Discurso durante a 136ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Celebração dos 60 anos de existência da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC. Apelo no sentido de mais incentivos à pesquisa no País.

Autor
Marco Maciel (DEM - Democratas/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Celebração dos 60 anos de existência da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC. Apelo no sentido de mais incentivos à pesquisa no País.
Publicação
Publicação no DSF de 05/08/2008 - Página 28758
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIENCIA (SBPC), LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, PRESIDENTE, ENTIDADE, REGISTRO, HISTORIA, FUNDAÇÃO, REALIZAÇÃO, ENCONTRO, CIENTISTA, AVALIAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, SETOR, IMPORTANCIA, CIENCIA E TECNOLOGIA, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, INFERIORIDADE, INVESTIMENTO, COMPARAÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ASIA, NEGLIGENCIA, GOVERNO BRASILEIRO, PROMOÇÃO, PARCERIA, UNIVERSIDADE, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, EMPRESA PRIVADA, APOIO, SUGESTÃO, MELHORIA, EDUCAÇÃO, ENSINO, CIENCIAS, FORMAÇÃO, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO AMAZONICA, COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL, SIMPLIFICAÇÃO, BUROCRACIA, APROVAÇÃO, PROJETO.
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AVALIAÇÃO, INFERIORIDADE, NUMERO, PATENTE DE REGISTRO, PATENTE DE INVENÇÃO, PREJUIZO, COMPETIÇÃO INDUSTRIAL, BRASIL, AGREGAÇÃO, VALOR, PRODUTO NACIONAL.

O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente nobre Senador Alvaro Dias; Srs. Senadores Paulo Paim, Eduardo Azeredo e Osmar Dias, Srªs e Srs. Senadores, a SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência está celebrando, como nós sabemos, seus 60 anos de existência. O atual Presidente da instituição, o matemático e ex-diretor do INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Marco Antonio Raupp, observa, em artigo publicado em O Estado de S. Paulo, que:

“No dia 08 de julho de 1948, cerca de sessenta pessoas, atendendo a convite dos Drs. Paulo Sawaya, José Reis e Maurício Rocha e Silva, reuniram-se no auditório da Associação Paulista de Medicina para cuidar da fundação destinada a lutar pelo progresso e defesa da ciência em nosso País”.

Mais adiante, diz o articulista:

“Em outubro de 1949, quando foi realizado a primeira Reunião Anual da SBPC em Campinas (SP), apenas cento e quatro cientistas e amigos da ciência participaram do evento. Esse primeiro encontro marcou a forma como a SBPC se pronunciaria sobre os diversos eventos científicos nacionais. No mês de julho passado, retornamos a Campinas, onde realizamos na Unicamp [Universidade Estadual de São Paulo] a 60ª Reunião Anual da SBPC. Com um público estimado em 10.000 pessoas, sabemos que já trilhamos um bom caminho”.

Faço o cotejo entre 1948 e 2008. Enquanto eram apenas sessenta pessoas há sessenta anos, mais de dez mil estavam presentes à recente reunião, o que deixa evidente que a SBPC é cada vez mais um fórum, um locus, extremamente competente e articulado na defesa dos assuntos que interessam ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia. O mundo do século XXI se caracteriza por grande aceleração histórica e se deve, em grande parte, ao desenvolvimento da ciência e tecnologia no mundo todo.

A SBPC é hoje, credenciadamente, uma instituição respeitada e seus trabalhos reverberam nos diferentes fóruns do País, inclusive aqui no Congresso Nacional, porque não podemos pensar o País sem dar prioridade ao desenvolvimento da ciência e tecnologia; e eu acrescentaria também o da inovação, assunto sobre o qual ainda avançamos pouco.

No seu último encontro nacional, em Campinas, como acabei de me referir, a SBPC tornou a oferecer conclusões voltadas para reduzir o “custo Brasil” nas nossas exportações. Prosseguimos gerando pouco valor agregado, isto é, as exportações brasileiras são basicamente exportações de commodities e, conseqüentemente, caracterizadas por baixo valor agregado. A incorporação de ciência e tecnologia é relativamente pequena no caso das commodities.

Felizmente, há uma empresa, hoje privatizada - aliás, a sua privatização foi um grande êxito, que eu tive a oportunidade de acompanhar aqui como Senador, no início da década de 80 -, que exporta com alto valor agregado. Refiro-me à Embraer, que nasceu de um projeto gestado no Ministério da Aeronáutica, na Força Aérea Brasileira. Seus quadros foram preparados basicamente no ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica - e muitos vieram do IME- Instituto Militar de Engenharia, localizado na Praia Vermelha, Rio de Janeiro, instituição vinculada ao Exército brasileiro, isto é, anteriormente, ao Ministério da Guerra.

Federico Souto Maior, ex-diretor-geral da Unesco e um grande intelectual espanhol, disse, certa feita, que “a distância entre países pobres e ricos é uma distância de conhecimento”. Parece-me que a sua afirmação é extremamente consistente com que observamos no panorama internacional dos nosso dias. Os países que investiram mais em ciência e tecnologia, acrescentando inovação, estão numa posição mais destacada no ranking do desenvolvimento, conseguem assegurar aos seus respectivos povos melhores condições de vida e participação nas grandes decisões internacionais. 

Portanto, ciência, tecnologia e inovação são insumos vitais para uma correta opção de desenvolvimento.

Nós, no Brasil, precisamos gerar consciência da necessidade de estarmos atentos à questão científica e tecnológica. Há, no Brasil, um sentimento nesse sentido, mas que ainda não se converteu em algo que a sociedade reclame como fundamental. É também importante que os Governos se motivem mais para essa variável científica e tecnológica que tem muito a ver com a melhoria do conhecimento e do saber em diferentes áreas, sobretudo aquelas consideradas estratégicas para o País.

Os investimentos brasileiros em pesquisa, Sr. Presidente, oscilam em torno de 1% do Produto Interno Bruto, metade do que aplica a Coréia do Sul, com população menor de 1/3 da brasileira e menos até que os de países latino-americanos, como o Chile, por exemplo.

É importante insistir que a Coréia do Sul, embora seja um país de pequena extensão territorial, com uma população relativamente bem menor do que a do Brasil, consegue realizar essa proeza, e isso acontece, obviamente, porque os governos desses países, assim como suas sociedades, buscam melhorar o seu desenho industrial e a sua competitividade, conseguindo exportar mais com alto valor agregado. O fundamental é gerar, portanto, essa consciência.

Certa ocasião, disse o Presidente Kennedy que governar é administrar pressões. Penso que, no Brasil, ainda não há uma tomada de posição no que diz respeito à questão científica e tecnológica, salvo em alguns governos - e aí eu gostaria de destacar o Governo a que tive a honra de pertencer, o Governo de Fernando Henrique Cardoso. Geralmente os governos não têm essa compreensão da importância da estrategicidade, se assim posso dizer, da questão científica e tecnológica.

Eu argumentei sobre a Coréia do Sul, mas podia falar também a respeito de Taiwan, da Malásia e Cingapura, que devem seus recordes de desenvolvimento aos investimentos em ciência e tecnologia. Antes daqueles países, a revolução industrial européia e norte-americana já havia recebido grande apoio das universidades.

Isso nos faz lembrar a necessidade de articular esse esforço no campo científico e tecnológico com a sociedade civil e, mais do que isso, com os respectivos governos. É necessário portanto, insisto, esse esforço de gerar ciência e tecnologia. Não é um esforço que deve ser apenas das universidades ou das instituições de pesquisa, mas que deve compreender também a participação das empresas e a inserção e o estímulo do próprio governo. Isso é o que acontece nos Estados Unidos da América do Norte e na Europa. Esses países perceberam cedo o quanto é importante a necessidade da ligação entre universidade e empresa.

Com relação a patentes, a posição brasileira é mais desconfortável ainda. Se com relação a investimentos chega a 1% em ciência e tecnologia, com relação a patentes o Brasil participa apenas com 0,2% das patentes anualmente registradas no mundo. Trata-se - reforço - de número extremamente baixo, sobretudo se comparado à expressão econômica de nossa Nação. Somos um País com uma grande expressão territorial. Temos uma população que já ultrapassa 180 milhões de habitantes.

Temos vizinhança com dez países e precisamos, por isso mesmo, ter consciência de nossa grandeza e melhor aproveitar as oportunidades que surgem e podem beneficiar muito o nosso processo de desenvolvimento não somente econômico, tecnológico, mas também social.

Precisamos, Sr. Presidente, multiplicar e aprofundar as experiências de incubadoras de novas pesquisas tecnológicas em articulação com as já existentes para integração entre os pós-graduados e a iniciativa privada. No Brasil, cerca de 80% dos nossos doutores pesquisam em universidades enquanto na Coréia do Sul - e volto a esse país asiático para fazer mais uma vez um cotejo - dois terços o fazem nas empresas. Então, aí está muito clara uma das causas do êxito da Coréia do Sul: esse link, essa integração, esse enlace entre universidade e empresas.

No Brasil, isso ainda não acontece, o que significa dizer que precisamos fazer com que o empresariado, sobretudo nas médias e grandes empresas, se voltem mais para essa questão, o que importará ganhos significativos não somente na exportação dos seus produtos, mas também no fornecimento para o nosso mercado interno.

Já temos um mercado de certa expressão, sem contar que países vizinhos compram cada vez mais produtos brasileiros, e daí a importância de buscar essa ligação entre empresa e universidade.

A questão atual do etanol é típica desse contexto. O Brasil dispõe de enormes áreas disponíveis e muitas experiências acumuladas. Mas outros países já estão pesquisando a extração do etanol do milho ou do próprio álcool. Na última reunião da SBPC tornou-se evidente que “o risco maior é ficar para trás, não fazer nada e ficar sem agregar tecnologia cada vez mais intensamente ao produto”.

O Presidente da SBPC, a quem já citei neste pronunciamento, entende que não há falta de recursos para atender a demanda atual da pesquisa no Brasil, o que urge melhorar a oferta de bons projetos. Para tal, afirma ele:

“Um fator crucial para garantir essa demanda qualificada é investir mais em educação científica nas escolas e universidades para formar mais e melhores pesquisadores, especialmente em regiões carentes de cientistas, como no Norte e Nordeste”.

      No Nordeste já se faz um esforço muito grande nesse sentido.Com relação ao Norte, sabemos que a Amazônia ainda é o nosso grande desafio e vai depender muito do talento dos nossos pesquisadores para que ela possa responder de forma mais significativa pelo crescimento do nosso País. Continuo com a afirmação do Presidente da SBPC:

A qualidade do ensino básico de ciência é periclitante” - uso as palavras de Marco Antônio Raupp. “Precisamos de uma revolução. Na Amazônia, região que cobre 60% do território brasileiro, por exemplo, há menos doutores do que na Universidade de São Paulo (USP). Precisamos de muito mais ciência na Amazônia, só assim vamos conseguir preservá-la.” (...) “A prioridade, mais uma vez, é a Amazônia. A região contribui com 9% do PIB nacional, mas recebe apenas 2,5% dos investimentos nacionais em ciência e tecnologia. Isso significa que as regiões mais pobres estão financiando a ciência nas mais ricas.”

Além disso, é fundamental, segundo a SBPC, aumentar o número de doutores em nosso País. Nos últimos dois anos nos limitamos a algo na casa de dez mil.

De acordo com a SBPC, os desafios que norteiam à ação da entidade são os seguintes:

- revolução educacional de grande escala e em todos os níveis, buscando qualidade, universalização, profissionalização, criatividade e flexibilidade;

- superação das desigualdades regionais, promovendo a ocupação plena, racional e bem distribuída do território, com atividades educacionais e de pesquisa e desenvolvimento, ocupação esta estratégica e preparada para a incorporação das novas fronteiras do desenvolvimento, com especial referência à Amazônia;

- promoção da inovação das empresas, superando o fosso ainda existente entre universidade e setor produtivo;

- criação de 8ma metrológica de padrões amplos, com base científica e capacidade de promover qualidade entre as relações de exportação/importação e produção/consumo.

Sr. Presidente, W.W. Rostow demonstrou muito bem, no seu livro publicado há cerca de trinta anos intitulado As Etapas do Desenvolvimento Econômico, a correlação entre os ciclos da economia e os da inovação tecnológica. Os nossos cientistas, reunidos há pouco pela SBPC, testemunharam também as dificuldades burocráticas de apreciação, julgamento e decisão de apoio aos projetos científicos brasileiros. Houve importante discussão sobre a necessidade de parques como ponto de encontro de empresas e universidades. Às universidades públicas deveria caber o controle do uso, por exemplo, das coletas na floresta amazônica para pesquisa e sua posterior destinação. O mesmo se pode dizer do etanol e de outros produtos oriundos da tecnologia brasileira, enfrentando, por sinal, a complexidade e lentidão dos processos de financiamento no inicio de cada pesquisa e nos respectivos patenteamentos ao seu término.

Sr. Presidente, em que pesem os esforços feitos, os avanços e os recuos, que felizmente foram poucos, existe um setor que continua sem apresentar grande progresso. Refiro-me à prestação de inovação tecnológica. Em artigo na Folha de S.Paulo, em julho passado, os professores Roberto Nicolsky, este Diretor-Geral da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica, e André Korottchenko de Oliveira, engenheiro e Consultor em Gestão de Patentes, constatam:

“O Brasil ainda está longe de gerar tecnologia competitiva o suficientes para garantir espaço entre os grandes players mundiais em setores estratégicos da economia.

Tal situação pode ser claramente percebida ao analisar as últimas três décadas do ranking de registros de patentes no escritório norte-americano, USPTO. O país vem gradativamente involuindo quando comparado com os emergentes asiáticos.

Em países desenvolvidos, consegue-se maior número de patentes a inventores nacionais que a estrangeiros, não sendo diferentes nos Estados Unidos, líder em seu território.

      O Japão ultrapassou a Alemanha em patentes concedidas no EUA em 1975 e, desde então, as duas nações se mantiveram, respectivamente, na segunda e terceira posições do ranking do USPTO. A grande mudança nos últimos dez anos é a ascensão de Taiwan e, principalmente, da Coréia do Sul.

      O baixo número de patentes brasileiras está diretamente relacionado ao escasso investimento em pesquisa e desenvolvimento na indústria.

          Como as inovações atendem a necessidades dos consumidores e usuários, é natural que sejam geradas no pólo produtor, isto é, na empresas.

      O recente desenvolvimento tecnológico da Índia e da China reforça essa tese.

         Agregar valor por meio de inovações incrementais em tecnologia importadas é uma atividade que conta com fomento explícito da Índia (lei nº 44/95).

           Assim ocorreu no Japão do pós-guerra e, posteriormente, na Coréia do Sul e em Taiwan. E é isso que, entre nós, faz o sucesso de Petrobrás, Embraer e outras empresas brasileiras que estão continuamente agregando pequenas inovações incrementais aos seus produtos e processos.

     O bisonho desempenho nesse campo levou o economista norte-americano Jefrey Sachs a considerar que: “O ideal é que um país como o Brasil tivesse tanta inovação quando difusão tecnológica. Mas esse processo tem sido surpreendentemente frágil e isso é uma das razões para o desenvolvimento do Brasil ter sido extremamente decepcionante nos últimos 25 anos.”

      Em toda a minha vida pública, Sr. Presidente, sempre busquei apoiar o desenvolvimento científico-tecnológico do País. Entendo ser este setor estratégico para o crescimento sustentável brasileiro.

       Sou autor, entre outras iniciativas, do projeto que se transformou na Lei nº 8.172, de 18 de janeiro de 1991, que restabeleceu o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FNDCT. E também da Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, que estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética para a construção, manipulação, circulação e liberação de moléculas de DNA - recombinante e de organismos e vírus que os contenham.

Encerrando, Sr. Presidente, gostaria de frisar que o Brasil precisa, cada vez mais, se conscientizar que essa é uma corrida contra o tempo para a urgente diminuição do custo Brasil, também nessa área enfrentando cada vez maior concorrência internacional. Penso que esse é um problema que somente será enfrentado com êxito quando houver convicção, tanto do Governo quanto da sociedade, para a importância do desenvolvimento do País e sua maior inserção na sociedade internacional, na busca de condições de termos um desenvolvimento que realmente mereça esse nome.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/08/2008 - Página 28758