Discurso durante a 111ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apreensão com o projeto do governo que flexibiliza a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Autor
Jarbas Vasconcelos (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PE)
Nome completo: Jarbas de Andrade Vasconcelos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO FISCAL.:
  • Apreensão com o projeto do governo que flexibiliza a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2008 - Página 23181
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO FISCAL.
Indexação
  • COMENTARIO, EFICACIA, RESULTADO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, CONTINUAÇÃO, POLITICA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONTROLE, INFLAÇÃO, IMPORTANCIA, PLANO, REAL, LEI FEDERAL, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL.
  • ANALISE, IMPORTANCIA, LEGISLAÇÃO, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, ESTABILIDADE, FINANÇAS, PODER PUBLICO, VIABILIDADE, ESTADOS, MUNICIPIOS, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA, COMENTARIO, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), PERIODO, GESTÃO, ORADOR, GOVERNADOR.
  • QUESTIONAMENTO, INCOERENCIA, PROPOSTA, AUTORIA, EXECUTIVO, APROVAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, AUMENTO, FLEXIBILIDADE, LEI FEDERAL, RESPONSABILIDADE, NATUREZA FISCAL, VIABILIDADE, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO MUNICIPAL, CONTRATAÇÃO, EMPRESTIMO, REESTRUTURAÇÃO, DIVIDA PUBLICA, POSSIBILIDADE, DESPESA, PESSOAL, ADVERTENCIA, RISCOS, FALTA, ESTABILIDADE, ECONOMIA INTERNACIONAL, RETORNO, INFLAÇÃO.
  • DEFESA, ADAPTAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, PODERES CONSTITUCIONAIS, ESTADOS, MUNICIPIOS, ORÇAMENTO, IMPEDIMENTO, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO FISCAL.
  • CONCLAMAÇÃO, SENADO, REJEIÇÃO, PROPOSTA, AUMENTO, FLEXIBILIDADE, LEGISLAÇÃO FISCAL.

O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, o Presidente da República, nas suas aparições públicas, que são quase diárias, tem dito uma frase que se tornou rotineira no noticiário da imprensa brasileira: "Nunca antes no Brasil" - é a frase que ele sempre ressalta os feitos do seu Governo: "Nunca antes no Brasil se trabalhou tanto", "Nunca antes no Brasil se fez tanto", "Nunca antes no Brasil a economia viveu um momento tão importante".

         É verdade, Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, que a economia brasileira vive um momento bom, muito bom. A economia não vive esse momento por acaso, por um falso milagre, por uma dádiva de Deus ou coisa parecida. É um processo que foi iniciado lá atrás com a implantação, por exemplo, do Plano Real e, através do mesmo, obteve-se o controle da inflação. 

A inflação, todo brasileiro com um mínimo de conhecimento sabe, foi sócia dos banqueiros, ajudou muito os governos, tanto o Governo Federal quanto os 27 Estados da Federação e as prefeituras, que gastavam, davam aumentos generosos ao servidor público, e a inflação compensava tudo isso de dois em dois meses, de três em três meses. 

Esse processo inflacionário foi enfrentado, foi vencido com muitas dificuldades. O povo brasileiro pagou um preço por isso. E sempre é bom frisar que nenhum país do mundo conseguiu superar o processo inflacionário sem que o povo pagasse um ônus, sem que isso custasse caro a largos setores da população.

Dizer que a economia vive um processo extraordinário a partir de janeiro de 2003, com a ascensão do PT e de Lula à Presidência da República, é falso, não é verdade. É uma enganação. A inflação estava controlada já há bastante tempo, e foi através desse controle da inflação que o País conquistou confiança interna e externa e plantou as sementes do desenvolvimento, desenvolvimento que o Governo atual tem em suas mãos e tem administrado de forma competente, inclusive, porque, ao assumir, em janeiro de 2003, o Governo não fez nenhuma aventura. Tivesse o Governo enveredado pelo que dispunha o programa do PT, o que previu, por exemplo, no passado, o programa do PT, é lógico e evidente que teria levado o País a uma aventura. Pelo contrário, Lula deu seguimento à política econômica do Governo de Fernando Henrique Cardoso, em determinados aspectos - se aqui tem algum economista sabe disso -, muito mais duro, muito mais rígido, muito mais ortodoxo do que a política econômica adotada pelo Pedro Malan, Ministro da Fazenda de Fernando Henrique Cardoso, durante oito anos. E foi por isso, pelo caminho trilhado pelo Governo Lula de não fazer aventura e por adotar a política econômica do Governo anterior, que o País vive hoje esse momento excelente na economia.

A conquista, Sr. Presidente, da estabilidade da economia do Brasil foi, na minha opinião, obtida a partir de dois pilares, de dois momentos, de dois grandes eventos: o Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Sem esses dois pilares, sem essas duas pernas, evidentemente o País não teria alcançado o papel que desempenha nos dias de hoje.

E não faz mal algum relembrar para o Plenário do Senado e para o Brasil que tanto o Plano Real como a Lei de Responsabilidade Fiscal, ambos tiveram a oposição ferrenha do atual Presidente da República e do seu Partido. Votaram contra o Plano Real, não acreditavam nele e massacraram, na Câmara dos Deputados e aqui neste Plenário, a Lei de Responsabilidade Fiscal, que passou a duras penas. Eu entendo que sem essas duas premissas seria impossível comemorar muitos dos avanços conquistados nos últimos anos.

A aprovação, por exemplo, Sr. Presidente, da Lei de Responsabilidade Fiscal, há sete anos, é um marco na história da administração pública brasileira. Pela primeira vez foram adotadas regras claras, transparentes, para obter o equilíbrio das finanças públicas do nosso País.

Com o fim da inflação, a que já me referi, os gestores públicos perceberam que não mais poderiam ser sócios da ciranda da correção monetária, e a Lei de Responsabilidade Fiscal abriu as portas para que os Estados e Municípios não fossem um obstáculo à estabilidade econômica.

Como Governador de Pernambuco, eleito em 1998, assumi, em 1º de janeiro de 1999, o meu primeiro mandato, a renegociação da dívida do meu Estado tinha sido feita pelo meu antecessor, no ano de 1988. Aliás, foi um dos últimos Estados da Federação a fazer essa renegociação.

O Estado devia a duas entidades, a duas pessoas: a Deus e ao mundo. Eram vários os credores; não era só o Estado de Pernambuco, eram quase que todos os Estados da Federação. O Rio Grande do Sul, Estado a que pertence o eminente e nobre Presidente Paulo Paim, ainda hoje, é um dos Estados, ou talvez um dos poucos Estados no Brasil, que pagam um tributo muito grande por isso, por conta de uma renegociação da dívida que foi feita, mas que, por isso ou por aquilo - que não dá para comentar agora - determinadas coisas não foram feitas em momentos certos. E o Rio Grande, hoje, paga um preço muito caro pelo descontrole de suas contas, que não é nem da atual administração nem da administração que a antecedeu. É um processo que há, no Rio Grande, já há algum tempo, de descontrole das contas, como se aquele Estado fosse dirigido por pessoas perdulárias sem compromisso com o erário, o que não é verdade.

Assumindo o Governo do Estado, em 1999, a partir de janeiro, nós começamos a pagar essa dívida. Faz exatamente dez anos, Sr. Presidente do Senado. E, como Governador, durante o meu segundo mandato, de 2003 à 2006, algumas vezes eu fui convocado para reuniões em Brasília por outros governadores que queriam renegociar, abrir uma porta para a renegociação da dívida. E eu sempre me neguei a me sentar à mesa para reabrir essa discussão em torno da renegociação da dívida. O Governo do Estado de Pernambuco, a exemplo dos outros 26 Estados da Federação, assinou um compromisso de pagar a dívida em 30 anos, com juros de 6% ao ano.

Eu não me senti em condições de me sentar a uma mesa para renegociar uma dívida dessas, uma dívida para pagar em 30 anos, com juros de 6% ao ano, juros privilegiados.

Então, Sr. Presidente, nós pagamos, algumas vezes com sacrifício - 11%, 12%, 13% da arrecadação líquida do Estado, parcelas dessa dívida. Mas tenho absoluta convicção de que, se não fosse isso, se a União não tivesse assumido esse papel de renegociar a dívida e ser o único credor junto a todos os Estados da Federação, evidentemente, estaríamos numa situação de total e completa bancarrota. Nós veríamos Estados e Municípios gastando mais do que arrecadam, comportando-se como verdadeiros papais noéis, porque era isso que existia de norte a sul do País, em todos os Estados da Federação brasileira.

A intenção do Governo Federal neste momento, ao enviar um projeto à Câmara dos Deputados, que acaba de chegar ao Senado da República, de flexibilizar a Lei de Responsabilidade Fiscal é uma insensatez, Sr. Presidente, especialmente neste momento em que a instabilidade ronda a economia mundial e a inflação volta a ser uma preocupação para os brasileiros.

Basta ver a televisão, basta ler os jornais, basta conversar com qualquer pessoa que entenda o mínimo de inflação para ver em cada um dos brasileiros a inquietação em relação ao retorno do processo inflacionário.

O Governo Federal enviou projeto de lei ao Congresso Nacional, no qual permite que Estados e Municípios contratem empréstimos ou reestruturem suas dívidas, mesmo que alguns dos poderes gastem com pessoal mais do que atualmente é permitido pela Lei Fiscal.

Não dá, Sr. Presidente para ver isso calado, sem falar, sem protestar e sem chamar a atenção da opinião pública brasileira.

O que o Governo Federal propõe é um verdadeiro "estupro" da Lei de Responsabilidade Fiscal. Não é justa a argumentação de que o Estado não pode ser punido diante do descumprimento dos Poderes Legislativo e Judiciário. É verdade que os Poderes são independentes, mas o ajuste fiscal não pode ser exigido apenas do Executivo. Até porque o caixa é um só; não existe caixa do Poder Legislativo nem existe caixa do Poder Judiciário, existe o do Executivo; os outros recebem os duodécimos. E não é justo que se abra exceção agora para um ou para outro.

Se existem Legislativos e Judiciários fora dos eixos da Lei de Responsabilidade Fiscal, eles devem ser chamados à ordem. Alterar esta Lei é premiar quem não fez o dever de casa corretamente. Mudá-la representa colocar em risco, Sr. Presidente, tudo que conquistamos nos últimos quinze anos - primeiro com o Plano Real e depois com a Lei de Responsabilidade Fiscal, desde as primeiras medidas aplicadas pelo Plano Real.

Dessa forma, Sr. Presidente, minha vinda à tribuna nesta tarde é para dizer que acompanhei, com grande apreensão, o envio deste projeto do Executivo e a sua tramitação na Câmara dos Deputados. Espero sinceramente que o Senado, através de uma maioria expressiva, esteja atento à tramitação e não permita que avance esse projeto de lei que "flexibiliza" a própria Lei de Responsabilidade Fiscal. Cabe ao Senado Federal agora barrar essa insensatez, essa irresponsabilidade - tem de ser colocado nesses termos, Sr. Presidente. Da forma como foram enviadas ao Congresso Nacional, as alterações são aberrações, são atos de insensatez e de irresponsabilidade. Cabe ao Senado da República, que tem tempo para isso, através das suas comissões e, sobretudo, de seu Plenário, não permitir que avance essa irresponsabilidade, essa total insensatez promovida pelo Governo Federal.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2008 - Página 23181