Discurso durante a 124ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com informações a respeito de monitoramentos feitos pelos Estados Unidos da América em todo o planeta, incluindo o campo petrolífero de Tupi.

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Preocupação com informações a respeito de monitoramentos feitos pelos Estados Unidos da América em todo o planeta, incluindo o campo petrolífero de Tupi.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 04/07/2008 - Página 25482
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • APREENSÃO, RECRIAÇÃO, SETOR, EXERCITO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), DESTINAÇÃO, VIGILANCIA, INTERVENÇÃO, CONTINENTE, REALIZAÇÃO, MISSÃO, AGUAS TERRITORIAIS, AMERICA CENTRAL, AMERICA DO SUL, SUPERIORIDADE, MATERIAL BELICO, ARMAMENTO NUCLEAR, ADVERTENCIA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, PAIS, AMERICA LATINA, REPUDIO, DESRESPEITO, SOBERANIA NACIONAL.
  • APOIO, PROPOSIÇÃO, CRISTOVAM BUARQUE, SENADOR, QUALIDADE, MEMBROS, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, BUSCA, DIALOGO, EMBAIXADOR, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, ASSUNTO, DEMONSTRAÇÃO, APREENSÃO, SENADO, REPUDIO, INTERVENÇÃO, DESRESPEITO, SOBERANIA NACIONAL.
  • APREENSÃO, DIVULGAÇÃO, IMPRENSA, BRASIL, INFORMAÇÕES, INTERESSE, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), DESCOBERTA, POÇO PETROLIFERO, BACIA DE SANTOS, SUSPEIÇÃO, LIGAÇÃO, EMPRESA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, SEGURANÇA, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), EMPRESA ESTRANGEIRA, VICE-PRESIDENTE, PAIS INDUSTRIALIZADO, DEFESA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, EMPENHO, GOVERNO BRASILEIRO, PRESERVAÇÃO, SOBERANIA NACIONAL.
  • REGISTRO, VOTO, CONGRATULAÇÕES, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, LIBERDADE, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, REFEM, GRUPO, GUERRILHA, DEFESA, NEGOCIAÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, MILICIA, BUSCA, PACIFICAÇÃO, REGIÃO.

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente João Pedro, Srªs e Srs. Senadores, recentemente, a imprensa brasileira pautou o debate da soberania nacional. Os alvos seriam a presença de ONGs estrangeiras, a compra de terras por estrangeiros na Amazônia e o conflito indígena na reserva Raposa Serra do Sol, entre outros. Tenho a opinião de que temas tão delicados mereceriam tratamento mais equilibrado e democrático dos meios de comunicação do nosso País.

É angustiante que um fato mais grave que representa um verdadeiro ataque à soberania de nosso País e que, potencialmente, representa uma ameaça à paz na região não esteja despertando a devida atenção dos parlamentos e dos governos dos países latino-americanos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a 4º Frota de Intervenção dos Estados Unidos da América foi criada em 1943 para combater os submarinos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1950, foi desativada por ser desnecessária, mas, 50 anos depois, acaba de renascer, e não é preciso esforço para mostrar seus fins intervencionistas. Os próprios chefes militares os divulgam em suas declarações de forma natural, espontânea e até direta. O chefe do Comando Sul, o Almirante James Stavridis, afirmou que o aparato militar ajuda, no mercado de idéias, a ganhar corações e mentes das populações da região. Já o diretor de Operações Navais, Almirante Gary Roughead, informou que o objetivo da 4ª Frota é “combater o terrorismo e as atividades ilícitas no continente”. A 4ª Frota acaba de entrar em operação e tem sob sua responsabilidade mais de 30 países do continente, cobrindo 16,6 milhões de milhas.

Os Estados Unidos da América têm, hoje, dez porta-aviões do tipo Nimitz, com capacidade de deslocamento de 101 mil a 104 mil toneladas de carga, incluindo 90 aviões e dois reatores nucleares. Os Estados Unidos têm, hoje, esse arsenal e, ao colocá-lo em operação, devem causar preocupação e estranheza por parte dos países latino-americanos. É bom lembrar que o último porta-aviões construído leva o nome de George W. Bush, pai do atual Presidente, e entrará em operação em dois meses.

A recriação da 4ª Frota, destinada a realizar missões navais agressivas nas regiões do Caribe, da América Central e da América do Sul, é uma grave ameaça à paz, à segurança e à soberania dos povos da nossa região e se inspira em doutrina que devemos combater: o suposto direito dos Estados Unidos de intervir, preventivamente, em outros países, a partir da avaliação de que esses ameaçam seu território potencialmente.

Com o restabelecimento da 4ª Frota, os Estados Unidos fomentam a militarização do continente, a corrida armamentista e a ameaça nuclear, já que ela é equipada com porta-aviões nucleares. O Brasil deve se posicionar de maneira contundente contra essa ação americana. Não aceitamos ser vigiados pela 4ª Frota. O alvo dos Estados Unidos é a crescente força que governos de esquerda vêm conseguindo democraticamente no continente. A América Latina não pertence aos Estados Unidos. O povo latino-americano não aceita ser tutelado pelo “grande irmão do norte”.

Concedo aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador José Nery, ainda hoje, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, o Senador Pedro Simon externou preocupação que guarda relação com o pronunciamento de V. Exª, ao afirmar não ver razão para, a esta altura, com o continente americano vivendo em condição normal em sua maior parte, haver operações dessa 4ª Frota. Recordou o Senador Pedro Simon que, quando do Golpe Militar de 1964, havia frotas do governo dos Estados Unidos nos mares do Atlântico, diante do Brasil. Recordou o Senador Pedro Simon que as Forças Armadas dos Estados Unidos, a sua Marinha, intervieram e ocuparam a República Dominicana há algum tempo. Mas, desde então, inclusive no tempo das ditaduras militares, não apenas aqui no Brasil, mas também no Chile, na Argentina, no Uruguai, no Peru e assim por diante, esse tempo foi superado. Em todas as nações da América do Sul, há hoje governos democraticamente eleitos. Aliás, os Estados Unidos da América, que têm seu governo eleito pelo seu povo, sempre professam isso como algo muito importante. Assim como V. Exª, o Senador Pedro Simon expressou que será importante debatermos esse ponto, para, inclusive, transmitirmos nossa preocupação aos Estados Unidos da América. Foi, então, que o Senador Cristovam Buarque fez a sugestão, que avalio como muito positiva, de que nós, Senadores, constituindo um grupo, pudéssemos dialogar com o Embaixador dos Estados Unidos no Brasil, o Embaixador Clifford Sobel, para externarmos nossa preocupação e o ouvirmos também. Ficamos encarregados - o Senador Cristovam Buarque, o Senador Pedro Simon e eu - de procurar o Embaixador. Há pouco, eu conversava com o Senador Cristovam Buarque, para dizer-lhe que telefonei, nesta tarde, para o Embaixador Clifford Sobel, talvez em horário em que S. Exª não estivesse mais atendendo à Embaixada, mas lhe deixei um recado. Mas, amanhã, vou procurá-lo novamente, para marcarmos, para a próxima semana, a visita desses Senadores, inclusive V. Exª, para, em conversa com o Embaixador Clifford Sobel, expressarmos nossas preocupações e também ouvirmos às dele.

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Agradeço ao Senador Eduardo Suplicy o aparte. Desde já, concordo com a proposta apresentada pelo Senador Cristovam no âmbito da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, para que o Senado Federal, por intermédio dessa comissão de Senadores, busque informações precisas e objetivas, a fim de manifestarmos, de forma clara, as preocupações que aqui estou elencando.

Sr. Presidente, Senador João Pedro, espero que V. Exª me conceda um pouco mais de tempo, para que eu possa ouvir o Senador Cristovam Buarque e ainda tratar, num segundo momento, em curtas palavras, acerca dos acontecimentos no Estado do Pará, que merecem também toda a nossa atenção.

Concedo o aparte ao Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Nery, o senhor traz um ponto importante para esta Casa. Para isto existe o Senado: para se preocupar com o futuro, com todos os problemas que temos, inclusive com o problema da soberania. Hoje, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, fiz a recomendação de procurar o Embaixador por que, sinceramente, do ponto de vista da segurança, não vejo que essa esquadra possa nos ameaçar, pelo menos agora, nem nos próximos meses ou anos. Mas, do ponto de vista diplomático, é que eu acho que é importante alertamos que cometem um erro os Estados Unidos ao enviarem essa esquadra para cá. Nos últimos anos, sobretudo nos últimos meses, tem caminhado muito pela Internet, nos meios de opinião, a idéia de internacionalização da Amazônia. E falo aqui diante de dois representantes da Amazônia. Há um clima de receio, sobretudo na juventude brasileira, de que a Amazônia está sob ameaça. Nem vou discutir se está ou não sob ameaça, mas há um clima de preocupação. Dizem que há um livro de Geografia nos Estados Unidos que não põe a área da Amazônia como sendo território brasileiro. Devo dizer aqui que já fiz tudo para encontrar esse livro e que nunca o encontrei. Já coloquei pessoas, bibliotecários e bibliotecárias em busca desse livro, mas nunca confirmei isso. Mas isso chega bonitinho pela Internet, como uma página de livro. Há um clima no Brasil de medo em relação à soberania brasileira na Amazônia. E uma esquadra como essa só faz acirrar o clima de temor. Podem até dizer alguns que se trata de um clima de paranóia, se quiserem. Não considero paranóia. Não considero que haja nada concreto, mas não diria que é paranóia, até porque não seria a primeira vez que países englobam outras áreas. Os próprios Estados Unidos já incorporaram um pedaço grande do México, já compraram o Alasca. Não seria a primeira vez que aconteceria uma coisa dessas. Devo até dizer que recebi um e-mail um dia desses de um cidadão, sugerindo que o Senado discutisse a venda da Amazônia, que seria melhor vender a Amazônia e aplicar esse dinheiro em educação, em saúde etc. Respondi a ele, perguntando se ele sabia o que hoje na Rússia dizem do Czar que vendeu o Alasca: é horror, ódio. É com isso que ficariam as gerações futuras em relação à nossa. Mesmo que a gente aplicasse bem o dinheiro, mesmo que não houvesse desvio, seria uma traição à Nação, à Pátria. Então, há um clima ruim nas relações entre Estados Unidos e Brasil, não entre os governos - é interessante que os governos vão muito bem -, mas entre a opinião pública brasileira. E acho também que há um clima ruim da opinião pública americana com relação a nós, com razão, porque estamos queimando a Amazônia. Estamos tocando fogo na Amazônia, e os americanos têm razão também de ficarem descontentes conosco. Como tenho dito sempre, a Amazônia é nossa, mas a Terra é um imenso condomínio em que cada país tem de respeitar os vizinhos. Por isso, tive a idéia de falar com o Embaixador, do ponto de vista diplomático, no sentido de que não é, a meu ver, um gesto que agrade e acalme o imaginário brasileiro, que está temeroso de perder a Amazônia. Espero que esse encontro seja possível, que o Embaixador nos receba. Aliás, é um homem muito afável, muito cooperativo. Os encontros que tive com ele foram sempre muito bons. E que ele entenda que não faz bem, nas relações mútuas, na simpatia mútua, queimarmos a Amazônia, nem eles mandarem para cá, na mesma época, uma esquadra com todo esse poder bélico, que tem a 4ª Frota!

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Agradeço ao Senador Cristovam Buarque as recomendações e orientações que foram discutidas no âmbito da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Creio que esse é uma passo importante para obtermos explicações e para manifestarmos diretamente ao Embaixador dos Estados Unidos nossa apreensão e, de fato, inconformidade com essas manobras e operações militares em águas dos continentes da América Central e da América do Sul. Porém, essa nossa compreensão se dá por que houve comentários indignados feitos pelo Presidente da Venezuela, e, por isso, é importante que o Senado demonstre publicamente sua indignação com essa atitude dos Estados Unidos, porque, para alguns, talvez, seja mais fácil bradar contra ONGs e tribos indígenas do que contra o império norte-americano.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Permita-me um aparte, Senador José Nery?

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Pois não, Senador Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Dei-me conta agora de que, provavelmente, a razão de a Embaixada dos Estados Unidos não ter respondido à minha ligação seja o fato de amanhã ser feriado naquele país. É o Dia da Independência dos Estados Unidos o dia 4 de julho. Assim, provavelmente, somente na segunda-feira, conseguiremos o diálogo com o Embaixador Clifford Sobel, mas fica aqui nossa solicitação para que ele receba uma comissão de Senadores, entre os quais V. Exª, Cristovam Buarque, eu próprio, o Senador Pedro Simon e todos os que assim desejarem, quem sabe na próxima semana, se o Embaixador puder. Muito obrigado.

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Muito obrigado, Senador Suplicy. Seguiremos, então, esse caminho do diálogo mais direto com o Embaixador dos Estados Unidos.

Como eu falava antes, fiquei bastante preocupado com informações que circulam na imprensa brasileira, fazendo algumas afirmações em relação ao monitoramento permanente que os Estados Unidos realizam em todas as regiões do planeta. Os comentários justamente faziam alusão ao roubo de informações privilegiadas da Petrobras, recentemente, logo após a descoberta do campo petrolífero de Tupi. Os jornais falam que a empresa que faz a segurança na Petrobras teria a participação de empresas norte-americanas que, inclusive, seriam ligadas ao atual Vice-Presidente dos Estados Unidos.

É bom lembrar que, com base nesse argumento de combate ao terrorismo...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Sr. Presidente, peço a V. Exª mais três minutos somente, para que eu possa concluir, após sua extrema condescendência para com o tempo aqui utilizado.

Eu gostaria de dizer que, com base no argumento de combater o terrorismo, os Estados Unidos invadiram o Iraque, mataram Saddam e, agora, operam um plano para obter o mais absoluto controle sobre as reservas petrolíferas, sobre a exploração, a distribuição e a comercialização do petróleo iraquiano.

Portanto, é bom que tenhamos muita firmeza...

(Interrupção de som.)

O SR. PRESIDENTE (João Pedro. Bloco/PT - AM) - V. Exª já falou dez minutos a mais. Vou conceder-lhe mais dois minutos, porque nosso querido Senador Augusto Botelho está precisando sair. V. Exª vai ter mais dois minutos, num total de doze minutos.

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Obrigado, Senador João Pedro.

Estão manifestadas nossas preocupações, e esperamos respostas adequadas, para que essas preocupações sejam eliminadas. Porém, é importante estarmos muito vigilantes e manifestarmos, juntamente com os outros países, muito claramente, que não aceitamos intervenção de quem quer que seja. Somos um país e um povo soberano e assim pretendemos continuar.

Sr. Presidente, uma palavra para saudar a libertação de Ingrid Betancourt, ex-Senadora e ex-candidata à Presidência da Colômbia, seqüestrada durante seis anos e ontem libertada.

Na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional apresentamos voto de congratulações pela libertação de Ingrid Betancourt, dizendo, claramente, que esse gesto deveria significar a retomada verdadeira de um processo de negociação para o estabelecimento da paz no país irmão, de povo irmão, o povo colombiano.

Esperamos que, com a experiência e com o sofrimento desse seqüestro, bem como com o sofrimento dos outros reféns que ainda se encontram seqüestrados, consigamos criar as condições para obtermos uma negociação satisfatória entre as partes, negociação que, de um lado, represente a libertação de todos os reféns e, de outro, a libertação dos presos políticos que estão nos cárceres colombianos. Essa é uma fórmula que, acredito, será capaz de pôr fim a quarenta anos de uma guerra que tem significado para ambos os lados, com perda de vidas e com sofrimento. Precisamos, com certeza, encontrar um caminho para a paz na Colômbia.

Por último, Sr. Presidente, queria solicitar que constasse dos Anais da Casa um artigo da jornalista Paula Sampaio, que trata das mortes dos bebês em maternidade da Santa Casa em Belém, no Pará, para que ficasse registrado um relato minucioso e comovente de como são tratados os pobres em circunstâncias como essa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/07/2008 - Página 25482