Discurso durante a 138ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Balanço dos rumos da economia brasileira.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Balanço dos rumos da economia brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 07/08/2008 - Página 29472
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • BALANÇO, ECONOMIA NACIONAL, AMBITO, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, ORIGEM, MERCADO IMOBILIARIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PERDA, BOLSA DE VALORES, VALOR, PATRIMONIO, BANCOS, EFEITO, REDUÇÃO, CREDITOS, FINANCIAMENTO.
  • ANALISE, DADOS, COMPARAÇÃO, ECONOMIA, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CHINA, ALTERAÇÃO, LIDERANÇA, ECONOMIA INTERNACIONAL, AVALIAÇÃO, VANTAGENS, ECONOMIA NACIONAL, AUMENTO, EXCEDENTE, PRODUÇÃO, ALIMENTOS, PREVISÃO, CRESCIMENTO, DESENVOLVIMENTO AGRARIO, RENDA, EMPREGO.
  • DEFESA, SOLUÇÃO, DEPENDENCIA, BRASIL, IMPORTAÇÃO, FERTILIZANTE, ANALISE, DEMANDA, ENERGIA, PLANEJAMENTO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), MODERNIZAÇÃO, CONSTRUÇÃO, REFINARIA, PRIORIDADE, PRODUÇÃO, OLEO DIESEL, ESTIMATIVA, AMPLIAÇÃO, RESERVA, PETROLEO, IMPORTANCIA, DEBATE, UTILIZAÇÃO, JAZIDAS, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, LONGO PRAZO, AUSENCIA, EXCLUSIVIDADE, EXPORTAÇÃO, APROVEITAMENTO, EXPERIENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, NORUEGA.
  • ELOGIO, POSIÇÃO, BRASIL, CONJUNTURA ECONOMICA, AMBITO INTERNACIONAL, GESTÃO, GOVERNO FEDERAL, PROMOÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, eu gostaria de agradecer as palavras generosas do acolhimento e retribuí-las, Senador Mão Santa. V. Exª também é um dos mais presentes Senadores deste plenário, sempre contribuindo para o debate. Mesmo que às vezes eu não concorde com as suas posições, devo reconhecer que a leitura, a contribuição de aprofundar temas relevantes para o País é uma marca do seu mandato e da sua intervenção no plenário.

Subo neste momento à tribuna para fazer um balanço breve dos rumos que a nossa economia atravessa e das repercussões que teremos do ponto de vista da vida da nossa sociedade.

Estamos vivendo uma grave crise econômico-financeira internacional, cujo centro é a economia americana. As crises imobiliárias, que são a natureza da crise que atinge o sistema financeiro americano, são, na história econômica, em geral duas vezes mais profundas e duradouras que as crises de Bolsa de Valores. E essa crise atingiu o núcleo do sistema americano, porque atingiu todo financiamento habitacional imobiliário, as chamadas hipotecas imobiliárias, e trouxe um prejuízo ao sistema financeiro - em particular, a Bolsa de Valores manifesta isso - em que as cinqüenta maiores instituições financeiras do mundo, especialmente as americanas, já sofreram uma perda em Bolsa de Valores de US$870 milhões, aproximadamente.

Com essa perda do valor patrimonial dos bancos, um banco como o Citibank, que valia US$ 250 bilhões, hoje vale menos de US$ 90 bilhões em Bolsa. Os bancos trabalham alavancados. As linhas de financiamento têm de ter uma correspondência ao valor patrimonial da instituição financeira. E essa perda patrimonial, em geral, representa um corte de até dez vezes mais nas linhas de financiamento de crédito bancário.

Isso significa que nós poderemos ter um corte de crédito, se for mantida essa trajetória na economia americana, alguma coisa da ordem de US$ 7 a US$ 8 trilhões de linhas de financiamento, com repercussões muito severas e uma parte importante do sistema financeiro, das menores instituições, sobretudo no setor produtivo. Porque a indústria automotiva americana já vive também uma crise extremamente delicada e a trajetória de recessão e de desaceleração permanece, sendo que, no horizonte, o que nós podemos ver é que, enquanto o mercado imobiliário não encontrar um preço de equilíbrio para mais de seiscentos mil imóveis que estão vazios na economia americana, dificilmente nós teremos a retomada do crescimento e a saída desta crise, que tem profundos desdobramentos.

O Banco Central Americano, felizmente, tem tido uma resposta tipicamente keynesiana: socorreu os bancos em mais de US$470 bilhões. Agora, fez um programa de socorro financeiro de mais US$163 bilhões para instituições, grandes instituições, de crédito imobiliário da economia americana. E tem feito uma política de redução da taxa de juros, apesar da pressão inflacionária, para tentar amenizar.

Essa crise americana que, no passado, seria devastadora para a economia internacional, hoje tem um impacto relativamente menor - mas não pode e não deve ser subestimada - por duas razões. primeiro, porque o Leste Europeu e também e em particular a China se integraram à economia internacional capitalista e, portanto, o peso relativo da economia americana hoje é menor do que no passado. Em segundo lugar, porque o motor da economia internacional, hoje, é a China, é a Ásia - em menor proporção a Índia e a Rússia, mas sobretudo a China.

Eu vou dar alguns dados. o Brasil, que consumia 35 milhões de toneladas de cimento há cinco anos e, hoje, está consumindo 53 milhões de toneladas de cimento - um forte programa habitacional, demanda de crédito nesse setor, crescimento da indústria de cimento, emprego. Falta mão-de-obra em algumas setores do País nessa cadeia da construção civil. Cinqüenta e três milhões de toneladas de cimento! Os Estados Unidos, hoje, estão consumindo 153 milhões de toneladas de cimento; a China consome 1,350 bilhão de toneladas, onze vezes mais do que a economia americana. Eles estão urbanizando 150 milhões de pessoas em cinco anos - é quase um Brasil que está indo para a cidade. Investimentos em casa, edifício, infra-estrutura, logística, saneamento são de tal ordem que ela consome hoje onze vezes mais cimento do que a economia americana.

Aço: o Brasil produz e exporta 36 milhões de toneladas de aço; a China consome hoje e produz mais de 400 milhões de toneladas de aço.

Portanto, é essa força propulsora da China que mantém, nos últimos anos, a economia mundial crescendo acima da média histórica.

O mundo, que crescia em torno de 3,5% do PIB, cresce hoje mais de 5% do PIB, mas é basicamente a Ásia e particularmente a China.

Nesse cenário de crise americana, mas de crescimento sustentável, estável e de forte aquecimento do consumo mundial a partir da China, o Brasil não pode subestimar essa crise financeira internacional, mas tem um cenário extremamente favorável a médio e longo prazo.

Primeiro, nós temos um cenário imediato favorável, porque, nos últimos cinco anos, o Brasil foi o país que mais aumentou o excedente exportável de alimentos. Nós aumentamos a safra de grãos em 49,5%. Estamos produzindo este ano 143 milhões de toneladas de grãos. E o Brasil é o país que mais aumentou a quantidade de alimentos que pode ser vendida para os outros países.

Ora, esse aquecimento da China fez com que, nos últimos cinco anos, o estoque de alimentos no mundo caísse significativamente e houvesse um aumento no preço dos alimentos, que está sendo também acelerado pelo movimento do capital financeiro, que está perdendo recursos nas Bolsas, especulando no mercado futuro de commodities: petróleo, matérias-primas e alimentos.

Portanto, a crise internacional e a queda no estoque de alimentos pelo forte consumo da China e da Ásia fizeram com que os preços dos alimentos subissem, e o Brasil, que é um grande exportador de alimentos, vai ter, no campo brasileiro, um forte impulso ao desenvolvimento nos próximos três, quatro, cinco anos, porque essa crise não será resolvida antes disso. Podemos ter uma certa desaceleração do preço em uma cultura ou outra, mas a tendência é aumentar a renda do campo no Brasil, gerar emprego na agricultura, impulsionar o agro-negócio, aumentar o setor de máquinas e equipamentos de insumos. E nós temos que aproveitar este momento. O Governo foi competente em fazer um plano ousado de estímulos à produção agrícola, de preços mínimos, de financiamentos e nós temos que enfrentar o problema da dependência do País na produção de fertilizantes.

Hoje 50% do nitrogênio brasileiro é importado. E nitrogênio depende de gás, depende de produção de uréia. É daí que vem a produção de nitrogênio do fertilizante. E importamos 70%, 80% de fósforo e potássio. O Brasil precisa fazer um grande esforço para diminuir essa dependência e produzir mais fertilizantes, para que esse choque de demanda e essa perspectiva fantástica da nossa agricultura possa se concretizar, aumentando a margem de rentabilidade para a economia e menos dependência de insumos importados.

De outro lado, essa crise atinge também o setor de energia. Há uma grave carência de oferta de energia no mundo. As reservas de petróleo internacional, nos últimos dez anos, aumentaram apenas 15,3% - muito pouco pelo aumento da demanda global. E mais da metade do aumento do consumo de petróleo, particularmente de gás, vem da China. Novamente a China é o maior consumidor, é quem vem aumentando o consumo de petróleo, e as reservas, a capacidade de produção do mundo não acompanha esse ritmo. Novamente também no petróleo, parte dos grandes fundos dos investidores, dos especuladores, fogem do mercado e da bolsa, especula com commodities agrícolas e com petróleo. Mas esse preço do petróleo, em torno de 120 dólares, em torno de 100 dólares, dificilmente se reverterá. E o Brasil, que ainda tem o déficit comercial de 6 bilhões de dólares em petróleo, porque nós somos auto-suficientes em volume de petróleo, mas nos compramos óleo leve, óleo light e exportamos óleo bruto, óleo pesado - e por isso temos o déficit. A Petrobras tem um plano agressivo de modernização das refinarias. Por exemplo, a Refinaria de São José dos Campos: US$3 bilhões e 100 milhões em dois anos de investimentos, onze mil trabalhadores hoje na planta industrial, para que essa refinaria possa processar óleo pesado e produzir diesel de alta qualidade. Nós não precisamos mais tanto de gasolina, porque o etanol está substituindo a gasolina, já que mais de 51% do consumo de energia combustível dos automóveis brasileiros hoje vêm do etanol e não mais da gasolina. Essa planta é em São José dos Campos, mas a mesma coisa acontece em Cubatão e no Rio de Janeiro. Além disso, cinco novas refinarias serão construídas pela Petrobras.

Então, temos uma mudança estrutural que vinha andando de uma forma muito consistente e agora há um grande salto de qualidade, que são as descobertas das reservas do pré-sal. As estimativas daquela empresa...

(Interrupção do som.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Nas estimativas da Empresa HRTP, que fez uma análise sobre o potencial do pré-sal, que são perfurações de dois mil metros de sal, a perspectiva é que as reservas estejam entre 50 e 70 bilhões de barris.

Vou fazer uma conta grosseira, para que o Brasil possa entender o que representa o pré-sal e essas reservas de petróleo. Vamos supor que aconteça a hipótese mínima: 50 bilhões de barris. O que temos comprovado neste momento é Tupi, um único poço que tem entre 5 e 8 bilhões. Então, é uma estimativa ainda preliminar, mas muito provavelmente deve ser alguma coisa próxima a isso. Vamos supor que somente seja possível explorar metade dessas reservas: 25 bilhões de barris. A US$130 o barril, estamos falando de uma riqueza potencial no pré-sal da ordem de US$3,5 trilhões ou de R$5 trilhões.

Essa é a riqueza nova que o Brasil descobre no pré-sal. É uma riqueza absolutamente estratégica que o País tem que debater com profundidade, porque, se é uma riqueza muito promissora para o futuro do Brasil, também traz riscos.

Se olharmos a história do petróleo, das grandes potências exportadoras de petróleo - a Arábia Saudita, o Iraque, o Irã, a Venezuela -, nós vamos ver que o petróleo nem sempre representou mais desenvolvimento, mais industrialização, mais desenvolvimento da agricultura. Por quê? Porque essa riqueza, entrando no balanço de pagamentos do Brasil, vai apreciar de tal forma a moeda brasileira e vai criar tal capacidade de importação que dificilmente vamos manter a competitividade da indústria e da agricultura e podemos ficar prisioneiros da chamada doença holandesa: exatamente países que têm a moeda apreciada e importam cada vez mais e não produzem, como aconteceu com as principais economias exportadoras de petróleo. E o Brasil, em vez de dar um salto de qualidade naquilo que já é a décima economia do mundo hoje, nós podemos perder parte da nossa capacidade industrial e agrícola e nos transformarmos também em uma sociedade parasitária, que vive apenas da extração de um recurso não renovável, que é o petróleo, com burocracias agigantadas, com um Estado autoritário, um Estado que tem uma relação impositiva com outros países como acontece hoje com as principais potência produtoras de petróleo.

O Brasil não tem por que repetir os erros que outras Nações já cometeram. O debate de como vamos desenvolver o pré-sal, o debate de como é que nós vamos absorver a riqueza do petróleo para que haja, de fato, um crescimento sustentável, de longo prazo, viável e que não aprisione o Brasil da doença holandesa e que não transforme mais em uma tragédia histórica como o petróleo, que já representa hoje no Iraque e em tantos outros países produtores de petróleo, é um grande desafio.

A principal referência internacional, no meu ponto de vista, é a Noruega. A Noruega é um país que soube fazer um fundo soberano, soube aplicar em projetos estruturantes e, hoje, tem uma poupança da ordem de US$ 400 bilhões. Caiu a produção de petróleo, mas é um país que olhou para o futuro, olhou para as futuras gerações e soube construir uma solução criativa. É um país que tem um bom índice de desenvolvimento humano, porque as 15 maiores potências exportadoras de petróleo têm péssimos índices de desenvolvimento humano.

Por último, quero concluir dizendo que, para mim, o cenário nunca foi tão promissor a médio e longo prazos para o Brasil. Falo nesses quatro, cinco anos, em que temos de ter muita maturidade para construir essa passagem, mas o Brasil dará um salto histórico absolutamente espetacular em razão desse cenário internacional, que nos coloca numa condição extremamente favorável e num posicionamento estratégico muito positivo.

O mais importante é que, enquanto estamos amadurecendo esse caminho, está sendo possível crescer mais de 5% neste momento, manter a inflação sob controle num mundo em que a pressão inflacionária é muito grande, não ser atingido diretamente pela grave crise financeira americana e, principalmente, crescer distribuindo renda. São muito importantes os dados do Ipea e da FGV. Vinte milhões de pessoas saíram da pobreza. Metade da população indigente deixou de sê-lo, e temos mais de 51% da população, hoje, na classe média, tendo condições de consumir, tendo acesso ao mercado, exatamente porque geramos, nesses cinco anos e meio, 10,4 milhões de empregos com carteira de trabalho assinada, recuperamos o salário mínimo, implementamos o Bolsa Família e estamos criando um grande mercado de consumo de massas num País mais generoso, mas ainda muito injusto.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/08/2008 - Página 29472