Discurso durante a 134ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro de reunião realizada hoje na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, com a participação de parlamentares venezuelanos, que tratou de temas relacionados à Amazônia.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Registro de reunião realizada hoje na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, com a participação de parlamentares venezuelanos, que tratou de temas relacionados à Amazônia.
Aparteantes
Augusto Botelho, Jefferson Praia.
Publicação
Publicação no DSF de 18/07/2008 - Página 27894
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, REUNIÃO, GRUPO, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, DEBATE, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), REGIÃO AMAZONICA, COMENTARIO, SIMILARIDADE, CONDUTA, ESPECIFICAÇÃO, ATENDIMENTO, COMUNIDADE INDIGENA, ADVERTENCIA, DENUNCIA, CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU), TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), OCORRENCIA, DESVIO, FUNÇÃO, RECURSOS, REPASSE, GOVERNO FEDERAL.
  • CRITICA, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL, IMPLEMENTAÇÃO, POLITICA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, REGIÃO AMAZONICA, PREJUIZO, POPULAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE RORAIMA (RR), SUPERIORIDADE, EXTENSÃO, TERRITORIO, RESERVA INDIGENA, TERRAS, PRECARIEDADE, ASSENTAMENTO RURAL, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), DIFICULDADE, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, REGIÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), REGIÃO AMAZONICA, NECESSIDADE, CONTROLE, REGIÃO, EXCESSO, OCORRENCIA, TRAFICO, DROGA, ARMA DE FOGO, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, RECURSOS MINERAIS, FRONTEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, BOLIVIA, ADVERTENCIA, INSUFICIENCIA, CONTINGENTE MILITAR, PRECARIEDADE, EQUIPAMENTOS, FORÇAS ARMADAS, FALTA, ATUAÇÃO, POLICIA FEDERAL, MINISTERIO.
  • EXPECTATIVA, ATUAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), REGIÃO AMAZONICA, ELABORAÇÃO, DIAGNOSTICO, PROBLEMA, DIVERSIDADE, ECOSSISTEMA, SITUAÇÃO, POPULAÇÃO, CRIAÇÃO, PLANEJAMENTO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, RACIONALIZAÇÃO, EXPLORAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, POSSIBILIDADE, BENEFICIO, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Alvaro Dias, Srªs e Srs. Senadores, hoje estamos no último dia dos nossos trabalhos desta primeira metade da sessão legislativa deste ano. Vamos ter duas semanas de recesso.

Eu gostaria de, primeiro, registrar que tivemos uma reunião hoje na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional junto com a Subcomissão da Amazônia, uma reunião com alguns parlamentares da Venezuela, e trocamos idéias principalmente sobre a Amazônia brasileira e a Amazônia venezuelana.

Tive uma surpresa, Senador Jefferson Praia, acerca deste ponto que o Senador Heráclito Fortes falou aqui, das ONGs que atuam na Amazônia. Há uma coincidência muito grande na forma de agir lá e na forma de agir aqui, principalmente no meio das comunidades indígenas. Essas ONGs - ou “oenegês”, como são popularmente conhecidas - que atuam na área indígena, seja na atenção à saúde, seja no chamado etno-desenvolvimento, no fundo, está provado, inclusive pelo Tribunal de Contas da União, pela CGU, que elas nada mais fazem do que roubar o dinheiro dos convênios assinados com o Governo Federal, principalmente.

Só uma ONG em Roraima, a Urihi, que atua com os índios ianomâmis, desviou mais de R$30 milhões. A outra, a CCPY está listada pelo Tribunal de Contas da União. O Conselho Índigena de Roraima também. Então, na verdade, é preocupante vermos isso numa região como a Amazônia.

Prestei atenção no discurso de V. Exª, Senador Jefferson Praia, em que abordou a importância da Amazônia. Preocupa-me ouvir falar sempre que há um processo de internacionalização da Amazônia; há uma cobiça internacional sobre essa área, seja através de ações com as ONGs, seja na compra de terras por pessoas físicas ou por ONGs internacionais, como é o caso da Cool Earth lá no Amazonas, dirigida por um cidadão britânico.

Na verdade, o Governo brasileiro relega a Amazônia, não dá a atenção que a região merece. Como bem disse V. Exª, a região representa 61% do território nacional, tem mais de 80% das riquezas nacionais, e 25 milhões de brasileiros vivem lá. Quando se fala em Amazônia, a impressão que se tem no resto do País, o que vem à cabeça das pessoas é: mata, bicho e índio. Não que o índio não seja ser humano; é ser humano, sim. Mas os índios na Amazônia não são nem um milhão; aliás, nem no Brasil; o Brasil não chega a ter um milhão de índios. Na Amazônia, temos 25 milhões de pessoas, já incluídos os índios.

Fico a me perguntar - como V. Exª e o Senador Augusto Botelho, somos nascidos na Amazônia, vivemos na Amazônia e não apenas ouvimos falar ou somos informados a respeito dela -, fico sem entender por que tanto descaso por parte do Governo Federal com relação a essa região, com o que se faz na Amazônia.

Aliás, é uma surpresa para mim. O Presidente Lula, quando foi candidato a primeira vez, disse uma frase que me levou a votar nele no segundo turno: ele disse que era preciso um plano para a Amazônia para desenvolvê-la. E é evidente que, quando se fala em desenvolvimento, pensa-se em desenvolvimento sustentável. Desenvolvimento sem ser sustentável não é desenvolvimento. Então, ele disse que era necessário um plano que dissesse o que se pode fazer na Amazônia, e não apenas fazer proibições sobre o que não se pode fazer na Amazônia. Passado o seu primeiro mandato e já transcorridos praticamente dois anos do segundo mandato, o que aconteceu de novo na Amazônia no Governo Lula? Nada! Nada de importante.

No caso do meu Estado, ao contrário, só o que ele tem feito é inviabilizar o desenvolvimento do Estado. Cinqüenta por cento da área do meu Estado é de reservas indígenas nas fronteiras - na fronteira com a Venezuela, na fronteira com a Guiana -, desertificando essas fronteiras, inclusive na região da Raposa Serra do Sol, acabando com quatro pequenas cidades, expulsando de lá brasileiros que foram para lá há séculos! Por quê? Sob a falsa premissa de que os índios precisam daquela imensidão de terra. Na Raposa Serra do Sol, não é só um tipo de índio que está lá, não; são seis etnias diferentes, todas aculturadas, com exceção de uma: os garicós. Lá, o prefeito de um dos municípios é índio, o vice-prefeito de outro município é índio, e a prefeita de um município principal, onde está essa reserva, é neta de índio, embora já miscigenada. Aliás, miscigenada é a maioria da população da Amazônia. Então, não posso compreender esse tipo de medidas.

Por outro lado, o que não é reserva indígena está nas mãos do Incra, arrecadadas pelo Incra. E o Incra, Senador Mão Santa, gere muito mal as terras que estão sob o seu domínio. Faz assentamentos mal e porcamente, não dá assistência aos colonos que ele assenta lá, não dá assistência técnica, nem financeira adequadas. Eu conheço os assentamentos, no meu Estado e em outros Estados, e fico boquiaberto de ver realmente esse descaso.

Lamentavelmente - estou no meu segundo mandato de Senador, estou com dois anos do meu segundo mandato, um ano e meio, para ser mais exato -, já fizemos todas as tentativas, seja no âmbito do Parlamento, isto é, Senado e Câmara, seja no âmbito do Executivo, andando pelos mais diversos Ministérios. Porque a Amazônia está embutida em quase todos os Ministérios. O da Integração Nacional não diz para o que existe em termos da integração da Amazônia ao Brasil. O do Desenvolvimento Agrário é um fiasco. A Funai, que é do Ministério da Justiça, é um absurdo, além das roubalheiras. E os outros Ministérios? O da Saúde joga dinheiro à toa para essas ONGs roubarem na questão da saúde indígena e não atende direito os municípios daquela região.

Diante desse quadro, eu cheguei à conclusão de que só uma coisa poderia pelo menos fazer um diagnóstico, Senador Jefferson, sobre a questão da Amazônia: seria uma CPI. Apresentei um requerimento aqui, assinado por 55 Senadores. Vejam bem, eram necessários 27, mas 55 Senadores apoiaram a idéia. Por quê? Porque realmente nós precisamos fazer um diagnóstico correto do que existe na Amazônia. Como está a questão das terras? Nas mãos de quem estão as terras? Os nossos minérios são descaminhados, contrabandeados, nossas fronteiras são violadas, o narcotráfico, o contrabando de armas, tudo isso acontece na Amazônia.

Pior: não acontece só na Amazônia, mas as fronteiras da Amazônia são a grande porta de entrada para o tráfico; é de lá que vem da Colômbia, da Bolívia e de outros lugares a grande quantidade de tóxico consumido no Brasil.

Onde foi preso o Fernandinho Beira-mar? Não foi na Colômbia? Prova-se aí, portanto, a conexão perfeita. Mas a Amazônia não tem Forças Armadas adequadamente equipadas, nem em número de pessoas; não tem uma Polícia Federal mais bem equipada e mais bem remunerada; não tem a presença dos Ministérios na região, e os governos estaduais ficam aí fazendo um esforço imenso. Imagino o seu Estado, Senador Jefferson, que, sozinho, é maior que sete Estados do Sul e do Sudeste, imagino como seja governar um Estado como aquele sem o apoio adequado. De qualquer forma, eu acho que com essa CPI que pretendemos instalar logo quando retornarmos ao trabalho poderemos fazer o diagnóstico e indicar os caminhos e elaborar leis.

Sei que aqui no Congresso só se aprova o que o Governo quer, está aí o exemplo da CPI das ONGs, sobre a qual o Senador Heráclito falou, que presidi. Terminamos indicando dez ONGs que cometeram delitos e propusemos um projeto de lei para disciplinar a atuação das ONGs. Aprovamos aqui no Senado, foi à Câmara, onde está há três ou quatro anos, e não aprovam. Por quê? Porque o Governo não quer, o Governo tem a maioria. Infelizmente essa é a verdade.

Senador Jefferson Praia, com muito prazer, concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Jefferson Praia (PDT - AM) - Senador Mozarildo Cavalcanti, a cada dia as nossas preocupações aumentam e nós trabalhamos as soluções para essa nossa questão. Tenho acompanhado aqui o trabalho de V. Exª e, junto com outros conterrâneos, tenho indagado que soluções podemos ter. Na verdade, para a Amazônia nós não teremos uma única forma. Eu tenho percebido, um pouco a distância, o trabalho que está sendo feito pelo Ministro Mangabeira Unger quanto ao Plano Amazônia Sustentável. Observo o interesse, as discussões que ocorreram nos diversos Estados, as diretrizes apontadas nesse plano. Alguma coisa já está sendo trabalhada. Acredito que V. Exª deve estar com a mesma preocupação que a que eu tenho quanto ao que fazermos no curto prazo. O que fazermos até viabilizar todas as ações, todos os projetos que devem ser feitos para que nós tenhamos uma região mais bem cuidada e com melhor qualidade de vida. O que fazer até lá? Quando V. Exª fez essa proposição eu não a assinei, talvez por não termos nos encontrado, sobre a CPI da Amazônia. Eu acredito que o objetivo, como V. Exª externou, é o de verificar todas os problemas que estão ocorrendo. Talvez nós devêssemos focar alguma área específica. Por exemplo, se a nossa preocupação é maior quanto às terras da Amazônia, vamos verificar quais são as questões relacionadas com elas, quem são os proprietários de terras na Amazônia. Aí talvez nós possamos, de forma muito mais rápida, obter os resultados que queremos - eu, V. Exª e os demais Parlamentares desta Casa. A preocupação no curto prazo - eu tenho refletido com o meu parco conhecimento sobre a Amazônia, sou de lá, estudo aquela região, nós estudamos aquela região, mas nós, a cada dia, percebemos, Sr. Presidente Senador Mão Santa, o quanto não sabemos de nada - é com a quantidade de biodiversidade perdida quando se desmata e se queima, por exemplo, um hectare de terra da Amazônia. Quanta coisa está sendo jogada fora, quanta riqueza, quantas contribuições fantásticas poderíamos ter para a sociedade atual e para as futuras gerações. No curto prazo, então, o que eu estou pensando neste momento? Digo isso para que V. Exª possa também contribuir para resolver essa questão e intensificar o debate na busca das soluções. Eu acredito que nós deveríamos, primeiro, percebendo que todo aquele arco do desmatamento em todos os Estados da Amazônia Legal - que passa também um pouco pelo seu Estado - conversar. Ter um encontro, aqui, começando nesta Casa com Parlamentares dos demais Estados da Amazônia Legal para que pudéssemos, in loco, conhecer as realidades de cada Estado, ouvir as pessoas interessadas, os agricultores, os cientistas, as universidades e buscar as soluções. Talvez a solução mais apropriada para o Estado de V. Exª não o seja para o meu Estado. Depois, traçarmos um caminho a curto prazo. Quando percebo o trabalho que o Ministro Mangabeira Unger está fazendo... E eu irei, daqui a tempo, procurar ter uma audiência com S. Exª para expor essa minha preocupação e ver em que eu, V. Exª e outros poderemos contribuir para buscarmos as soluções. Para mim, elas surgirão dentro do contexto de conversa in loco. Vamos conversar em Rondônia, vamos conversar em Roraima, vamos conversar no Estado do Amazonas, vamos conversar no Mato Grosso, vamos conversar no Maranhão, vamos conversar com o pessoal do Pará, do Acre, do Amapá. Vamos conversar com todo mundo, com os Parlamentares, com os Senadores, com os Deputados Federais, com os demais representantes do povo, com os governos, com as prefeituras para, quem sabe... Talvez eu esteja fazendo uma proposta tão complicada quanto talvez termos uma CPI com tanta abrangência, Senador Mozarildo Cavalcanti, quanto uma CPI em relação à Amazônia.

Vamos ter tantas vertentes, que não sei se chegaremos o mais rápido possível às soluções que queremos. Será interessante pelos problemas que serão levantados, pelos problemas que já conhecemos, pelo diagnóstico que fizermos. A questão maior é viabilizarmos as soluções, conversarmos com os agentes econômicos que estão lá fazendo o desmatamento, encontrarmos essas pessoas e trabalharmos dentro de um contexto. Vamos dizer o seguinte: olha, você não vai mais desmatar, você não vai mais derrubar nenhuma árvore aqui. A opção que vamos lhe dar, o incentivo que vamos lhe dar, que passa pelas prefeituras e pelo governo dos Estados, é essa aqui, porque vão nos perguntar sobre isso. Concorda? Seremos questionados. No momento em que não puderem mais derrubar a árvore tal... Veja bem que sou um defensor dessa tese, mas vejo também - trabalho sempre dentro dessa concepção - os interesses dos empreendedores amazônicos. Precisaremos ter toda uma orientação para que esses empreendedores amazônicos sejam nossos aliados, mantendo a floresta, aproveitando a floresta da melhor forma possível, verificando, por exemplo, dentro do contexto dos produtos extrativistas, como podemos fortalecer as cadeias produtivas. E aí todos devem estar envolvidos.

Concordo plenamente com V. Exª quando destaca a ação, ou melhor, a falta de presença do Estado brasileiro na Amazônia. Nós somos vistos, como V. Exª muito bem destacou, como aqueles que estão dentro de uma floresta, junto com os animais. Alguns pensam até que em nossa cidade, de vez em quando, encontramos um ou outro animal. Isso pode acontecer também. Eu, por exemplo, que moro num conjunto habitacional perto de uma área verde, já vi dentro da minha casa um jacaré adulto medindo mais de um metro. E eu nunca pensei nisso. Por quê? Nós estamos na Amazônia, no meio da floresta. Manaus é uma cidade - aí falo apenas da minha cidade - que está no meio daquela floresta fantástica. Portanto, a presença do Governo Federal tem de ser mais intensa. O envolvimento por parte do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem de ser maior. Precisa haver um compromisso maior. Não podemos ter um discurso apenas voltado, Senador Mozarildo Cavalcanti, para o crescimento econômico, que é o que viabiliza rapidamente o emprego, o produto, que dá resultados, mas, por outro lado causa os danos ambientais que estamos percebendo. Ou nós - quando digo “nós”, coloco-me junto daqueles que querem o melhor para a Amazônia - forçamos a barra para que o Governo Federal perceba a urgência do tratamento que deve ser dispensado à Amazônia, a urgência da busca de soluções que devem ser encontradas de uma forma tal que o entendimento seja a palavra principal; ou fazemos isso, ou teremos muitas dificuldades.

Um ano para a Amazônia é muito tempo, uma semana é muito tempo. Quantas árvores são derrubadas em uma semana? De acordo com estudos, se nada for feito da forma como queremos, como V. Exª quer também, em 2050 - se Deus nos der todos esses anos - teremos 40% da cobertura vegetal eliminada naquela região. Quanta riqueza jogamos fora? Todos estão com os olhos voltados para lá, o mundo está com os olhos voltados para lá. O mundo nos cobra com um velho ditado - o Senador Mão Santa, pessoa inteligente e de muita leitura, gosta de um ditado. O ditado dos Estados Unidos é: "Façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço". Cobram-nos, assim como fazem outros países desenvolvidos, mas suas ações no sentido da diminuição do efeito estufa, na minha opinião, ainda deixam muito a desejar. Portanto, temos um desafio enorme. Coloco-me ao lado de V. Exª para que possamos, cada vez mais, representar bem aquela região, lutar por aqueles homens e mulheres sofridos que estão lá no meio da floresta esperando por nossas decisões. Parabenizo V. Exª pela brilhante exposição, na qual destaca a nossa região e as preocupações relativas a ela. Muito obrigado.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Jefferson, veja V. Exª que, realmente, a Amazônia é constituída por várias regiões e por vários ecossistemas. V. Exª falou aí, por exemplo, do jacaré. Aqui em Brasília, no lago Paranoá, um dia desses, os bombeiros pegaram um jacaré maior do que esse que foi encontrado na casa de V. Exª.

A minha preocupação é que a gente destaca sempre esta história: árvore e bicho. E os seres humanos de lá, os 25 milhões? Vamos querer ficar nessa poesia de que eles não podem se aproveitar das riquezas existentes? Uma árvore, o que é? É um ser vivo que nasce, cresce, produz e morre. Temos de ter a inteligência de aproveitá-la na hora certa e não dizer, como pregam aí, que há um desmatamento desenfreado, que derrubam a mata por derrubar. Não é verdade: em 508 anos de Brasil, apenas 12% da Amazônia foi mexida. E mexida como? Criando cidades, estradas etc.

Então, discordo de V. Exª em alguns pontos, o que é bom, porque somos de Amazônias diferentes...

(Interrupção de som.)

Percebo que o povo da Amazônia está cansado de conversa. Temos de, realmente, cobrar do Governo Federal ação, temos de cobrar ação dos governos estaduais e municipais.

Eu, que sou médico, penso assim: primeiro o ser humano. Temos de olhar primeiro o ser humano, e esse ser humano tem de se aproveitar de maneira racional das terras, das riquezas, aí incluída também a própria mata, e não ficarmos fazendo o jogo dos desenvolvidos como V. Exª colocou.

Os Estados Unidos e a Europa preservaram suas florestas? Quem é que polui mais: são eles ou somos nós, o Brasil todo? Aqui mesmo, no Brasil, dizem que as queimadas e o desmatamento na Amazônia causam poluição, mas e a queima dos combustíveis fósseis usados nos carros, nos ônibus, nos aviões e nas fábricas em São Paulo? Isso não conta? É muito mais do que na Amazônia.

Então, é preciso que façamos - de novo a minha vertente médica - um diagnóstico correto da Amazônia.

Senador Jefferson, propus a CPI porque não vejo outro caminho, não vejo. Essa história de dizer que a Subcomissão da Amazônia vai resolver ou que a Comissão da Amazônia da Câmara vai resolver é ilusão: não vai, não tem resolvido. Eu estou no Parlamento desde 1982 e tenho visto que os Parlamentares da Amazônia brigam, brigam, brigam e morrem na praia, porque não têm o respaldo de quem executa as coisas, que é o Poder Executivo.

Ora, a Amazônia tem sete Estados, que são Roraima, Amazonas, Acre, Rondônia, Amapá, Pará e Tocantins, e ainda mais dois, o Mato Grosso, que é do Centro-Oeste, mas faz parte da Amazônia Legal, e o Maranhão, que é do Nordeste, mas tem uma parte que é da Amazônia Legal. É uma diversidade enorme! No meu Estado, por exemplo, mais de 40% de sua área não têm mata: são campos naturais, como os cerrados do Centro-Oeste, mas com menos árvores ainda.

Então, o que nós precisamos, efetivamente, é fazer um diagnóstico da realidade da Amazônia, fazê-la desenvolver-se e pedir que o povo brasileiro cobice em conhecê-la. Por exemplo, é muito comum encontrar um brasileiro do Rio ou de São Paulo que conhece toda a Europa, mas não conhece a Amazônia. Eles vão fazer passeios em todo o exterior, mas não passam um dia sequer na Amazônia, que tem um ecoturismo maravilhoso.

Senador Augusto Botelho.

O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Senador Mozarildo, hoje de manhã, eu estive na reunião com os Deputados da Venezuela. Realmente, nossos pontos são coincidentes. A confusão com essas ONGs, que não são ONGs... Existem muitas ONGs boas na Amazônia. Eu posso citar a Missão Evangélica da Amazônia...

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - ...as Novas Tribos, que são missões religiosas, e a Asas de Socorro, que prestam assistência. São três missões que estão há mais de quarenta ou cinqüenta anos na Amazônia. Na Venezuela, os problemas são iguais aos nossos, com ONGs interferindo nas ações lá. Mas eu vou falar da nossa Amazônia. Vou repetir a mesma frase que todo mundo falou: a Amazônia não é uma Amazônia. Em Roraima, temos uma Amazônia diferente da Amazônia do Amazonas, que é diferente da do Amapá e da do Acre. Dentro de Roraima, também temos vários tipos de Amazônia: temos a de transição, quando a mata fica rara e começam os campos; temos a Amazônia pesada mesmo, normal; e temos também a Amazônia em cima das serras, na nossa área de serra, que é a mesma floresta que se estende por toda essa região. Eu pedi este aparte justamente para fazer essas observações e para dizer a V. Exª que a CPI da Amazônia vai ser muito boa. Do meu ponto de vista, é uma falta de respeito que a Nação brasileira faz com a gente amazônida, principalmente com aqueles que ficam à beira dos rios, ao pé da serra, nos campos, pessoas que moram nesses lugares há três gerações, mas até hoje a Nação não deu o título da terra para eles. E não são títulos grandes não, são títulos pequenos. Alguns estão assentados há vinte, vinte e oito, trinta anos, e não têm seus títulos. Como é que querem resolver o problema da Amazônia se a gente que vive lá em cima não tem o direito de ser dona dela? Por isso é que chegam esses caras, vão entrando e derrubando tudo. O pequeno agricultor tem que derrubar a mata para sobreviver mesmo, porque ele não tem alternativa. Ele não tem mecanização, não tem conhecimento de adubação nem de sementes especializadas, ele vive isolado lá no meio daquele mato. Esse homem tem que ter o direito de cortar árvores. É uma injustiça quando o Ibama chega e multa uma pessoa dessa com um valor que equivale a três vezes o preço de sua propriedade: a propriedade vale R$50 mil, e o Ibama dá uma multa de R$150 mil. Em uma região lá de Roraima, este mês agora, nos assentamentos do Cantá, na região de Confiança, deram multas exageradas, e isso não está correto. Por quê? Porque é conversa esse discurso de que estão acabando com a Amazônia, de que a Amazônia está poluindo o mundo. A queima de combustível em um dia de uso de carro em Nova Iorque polui mais do que um mês de atividade na Amazônia. E nós, brasileiros, encaramos esse discurso e ficamos com essa lengalenga de que estamos poluindo. A Amazônia não está poluindo coisa nenhuma! Esse tanto de floresta que foi derrubado... Não é para derrubar floresta, concordo, mas quem derruba essas grandes áreas são os grandes. Os pequenos, no machado, nem conseguem derrubar grandes áreas. Vá derrubar no machado três hectares: são três homens trabalhando um ano todo, que é o que eles fazem para produzir arroz, farinha, mandioca, abóbora. Numa área dessa, eles trabalham três ou quatro anos, só derrubam outra área quando não podem mais. Para eles não deveria nem ser exigida licença de Ibama para fazer a sua rocinha. Sou, portanto, contra essa história, porque prejudica o pequeno. Os grandes não, aqueles caras que derrubam dez quilômetros de uma vez lá, esses, sim, têm que ser multados, devem tomar tudo deles. Dos pequenos, não. A lei tem que ver diferentemente os diferentes. A lei está errada, porque quando o Ibama multa os pequenos, para mim, multa até com mais rigor, porque o cara não tem nem onde cair morto, não tem dinheiro nem para comer. Como é que vão pagar uma multa de R$100mil ou de R$150 mil? Então, acho que a nossa CPI vai servir para corrigir essas distorções, principalmente para resolver titular essas terras. Nosso Estado até hoje não tem terra, Senador Mozarildo. Nós falamos isto todo dia e toda hora aqui: até hoje a Nação brasileira não passou as terras para o nosso Estado. Por isso, acredito que vamos discutir um leque de problemas na CPI. Mas tem que ser assim mesmo. Talvez ela não seja CPI corrida, seja meio lenta, mas deve fazer o que é melhor para a gente que vive lá. Também quero proteger a natureza, gosto da floresta, gosto do campo, gosto de mato. Sinto-me melhor nas áreas bucólicas do que aqui. Temos que fazer tudo para o homem poupar, porque quero que meus netos, bisnetos, tetranetos tenham floresta e tenham animais. Espero que haja jacaré - não para entrar em casa - para eles verem no igarapé. Muito obrigado.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Augusto Botelho, agradeço a V. Exª o aparte. V. Exª conhece muito bem o nosso Estado de Roraima e a Amazônia como um todo.

Já andei por todos os Estados da Amazônia, morei no Pará - e lá me formei - por oito anos. Estive lá recentemente, lamentavelmente para ver a questão da mortandade de crianças na Santa Casa.

Temos que fazer exatamente isto - V. Exª que também é médico, como o Senador Mão Santa: estabelecer um diagnóstico e indicar o tratamento adequado para a Amazônia. Não se pode ficar tratando a Amazônia como se fosse o quintal da Nação, como se lá não houvesse gente, como se lá não estivesse, inclusive, a solução para os problemas do Brasil.

Se o Brasil explorasse adequadamente as riquezas minerais da Amazônia, nós não teríamos sequer dívida interna, nós não teríamos as mazelas sociais que temos no País. Mas não sabemos e ficamos repetindo o discurso do G-8, das grandes corporações financeiras internacionais, de que temos que dar prioridades paras árvores e não para os seres humanos, que nós temos que dar prioridade para os bichos e não para os seres humanos.

Eu não tenho nada contra árvore nem contra bicho, mas acho que, primeiro, é o ser humano.

Encerro o meu pronunciamento, Senador Mão Santa, coincidentemente, nesta última sessão, desta primeira metade do ano, dizendo isto: espero que, ao voltarmos, daqui a duas semanas, nós possamos discutir melhor a implantação dessa CPI, que, muito mais do que investigativa, vai ser propositiva, vai, portanto, diagnosticar e propor as soluções para a nossa querida Amazônia.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/07/2008 - Página 27894