Discurso durante a 131ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao episódio entre o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes e o Juiz Federal Fausto de Sanctis, no caso envolvendo o banqueiro Daniel Dantas. Elogios às ações da Polícia Federal.

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. JUDICIARIO. REFORMA AGRARIA.:
  • Comentários ao episódio entre o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes e o Juiz Federal Fausto de Sanctis, no caso envolvendo o banqueiro Daniel Dantas. Elogios às ações da Polícia Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 15/07/2008 - Página 27341
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. JUDICIARIO. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • DETALHAMENTO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, EFEITO, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, MESADA, CONGRESSISTA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), DENUNCIA, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, RESULTADO, PRISÃO, EX PREFEITO, BANQUEIRO, REU, CRIME DO COLARINHO BRANCO, PARTICIPAÇÃO, AUTORIDADE FEDERAL, POLITICO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), LAVAGEM DE DINHEIRO, FAVORECIMENTO PESSOAL, FRAUDE, MERCADO DE CAPITAIS, QUESTIONAMENTO, DECISÃO, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), LIBERAÇÃO, PRESO, RECLAMAÇÃO, DIVULGAÇÃO, IMPRENSA.
  • CRITICA, JUDICIARIO, DEMORA, CONCESSÃO, HABEAS CORPUS, PRESO, BAIXA RENDA, INDIGNIDADE, COMPARAÇÃO, LIBERAÇÃO, REU, RIQUEZAS, EXPECTATIVA, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, TENTATIVA, SUBORNO, POLICIA FEDERAL, COMBATE, IMPUNIDADE, CORRUPÇÃO, CAMPANHA ELEITORAL, VINCULAÇÃO, BANQUEIRO, PODER PUBLICO, REGISTRO, NOTICIARIO, IMPRENSA.
  • SOLIDARIEDADE, MANIFESTAÇÃO, MAGISTRADO, PROCURADOR, ENTIDADE, OPOSIÇÃO, DECISÃO, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), NECESSIDADE, ANALISE, CONSELHO NACIONAL, JUSTIÇA, CONCLAMAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, MUTIRÃO, COMBATE, CORRUPÇÃO.
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O LIBERAL, ESTADO DO PARA (PA), REGISTRO, SUPERIORIDADE, PATRIMONIO IMOBILIARIO, BANQUEIRO, REGIÃO NORTE, SUSPEIÇÃO, IRREGULARIDADE.
  • ELOGIO, TRABALHO, POLICIA FEDERAL, JUIZ, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), COMBATE, TRAFICO, DROGA, CRIME ORGANIZADO, LAVAGEM DE DINHEIRO, EXPECTATIVA, INVESTIGAÇÃO, BANQUEIRO, POSSIBILIDADE, CONFISCO, TERRAS, ESTADO DO PARA (PA), OBJETIVO, REFORMA AGRARIA, SUGESTÃO, INVASÃO, SEM-TERRA.
  • REITERAÇÃO, CRITICA, JUIZ, ESTADO DO PARA (PA), CONDENAÇÃO, ADVOGADO, DEFESA, TRABALHADOR RURAL.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na última semana, o povo brasileiro acompanhou com grande interesse o desenrolar da Operação Satiagraha da Polícia Federal, que investiga crime de lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão de divisas, formação de quadrilha e tráfico de influência para obtenção de informações privilegiadas em operações financeiras. Durante a referida Operação, foram presos, entre outros, o banqueiro Daniel Dantas, o ex-Prefeito de São Paulo Celso Pitta e o investidor Naji Nahas.

            Satiagraha é o termo usado pelo pacifista indiano Mahatma Gandhi durante sua campanha pela independência da Índia. Em sânscrito, satia significa “verdade”; já graha significa “firmeza”. A palavra pode ser traduzida como “busca da verdade”.

            Os acusados foram libertados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), beneficiados por habeas corpus impetrado por seus advogados. O Presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes, aceitou o primeiro pedido de liberdade por considerar desnecessária a prisão de Dantas, de Nahas, de Pitta e de outros suspeitos.

            A Operação Satiagraha é o desdobramento das investigações motivadas pelo escândalo do mensalão, seja pela denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, seja pelo teor do relatório da CPMI dos Correios. Recomendo uma leitura atenta do relatório da CPMI dos Correios, no qual é possível encontrar o elo de ligação entre o publicitário Marcos Valério, o ex-tesoureiro nacional do PT Delúbio Soares e o banqueiro Daniel Dantas. Foram vários milhões de reais canalizados por Daniel Dantas para as empresas de Marcos Valério e dela para paraísos fiscais e para o favorecimento de personalidades da República.

            Com a remoção, o poder do Sr. Daniel Dantas e de seu grupo Opportunity na Brasil/Telecom S.A., na Telemig, na Telemig Celular S.A. e na Amazônia Celular foi seriamente abalado e estaria com os dias contados. No afã de voltar a obter o poder de outrora, o Sr. Dantas não mediu esforços e canalizou recursos das citadas empresas para as de Marcos Valério, que os distribuiu entre seus interlocutores, com o intuito de auxiliar o Sr. Daniel Dantas. É do que trata o relatório da CPMI, vol. II, p. 638. O Sr. Daniel Dantas necessitava influenciar políticos, para que pudesse manter o controle das citadas empresas durante e após sua destituição da administração de recursos dos fundos de pensão das grandes empresas estatais.

            A proximidade do Sr. Dantas e de seu Grupo Opportunity com os Srs. Marcos Valério e Delúbio Soares tinha o objetivo de persuadir e pressionar políticos e dirigentes de fundos de pensão, para que não o removessem do controle da Brasil Telecom, da Telemig Celular e da Amazônia Celular, conforme o relatório da CPMI dos Correios.

            Na apuração feita pela Polícia Federal, foram identificadas pessoas e empresas supostamente beneficiadas no esquema montado pelo empresário Marcos Valério, para intermediar e desviar recursos públicos.

            Com base em informações e documentos colhidos em outras investigações da Polícia Federal, os policiais apuraram a existência de uma organização criminosa, supostamente comandada por Daniel Dantas, envolvida com a prática de diversos crimes. Para a prática dos delitos, o grupo teria possuído empresa de fachada. As investigações ainda descobriram que havia uma segunda organização formada por empresários e por doleiros que supostamente atuavam no mercado financeiro para lavagem de dinheiro. O segundo grupo seria comandado pelo investidor Naji Nahas.

            Além de fraude no mercado de capitais, baseada principalmente no recebimento de informações privilegiadas, a organização teria atuado no mercado paralelo de moedas estrangeiras. Há indícios, inclusive, do recebimento de informações privilegiadas sobre a taxa de juros do Federal Reserve (FED), o Banco Central americano.

            É necessário que a impunidade tenha fim em nosso País, Sr. Presidente. É escandaloso ver a reação de Ministros e de Parlamentares, criticando o fato de os acusados terem sido algemados. Mais escandalosa foi a agilidade com que o STF liberou os acusados.

            Gostaria de lembrar que metade da população carcerária brasileira, de acordo com números oficiais do Ministério da Justiça, espera decisão semelhante àquela que o banqueiro Daniel Dantas recebeu do Presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes. Do total de 422.373 presos em todo o País, mais de 211 mil estão em situação de prisão provisória, ainda sem condenação, e poderiam aguardar o julgamento em liberdade, como ocorrerá com Dantas e com outros acusados pela Operação Satiagraha. Ou seja, quem tem muito dinheiro e possui muitos amigos poderosos pode aguardar em liberdade; os demais, os pobres e excluídos, que contem com a própria sorte.

            É necessário que se apurem com rigor as denúncias feitas pelo Sr. Hugo Chicaroni, preso na terça-feira, durante a Operação Satiagraha, e que se detalhe a tentativa de suborno de um delegado da Polícia Federal por mando de Dantas.

            O Brasil quer saber quem são os beneficiados pelo dinheiro que aparece no documento intitulado “Contribuições ao Clube”. Que clube seria esse, Sr. Presidente? É o que o Brasil quer saber e o que a Polícia Federal tem a obrigação de apurar, de investigar, encontrando e identificando, se possível, os beneficiários desse clube assinalado nos documentos em posse do Sr. Daniel Dantas.

            Durante a CPMI dos Correios, ficou cristalino que o esquema de caixa dois para campanhas eleitorais e as relações promíscuas entre empresas e representantes do Poder Público são práticas recorrentes na política brasileira.

            É muito importante que se apure a forma fraudulenta com que o Governo de Fernando Henrique Cardoso dilapidou o patrimônio nacional, entregando a preço de banana empresas estatais, beneficiando pessoas do quilate de Daniel Dantas. É essencial que se apurem as relações subterrâneas do banqueiro Daniel Dantas com esferas do Poder Judiciário.

            Sr. Presidente, no episódio ocorrido, a operação realizada pela Polícia Federal, que, ao cumprir seu papel, tem a atribuição de investigar crimes graves como esse, tem encontrado muitas resistências e muitos opositores. Inclusive, dias atrás, o próprio Ministro Gilmar Mendes, antes de conceder habeas corpus aos acusados, havia se manifestado de forma bastante crítica e contundente contra o que chamava de excesso da Polícia Federal. Considero que o Ministro Presidente do STF não poderia analisar, julgar e conceder liminar naquele pedido de habeas corpus, tendo em vista haver manifestado anteriormente seu desagrado, sua repulsa, de forma contundente, em relação às ações promovidas pela Polícia Federal. A primeira atitude do Ministro Presidente deveria ter sido a de considerar-se suspeito para julgar aquele habeas corpus. S. Exª deveria, de ofício, ter transmitido o pedido para outro Ministro do STF.

            Além do mais, Sr. Presidente, o que nos chama a atenção e a do povo brasileiro é aquele conceito, aquela visão presente em nosso País de que a Justiça brasileira é lenta. É lenta, sim, para os pobres. Nunca se viu tanta preciosidade do Supremo para, em dois dias, de forma muito apressada, mandar soltar os acusados, contrariando a decisão do Juiz de 1ª Instância de São Paulo, Dr. Fausto de Sanctis, para conceder dois habeas corpus em seguida, mandando liberar o banqueiro suspeito de vários crimes. É essa agilidade que o Brasil não pode compreender e muito menos aceitar. Os 211 mil presos que estão em situação de prisão provisória, sem julgamento, teriam o direito que teve o medalhão banqueiro em poucas horas? É esse gesto de impunidade que o Brasil e a consciência democrática não podem aceitar.

            Sr. Presidente, alguns dizem que decisões da Justiça não devem ser discutidas, mas devem ser acatadas. Mas considero esse episódio um verdadeiro acinte, uma provocação. Nessa decisão, em todos os sentidos, onde se procurar analisar, fica claro o comprometimento da Justiça brasileira, por meio de seu órgão maior, de seu representante maior, com fatos que merecem a repulsa de todos os brasileiros e brasileiras. Uma Justiça tão ágil e tão prestativa para socorrer banqueiros, ladrões do dinheiro público, não tem sentido algum, não tem nenhum senso de responsabilidade para com o País, ao tomar decisões dessa natureza.

            Por isso, essa decisão foi amplamente questionada por magistrados e por procuradores de várias instituições do País. A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e membros do Ministério Público Federal emitiram opiniões contrárias a essa decisão. Inclusive, vários jornais também se manifestaram a esse respeito. Faço referência a um texto do jornal O Liberal, de Belém do Pará, que registra crítica contundente à decisão do STF, do Ministro Gilmar Mendes, por conceder liminar para suspender a decisão de prisão do banqueiro Daniel Dantas. Trata-se de manifestação da Ajufe, que condena essa decisão.

            Inclusive, chegou-se a manifestar que o juiz deveria ser responsabilizado perante o Conselho Nacional de Justiça, tendo em vista que teria adotado procedimentos ao arrepio da lei; que teria tomado decisões que estavam fora das suas atribuições. E a resposta dos juízes, da associação de juízes federais é a de que, naquele ato, não se vislumbra motivação plausível para que um juiz seja investigado por um determinado entendimento jurídico.

            Creio que, se há decisão que deva ser analisada no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, é a própria decisão do Ministro Gilmar Mendes, Presidente do próprio Conselho Nacional de Justiça.

            Sr. Presidente, é com profundo pesar que convivemos, constatamos e registramos esses fatos que diminuem a Justiça do nosso País e que, de certa forma, decepcionam milhões que, ao longo de suas vidas, combatem a impunidade e lutam por justiça em nosso País.

            Portanto, essa decisão do Supremo Tribunal Federal haverá de ser discutida o mais que pudermos, porque é inaceitável, já que inquérito realizado pela Polícia Federal, com detalhes, comprovou que um agente do Sr. Daniel Dantas tentou entregar propina - e entregou uma parte - a um delegado federal, visando à retirada do nome dele e de toda a sua gangue daquele processo.

            É inaceitável, Sr. Presidente, que a investigação conduzida seja tratada como um fato menor, corriqueiro e, com a gravidade que encerra, seja tratada de forma - até parece - aleatória.

            Então, Sr. Presidente, fica aqui a nossa mais veemente discordância com relação a essa decisão do Supremo Tribunal Federal. E não temos problemas em elogiar a Justiça brasileira, inclusive o próprio Supremo Tribunal Federal, quando toma decisões altivas no cumprimento das leis e da Constituição, interpretando e fazendo com que, em muitas situações, e na maioria delas, suas decisões sejam motivo de orgulho.

            Mas essa é uma decepção tão grande, que, se não provocar uma reação da sociedade brasileira, por meio de suas diversas organizações, como fizeram juízes, Procuradores da República, o Ministério Público, muitos órgãos da imprensa brasileira... Mas é preciso uma reação mais organizada. As organizações da sociedade civil brasileira, as mais notáveis, que, ao longo dos últimos anos, das últimas décadas, têm-se dedicado à luta por justiça em nosso País - como os partidos políticos, a OAB, a CNBB, a Associação Brasileira de Imprensa, o movimento sindical brasileiro -, precisam, mais do que tudo, discutir de público essa questão, para que, no âmbito delas, possamos organizar, em nosso País, um movimento nacional contra a corrupção.

            O Brasil - como tem dito aqui, em muitas oportunidades, o Senador Pedro Simon - tem clamado pela realização de uma operação mãos limpas, só que a nossa dificuldade no País, hoje, é definir exatamente quem poderia, Presidente João Durval, conduzir uma investigação desse porte, já que na Itália ela foi promovida pelo Poder Judiciário e pelos Procuradores de Justiça.

            Como se avolumam, a cada dia, os escândalos da corrupção, envolvendo os desvios de recursos públicos, lavagem de dinheiro e todo tipo de falcatrua, creio que é chegada a hora de um movimento muito mais amplo, para combater a corrupção no País, e esse deveria ser, de agora por diante - aliás, como vem sendo a trajetória de muitos aqui nesta Casa, no Senado, na Câmara e no Congresso Nacional -, de vários setores da sociedade brasileira. Mas nunca foi tão atual quanto hoje organizarmos um movimento de mutirão nacional de combate à corrupção em nosso País, em todos os níveis.

            Mas, Sr. Presidente, ainda falando desse episódio da investigação, da operação da Polícia Federal que envolve criminosos ou supostos criminosos - não vou aqui condenar, antes que a Justiça o diga - de colarinho-branco, que provocou tantas reações pelas algemas que foram colocadas neles, como se as elas existem apenas para serem colocadas nos punhos dos pobres, como é feito todos os dias e não se provoca aqui nenhuma reação indignada. Onde está a igualdade prevista no art. 5º da Constituição, “Todos são iguais perante a lei [...]”?

            O grande problema é que alguns querem ser e infelizmente são mais iguais, ou terrivelmente iguais.

            Veja, Sr. Presidente, os jornais do meu Estado, como O Liberal e o Diário do Pará, deram bastante destaque a essa questão, como de fato o fez a imprensa em geral.

            Se olharmos as manchetes dos jornais de hoje, todos tratam dessa questão. O Globo destaca: “Relação de Daniel Dantas com o governo preocupa Lula”; a Folha de S.Paulo, “PF acusa Opportunity de driblar fiscalização”; O Estado de S. Paulo, “Dantas fez lobby para negócio ilícito do Planalto, afirma PF”; e o Jornal do Brasil denuncia: “A teia montada por Daniel Dantas”. Tudo isso, nas primeiras páginas dos jornais do Brasil.

            No meu Estado não foi diferente, mas com o detalhe de que o jornal O Liberal destaca, em sua edição de ontem: “O chamado império de Dantas no Pará é de 4,5 bilhões”. Isso, por conta do seu fabuloso negócio que envolve a aquisição de pelo menos 18 grandes fazendas no sul do Pará.

            Por exemplo, a fazenda São Roberto, em Santa Maria das Barreiras, onde, inclusive, foi identificada a ocorrência de trabalho escravo e de libertação de trabalhadores, que, à época, pertencia ao madeireiro Antonio Lucena Barros, o “Maranhense”, de Redenção; a fazenda Espírito Santo, que fica entre Eldorado dos Carajás e Xinguara, em cuja área há 75 mil cabeças de gado; a fazenda Maria Bonita, situada entre Eldorado dos Carajás e Xinguara; a fazenda Fortaleza, localizada entre Eldorado dos Carajás e Marabá; a fazenda Castanhal, localizada em Sapucaia, que pertencia antes ao fazendeiro João Cléber; a fazenda São Roque, situada em Xinguara, que pertencia ao “Maranhense e que foi comprada ao preço de R$210 milhões; a fazenda Cedro, em Marabá, que era de propriedade do pecuarista Benedito Mutran Filho, no valor de R$85 milhões. As outras oito fazendas estão localizadas em São Félix do Xingu, foram negociadas pelo fazendeiro João Cléber, que foi dono da fazenda Flor da Mata, onde havia trabalho escravo e tráfico de drogas. Ele embolsou R$2 milhões quando a área foi desapropriada em 1999 pelo Governo Federal. Um verdadeiro prêmio.

            O jornal chama “Dantas ‘rei’ no Pará. Banqueiro que esteve preso tem império no sul do Estado”.

            Diz a notícia:

            O banqueiro Daniel Dantas, enrolado até o pescoço em investigações da Polícia Federal, é um rei sem coroa no sul do Pará. Seu tino para fazer negócio causa admiração e espanto entre fazendeiros. Em apenas dois anos, ele acumula no Estado um patrimônio invejável de terras e cabeça de gado. Nos 510 mil hectares de suas fazendas - algumas sob suspeita de grilagem e com ocorrência de trabalho escravo - existem 450 mil cabeças de gado.O valor mínimo estimado desse plantel alcança R$2,7 bilhões e o máximo, R$4,5 bilhões. Nada mal para quem gastou cerca de R$600 milhões na aquisição de fazenda em nove municípios paraenses.O tamanho dos pastos dos bois de Daniel Dantas, com essas terras, supera em três vezes o tamanho da cidade de São Paulo.

            O jornal diz mais:

            A prisão de Daniel Dantas pela Polícia Federal, no começo da semana que passou, sob a acusação de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, não deve frear seu apetite pelas terras do Pará [porque, segundo ele] “São as melhores terras do Brasil para produzir alimentos”, costuma dizer aos magnatas da carne que o procuram. O “rei do gado” no Pará é um homem que não pensa duas vezes antes de fechar um bom negócio.

            Bem, Sr. Presidente, diante dos graves conflitos pela posse da terra em meu Estado, e especialmente no Estado do Pará, nós conclamamos e desejamos que a Polícia Federal, que tem feito um trabalho digno de registro, com independência... É claro, só há um fato com o qual eu tenho também discordância da Polícia Federal: trata-se de, ao fazer as prisões - isso defendo não só em relação ao medalhões, a banqueiros, políticos ou quem quer que seja - ao fazer a operação, muitos a transformam em um fato midiático e, às vezes, só para causar um determinado impacto e constrangimento. Embora, ladrões e criminosos tenham que passar por constrangimento mesmo. Porém, a forma como é feita essa publicidade me parece exagerada. Mas não poderia deixar de reconhecer e elogiar o trabalho da Polícia Federal nessas investigações contra o tráfico de drogas, o crime organizado, a lavagem de dinheiro e a corrupção em nosso País. É digno de nota o trabalho realizado nos últimos anos, especialmente nos últimos cinco anos.

            Portanto, Sr. Presidente, nós esperamos, como os jornais de hoje anunciam que há suspeita de que as terras adquiridas no sul do Pará sejam fruto da lavagem de dinheiro do banqueiro Daniel Dantas e seus comparsas, e conclamamos para que o Presidente da República, uma vez constatada essa prática criminosa, promova o confisco de todas essas terras e dos bens que lá se encontram para colocá-los a serviço do Programa de Reforma Agrária, numa área em que estão presentes muitos conflitos de terra, muitas mortes e muita impunidade.

            E ainda, Sr. Presidente, se, eventualmente, a investigação e a Justiça não venham a promover o confisco dessas terras, sugiro aos trabalhadores rurais sem terra que, como têm sido suas lutas, promovam a reforma agrária nessas terras adquiridas com o dinheiro da corrupção e da lavagem nesses processos escusos que a polícia está investigando.

            Aos trabalhadores que morrem na luta por um pedaço de terra - se o Estado não promove aquilo que lhes é de direito -, que, com sua luta, com seus esforços, façam a reforma agrária nas terras desses banqueiros, agiotas e inimigos do povo brasileiro.

            Quero, finalmente, Sr. Presidente, prestar a minha mais absoluta e irrestrita solidariedade ao Juiz Fausto de Sanctis, da 6ª Vara Criminal de São Paulo, pela coragem que tem demonstrado em suas decisões. O Brasil anseia que a Justiça impeça a continuidade da impunidade, que aja com rigor contra os corruptos e para que deixe de tratar de forma benevolente os autores de “crimes do colarinho branco” e que coloque na cadeia os que sangram as finanças do nosso País diariamente.

            Sr. Presidente, há vinte dias, desta mesma tribuna, critiquei a decisão do Juiz Federal de Marabá, da Justiça Federal de Marabá, que condenou o Dr. José Batista, advogado da CPT e dos trabalhadores rurais sem terra a dois anos e cinco meses de prisão por ter atuado no momento em que os trabalhadores rurais, no sul do Pará e em Marabá, faziam manifestação junto ao Incra para ver garantidos os seus direitos. Daqui desta tribuna, critiquei duramente a decisão do Juiz de Marabá por entender que, se da Justiça sobrevier uma condenação final do advogado, estará sendo aberto um precedente que coloca em risco a atividade dos advogados brasileiros na defesa dos interesses sociais, principalmente dos trabalhadores excluídos. Portanto, lutamos para que aquela decisão do Juiz de Marabá seja revogada. Foi a decisão de um Juiz Federal da Comarca de Marabá, no sul do Estado.

            Mas aqui estou elogiando, reconhecendo e apoiando a decisão do Dr. Fausto de Sanctis pela coragem, por não se deixar intimidar, mesmo sabendo que as suas decisões poderiam ser reformadas, como o foram. Mas, como ele disse, ele tinha de fazê-lo e se dá por satisfeito por cumprir o seu dever. E, se cada brasileiro, em cada local onde se encontra - no seu trabalho, na sua instituição, na sua empresa, em qualquer lugar -, se cada um de nós procurasse fazer o que é da nossa atribuição, da nossa obrigação, com certeza, o nosso País teria mais justiça, menos impunidade e, sem dúvida, seria uma sociedade bem melhor.

            Essa, Sr. Presidente, é a nossa manifestação, indignada por saber que, ao falar assim, falo pela voz e pela consciência de milhões e milhões de brasileiros que, se viessem a essa tribuna, diriam o que eu estou dizendo e, com certeza, diriam muito mais. Porque é lá, no Município, lá, nos nossos Estados, onde acontecem os abusos, as violências, o desrespeito à lei que, sem dúvida, cada brasileiro percebe e verifica o quanto estamos distantes do dia em que a justiça será para todos, e não para meia dúzia de criminosos do colarinho branco.

            Muito obrigado. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/07/2008 - Página 27341