Discurso durante a 136ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Cobrança de debate a projeto que cria inviolabilidade de escritórios de advocacia. Questionamentos sobre a inelegibilidade de candidatos com "ficha suja".

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXERCICIO PROFISSIONAL. SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Cobrança de debate a projeto que cria inviolabilidade de escritórios de advocacia. Questionamentos sobre a inelegibilidade de candidatos com "ficha suja".
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 05/08/2008 - Página 28798
Assunto
Outros > EXERCICIO PROFISSIONAL. SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • APREENSÃO, DESCONHECIMENTO, ORADOR, VOTAÇÃO, SENADO, ACORDO, LIDER, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO DE LEI, IMUNIDADE, ESCRITORIO, ADVOCACIA, APOIO, PEDIDO, IMPRENSA, EDITORIAL, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), VETO (VET), PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETIVO, DISCUSSÃO, LEGISLATIVO.
  • ANALISE, ORIGEM, PROPOSIÇÃO, DEBATE, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, PRISÃO, BANQUEIRO, AFASTAMENTO, DELEGADO, RECONHECIMENTO, LEGITIMIDADE, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), DEFESA, INVIOLABILIDADE, OPINIÃO, ORADOR, NECESSIDADE, COMBATE, IMPUNIDADE, BRASIL.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, POLICIA FEDERAL, PRISÃO, BANQUEIRO, INFORMAÇÃO, SUPERIORIDADE, VINCULAÇÃO, REU, DIVERSIDADE, BANCADA, CONGRESSISTA, LOBBY, IMPUNIDADE, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, DEBATE, COMBATE, CRIME DO COLARINHO BRANCO, SIMULTANEIDADE, RESPEITO, DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS, APREENSÃO, PROJETO DE LEI, RESTRIÇÃO, JUDICIARIO, INTIMIDAÇÃO, PROMOTOR, DELEGADO, JUIZ.
  • REGISTRO, OMISSÃO, CONGRESSO NACIONAL, REGULAMENTAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, SITUAÇÃO, INELEGIBILIDADE, AMBITO, MORAL, DIGNIDADE, BIOGRAFIA, CANDIDATO, EFEITO, INICIATIVA, JUDICIARIO, SOLUÇÃO, PENDENCIA, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, LEGISLAÇÃO PROCESSUAL, ESPECIFICAÇÃO, ESCUTA TELEFONICA.
  • JUSTIFICAÇÃO, ANTERIORIDADE, PROJETO, AUTORIA, ORADOR, UNIFICAÇÃO, INQUERITO POLICIAL, INQUERITO JUDICIAL, AUTONOMIA, POLICIA FEDERAL, VINCULAÇÃO, JUDICIARIO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, acompanhei pela imprensa a expectativa da sociedade com relação a um projeto votado nesta Casa. A expectativa é com relação, Sr. Presidente, a se Lula veta ou não o projeto.

Estranho, e estranho muito, Sr. Presidente, porque não ouvi falar nesse projeto. Eu não sabia que ele estava tramitando, eu não sabia que havia sido votado. E olha, Sr. Presidente, que sou dos Parlamentares que procuram conhecer as matérias que são votadas. Tenho informações porque recebo - uma gentileza muito grande - até a cópia da Ordem do Dia. Mas, naquela correria do último dia, com os célebres acordos de Líderes - ah! os acordos de Líderes, Sr. Presidente! -, o projeto foi votado.

Escritórios de advocacia ficam invioláveis a qualquer ação. Isso foi tomado com relação ao que aconteceu ao célebre projeto que já conhecemos da ação da Polícia Federal com o senhor banqueiro do Opportunity.

O editorial da Folha de S.Paulo chama a atenção para esse detalhe e pede ao Presidente Lula que vete o projeto.

Respeito muito a OAB, acho que dificilmente há um parlamentar mais identificado e mais junto à vida da OAB do que eu. Principalmente nas horas amargas e difíceis da vida da democracia brasileira, eu sei o que foi a OAB, a sua ação, a sua luta e a sua garra. Mas, nessa questão que estamos debatendo hoje, acho que devemos analisar com frieza as várias situações.

Desde o momento em que apareceu na televisão a prisão do ilustre banqueiro, o debate está sendo travado permanentemente em cima dessa matéria. O delegado da Polícia é afastado; uma hora apresentado como herói, outra hora apresentado como vilão; o juiz federal que deu duas determinações de prisão ora aparece como uma pessoa com interrogações sobre sua conduta, ora como herói. E o que vejo no Congresso é um debate muito importante.

Primeiro, eu acho que o Lula, Presidente da República, deveria vetar esse projeto. Não houve a discussão que deveria haver nesta Casa. Uma matéria como esta não pode ser votada de contrabando, não pode ser votada às escondidas. Tem que ser debatida. Tem que ser conhecida. Tem que ser analisada. E não o foi. Absolutamente não o foi. Eu acho que o Lula deve vetar. Vamos debater. Vamos ouvir.

Eu acho o editorial da Folha de S.Paulo muito sério. Que a OAB tenha preocupação com a inviolabilidade é importante, mas que nós temos que ter a responsabilidade em buscar a apuração também é importante.

Vejo no Brasil uma questão: o Brasil é o País da impunidade. Vejo o Brasil como um País onde nós não conseguimos chegar ao fim de praticamente nenhuma questão importante do ponto de vista penal. O levantamento feito dos casos que acontecem, dos processos policiais e daqueles que chegam à conclusão definitiva é um percentual insignificante. Por isso, Sr. Presidente, eu volto a repetir: eu acho que o Lula, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve vetar esse projeto. E acho que esta Casa poderá analisá-lo com a profundidade que merece.

E acho, Sr. Presidente, que a Polícia Federal teve um mérito muito importante no processo que investigou os banqueiros. E o que está sendo analisado agora é se isso pode continuar ou não.

Olha, é impressionante como algumas pessoas ficaram impressionadas em ver um banqueiro algemado na televisão. É impressionante ver como a hombridade, a seriedade, a responsabilidade de muitas pessoas foram à revolta total.

Eu acho que não precisava. Mas daí a dizer que aquela operação se resumiu na algema ao senhor banqueiro? Acho que não. Aquele banqueiro, desde as duas CPIs nesta Casa, era a figura de que se falava, sobre a qual se debatia e não se conseguia aprofundar. Desde as privatizações, da CPI criada nos debates levantados aqui, não se conseguia chegar ao seu nome. Dizem que a sua bancada é muito grande. Dizem que há lideranças ligadas a ele por todos os setores, do anterior e do atual governo. Em todos os partidos, ele tem gente muito forte. E, de repente, o nome dele aparece. E, de repente, ele é preso e aparece algemado.

Conta a imprensa que, na segunda vez que o juiz decretou a sua prisão, enquanto estava preso em sua residência, a polícia derrubou uma parede falsa e encontrou um cofre com elementos, computadores, uma lista enorme. E que aí estariam envolvidas não sei quantas pessoas.

Há projetos andando, até projetos de amigos meus por quem tenho o maior carinho, o maior respeito, a maior admiração, fazendo com que escutas telefônicas, daqui para adiante, tornem-se praticamente impossíveis.

Não sei. Acho que isso deveria determinar, aí sim, um grande debate em torno do contexto geral. Uma questão é a impunidade. Ninguém é condenado, ninguém vai para a cadeia, ninguém devolve. Nada acontece. A outra é a questão dos direitos individuais. Ninguém, mais do que eu, defende os direitos individuais. Vim da luta de 64. Na luta contra a ditadura, contra o arbítrio, lutamos pela defesa dos direitos individuais. Era difícil. Agora, vejo a invocação dos direitos individuais utilizados sempre a favor do acusado, acusado de roubo, acusado de falcatrua, acusado de escândalos realmente imensos.

Gabriel Wedy, Juiz Federal e Presidente da Associação dos Juízes Federais, em uma coluna, hoje, no jornal O Sul, diz que um deputado está apresentando a lei da mordaça para o Poder judiciário. Então, ele repete, por exemplo, que o juiz que decretou a audição das gravações do Sr. Dantas poderia estar sujeito a oito anos de cadeia e perda do cargo se for considerado que atingiu os direitos do cidadão.

Eu acho que, a essa altura, em vez de se votar correndo como se está querendo votar - e tem um projeto aqui no Senado e outro na Câmara e do Presidente no mesmo sentido -, Sr. Presidente, com todo respeito, era hora de a gente se reunir para discutir. Está lá a Justiça, está lá a Justiça Eleitoral, está lá a Polícia Federal, está lá o Ministro da Justiça, estão lá os partidos, está este amplo debate, vamos sentar para discutir. Eu vou ser muito sincero, querer vedar a atuação da Polícia Federal, querer impedir que uma CPI possa investigar, vejo com muita preocupação, querer fazer a lei da mordaça para intimar o promotor, o delegado, o juiz. Tem um projeto de lei que diz isto: o promotor que fizer uma denúncia com relação a um político e se ele não for condenado, o promotor é quem vai pagar a verba que ele dizia que o cidadão deveria pagar. Ninguém vai denunciar ninguém.

Sr. Presidente, eu acho que o clima está muito tumultuado. Eu acho, com toda a sinceridade. Amanhã, o Superior Tribunal Eleitoral vai votar de novo o problema da ficha suja. Agora, é uma solução apresentada pela Associação dos Juizes Eleitorais de todo o Brasil. A tese é a mesma: o candidato com a ficha suja pode ou não pode ser candidato? É um debate longo.

Eu tenho dito desta tribuna que o Congresso tem de legislar. O Congresso está se omitindo porque não legisla. A Constituição brasileira diz que político com condenação definitiva não pode ser candidato. É verdade. Então, só não pode ser candidato quem não for condenado em condenação definitiva. Logo, todo mundo é candidato, porque condenação definitiva praticamente ninguém tem.

Mas a Constituição diz, Sr. Presidente, que na lei das inelegibilidades constará as questões em que serão inelegíveis, no que tange à moral, no que tange à dignidade, no que tange a sua biografia. Tem esse artigo na Constituição, mas como não votamos, a Justiça diz que eles devem fazer, na prática, aquilo que nós não fazemos. Nós estamos dando razão para eles fazerem isso, porque nós não fazemos.

Nós podemos argumentar, Sr. Presidente. Esse artigo não pode ficar assim, vazio. Não, candidato com ficha suja! E, de repente, a Justiça vetar um vereador ali, um fulano de lá, outro de cá, por causa de uma bobagem ou sei lá o quê. Mas existem casos de profundidade, e nós podemos fazer isso. Em que caso é isso? Mas nós não fazemos. É o debate que está acontecendo.

É o caso da escuta. Pode dar margem a exagero? Pode. Alguma coisa deve ser feita? Deve. Mas não o que estão querendo fazer, como diz o Juiz, em seu artigo, e é absolutamente correto. De repente, estabelecer a lei da mordaça. Um Juiz que determina a escuta pode terminar inclusive perdendo o seu cargo em razão da escuta que ele determinou. E é o que diz aqui.

O juiz federal que determinou a escuta do Sr. Dantas, como o Presidente do Supremo decidiu pela soltura dele, pode ser acusado e pode ser condenado pela determinação que fez.

Nós estamos vivendo uma situação muito delicada. Eu estou nessa situação. Faz 25 anos que eu estou nesta Casa. No primeiro ano em que eu estive aqui, eu apresentei o projeto. Quando eu cheguei aqui, Sr. Presidente, e até quatro anos atrás, Deputado e Senador só podia ser processado se a Câmara dos Deputados ou o Senado Federal desse licença. Se não, não podia. Não podia! E o que acontecia? Câmara e Senado nunca davam licença. Nunca davam licença!

Lutei por vários anos. Eu apresentei mais de sete ou oito projetos e, no final, conseguimos: esta Casa e a Câmara aprovaram. A Câmara e o Senado não precisam dar licença para o Supremo processar nem Deputado nem Senador. Basta quererem processar. Olhem que foi uma grande vitória. No início, eram uma loucura o protesto e a revolta. Foi aprovado praticamente por unanimidade.

Este segundo avanço nós temos de fazer: o que é ficha suja e o que não é ficha suja. Temos de fazer.

E o terceiro é: por que nos assustarmos porque apareceu um banqueiro algemado na televisão? Está errado. Não acho isso bacana. Não acho isso necessário. Mas também não acho esse escândalo todo necessário. A violência que essa Polícia pratica com relação a crianças, com relação a favelados, com relação a miseráveis! Meu Deus do Céu! Meu Deus do Céu! E nunca vi essa grita, esse protesto, essa revolta. Não.

Eu acho que o Presidente Lula deve vetar esse projeto, e pode vetar até com um argumento sério: não houve a discussão na Casa! Ele não tem o argumento que diga que houve o debate, que houve a discussão. Por uma votação, cá entre nós, incrivelmente sem a seriedade que merecia. No projeto de Líderes, Sr. Presidente, os Líderes se reúnem e decidem, mas eles têm um ponto do limite.

Claro que, em um Casa como a nossa, que está parada a vida inteira, onde as medidas provisórias trancam a vida inteira, V. Exª tem de socorrer um acordo de Líderes para poder votar. Não há outra saída. Mas esse acordo tem de ter um limite.

Em um projeto como esse, sobre o qual há um editorial como o da Folha de S.Paulo, da maior respeitabilidade, e em que há divergência: inúmeros Senadores foram à tribuna pedir para o Lula não vetar. E eu estou pedindo ao Lula para vetar. Um projeto dessa magnitude não pode ser fruto de um acordo de Líderes, para votar... Até porque, qual é a urgência, Sr. Presidente? Qual é a urgência?

Se a vida inteira é de um jeito e querem mudar, vamos debater! Mas não votar às escondidas, por baixo da perna, sem o Congresso saber, sem a Casa saber o que é!

Pois não, Senador.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Pedro Simon, V. Exª levanta assunto da maior relevância e coloca aqui um debate que, em verdade, deveria ter sido realizado em maior profundidade por todos nós, Senadores. Eu, que não tenho formação jurídica como V. Exª, estou agora sendo instado a mais e mais aprofundar-me nessa questão. Eu estou aqui observando a tramitação dessa matéria, que vou recordar. Ela é da autoria do Deputado Michel Temer, que a apresentou em 2005. O projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 2006. Então veio para o Senado em 2006. Foi para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania em 24 de janeiro de 2007. Ficou aguardando a designação do Relator. Designado o Senador Valter Pereira, S. Exª acabou apresentando o voto, em 21 de fevereiro de 2008, pela aprovação do projeto com duas emendas que apresentou. Em 9 de abril deste ano, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania aprovou o relatório do Senador Valter Pereira. E, pela informação que aqui tenho, houve um consenso dos Líderes do Governo e dos diversos Partidos, tanto da Base de sustentação do Governo quanto da Oposição, para que fosse aprovado. Posteriormente, em 9 de julho de 2008, naquela sessão em que analisamos e aprovamos inúmeros projetos, conforme acordo entre as Lideranças partidárias - aqui está registrado - foi aprovado o projeto e, inclusive, as Emendas nºs 1 e 2 da Comissão. Agora, observo, juntamente com V. Exª, que, de um lado, há uma polêmica muito grande, pois a OAB, Ordem dos Advogados do Brasil, tem procurado tanto o Ministro da Justiça, Tarso Genro, quanto o próprio Presidente da República, fazendo um apelo no sentido de que seja sancionado o projeto do Deputado Michel Temer, que, obviamente, merece todo o nosso respeito. Por exemplo, há um artigo de três eminentes advogados, Alberto Zacharias Toron, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, Rubens Approbato Machado, publicado no jornal O Estado de S. Paulo, no qual proclamam que é muito importante a preservação do depoimento de um cliente, de um advogado que, tal como aquela pessoa que porventura procura um sacerdote para expor tudo que acontece na sua vida, relata inteiramente os episódios e traça um paralelo com essa situação. Então, um cidadão procura um advogado, revela-lhe todos os fatos, para que o advogado tenha o conhecimento total dos episódios e, assim, realizar a sua defesa. E os advogados, signatários deste artigo, argumentam que é necessário se preservar o direito de não serem violadas essas informações que um cidadão dá ao seu advogado. Por outro lado, estamos aqui diante de pareceres e conclamações em que tanto a Associação dos Juízes Federais do Brasil, citadas por V. Exª, quanto representantes do Ministério Público conclamam, na direção do que V. Exª está dizendo, que deve o Presidente vetar o referido projeto. Se me permite, vou sintetizar alguns dos principais argumentos em contraposição aos dos advogados, que acabo de mencionar. A Ajufe pede que o projeto seja vetado, porque, se transformado em lei, o escritório do advogado passará a ser inviolável e não mais poderá ser alvo de busca e apreensão, mesmo que por ordem judicial, salvo quando o próprio advogado for o investigado pela prática do crime. Neste caso, segundo a Ajufe, a prática de crime será facilitada, pois os criminosos poderão fazer uso de escritórios de advocacia para esconder provas, tornando-os imunes à ação da polícia, do Ministério Público e do Poder Judiciário. Para a Ajufe, caso prevaleça o texto do projeto, não poderiam ser decretadas a busca e a apreensão para escritórios de advogados, mesmo com indícios veementes de que o local estaria sendo utilizado para ocultar arma de um homicídio, por exemplo. A exceção é a suspeita recair sobre o próprio advogado. Dessa maneira, “como justificativa da nota de repúdio ao projeto, a associação afirma que essa imunidade à investigação não encontra similares na ordem constitucional e legal vigente para nenhum outro agente público ou privado detentor de informações sigilosas de terceiros. Seria esse o caso das instituições financeiras de saúde, de ensino, de imprensa ou mesmo das Casas Legislativa.” Ora, estamos, caro Senador Pedro Simon, ainda examinando as manifestações dos representantes do Ministério Público. Estes afirmam que, além de ser inconstitucional por oferecer mais proteção ao escritório do que é prevista na Constituição para as moradias, o projeto é “totalmente contrário ao interesse público, ao estabelecer locais imunes à persecução penal que, certamente, serão exploradas pela crescente criminalidade organizada”. Também argumentam os representantes do Ministério Público que o projeto impede a decretação de busca e apreensão ao escritório de advogados, “mesmo se surgissem indícios veementes de que o local estaria sendo utilizado para ocultar arma, um revólver ou uma faca utilizada para a prática de um homicídio”. “Da mesma forma, um pedófilo, que registrasse em vídeo o abuso sexual de uma criança ou de um adolescente, poderia igualmente encontrar refúgio desde que entregasse o material para ser guardado em um escritório de advocacia”.

Cito esses argumentos para refletir que o Ministro Tasso Genro está em uma situação não muito fácil, porque eminentes advogados, colegas de V. Exª na profissão, com os quais V. Exª teve inclusive grande convivência, a começar pelo autor do projeto, Michel Temer. De outro lado, os argumentos de membros do Ministério Público e de membros da Associação de Juízes e Magistrados do Brasil, tendo aqui os Senadores José Sarney e Valter Pereira recomendado, na semana passada, a sanção do projeto; V. Exª preconiza que o Presidente vete. Quero dizer que, no balanço dos argumentos, estou mais com os argumentos de V. Exª, mas não me sinto, como V. Exª o é, um especialista nas questões jurídicas.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço a V. Exª, que, na sua exposição - longa, mas necessária -, deixa muito claro que um projeto como esse não pode ser votado na Casa sem o debate necessário. Não houve o debate na Comissão nem houve aqui. Esse debate era necessário. Aliás, esta Casa tem um problema grave. Há projetos ótimos, que são debatidos, discutidos - levamos madrugadas discutindo algumas matérias -, mas há outros projetos que ficam na gaveta um tempo enorme e, de repente, vêm para o plenário e são votados ao calor de uma madrugada, juntamente com mais trinta ou vinte projetos. Esse projeto não foi discutido. Quando digo que o Presidente Lula deveria vetá-lo, acho que ele determinaria a volta ao debate dessa matéria. Acho que essa matéria com relação ao escritório de advocacia e que o projeto que está na Câmara e o outro que está no Senado com relação à escuta telefônica, levando à gravidade, estabelecem praticamente que, se o juiz determinar uma escuta telefônica, estará correndo o risco de perder o seu cargo ou até de ser condenado à cadeia.

Há exagero? Vamos analisar. Vamos analisar esses exageros. Essas questões devem ser analisadas. O que me chama atenção e me magoa é que isso tudo está acontecendo porque o Sr. Dantas foi preso. O Sr. Dantas, o banqueiro, apareceu na televisão de mãos algemadas, e isso colocou um impacto no Brasil. O Senado, a Câmara e o Brasil inteiro estão espantados com a barbaridade de se algemar o Sr. Dantas, banqueiro. Tudo bem. Vamos debater. Mas vamos debater com calma, com análise. Volto a dizer: o Brasil é o País da impunidade. Vai, vem, e o Sr. Dantas está solto. Vai, vem, e está lá o Sr. Cacciola, depois de três anos, preso não sei por quanto tempo.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Permita-me, à luz do excelente pronunciamento de V. Exª, aqui fazer duas sugestões ao Presidente Garibaldi Alves: a primeira é que ele possa encaminhar ao Ministro Tarso Genro, o quanto antes, o teor dos pronunciamentos efetuados na semana passada - pelo menos aquele a que eu aqui assisti - dos Senadores José Sarney e Valter Pereira.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Mais o Senador de Goiás...

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Demóstenes Torres...

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - ...que fala a favor do veto.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Demóstenes Torres. Os três. E que envie também o pronunciamento que V. Exª agora faz, incluindo o meu aparte. Que isso seja encaminhado ao Ministro Tarso Genro e que, à luz desses argumentos, se for convicção do Ministro Tarso Genro recomendar o veto e o Presidente assim vetar, considerando tudo o que V. Exª disse, qual seja, uma crítica a nós mesmos, ao conjunto dos Senadores, por termos votado sem que tenha havido debate mais aprofundado, possa, Presidente Garibaldi Alves Filho, haver como que um compromisso: uma vez havendo o veto, possa V. Exª convocar uma sessão especial do Congresso Nacional, dada a grande importância deste assunto, para então realizarmos um debate profundo, prévio à votação definitiva em que se derruba ou não o veto do Presidente. Seria uma maneira de nós superarmos uma falha que acabou sendo cometida. É a sugestão que formulo.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Sr. Presidente, eu acho muito importante a sugestão, eu acho que ela é viável. O normal é que o veto entre na fila dos mil que estão aí. Mas temos o tradicional acordo de Líderes, e, dada a importância desta matéria, poderíamos até iniciar com essa proposta um fato novo. Quer dizer, à margem dos projetos que estão vetados e estão na fila, há um momento em que as Lideranças podem se reunir e determinar: “este nós vamos votar agora”.

Eu aceito e acho muito competente a iniciativa do Senador Suplicy, e acho que é um fato novo que está sendo apresentado neste momento porque, daqui para diante, como é que nós vamos ver os mil vetos que estão aí? Estamos votando porque V. Exª, aliás, com grande mérito, diga-se de passagem, está fazendo um esforço, e grande parte já foi votada. Agora pode haver esse fato novo. Qual é o fato? Se para este veto “x” há um entendimento, a Presidência vai colocar o veto perante uma comissão que o analisará, e vamos responder, votando esse veto, para saber se aceitamos ou não aceitamos.

Eu acho muito feliz a proposta do Senador Suplicy e, se V. Exª houver por bem levar amanhã na reunião das Lideranças, acharia muito oportuno.

Aí seria o caso de o Presidente Lula, tranqüilamente, se achar que deve vetar, é um problema dele, mas se achar que deve vetar, ele tem mais um argumento a seu favor: eu veto, até lá a Câmara e o Senado vão debater com profundidade, o que não fizeram na hora da votação, e vamos analisar essa matéria.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Em sessão do Congresso.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Claro, tem que ser.

Agradeço, Sr. Presidente, e volto a dizer a V. Exª: esta matéria toda está se tornando realmente quase que uma questão nacional, envolveu a operação da Polícia Federal, eu a recebo com muita responsabilidade.

Não considero réu o promotor, nem o delegado, nem o juiz. Acho que essas três pessoas agiram com muita capacidade e com muita responsabilidade. A imprensa está apontando erros, equívocos; a Polícia Federal está distribuída em dois blocos: a do ex-presidente da Polícia Federal e a do atual presidente; que o delegado era uma pessoa apaixonada, que cuidava com exagero e que tinha medo de que houvesse escuta, fraude, desconfiava de Deus e todo mundo, uma série de fatos que eu respeito. Mas, cá entre nós, que esse delegado é uma pessoa competente e responsável, ele é; que merece respeito, merece respeito; que esse juiz de Direito merece respeito, merece respeito; que esse promotor merece respeito, merece respeito. São os donos da verdade? Não. Têm que mudar? Têm que mudar. O escândalo que fizeram, o carnaval que fizeram é exagerado? É exagerado. Agora, nós sabemos como é agir, nós sabemos como é funcionar, como é levar essa questão adiante, desde a ameaça de morte até tudo o mais.

Há aqui outro debate, Sr. Presidente: é sobre a autonomia ou não da Polícia Federal. Há manchete em todos os jornais: os delegados estão pedindo autonomia, porque hoje eles funcionam na base de órgão do Poder Executivo e que vivem à mercê da decisão, até política ou não, do Poder Executivo.

Não sei, Senador Suplicy, mas há um projeto de minha autoria em que termino com o inquérito policial. Estimo para o Brasil o que tem na França, nos Estados Unidos: a polícia está diretamente ligada à procuradoria. O inquérito policial não é um e o inquérito judiciário é outro; são um só e quem coordena está junto, o delegado de polícia e o promotor. Eu acho que seria uma maravilha. Sai a polícia do âmbito do Poder Executivo e entra na responsabilidade do Poder Judiciário. Não cria um poder autônomo.

            Polícia Federal com autonomia. Promotor aqui e juiz ali... Não sei onde eles terminariam.

            Mas terminar com o inquérito policial e fazer como nos Estados Unidos. O que vemos em filme americano é o que acontece na realidade. Houve um crime, aparecem a polícia e a promotoria; na mesma hora, já se diz ao acusado que ele pode falar, mas o que ele falar será usado contra ele. Nesse momento, começa o inquérito e é um só.

Fui advogado criminalista a vida inteira. A gente leva no deboche. Advogado de defesa gosta muito de inquérito policial. Tudo se derruba na Justiça, tudo não vale nada. Fala um, fala outro, prova, não sei o quê e tudo morre. Veja o que aconteceu com a menina que foi jogada do 6º andar em São Paulo. Fizeram todo aquele esforço no inquérito policial e agora vai começar tudo de novo na Justiça. Vão ter que fazer tudo de novo na Justiça. Se fosse feito uma vez só já estaria resolvido.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já encerro, Sr. Presidente, e agradeço a tolerância de V. Exª.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Apenas para dizer que V. Exª tocou num assunto de tamanha relevância, relacionado ao primeiro tema que foi o desvendar da Operação Satiagraha, conduzida, na sua primeira fase, pelo Delegado Protógenes Queiroz. Estou de acordo com V. Exª quando diz que ele demonstrou muita eficiência e determinação para conduzir o inquérito que tem extraordinária complexidade e miríades. Ainda não sabemos exatamente os denominados crimes financeiros que se diz foram cometidos. Nós tivemos consciência, por exemplo, do flagrante da tentativa de suborno que foi evidenciado. Mas qual é a natureza de todos os crimes que inclusive levaram um representante - se isso for confirmado - do dirigente de banco Daniel Dantas para tentar evitar que ele e a irmã dele fossem indiciados? Isso é um indicador já muito grave. Que o Sr. Protógenes Queiroz conduziu a apuração para desvendar isso é um fato. Certamente ele realizou um trabalho de grande mérito. Se houve algum exagero, isso precisa ser objeto de análise. Mas eu concordo com V. Exª que, na ação dele, do Promotor e do Juiz, houve grande mérito. Queria, se me permite ainda, Senador Pedro Simon, comentar um aspecto do dilema em que está o Ministro Tarso Genro, não apenas com respeito ao projeto analisado por V. Exª, mas também com respeito ao outro tema sobre o qual há conversávamos. Refiro-me à eventual modificação da Lei da Anistia. Eu gostaria aqui de formular uma sugestão de caminho inspirada naquilo que aconteceu na África do Sul. Quando terminou o apartheid...

(Interrupção do som.)

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - ...o Presidente Nelson Mandela assumiu em 1994, depois de uma eleição memorável, e instituiu a Comissão de Reconciliação e Verdade, que foi presidida pelo Bispo Desmond Tutu. Ali se estabeleceu que, na medida em que pessoas responsáveis por crimes tais como os de tortura e outras barbaridades cometidas ao tempo do apartheid revelassem inteiramente a verdade, inclusive com a disposição de solicitar o perdão...

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Devíamos deixar para conversar sobre esse tipo de assunto amanhã, Senador.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Vou respeitar o apelo de V. Exª. Então, deixaremos isso para amanhã.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito obrigado.

Agradeço a tolerância de V. Exª, Sr. Presidente.

            E volto a repetir: não tomo posição definitiva com relação a essa matéria. Mas acho que o Presidente Lula deve vetá-la. E, vetando-a o Presidente Lula, se o Presidente da Casa adotar a proposta do Senador Eduardo Suplicy, poderemos apreciar logo o veto, não esperando que ele entre na fila. Dentro de um ou dois meses, podemos votar esse veto. E, aí sim, na hora de votá-lo, podemos fazer o amplo debate que esta Casa merece.

Era isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/08/2008 - Página 28798