Discurso durante a 127ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Perplexidade com o assassinato do menor João Roberto Amorim Soares por policiais na cidade do Rio de Janeiro.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Perplexidade com o assassinato do menor João Roberto Amorim Soares por policiais na cidade do Rio de Janeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 09/07/2008 - Página 26015
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, INJUSTIÇA, HOMICIDIO, CRIANÇA, VITIMA, POLICIAL MILITAR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CRITICA, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, DESPREPARO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIOS, NECESSIDADE, TREINAMENTO DE PESSOAL, AMPLIAÇÃO, CAPACIDADE PROFISSIONAL, QUALIFICAÇÃO, SERVIDOR, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, MELHORIA, ATENDIMENTO, DEMANDA, POPULAÇÃO.
  • VOTO DE PESAR, FAMILIA, VITIMA, CONCLAMAÇÃO, EMPENHO, SENADOR, DEBATE, SITUAÇÃO, SERVIÇO PUBLICO, BRASIL.

            O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os aparelhos que mantinham a respiração do menor João Roberto Amorim Soares foram desligados ontem, e mais um inocente morreu nessa infindável guerra contra o crime.

            Quem assistiu aos telejornais desse domingo, seguramente chocou-se com a execução de uma criança e o pranto de uma mãe desesperada.

            Sr. Presidente, na noite de ontem, assisti ao desabafo de um pai inconformado, de um pai que sonhava, diariamente, com o futuro do filho, que se embriagava a cada gesto novo, com cada peripécia e até com aquele choro maroto, que é próprio do desenvolvimento infantil. Naquele dolorido desabafo não faltou a confissão até daquele sonho mais imediato: o da festa, que deveria se realizar nos próximos dias. Da festa para qual o dedicado pai guardava suas economias! Seria para festa de aniversário; aniversário que não terá festa, mas o silêncio, a reflexão.

            Qualquer vítima inocente dessa guerra suja gera indignação e inconformismo. No entanto, quando a vítima é uma criança, a revolta se agrava ainda mais. Afinal, os pequenos são indefesos e não têm a mínima compreensão do que está acontecendo.

            Além da perplexidade e da dor que rompe os limites da família para alcançar a sociedade como um todo, incluindo aí esta Casa, o episódio impõe profunda reflexão.

            Acontece, Sr. Presidente, que ele está reiterando uma debilidade, que já tem sido discutida nesta Casa, que tem sido discutida neste Congresso, que é a debilidade da segurança pública. O que saltou aos olhos do mais simplório dos observadores é que os policias agiram pelo impulso e não pela razão. Promoveram verdadeira trapalhada, deixando escapar a viatura que conduzia os marginais perseguidos e metralhando o veículo que transportava uma família.

            A responsabilidade do policial que sai atirando a torto e a direito pelo tráfego é inquestionável. No entanto, Sr. Presidente, é preciso reconhecer que há um responsável maior ainda: o Estado.

            Os policiais são agentes do Estado e dão cabo de uma política de segurança pública, que tem como objetivo proteger o cidadão, proteger a sociedade.

            Qualquer política de segurança pública exige mais do que uma boa seleção: exige capacitação, exige treinamento, e não é só o treinamento inicial, exige o treinamento constante. E, pelo que se viu, Sr. Presidente, os policiais não estavam preparados para aquela missão persecutória.

            Além do preparo, uma política de segurança pública não se implementa sem se considerar as condições psicossociais do ambiente profissional. Dadas as características dessa atividade, é preciso considerar as pressões que deságuam nas funções policiais.

            É o Governo exigindo resultados; é a sociedade pressionando o Governo contra essa onda de violência que se alastra por todos os cantos; é a imprensa também fazendo duras cobranças, e cobra porque a violência não tem freio. Enfim, a atividade policial é extremamente estressante e não pode prescindir de uma atenção, de cuidados redobrados da autoridade política de cada unidade da Federação e da União Federal também.

            E aqui cabem, Sr. Presidente, algumas indagações: será que existem procedimentos capazes de temperar aquela rotina diária do enfrentamento dos policiais com atividades de descontração, capazes de reduzir o estresse ocasionado pela brutalidade da atividade policial? Será que o policial é retirado periodicamente da brutalidade de suas diligências, de suas operações, para dedicar-se à atualização profissional? Será que não estão sendo exigidas modalidades de produtividade dos policiais que acabam induzindo esses profissionais ao açodamento, à busca permanente do resultado?

            Hoje, eu estava ouvindo um programa radiofônico onde o apresentador dizia exatamente isso. De repente, o que se busca é uma estatística: quanto mais se tomba, quanto mais mortes se causam, melhor seria a estatística para o policial. Obviamente que essa estatística seria focada no tombo do marginal.

            A verdade, Sr. Presidente, é que no serviço público, de maneira geral, tem prevalecido o amadorismo. O Estado faz o concurso, atende as exigências legais e, via de regra, entrega o servidor público à sua própria sorte. Aqui cabe até uma indagação: seria à própria sorte, ou seria o próprio serviço público que estaria sendo colocado em xeque?

            Ao abster-se de acompanhar o desempenho do servidor e de capacitá-lo para atender as crescentes demandas do setor público, acaba permitindo que este, que o servidor público, acabe se enferrujando.

            Essa crítica, Sr. Presidente, vale para todas as esferas do Governo - federal, estadual e municipal. Não se vê hoje, infelizmente, uma política de pessoal, uma política de recursos humanos balizando a Administração Pública de maneira geral. E vale também essa crítica, Sr. Presidente, para todas as áreas abrangidas pelo serviço público: é o caso da saúde, do meio ambiente, da educação, da fazenda pública, enfim, todos os ramos da Administração.

            Quando ocorre uma tragédia em qualquer dessas áreas, aí sim, discute-se, pontualmente os aspectos desse evento. Quantas vezes, Sr. Presidente, já fomos instados a discutir aqui tragédias ocorridas no meio ambiente, tragédias ocorridas na saúde pública. E quantas vezes foram detectadas nessas discussões a negligência, a imprudência, o despreparo do servidor público?

            Se o fato envolve uma área mais delicada, aí vem a comoção. A comoção do prejuízo, que às vezes é um prejuízo patrimonial, mas às vezes, como é o caso que aconteceu no domingo, é da própria vida. Aí então, todos acordam, todos discutem. Mas, virada a página desse evento, as coisas voltam a ser tocadas como dantes. Vencida a fase da comoção, a rotina do amadorismo retoma o seu curso natural.

            Essa é a questão de fundo que precisa ser debatida, que precisa ser discutida: o Brasil precisa urgentemente começar a pensar numa política de pessoal. Se o serviço público tem a finalidade de atender as demandas da sociedade, é preciso que os seus agentes se preparem e estejam à altura da missão em quaisquer áreas de atendimento.

            Enquanto isso não acontece, Sr. Presidente, seremos compelidos a conviver com episódios como esse que enluta não só a família dessa vítima, mas enluta a toda sociedade brasileira e causa constrangimento àqueles que têm a mínima responsabilidade com o serviço público, como é o caso do Senado Federal.

            Então, Sr. Presidente, para encerrar as minhas palavras, quero dizer a V. Exª que, ao mesmo tempo em que estendo a minha solidariedade a essa família, aproveito para concitar a todos os pares, a todos os Senadores para que se debrucem sobre a questão do serviço público, porque, se continuarmos com essa deficiência tamanha no serviço público, estaremos jogando mais dinheiro pela janela e prestando menos serviços à sociedade.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/07/2008 - Página 26015