Discurso durante a 140ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a matéria de autoria do jornalista Carlos Chagas, intitulada "Tiraram a bandeira brasileira", publicada no jornal Tribuna da Imprensa, sobre a Reserva Indígena Raposa Serra do Sol.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SOBERANIA NACIONAL. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Comentários sobre a matéria de autoria do jornalista Carlos Chagas, intitulada "Tiraram a bandeira brasileira", publicada no jornal Tribuna da Imprensa, sobre a Reserva Indígena Raposa Serra do Sol.
Aparteantes
Augusto Botelho, Heráclito Fortes, José Nery.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2008 - Página 29688
Assunto
Outros > SOBERANIA NACIONAL. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • LEITURA, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, TRIBUNA DA IMPRENSA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DENUNCIA, RETIRADA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), BANDEIRA NACIONAL, RESERVA INDIGENA, MUNICIPIO, PACARAIMA (RR), ESTADO DE RORAIMA (RR), OCORRENCIA, CONFLITO, REALIZAÇÃO, ACORDO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), DEVOLUÇÃO, BANDEIRA.
  • DENUNCIA, OCORRENCIA, ROUBO, CIDADÃO, MUNICIPIO, PACARAIMA (RR), ESTADO DE RORAIMA (RR), DEFESA, INVESTIGAÇÃO, ACUSAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, MEMBROS, POLICIA FEDERAL, FORÇA ESPECIAL, NECESSIDADE, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), PROBLEMA, RESERVA INDIGENA.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), ESTADO DE RORAIMA (RR), RECEBIMENTO, RECURSOS, GOVERNO FEDERAL, REGISTRO, VIAGEM, CONSELHO, CONTINENTE, EUROPA, DEBATE, POSSIBILIDADE, AUTONOMIA, RESERVA INDIGENA, AMEAÇA, SOBERANIA NACIONAL.
  • CRITICA, FALTA, AUTORIDADE, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), GOVERNO, QUESTIONAMENTO, POSIÇÃO, CONFLITO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR).
  • QUESTIONAMENTO, QUANTIDADE, AREA, RESERVA INDIGENA, AMBITO NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE RORAIMA (RR), CRITICA, OCORRENCIA, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, PROMOÇÃO, CONFLITO, NECESSIDADE, MANUTENÇÃO, SOBERANIA NACIONAL.
  • REGISTRO, VIAGEM, ORADOR, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, ENCONTRO, PARLAMENTAR ESTRANGEIRO, DEBATE, APREENSÃO, INFLUENCIA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), INDIO.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, às vezes, até me pergunto se algumas pessoas que me assistem pela TV Senado e me ouvem pela Rádio Senado, quando eu começo a falar, não dizem: “Lá vem ele, de novo, falar da Raposa Serra do Sol, da questão daquela reserva indígena em nossa fronteira com a Guiana e a Venezuela”. Mas eu vou continuar falando, Sr. Presidente. É a arma que eu tenho, como representante de meu Estado, para protestar contra essa infâmia que se está praticando contra meu Estado.

            E hoje eu quero trazer umas denúncias diferentes sobre essa questão. Primeiro, o jornal Tribuna da Imprensa, de hoje, no artigo do jornalista Carlos Chagas, publica o seguinte artigo:

Tiraram a Bandeira Brasileira

Vale abrir espaço para o desabafo de um militar que serviu na Amazônia durante quase toda sua vida profissional. Hoje na reserva, o coronel Gélio Fregapani, um dos fundadores da Escola de Guerra na Selva, revela toda sua indignação em uma nota por nós recebida:

“A cidadezinha de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, é a única povoação brasileira nas serras que marcam, no Norte, o início de nosso País”. Apesar de toda a pressão, essa população está crescendo, o que torna mais difícil a missão dos traidores da pátria: acabar como o enclave brasileiro na pretensa nova “nação” separada do Brasil, a reserva Raposa Serra do Sol, em área contínua que chega até à fronteira.

Uma das vilas sob pressão dos traidores resiste. Surumu, que mantém hasteada das 6 às 18 horas [por conta da população, diga-se de passagem] uma grande bandeira nacional, como símbolo da decisão de se manter brasileira. Sorrateiramente, num fim de semana, gente do Conselho Indígena de Roraima (CIR) retirou a bandeira,depois de espezinhá-la.

A população local, na maioria índios, mas todos brasileiros, indignada com o ato antipatriótico e com a indiferença das autoridades [e aqui faço questão de dizer que lá estão a Polícia Federal e a Força Nacional mandada pelo Presidente Lula], prepararam-se para retomar a bandeira à força. Na iminência de um conflito, a Funai afinal se mexeu: fez com que os asseclas do CIR devolvessem a bandeira, que novamente tremula em Surumu. Entretanto, ao devolvê-la, declararam que depois de agosto haveria uma outra bandeira hasteada, e que não seria a brasileira.

Após esse incidente, o CIR declarou que bloqueará o entrocamento da BR-174 para a vila Surumu, [é de onde sai a estrada para Surumu], o que me parece difícil pelo seu pouco efetivo, embora prenhe de recursos das Ongs e, mesmo, da Funasa. O CIR solicitou, ainda, da Funai 15 passagens aéreas para seus índios virem a Brasília reforçar seus lobbies. Eles mantêm a pressão enquanto tentam reduzir Pacaraima pelo estrangulamento de recursos, cortados por setores governamentais mal informados ou mal intencionados.

            E aí ele prossegue. Peço que V. Exª dê como lido todo o artigo, que merece ficar nos Anais do Senado como um alerta, porque, quando eu dizia aqui, há alguns anos, que essa reserva seria uma região de conflito, que haveria problema de questão intra-étnica - não é entre índio e não-índio, mas entre índios e índios -, o Governo Federal não “deu bola”.

            Hoje, recebi, pelo serviço de mensagem no meu celular, de um morador daquela região - e já comuniquei, inclusive, ao assessor parlamentar da Polícia Federal aqui no Senado, por uma questão de gentileza - outra denúncia de que homens, que eles dizem ser da Polícia Federal e da Força Nacional, entraram na casa de um senhor chamado Esmeraldino - é um morador tradicional da região da cidade de Surumu, Senador Augusto - e levaram as compras que ele tinha feito para comemorar o aniversário da sua filha. Não sei sob que alegação, mas, com certeza, sem ordem judicial, porque não mostraram ao Sr. Esmeraldino nenhuma ordem judicial para invadir a propriedade dele. E ele está lá por questão de direito; não há ordem judicial para ele sair de lá. A questão da Raposa Serra do Sol está sub judice, está lá no Supremo para ser decidida. No entanto, o Conselho Indígena de Roraima, como eu já fiz questão de frisar aqui, tem uma página bonita na Internet, muito ilustrada, muito cheia de indígenas vestidos de forma como eles não usam - não é, Senador Augusto? Aqui, eles estão sempre de cocar, pintados, só de calção. Lá, eles não vivem assim.

            Pois bem, o CIR recebeu só agora, no Governo Lula, R$44.312.153,00, só de convênios do Governo Federal, e pagos, não empenhados. Foram recursos pagos só no Governo Lula.

            Fora isso, o CIR, como eu disse ontem em um aparte, tem como parceiro - e isso está colocando na página dele na Internet - várias ONGs estrangeiras que são da Itália, da Inglaterra, dos Estados Unidos, da Holanda, da Noruega, novamente da Inglaterra, da Itália, da Alemanha, dos Estados Unidos, Inglaterra e do Brasil, que são várias. Mas vou nominá-las: Alianza Amazonica, da Itália; Cafod, da Inglaterra; Cese, dos Estados Unidos; Greenpeace, da Holanda; Norad, da Noruega; Oxfam, da Inglaterra; Pro Indios di Roraima, da Itália; a Pro Regenwald, da Alemanha; a Rainforest Foundation, dos Estados Unidos; a Survival International, da Inglaterra.

            Então, são essas ONGs internacionais que financiam as ações do CIR. Basta ver agora a viagem que eles fizeram recentemente à Europa.

            De 17 a 21 de junho, uma comitiva do CIR esteve na Espanha. Foram recebidos em Moncloa, no Palácio do Governo espanhol, por dois representantes do Gabinete da Vice-Presidente do 1º Governo da Espanha.

            De 22 a 25 de junho, estiveram na Inglaterra e foram recebidos pelo Diretor e responsável pela área de comunicação da entidade The Prince’s Rainforest Project, entidade criada pelo Príncipe Charles, da Inglaterra, para a defesa das florestas tropicais. Vejam só: o Príncipe Charles defendendo as nossas florestas tropicais.

            Entre os dias 26 a 30 de junho, estiveram na Bélgica. Foram recebidos por assessores do Deputado europeu alemão Schmidt, pela Deputada italiana Patrícia Toia, pela Embaixadora Maria Celina de Azevedo e pelo Secretário da Missão brasileira na União Européia.

            Entre os dias 1º a 4 de julho, estiveram na Itália e foram recebidos pelo Secretário-Geral do Conselho Pontifício da Justiça e Paz do Vaticano, Dom Giampaolo Crepadi, e pelo Papa Bento XVI.

            Entre os dias 5 a 8 de julho, estiveram em Portugal, visitaram a Embaixada brasileira em Lisboa, e foram recebidos pelo Embaixador, Sr. Celso Marcos Vieira de Souza, juntamente com a Primeira-Ministra da Embaixada, e pela Drª Maria Jesus Barroso, e visitaram o Parlamento português.

            Então vejam que, na verdade, está-se construindo uma Nação, Senador Virgínio, na fronteira da Guiana com a Venezuela. Já há a aceitação internacional. É só uma questão de momento. Daqui a pouco, esse grupo, que é a minoria dos índios que moram lá - é bom que se diga -, pois lá existem, pelo menos, quatro outras organizações, e são cinco etnias diferentes. Mas esta aqui foi escolhida misteriosamente por essas ONGs internacionais e abençoada pelo Governo brasileiro. Portanto, o Governo brasileiro está sendo conivente com essa questão.

            Portanto, quero fazer hoje essas duas denúncias sobre a Reserva Indígena Raposa Serra do Sol. A primeira trata da questão da bandeira brasileira, Sr. Presidente. Espero que as autoridades que estejam lá tenham sensibilidade com isso.

            A segunda denúncia, já a comuniquei - repito - ao assessor parlamentar da Polícia Federal. E vou fazê-la, por escrito, para o Ministro da Justiça, porque o Ministro da Justiça só foi a Roraima uma vez, quando os índios do Conselho Indígena de Roraima (CIR) invadiram a propriedade, porque lá não está definida, juridicamente, a questão. Foram recebidos a bala, o que não aprovo. Aí o Ministro correu, foi lá e prendeu o fazendeiro. Foi a única vez em que o Ministro foi a Roraima.

            Então, o Ministro Tarso Genro não tem credibilidade para conduzir esse processo, e o Governo Lula também não a tem. Desde o primeiro momento do Governo dele, o Presidente sabe dessas questões. Uma Comissão Temporária Externa do Senado fez esse diagnóstico, mostrou para o Presidente, a pedido dele, a forma de resolver essa questão, e o Presidente, pacificamente, quer tirar 320 mil hectares de 1,7 milhão de hectares. Este é um País...

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Permite-me um aparte, Senador Mozarildo Cavalcanti?

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Com certeza, eu o concederei a V. Exª, se o Presidente concordar.

            Há um slogan que diz que “o Brasil é um País de todos”. Mas é de todos mesmos? Quando se diz “todos”, eu entendo que são todos, todos. Um Governo que estimula a luta de classes, a luta racial, que aprofunda esses ódios até intra-étnicos, repito, não merece realmente, de jeito nenhum, a aprovação do povo brasileiro.

            Então, para encerrar, quero, se o Presidente permitir, ouvir o Senador Nery, com muito prazer.

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Senador Mozarildo, hoje, participei de uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos em que se discutia a situação da comunidade indígena Bananal aqui, em Brasília, que está prestes a ser expulsa pela especulação imobiliária. Enfim, há uma luta de resistência que merece ser apoiada por quem defende a dignidade e o direito dos povos ancestrais, que têm sido, ao longo dos 500 anos do nosso País, tratados com discriminação, com violência e com todo o tipo de insulto à sua dignidade. Então, eu queria, de forma muito cordial, mas muito direta, dizer a V. Exª que, naquela audiência pública, foi afirmado que, no Congresso e em vários setores da sociedade brasileira, há uma campanha diária, diuturna, de combate ao direito das populações indígenas, direito esse escrito na Constituição brasileira. Os indígenas precisam de vozes aqui, de Parlamentares que, com autenticidade, com respeito a esses povos, a essas etnias, digam claramente que o Estado brasileiro tem a obrigação de demarcar suas terras. Assim como existem aqui as bancadas que defendem os interesses dos banqueiros, em defesa do latifúndio, devem existir, sim, as bancadas em defesa dos interesses sociais. E por que não existir uma bancada em defesa dos interesses dos povos indígenas, consolidada na organização da frente parlamentar em defesa dos povos indígenas? Então, é importante aprofundar esse debate sobre a necessidade de o Estado brasileiro, o Parlamento brasileiro ter uma visão um pouco mais solidária a esses povos, que somavam cinco milhões de pessoas no período do Descobrimento e que, hoje, são apenas seiscentas mil pessoas. Essa é uma realidade que deve exigir de todos nós um compromisso sincero e leal, porque não podemos tratar os indígenas irmãos nossos com tanto desprezo e, às vezes, até com insultos. Então, rogo a V. Exª no sentido de que possamos ter um olhar um pouco mais aberto e democrático para essa questão, porque todos são brasileiros, todos defendem e querem o melhor para o nosso País. E as políticas que digo afirmativas para garantir esses direitos precisam ser apoiadas, não combatidas. Tenho muita divergência do Governo Lula em vários aspectos, mas, nesse aspecto especial, é preciso aprofundar, melhorar o papel...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - O aparte está maior do que meu discurso, não é?

            O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Então, Senador Mozarildo, devemos ter essa preocupação para com as etnias e os povos indígenas de nosso País, tendo em vista a necessidade de promovermos o congraçamento das diversas raças, etnias e culturas, para promovermos uma cultura de paz, de igualdade, de justiça, de boa convivência. Creio que a melhor forma é ajudar a preservar o direito de índios, de etnias que, historicamente, foram tão perseguidas! Agradeço a V. Exª a oportunidade democrática de poder expressar este pensamento. Desejo que avancemos na condução dessa visão mais ampla e mais igualitária em relação a todas as etnias, a todas as culturas, a todas as formas de organização desses povos, para que o País possa ser efetivamente melhor. Agradeço a V. Exª.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Nery, tenho repetido: minha formação é de médico, sou um humanista, não tenho ideologia ligada a esta ou àquela cor ou facção. Para mim, todos são iguais. Tenho a maior admiração pelos índios. Exerci a Medicina durante quatorze anos no meu Estado, atendendo majoritariamente os índios - e de graça, Senador Nery -, inclusive levado pela Diocese de Roraima para atendê-los, já fazendo essa pregação da divisão inter-étnica que ela estava fazendo. O que não aceito são certos jargões em que, por exemplo, a Igreja Católica é especialista. Repete-se uma coisa várias vezes. Quem verificou que havia cinco milhões de índios quando Pedro Álvares Cabral chegou aqui? O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE? Qual foi o instituto que fez o levantamento?

            Depois, vamos à história: não há país com a proporção de terras demarcadas que tem o Brasil. A população indígena corresponde - V. Exª mesmo disse que são 600 mil, mas o IBGE disse que são 740 mil - a 0,3% da população do Brasil, e 13% do território nacional está demarcado. Ninguém está dizendo que não quer a demarcação. O que não se quer - V. Exª usou a palavra “paz” - é uma demarcação que não promova a paz, uma demarcação que promova o ódio racial entre eles mesmos, índios, e entre os mestiços, os descendentes. É contra isso que estamos nos insurgindo. No meu Estado, há 34 reservas demarcadas, e essa é a trigésima quinta. Não estamos aqui, como V. Exª quis dar a entender, em uma bancada contra índio. Aqui não há bancada contra índio, muito menos de Roraima. O que queremos é que haja, realmente, um Brasil para todos, de todos.

            Então, não vamos rotular. Não rotulo V. Exª como, por exemplo, uma pessoa que pense como a Igreja Católica de antigamente, que rotulava as pessoas de hereges e de bruxas e que as queimava nas fogueiras. Não, não penso que V. Exª pense assim, mas também não pense que penso o contrário, que não gosto de índio, que tenho raiva de índio. Ao contrário, quero os índios do meu Estado participando, de fato, do meu Estado, como participam, aliás, naquela região. Dos três Prefeitos envolvidos naquelas reservas, dois são índios: uma é neta de índio, e o outro é índio de primeira geração. Os Vereadores, a maioria, são índios. Acontece que os indigenistas de fora ficam falando sobre as coisas de lá.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Com muito prazer, Senador Heráclito Fortes.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Mozarildo, V. Exª tem sido uma sentinela avançada, permanente, nesta Casa na defesa da Região Norte e do País. Sou testemunha disso. Fomos colegas na Câmara. V. Exª chegou ao Senado oito anos antes de mim, mas, mesmo à distância, acompanho sua luta e admiro que V. Exª - mudou governo, entrou governo, saiu governo - não tenha mudado o discurso e tenha mantido sempre a mesma coerência. Por isso lhe sobra autoridade para abordar assuntos dessa importância. Compreendo o posicionamento do Senador Nery, por quem tenho grande apreço e grande admiração. Não podemos ideologizar questões dessa natureza. Agora, é preciso que se quebrem hipocrisias. V. Exª há pouco falou sobre direitos humanos, Senador Nery. Chamo a atenção de V. Exª para um fato: o Ministro Tarso Genro vem, de uns dias para cá, fazendo constantemente apologia dos direitos humanos no Brasil, como se fosse um paladino isolado, único. Nessa corrente, anuncia para este ano um encontro, com lançamento de obras, enaltecendo data comemorativa aos direitos humanos no Brasil. Se há uma coisa que o Ministro Tarso Genro não tem é autoridade de comandar um processo dessa natureza. E o que me causa estranheza é que está sendo anunciado que ele fará esse lançamento juntamente com pessoas ilustres que têm história nessa matéria, como José Gregori. Não vejo como José Gregori e Tarso Genro dividirem o mesmo ambiente na defesa dos direitos humanos.

            É preciso que esta Casa se lembre de que S. Exª o Ministro da Justiça, relembrando episódios da ditadura Vargas, entregou ao ditador cubano Fidel Castro os boxeadores da maneira mais impiedosa e cruel que se poderia fazer com um cidadão, no caso, dois desportistas. Depois, convocado à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, mentiu sobre os episódios que posteriormente foram esclarecidos e expôs alguns Senadores com afirmativas falsas, inclusive o Senador Nery e o Senador Eduardo Suplicy. Passou informações não verdadeiras. O desaguar disso é que um dos boxeadores conseguiu agora fugir via México e está na Alemanha; e o outro, passando necessidades e privações na ilha.

            O episódio foi pior do que a entrega de Olga Benário, porque, com a biografia do Sr. Genro, jamais aquilo teria acontecido. Foi um pacto marcado e urdido com a digital do presidente venezuelano, que mandou um avião a jato ficar esperando aqui, no aeroporto do Galeão, a captura dos rapazes. O mais cruel é que se trouxe de lá o mais sanguinário e implacável dos perseguidores dos contrários ao regime do Sr. Fidel para vir aqui numa simbologia - não gostaria de dizer isso, mas sou obrigado - como se fora como se fora um Filinto Müller moderno.

            Veio aqui, levou os rapazes, e o Ministro, de uma maneira desabrida, tranqüila, disse que tudo aquilo tinha sido feito na legalidade. Mentiu com relação ao prefixo das aeronaves, escamoteou a verdade. E é por aí que nós vamos enaltecer direitos humanos? Não, Sr. Presidente! Nós temos todo o direito, nós temos todo o dever e temos, acima de tudo, a obrigação e o dever cívico, mas nessa mesa não tem lugar para o Sr. Tarso Genro até o momento em que ele conte direitinho a participação dele nesse vergonhoso episódio que envolveu dois jovens que poderiam, em outras circunstâncias, estar agora na China defendendo, por meio do esporte, a bandeira de um país que os adotasse, como, no caso, a Alemanha. É lamentável. Nesse encontro de direitos humanos não cabe José Gregori e Tarso Genro. Se isso acontecer, para mim será uma grande decepção que terei com a figura extraordinária desse homem público que se chama José Gregori. Muito obrigado.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Heráclito, eu agradeço o aparte de V. Exª e quero inclusive informar V. Exª, que é Presidente da Comissão de Relações Exteriores, que estive recentemente na Venezuela, em Caracas, e informalmente fui recebido por alguns deputados da Assembléia Nacional daquele país. E conversando sobre a Amazônia e a fronteira da Venezuela com o Brasil, percebi que eles estão altamente preocupados com a presença de ONGs naquela região, com a manipulação por essas ONGs dos indígenas da Venezuela. Como sabemos, existe índio ianomâmi na Venezuela e há índio ianomâmi do lado do Brasil; os índios ingaricós do Brasil passam de um lado para o outro, de lá para cá, a toda hora; os patamonas também.

            Então não precisamos ter nenhuma preocupação com o índio, temendo que representem um perigo, não; pelo contrário, temos é de fazer com que os índios tenham a consciência - no caso de Roraima a maioria tem - de que são brasileiros e têm que defender a nação brasileira. Infelizmente, algumas ONGs transnacionais que estão a serviço de corporações financeiras defendem o contrário, ou seja, os índios não são necessariamente brasileiros e devem ter uma região autônoma independente. Então quero frisar isto: essa preocupação é de todo aquele que tem o sentimento da nacionalidade, de quem é realmente nacionalista.

            Senador Augusto Botelho, V. Exª tinha me solicitado um aparte, que quero conceder-lhe, com muito prazer, porque não poderia encerrar o meu pronunciamento sem ouvir o meu colega de Estado.

            O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Mozarildo Cavalcanti, gostaria só de dar uma explicação, porque, quando o nosso colega fez um aparte, deu a entender que éramos contra o indígena. Queremos demarcar as áreas indígenas, mas como os índios querem; os índios que são a maioria de lá. É isso que não se respeita. Queremos também que as pessoas que vivem lá, nas mesmas condições que os índios, sejam respeitadas. As vilas que estão sendo extintas são as vilas de apoio aos indígenas da região. Existem idosos ingaricós que viajam dois dias a pé para chegar em Água Fria para pegar uma condução para receber a sua aposentadoria. Se acabar Água Fria, vão ter de viajar oito dias para chegar onde há uma condução para ir receber a aposentadoria. Então as pessoas que fizeram isso, as ONGs que têm interesse realmente de criar um país... Já ouvimos essa história há mais de 20 anos, Mozarildo, da história da tal Nação Ianomâmi que queria fazer no começo, depois mudaram para Parque Ianomâmi e tal, mudaram a história, quando viram que estavam mexendo com os brios nacionalistas da gente.

            Quero também frisar que nossos indígenas de Roraima, da Raposa Serra do Sol, em sua maioria, mais de 80%, são nacionalistas, são brasileiros. Há quase 300 indígenas na universidade e muitos terminando o curso superior. Eles têm luz elétrica, cursos de segundo grau nas escolas indígenas. Das 400 escolas estaduais de Roraima, 200 são indígenas. Nossos indígenas não andam nus e não precisam de tutor, de ter um gringo ao lado deles falando, não. Eles sabem o que querem. Por isso, acho que temos de continuar lutando mesmo e respeitar o direito dos que vivem lá há duas, três gerações. Aquilo só é Brasil porque eles foram para lá também e tem de continuar Brasil.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PTB - RR) - Senador Augusto Botelho, com muito prazer incorporo o aparte de V. Exª, que é de Roraima, como médico, assim como eu, atendeu e continua atendendo a todas essas comunidades e sabe que por trás dessa história há muito mais interesse estrangeiro e estranho ao Brasil do que mesmo os legítimos interesses do Brasil.

            Quero encerrar chamando a atenção do Ministro da Justiça - confio muito nele, mas vou chamar a atenção porque está exercendo o cargo -, para as denúncias que recebi da Vila Surumu por parte de integrantes da Polícia Federal e da Força Nacional. Eu gostaria de ver esclarecidos esses fatos assim como esse episódio com relação a nossa bandeira nacional. Não é possível que as forças do Brasil estejam lá a serviço apenas do Conselho indígena de Roraima. Devem estar a serviço do País, do Estado brasileiro para garantir a cidadania de todos que moram lá. Quero dizer ao Sr. Esmeraldino que lamento o que aconteceu com ele como a todos os habitantes da Vila Surumu. Estivemos lá recentemente. Só vi algo parecido com aquilo em filmes, Senador Augusto Botelho, no tempo do Stalin, do Hitler e do Mussolini, na Itália.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210 inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“Tiraram a bandeira brasileira”;

“Lista de parceiros do CIR”;

“Roteiro da Viagem do CIR À Europa”;

“Recursos Recebidos pelo CIR”;

“Conselho Indígena de Roraima”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/08/2008 - Página 29688