote da falada herança maldita.

Agradeço aos Srs. Senadores.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2008 - Página 23174