Discurso durante a 111ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Debate sobre a questão do desenvolvimento da Amazônia. Considerações sobre artigo da jornalista Dora Kramer, que analisa notícias divulgadas pelo Ipea sobre queda do índice de desigualdade de renda entre trabalhadores assalariados.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Debate sobre a questão do desenvolvimento da Amazônia. Considerações sobre artigo da jornalista Dora Kramer, que analisa notícias divulgadas pelo Ipea sobre queda do índice de desigualdade de renda entre trabalhadores assalariados.
Aparteantes
Jefferson Praia.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2008 - Página 23185
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • DEBATE, NECESSIDADE, INCLUSÃO, POPULAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, POLITICA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, RACIONALIZAÇÃO, ATIVIDADE, REGIÃO, ELOGIO, ATUAÇÃO, JEFFERSON PRAIA, SENADOR, PROMOÇÃO, DIALOGO, SUPERIORIDADE, IMPORTANCIA, PRESERVAÇÃO, FLORESTA AMAZONICA.
  • COMENTARIO, LEITURA, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, CONDUTA, PRESIDENTE, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), MANIPULAÇÃO, DADOS, REDUÇÃO, INDICE, DESIGUALDADE SOCIAL, BRASIL, FAVORECIMENTO, GOVERNO, ADVERTENCIA, PERDA, CONFIANÇA, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, NATUREZA TECNICA, MOTIVO, DESRESPEITO, NECESSIDADE, IMPARCIALIDADE, ESTUDO.
  • REPUDIO, CONDUTA, PRESIDENTE, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), ABUSO, FUNÇÃO PUBLICA, DESNECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, MANIPULAÇÃO, INFORMAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Amigo e companheiro Senador Paim, que preside esta sessão, Srs. Senadores, eu assistia, atentamente, ao discurso do Senador Jefferson Praia, um amazônida. V. Exª tem razão, Presidente, o Senador Jefferson Péres deve estar orgulhoso de ter aqui, na sua ausência, um Senador da seriedade, da envergadura do Senador Jefferson Praia.

Estamos todos orgulhosos, Senador Jefferson Praia. V. Exª participa, como todos nós, desse debate que deve ser permanente em torno da Amazônia.

Tenho minhas reflexões, já expus aqui mais de uma vez. Creio que o assunto merece e precisa da reflexão e contribuição de todos.

O Senador Cristovam convoca os 81 Senadores para discutirem a Amazônia; peço que o senhor inclua, Senador, os vinte e tantos milhões de amazônidas que estão lá e que, às vezes, assistem a esta discussão como a gente vê os aviões de carreira passando lá por cima, sem que nos diga respeito. É uma preocupação muito grande que tenho.

Fala-se e cunhou-se, nos últimos anos, expressões que chamo de verdadeiras grifes do ambientalismo. Por exemplo, desenvolvimento sustentável é uma expressão muito controvertida na minha opinião.

Creio, Senador Jefferson, que quem tem que ser sustentável, sobretudo na Amazônia, são os nossos conterrâneos que estão lá, as suas atividades, a sua luta pela sobrevivência; eles é que devem ser sustentáveis. As atividades outras, a nossa preocupação com a floresta têm a ver com práticas racionais. Quem de nós não quer preservar aquilo que deve ser preservado? Quem de nós não quer ter zelo? Quem de nós não quer cuidar bem da Amazônia? Todos nós queremos.

Agora, por vezes, sinto e noto que a gente se envolve tanto nesse debate, nessa discussão que passamos ao largo do fato para mim prioritário e que se sobrepõe a todos esses: precisamos criar políticas de desenvolvimento que contemplem e tenham concurso de todas as pessoas que moram na Amazônia, Senador Jefferson. Não se pode dizer, por exemplo, que não há desenvolvimento na Amazônia. Há. Todavia, ele diz respeito cada vez mais a um número cada vez menor de pessoas.

A verdade é essa. É uma preocupação que tem que nos ocupar aqui: o desenvolvimento na Amazônia diz respeito cada vez mais a um número cada vez menor de pessoas. Se isso não é motivo para nossa preocupação, não sei onde é que nós estamos.

Por isso é que eu saúdo a sua presença aqui, o seu ingresso nesse debate tão importante, porque eu tenho certeza absoluta de que, com a sua vivência, com a sua experiência, todos nós teremos muito a ganhar nesta Casa porque V. Exª enriquece o debate, V. Exª fala com seriedade, V. Exª fala com propriedade. Precisamos escoimar do debate, da discussão aquilo que é superficial, aquilo que não acrescenta nada, que não contribui para eliminarmos a pobreza absoluta que graça na nossa região, para eliminarmos a exclusão absoluta da grande maioria dos amazônidas. V. Exª, quando entra neste debate, chama estas questões, estes assuntos para o centro do debate, para o centro da discussão. É por isso que eu louvo a sua chegada, a sua participação nesse debate.

Concedo um aparte com muito prazer, Senador.

O Sr. Jefferson Praia (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Geraldo Mesquita. Eu apenas gostaria de agradecer as suas palavras de estímulo para que continuemos aqui representando o nosso povo, o povo da Amazônia. Como muito bem V. Exª abordou, apenas alguns se beneficiam de toda aquela riqueza. Na verdade, nós temos passado por crescimento econômico de forma totalmente egoísta, e o desenvolvimento, que é a qualidade de vida, não se dá. Na verdade, há uma região em que o povo é muito pobre; na verdade, estamos em um berço de muita riqueza com pessoas pobres ali dentro. Esse é o contexto daquela região - não querendo mais tomar o tempo de V. Exª -, que tem problemas desde a questão fundiária à questão relacionada à educação ambiental. Na minha visão, deveríamos começar na nossa região, em todos os Estados, falando de Amazônia, dos seus Estados e dos seus Municípios, começando no ensino fundamental e intensificando no ensino médio, para que as nossas crianças percebam onde estão. V. Exª diz que a percepção dos amazônidas é aquela de olhar um avião que está passando; realmente não é a vivência daquele sentimento de defesa, de cuidado com a nossa Amazônia. Acredito que só com a intensificação da educação ambiental, muito embora seja um resultado de médio e longo prazo. Precisamos de ações imediatas, de curto prazo na Amazônia; ações de médio e longo prazo, para, quem sabe, daqui a um tempo, termos um comportamento - e não sei se faço uma boa comparação - como hoje têm todos os que, ao entrar em seus carros, colocam o cinto de segurança. Para usar esse cinto de segurança tiveram de ser obrigados. Hoje, automaticamente, nós colocamos o cinto de segurança, porque tivemos condição de perceber a sua importância para as nossas vidas. Assim será na Amazônia. Precisamos, portanto, de uma iniciativa de curto prazo que possa dar exemplo, que possa frear aquela situação em que passamos do desmatamento desenfreado, desorganizado, apenas na busca de um lucro maior, para chegarmos mais à frente, aos cuidados que devemos ter com a questão ambiental, com a floresta, com os rios da nossa região, que é uma região lindíssima. Muito obrigado pelas palavras que V. Exª me direcionou de estímulo para que continuemos. Sei que V. Exª é um grande amazônida e tem lutado por nossa região.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Muito obrigado, Senador Jefferson. É uma constatação óbvia a que fiz.

Para encerrar o assunto, porque tenho outro a tratar, eu diria a V. Exª que a minha preocupação vai até o ponto em que acho que devemos primar por atividades racionais na Amazônia.

Eu evito muito usar o termo desenvolvimento sustentável porque acho que temos de colar a sustentabilidade aos amazônidas, às pessoas que estão ali. As suas vidas têm de ser sustentáveis, as suas atividades têm de ser sustentáveis, mas as políticas na Amazônia têm de ser racionais.

As atividades da Amazônia têm de ser racionais. Racionais por quê? Elas têm que estar assentadas na ciência, na tecnologia, no comprometimento das pessoas que ali vivem. Precisamos tirar da Amazônia, escoimar da Amazônia, as atividades predatórias, mas precisamos, sim, de um grande projeto para aquela região, precisamos de muita atividade lá. Não podemos considerar a Amazônia algo intocável, um lugar onde não se possa praticar qualquer atividade. Então, é nesse sentido que eu falo.

Sr. Presidente, a questão da Amazônia apaixona todos nós. Por isso, não pude deixar de fazer essas considerações logo após o discurso do Senador Jefferson Praia.

O assunto que me traz aqui, coincidentemente, já foi abordado pelo Senador Demóstenes Torres. Eu também, assim como o Senador Demóstenes Torres, fui tomado de certa preocupação, de certa intranqüilidade, devido às notícias divulgadas por um importante instituto de estudos e de pesquisas do nosso País, o Ipea. Na última segunda-feira, o Instituto noticiou a queda do índice de desigualdade de renda entre os trabalhadores assalariados nas seis maiores regiões metropolitanas do País.

Eu vou me valer de um artigo da jornalista Dora Kramer, publicado hoje no jornal O Estado de S. Paulo, Senador Paim, que achei muito importante, muito interessante, não só de ler, como também de trazer a esta Casa. 

Vou ler, na íntegra, o artigo de Dora Kramer, porque eu acho que é uma análise muito interessante da questão.

Todos nós, de certa forma, reconhecemos aquilo que é positivo nesse Governo em especial e em qualquer Governo. Isso nos leva a supor que não há necessidade, Senador Paulo Paim, de manipulação de informação. Essa é uma prática nociva, perigosa. É uma prática que não acrescenta, que desmerece. Quando você parte para a manipulação de informações, você parte para a tentativa de manipular a cabeça das pessoas. Informação hoje é muito importante. As pessoas hoje em dia decidem muitas coisas na sua vida com base em informações que recebem. Então, é perigoso, principalmente quando a informação parte de um organismo de grande respeitabilidade no Brasil, que é o Ipea.

Vou ler o artigo da Dora Kramer aqui. Quero inclusive que ele seja transcrito nos Anais desta Casa para ficar registrada essa análise, que é muito interessante.

Ela diz o seguinte, Senador Paulo Paim:

Na segunda-feira, o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) contou uma boa notícia sobre a queda no índice de desigualdade de renda entre os trabalhadores assalariados nas seis maiores regiões metropolitanas do País, mas omitiu uma parte importante da história da redução dessas diferenças e da recuperação gradativa do poder de compra dos salários.

Da missa inteira o Presidente do Ipea, Márcio Pochmann, só falou sobre uma parte, justamente a mais interessante para o governo Luiz Inácio Lula da Silva.

Deixou de lá o fato de a melhoria do Brasil, no Índice de Gini, usado no cálculo das diferenças entre as faixas de renda, ter tido início em 1999 - no rastro do fim da inflação quatro anos antes - e, conforme registra o próprio instituto, ter sido superior naquele período à redução apontada agora.

Ao divulgar o estudo sobre a evolução da desigualdade entre os anos de 2002 e 2008, o presidente do Ipea atribuiu a queda de 7% ao salário-mínimo, aos programas de transferência de renda e ficou por aí, restrito aos efeitos obtidos por medida tomadas durante o governo Lula.

Não fez referência ao começo do processo. Aliás falou como se não se tratasse de um processo, mas de um passe de mágica. O salário mínimo, por exemplo. Mais que dobrou nos últimos anos e o presidente do Ipea está certo em apontá-lo como um fator de redução de desigualdade.

Agora, o mínimo só se tornou uma referência hoje contabilizada como melhoria por causa do fim da inflação. Com ela, qualquer aumento - monumental que fosse - perdia o valor em semanas.

O Índice Gini (escala de 0 a 1, variando da igualdade à desigualdade, em ordem crescente), de acordo com o Ipea, ficou durante anos estacionado no patamar de 0,60. Em sua exposição de segunda-feira, Pochmann comemorou a queda de 0,54 para 0,50 nos últimos seis anos.

Mas a redução de 0,60 para 0,54 entre 1999 e 2003 - proporcionalmente maior - não foi sequer referida.

E seria obrigação do Ipea mostrar o cenário todo, a fim de conferir precisão ao resultado apresentado? Na atual conjuntura, a resposta depende do papel que o instituto pretende cumprir.

Se tem alguma veleidade de se preservar como entidade autônoma, tradicionalmente reverente ao rigor científico independente das conveniências do governo de turno - aí incluídos os militares -, evidentemente que não poderia condicionar fenômenos de longo prazo a mandatos presidenciais.

Muito menos selecionar fatos politicamente favoráveis a este ou àquele governo para explicar tais fenômenos.

Uma tarefa aceitável quando executada pelo sistema de comunicação do Palácio do Planalto, pelas agências de propaganda encarregadas da publicidade do governo ou até mesmo por marqueteiros responsáveis por campanhas eleitorais de políticos governistas.

No horário eleitoral gratuito, a exposição de Márcio Pochmann sobre as razões da redução da desigualdade entre trabalhadores assalariados das grandes metrópoles faria adequada figura.

Na boca de quem preside um instituto cuja credibilidade está diretamente ligada ao grau de impessoalidade da conduta de seus profissionais na elaboração dos estudos, soa como uso abusivo de função.

O ex-Deputado Roberto Brant, Relator da comissão especial da Câmara e do Senado, que acabou criando o Fundo de Combate à Pobreza, há quase 10 anos, qualifica a atitude do presidente do IPEA de “desonestidade intelectual”.

Mas provavelmente ele esteja mais próximo da realidade quando manifesta receio de que a forma como apresentado o estudo seja o sinal da capitulação do Ipea ao aparelhamento político-partidário do Estado.

Não foi o primeiro. Quando Pochmann assumiu, no ano passado, a demissão dos economista Fábio Giambiagi, Otávio Tourinho, Gervásio Rezende e Regis Bonelli - divergentes da linha de pensamento do novo presidente - foi recebida como um golpe na autonomia do Ipea.

Pochmann atribuiu as saídas a razões administrativas, mas o presidente Lula, numa entrevista logo em seguida, praticamente o desmentiu: ‘O mínimo de direito que tem alguém colocado num cargo de presidente de uma instituição como o Ipea é colocar quem ele queira, trocar quem ele quer’.

Pelo visto, o salvo-conduto ao exercício do arbítrio não se prende à equipe

Estende-se à escrita seletiva da História à luz da versão politicamente mais beneficente.

Fiz questão, Sr. Presidente, de pedir a inserção do artigo da Dora Kramer nos Anais do Senado, tendo em vista a análise perfeita que ela faz de um fato que preocupa muito, a mim particularmente.

Este Governo não precisa manipular informação. Quando a informação é manipulada, há tentativa de se manipular a cabeça das pessoas. E a manipulação se faz pela via mais odienta, a se verificar na execução de um Governo como este, que é o aparelhamento do Estado. O aparelhamento atrai a manipulação de informação. Isso é uma situação que devemos todos evitar.

Louvemos, saudemos as boas novas, os resultados positivos, mas, por uma questão de honestidade intelectual, principalmente vinda do Ipea, que tem esse dever como um dever funcional. Devemos fazer o registro completo de um processo de luta contra a inflação, que vem de anos e que promoveu as condições objetivas e subjetivas, para que, no Governo Lula, pudéssemos colher resultados importantes.

            Portanto, deixo aqui a minha intranqüilidade, Senador Paim, com relação a possível e aparente manipulação de informações praticada pelo Presidente de um instituto tão importante como é o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea, organismo que sempre teve o respeito da comunidade dos brasileiros - podemos dizer - e principalmente daqueles que têm o dever de se debruçar de forma profissional sobre informações pertinentes ao nosso País, ao seu crescimento e ao seu desenvolvimento.

Era o que tinha a trazer neste momento. Agradeço a gentileza de V. Exª.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR GERALDO MESQUITA JÚNIOR EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

Artigo “Da missa, a metade”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2008 - Página 23185