Discurso durante a 137ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do piso nacional dos professores. (como Líder)

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL. EDUCAÇÃO.:
  • Defesa do piso nacional dos professores. (como Líder)
Aparteantes
Eduardo Azeredo.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/2008 - Página 29220
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, MOBILIZAÇÃO, GRUPO, GOVERNADOR, REIVINDICAÇÃO, REVISÃO, LEGISLAÇÃO, CRIAÇÃO, PISO SALARIAL, PROFESSOR, EDUCAÇÃO BASICA, ALEGAÇÕES, FALTA, VERBA, SETOR PUBLICO, PAGAMENTO, CATEGORIA PROFISSIONAL, NECESSIDADE, PARIDADE, DISTRIBUIÇÃO, RECURSOS, PREFEITURA, ESTADOS.
  • REGISTRO, TENTATIVA, AUTORIDADE ESTADUAL, COMPROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, COMPARAÇÃO, ORADOR, SEMELHANÇA, PROBLEMA, HISTORIA, ABOLIÇÃO, ESCRAVATURA.
  • REGISTRO, POSSIBILIDADE, UTILIZAÇÃO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, EDUCAÇÃO BASICA, PAGAMENTO, PARTE, PROCESSO, IMPLANTAÇÃO, PISO SALARIAL, PROFESSOR, ENSINO PUBLICO, BRASIL.
  • DEFESA, FEDERALIZAÇÃO, EDUCAÇÃO BASICA, CONCLAMAÇÃO, PROFESSOR, BRASIL, LUTA, REIVINDICAÇÃO, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, PISO SALARIAL.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pela Liderança do PDT. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, 120 anos atrás, quando houve a abolição da escravatura - eu não sei se todos lembram de terem lido sobre isso -, logo após a abolição, Senador Jefferson Praia, houve tentativa de reverter a lei da abolição. A gente não se lembra disso, Senador Expedito, porque é uma coisa tão normal abolir a escravidão que a gente não sabe ou não lembra que houve tentativa de reverter aquela lei, seja fazendo com que ela fosse recusada depois de sancionada, seja de uma maneira mais sutil, apresentando outro projeto de lei para que houvesse uma indenização aos donos de escravos que perderam seus escravos, que eram o capital.

            Para nós, hoje, isso parece absurdo. Mas, se lemos os jornais hoje, Senador Mão Santa, estamos vendo que, 120 anos depois, as coisas se repetem, Senador Flávio Arns, porque, nesses últimos dias, tem havido tentativa afirmada, reclamada, proposta de acabar com a lei do piso salarial do professor. Está em marcha um movimento, liderado por Governadores, no sentido de que a lei do piso salarial seja revista.

            Uma forma é a proposta, segundo os jornais, de uma Adin, uma declaração de inconstitucionalidade da lei. Isso é o mesmo que tentar voltar atrás na lei da abolição da escravatura. Quais são os argumentos? O primeiro argumento é que vai custar muito caro aumentar o piso para R$950,00 para cada professor. Olhem que a lei diz que esse piso virá em três etapas. Mesmo assim estão achando que é muito caro.

            Senador Mão Santa, se custar muito caro aplicar essa lei, é porque a situação do professor é mais vergonhosa ainda do ponto de vista salarial do que se imagina, porque esse piso vai custar tanto mais quanto mais baixo for o salário atual. Se o salário for alto, não custa nada; se pagassem acima dele, não custaria nada. Isso significa que, de fato, a tragédia da educação no Brasil tem como uma de suas causas os baixos salários, que a lei do piso salarial, sancionada pelo Presidente Lula, tenta reverter, subindo ou não para dois, três, cinco, dez mil reais como é o piso salarial de algumas categorias. Dez mil reais! Mas subir para R$950,00 em três etapas?! E há Governadores fazendo manifestação contra isso, tentando fazer com que a lei seja considerada inconstitucional. Outros, que até já pagam acima do piso, têm dito que o problema não é o valor do piso; o problema é que, na Câmara dos Deputados, não aqui no Senado, de onde saiu a lei, foi incluído um artigo que prevê que a carga de aula do professor tem que ser, no máximo, dois terços do total de horas de trabalho. Ou seja, da carga de trabalho de 40 horas, o professor só pode dar, no máximo, 27 horas de aula por semana, porque hoje já existe uma regra que é, pelo menos, 25% livre de dar aula.

            Senador Flávio Arns, um professor que dá 40 horas de aula por semana - oito horas diárias por semana! - não está dando aula, está fazendo uma maratona, e os alunos assistindo à maratona. Não é aula. Não é sério dizer que um professor pode dar oito horas de aula por dia, Senador Mão Santa.

            Quantos médicos podem fazer uma cirurgia por oito horas todos os dias da semana? Não é sério. A mesma coisa ocorre com o professor.

            Mesmo as seis horas que eles vão dar a partir de agora - pouco mais de seis - é muito, e há Governador achando que não é possível manter a lei do piso salarial, porque eles querem que seus professores dêem mais de seis horas de aula por dia. Ou seja, eles querem enganar os alunos dizendo que eles estão em sala de aula, quando eles não estão em sala de aula; eles estão numa calçada assistindo aos professores como maratonistas, tentando chegar vivos até o fim da semana.

            Após 120 anos, da mesma maneira como ocorreu com a lei da abolição, quando houve movimentos contra tal lei, com tentativas de que ela não fosse cumprida, a gente vê a mesma coisa acontecendo no Brasil.

            Nesses debates sobre educação pelo Brasil afora, Senador Mão Santa, um dia ouvi, em Belo Horizonte,..

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Permita-me interromper V. Exª, que é o general educacionista. Atentai bem! O Presidente Castello Branco, no período revolucionário, assinou um decreto-lei determinando que a enfermeira ganharia seis salários mínimos. O que V. Exª está propondo é que a professora ganhe praticamente dois salários mínimos. Então, ressalto a sensibilidade de Castello Branco para aqueles que o criticam, visto que este Governo está bem pior do que o governo revolucionário. Digo isso porque eu era médico na época, e as enfermeiras ganhavam seis salários mínimos e estavam agradecidas a Castello Branco. Então, V. Exª está propondo dois salários mínimos e é essa avalanche. A nossa solidariedade e apoio. E que compreendam, entendam bem... Ô Wellington Salgado, ensine ao MDB, que V. Exª lidera, que o mundo todo não reverencia banqueiros, generais, senadores, presidentes. Só uma classe ele chama mestre, igual a Cristo, é a dos professores. Então eles merecem o respeito.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senador.

            Eu quero dizer que são míseros dois salários mínimos e com uma carga de seis horas de aula por dia e mais duas para que preparem as aulas, corrijam os trabalhos e os deveres de casa.

            Professor Mão Santa, qual é o professor que dá oito horas de aula por dia e leva dever de casa para corrigir em casa? Não faz sentido. É falsa a idéia de que um professor pode dar oito horas de aula por dia. É mesmo falsa a de que pode dar sete horas de aula por dia. Ou mesmo seis, como está no projeto de lei. Ao mesmo tempo, com um piso muito baixo.

            Mas eu dizia, Sr. Presidente, que uma vez, nessas caminhadas pela educação, eu estava em Belo Horizonte e uma pessoa me disse uma coisa que me tocou muito. A idéia da revolução pela educação não pega porque não há inimigos, e uma bandeira que não tem inimigos não funciona.

            Eu quero dizer que aqueles que hoje são contra o piso salarial são os inimigos da educação, e graças a eles é possível que a idéia agora pegue. Eu quero aproveitar aqui, Senador Mão Santa, para convocar os professores deste País a não deixarem que essa lei seja derrubada. Quero convocar aqueles que V. Exª chamou de educacionistas, aqueles que acreditam que o futuro deste País depende da educação, a não deixarem que essa lei seja derrubada. E, naqueles casos em que o prefeito não tem dinheiro, em que o governador não tem dinheiro, vocês precisam ir para a rua pedir que o Governo Federal dê o dinheiro, mas não pedir que não se cumpra essa lei.

            Vi secretários estaduais, Senador Azeredo, dizendo que não é possível continuar com esse projeto, com essa lei. Eu queria ver secretário exigindo do Governo Federal mais recursos, mas não dizendo que não se deve cumprir, não pedindo a inconstitucionalidade de uma lei que tem a dimensão, Senador Suplicy, guardadas as proporções, da lei da abolição. E dizia há pouco que houve tentativas de derrubar a lei da abolição depois do dia 13 de maio de 1888.

            Não podemos deixar que outra vez alguns queiram derrubar esse primeiro passo de uma nova lei da abolição, simples, pequena, Senador Azeredo - e já vou lhe dar a palavra -, que a gente não pode deixar voltar atrás. Daqui tem que ser para frente, tem que aumentar o valor do piso, tem que criar a carreira nacional do professor, a carreira nacional do magistério. Não pode haver professor de um jeito num lugar e professor de outro jeito no outro lugar. Os funcionários do Banco do Brasil, da Polícia Federal, da Infraero têm a mesma qualificação, o mesmo salário, os mesmos planos de cargos e salários, independente da cidade onde trabalham. Por que professor, em cada cidade, tem um plano de carreira diferente, tem um salário diferente? E por que começa-se a falar que a única coisa que unifica os professores, hoje, que é o piso salarial, é inconstitucional? Inconstitucional deveria ser ter mantido os salários tão baixos que, para pagar o piso, fala-se que vai custar R$10 bilhões. E se fossem dez bilhões? É 0,5% da renda nacional; é 1,5% da carga fiscal, dos recursos a disposição do setor público brasileiro. Mas esses recursos não estão sendo distribuídos igualmente. Há Prefeituras sem dinheiro, há Estados sem dinheiro. Briguemos para que o Governo Federal faça o equilíbrio.

            Eu tenho a impressão de que o Fundeb hoje é capaz de cobrir tudo dessa primeira etapa e que apenas um terço vai custar a mais do que necessário para cumprir o piso. Em três anos, o piso vai chegar e não de repente, mas se o Fundeb for insuficiente vamos pedir dinheiro ao Governo Federal. Isso vai me trazer uma grande satisfação porque não é de hoje que defendo.

            Peço mais alguns minutos, Senador Mão Santa, até porque o Senador Eduardo Azeredo está pedindo um aparte.

            Hoje a gente sabe que é pouco o que é necessário, mas sempre defendi, Senador Mão Santa, a idéia da federalização da educação de base. De repente, ao ver Governadores contra o piso, eu digo: eles estão reconhecendo a necessidade de federalizar a educação; estão reconhecendo que não é possível a educação de qualidade com um piso de 950! Não estou falando de 9.500. Não dá para os Estados pagarem nem os Municípios. Vamos federalizar, mas não vamos permitir que os professores voltem a ter os salários de antes.

            Quero convocar os professores deste País a se mobilizarem, e cada educacionista a não descansar enquanto os inimigos da educação insistirem que é preciso derrubar a lei do piso. Digo isso e passo a palavra ao Senador Azeredo.

            O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador Cristovam Buarque, eu estava no gabinete e vim exatamente para lhe fazer este aparte porque quero dar o testemunho de que acompanhei e acompanho há muito tempo esta sua luta pela educação. Em 1994 foi feito no Brasil um acordo de que o Consed (Conselho Nacional de Educação) participou - era um amplo acordo - de implantação de piso salarial. O que aconteceu? V. Exª, como Governador de Brasília, e eu, como Governador de Minas, buscamos essa implantação, a custos elevados, pesados, para nossas contas públicas, mas a maioria dos Governadores não fez isso, e o piso acabou não sendo implantado. E veja que o piso, à época, equivalia a mais do que os 950 de agora, se atualizarmos os valores. Então, fiz aqui um pronunciamento logo que aprovamos esse piso exatamente chamando a atenção, alertando, para que dessa vez fosse para valer, e que o piso fosse efetivamente implantado. Hoje, na Comissão de Educação, eu lia, exatamente nesse jornal O Educacionista, essa sua argumentação, mostrando essa realidade, ou seja, há cidades onde se explora petróleo que têm uma receita per capita 10, 20, 30 vezes maior do que uma cidade menor. Evidentemente, para poder atingir um salário melhor para as cidades mais pobres é mais difícil, daí a importância dessa federalização, para que o Governo Federal, pelo menos, possa fazer uma equalização. É evidente que o Município que tem mais dinheiro não precisa do socorro do Governo Federal para pagar o piso, mas aqueles que - não diria com menor arrecadação - são mais pobres mesmo, têm que fazer todo um esforço próprio para arrecadar. Evidentemente, com a quantidade de informações que existem, com os bancos de dados, podemos fazer um sistema compensatório que funcione. Então, ouvi essas notícias hoje com certa apreensão e pareceu-me que o questionamento maior não é em cima do piso, mas em cima dos 33% para as atividades extraclasse. Esse me pareceu o ponto mais importante de discórdia. Mas, a implantação em si, acredito que está garantida. Temos que lutar por ela. Quero cumprimentá-lo por trazer este assunto novamente.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Agradeço, Senador Azeredo, e lembro, sim, quando éramos Governadores, e o senhor lá aplicou o piso, eu aqui também, mas não havia uma lei nacional. Então, aquele que quis fez, o que não quis não fez; aquele que pôde fez com sacrifício muito duro - lembro-me que desequilibramos as contas; no meu caso, cheguei a desequilibrá-las por causa do aumento de salário do professor - e aqueles que não podiam não fariam nunca. A lei nacional vai obrigar o esforço de todos para que seja cumprida, mas para isso quero deixar claro aqui o meu apelo: não deixemos que essa lei seja derrubada. Professores do Brasil, se mobilizem, em nome do Brasil, para que essa lei não acabe!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/2008 - Página 29220