Discurso durante a 162ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Alerta para os riscos existentes na implantação de um Estado policial no País, e preocupação com o recente episódio dos grampos telefônicos contra autoridades da República. Referências a projeto de lei de autoria de S.Exa., que tem como objetivo estabelecer novas condições para o procedimento de interceptação telefônica, informática e telemática.

Autor
Jarbas Vasconcelos (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PE)
Nome completo: Jarbas de Andrade Vasconcelos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Alerta para os riscos existentes na implantação de um Estado policial no País, e preocupação com o recente episódio dos grampos telefônicos contra autoridades da República. Referências a projeto de lei de autoria de S.Exa., que tem como objetivo estabelecer novas condições para o procedimento de interceptação telefônica, informática e telemática.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Cícero Lucena.
Publicação
Publicação no DSF de 03/09/2008 - Página 36684
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REITERAÇÃO, RISCOS, AUTORITARISMO, ESTADO, BRASIL, JUSTIFICAÇÃO, ANTERIORIDADE, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REGULAMENTAÇÃO, ESCUTA TELEFONICA, MODERAÇÃO, ATUAÇÃO, POLICIA, MINISTERIO PUBLICO, PRESERVAÇÃO, ESTADO DE DIREITO, COMBATE, MANIPULAÇÃO, NATUREZA POLITICA, AMPLIAÇÃO, PENA, FUNCIONARIO PUBLICO, REGISTRO, ENCONTRO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), BUSCA, ENTENDIMENTO, SUBSTITUTIVO, URGENCIA, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL.
  • ELOGIO, DECISÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AFASTAMENTO, DIRIGENTE, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN), MOTIVO, ESPIONAGEM, COBRANÇA, ORADOR, ISENÇÃO, INVESTIGAÇÃO, PUNIÇÃO, RESPONSAVEL, ANALISE, GRAVIDADE, IMPUNIDADE, EXCESSO, CORRUPÇÃO, BRASIL.

O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, já subi várias vezes a esta tribuna alertando para os riscos existentes da implantação de um Estado policial no Brasil. O recente episódio - o Senador Alvaro Dias, com muita propriedade e muita competência, dele tratou há pouco desta tribuna - de uma escuta clandestina bisbilhotando o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, e vários Senadores da República mostra que essa minha preocupação não foi em vão.

Para não ficar apenas na retórica, em setembro do ano passado, há um ano, apresentei um projeto de lei com o objetivo de estabelecer novas condições para o procedimento de interceptação telefônica, informática e telemática.

            Na justificativa desse projeto, argumentei que as modificações propostas por mim pretendiam moralizar aquilo que havia se transformado num verdadeiro "mercado de escutas telefônicas".

No Estado Democrático de Direito não se admite desvirtuamento tão grande das técnicas de investigação policial. É necessário que a Polícia e o Ministério Público tenham moderação quanto ao pedido de interceptação telefônica - hoje ele é feito com bastante vulgaridade, às pressas, e, às vezes, sem nenhuma responsabilidade.

É lógico e evidente que o meu objetivo não é impedir que esse importante instrumento seja utilizado contra o crime, mas que ele não se transforme numa arma com conotações políticas, com objetivos menores na luta pelo poder dentro e fora do setor público.

Sr. Presidente, V. Exª, agora há pouco, como Presidente - inclusive chamando a atenção para o fato de estar contrariando o Regimento da Casa -, fez um alerta sobre esses desvios. É importante que V. Exª, ainda que eventualmente, episodicamente sentado no lugar do Presidente, faça essa interferência em favor da democracia.

É bom lembrar que todos os regimes totalitários, todos, nasceram com pequenos excessos que, sem uma reação enérgica da sociedade organizada, terminaram por jogar todas as liberdades na lata do lixo. Não podemos deixar que isso ocorra novamente no Brasil.

Os exemplos são recentes.

Na semana passada, Sr. Presidente, esse projeto de minha autoria - a ele fiz referência no início de minha fala - foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça com a relatoria brilhante do Senador Demóstenes Torres, que, como sempre, foi muito cuidadoso e responsável.

Não tenho nenhuma vaidade, Sr. Presidente, de ser apresentado como autor dessa proposta. Para mim é muito mais importante, muito mais relevante, que o projeto seja aprovado aqui, no plenário do Senado, e também na Câmara dos Deputados.

Foi com essa expectativa que aceitamos, há quinze dias, conversar com o Ministro da Justiça Tarso Genro para construir um substitutivo que preenchesse qualquer lacuna existente entre o meu projeto e o projeto do Executivo e viabilizar sua aprovação sem obstáculos aqui no Senado e na Câmara - não adianta aprová-lo aqui e, em seguida, vê-lo engavetado ou manipuldo pela maioria esmagadora, maioria inclusive fisiológica, que o Governo tem na Câmara dos Deputados.

Acredito piamente que este seria o melhor caminho em todos os embates entre Governo e Oposição no Congresso Nacional. Quando um entendimento não for possível, paciência, mas ele deve ser sempre buscado, sempre perseguido. O que não dá para ver com bons olhos é o Governo tirar do Congresso sua função de legislar e usar e abusar do chamado "rolo compressor" da maioria, que faz o que quer e o que bem entende aqui no Senado e, muito mais, na Câmara dos Deputados.

Embora governos anteriores também tenham usado as medidas provisórias, elas vêm sendo usadas abusivamente pelo atual Governo e, assim, têm paralisado o Congresso Nacional, em especial o Senado da República. Aqui acabaram os debates, não existem mais debates nesta Casa por conta do uso reiterado e desnecessário de medidas provisórias por parte do Presidente da República.

Não há como negar, Sr. Presidente, que é elogiável a iniciativa do Presidente da República de afastar, preventivamente, a Diretoria Executiva da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin. Trata-se até de um fato novo, ao contrário de outros casos, quando o Presidente preferiu fazer vista grossa a erros cometidos por auxiliares.

Agora, nesse final de semana, o Presidente da República teve a coragem de dizer, lá em São Paulo, que o escândaldo do mensalão foi uma infâmia, uma calúnia lançada pelas Oposições contra a sua base de apoio, contra o seu Governo. É querer fazer dos outros idiotas: o Congresso Nacional, a mídia e a opinião pública brasileira.

Mas a determinação do Governo com relação a esse caso não pode parar por aí, Sr. Presidente. Se foi louvável o afastamento de toda a diretoria da Abin, o Governo tem que ir além e buscar uma investigação profunda e isenta sobre essa verdadeira "grampolândia", que não é de hoje, já vem de há muito tempo. É necessária uma ampla articulação para aprovar medidas, em um prazo relativamente curto, que regulamentem o uso desses instrumentos de investigação policial.

No nosso projeto, não só agravamos, como aumentamos a pena quando se trata de agente público, de servidor público. Se um servidor público promoveu a escuta clandestina, ele tem a pena agravada.

Crises são sempre oportunidades para a correção de rumos e de erros. Espero sinceramente que o Governo cumpra com seu papel. Se agir corretamente, sem subterfúgios, sem tentativas de escamotear a verdade, como o Governo sempre faz, ele terá sempre o nosso apoio. Não dá para ficar escondendo as coisas e dizer até - ninguém do Governo disse ainda, mas daqui a pouco dirá - que é por conta do período eleitoral. Período eleitoral é todo o Governo Federal. Todo o Governo Lula tem sido transformado num dia-a-dia eleitoral. Então, não é uma eleição municipal que vai servir de pretexto para isso.

É muito sério, Sr. Presidente, o que aconteceu e foi publicado pela revista Veja. Como o País já se está acostumando com o descalabro, com os escândalos e as corrupções - Waldomiro Diniz não foi punido, sequer foi preso; aquele dossiê contra o atual Governador de São Paulo José Serra ninguém sabe seu destino; o escândalo do Mensalão se arrasta, ninguém ouve mais falar em vampiros ou em sanguessugas -, esses escândalos estão se incorporando à paisagem brasileira. Espero que esse não seja mais um que se incorpore à paisagem brasileira, porque ele é gravíssimo.

Grampear um Ministro do Supremo, grampear o Presidente da Casa, Senador Garibaldi Alves Filho, grampear outros Senadores e até Ministros de Estado é muito grave. Isso pode descambar, pode nos levar para uma situação de um Estado policial total e completo, que é totalmente indesejável, acredito eu, a todos os democratas.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Senador Jarbas Vasconcelos, concede-me um aparte?

O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE) - Concedo.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Quero me associar à preocupação de V. Exª. Veja bem, o Senador Alvaro Dias, há pouco, demonstrou essa preocupação, bem como o Presidente Papaléo Paes, que preside esta sessão. Onde se vai e se chega... V. Exª, quando levanta um tema desses, pela vida que tem, preocupa a Nação como um todo. Em relação às medidas provisórias, gostei do que V. Exª colocou: que elas não permitem os debates nesta Casa. Também elogiou quando o Presidente foi rápido naquele momento e tomou a providência. Mas há preocupação de que se grave à revelia, ainda mais quando é público. O servidor público usa, às vezes, essa função privilegiada para investigar ou para acompanhar outros. E, daqui a um pouco, vai haver grupos com direito a bisbilhotar. Também poderemos ter um poder paralelo que faz as gravações sem as precauções necessárias. Por isso, gostaria muito de estar acompanhando a reflexão de V. Exª na tarde de hoje. É necessário ver com muita responsabilidade e com muito cuidado um tema tão importante e que envolve a Nação como um todo. Meus cumprimentos a V. Exª, Senador Jarbas Vasconcelos.

O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE) - Eu é que agradeço a V. Exª, Senador Casildo Maldaner, já que V. Exª tem uma longa trajetória de Parlamentar e Governador de Estado, e conhece profundamente o risco de tudo isso.

Não quero comungar do pessimismo do Senador Alvaro Dias. Acho que ele está certo, correto, mas não quero, nesse aspecto, comungar do seu pessimismo. Mas o fato é gravíssimo. Portanto, o Presidente da República, que já tomou providências, não deve deixá-las pela metade! Que se avance sobre isso para que a Polícia Federal, que muitas vezes quer ficar acima da lei, acima da Constituição, como se qualquer instituição no Brasil ou no mundo pudesse ficar acima da Lei Maior, não sinta que pode ficar acima da Constituição. Tenho um ano e nove meses de mandato aqui nesta Casa e já é a terceira ou quarta vez que, desta tribuna, chamo atenção para isto: que a Polícia Federal, por mais admirável que seja o seu trabalho de desbaratar quadrilhas, sobretudo aquelas que assaltam os cofres públicos, não tem o poder de se colocar acima da Constituição.

Eu ouço, se V. Exª permitir, o Senador Cícero Lucena.

O Sr. Cícero Lucena (PSDB - PB) - Obrigado, Senador Jarbas Vasconcelos. Também quero me somar a todos aqueles Senadores, pois, tenho certeza, representamos a grande maioria do povo brasileiro, na preocupação com o estado policialesco a que V. Exª fez referência. Até porque eu também me encontrava aqui presente há um ano, quando V. Exª, dessa tribuna, colocava exatamente a preocupação da ação da Polícia Federal, respeitando o seu valoroso trabalho, mas chamando atenção das cenas que muitas vezes eram passadas, espetaculares, da ação da polícia, bem como a preocupação com o grampo. Eu estava presente há um ano e estou vendo hoje V. Exª repetir essa preocupação, embora já tenha encaminhado um projeto, que só demonstra a sua grandeza e a sua sintonia com a vida cotidiana do povo brasileiro, em particular do Estado que representa. Então, somo-me também nessa preocupação, reconhecendo e parabenizando-o por mais essa atitude, que coloca, de uma forma clara a sua identificação com o povo brasileiro. Muito obrigado.

O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE) - Senador Cícero Lucena, muito obrigado a V. Exª. Quem o conhece como eu, sabe que numa hora importante como esta, V. Exª não ficaria calado.

E até V. Exª, Senador Papaléo Paes, como Presidente da Mesa, pronunciou-se a favor da apuração rápida, eficiente e transparente desse fato. E os Senadores presentes no plenário - muito poucos, por sinal -, todos também já se manifestaram sobre isso. O fato é grave. O Presidente da República já tomou a primeira medida, mas é preciso que tome a segunda, a terceira, a quarta, a quinta, até que cesse essa paranóia sobre grampos que hoje inquieta a todos os brasileiros de todas as regiões do Brasil.

Ninguém tem o direito de grampear outras pessoas. Ninguém! Mas a ordem judicial tem sido dada com a maior liberalidade, com a maior facilidade. O Ministério Público pede com a maior facilidade; a Polícia, mais ainda. É preciso que todos esses exemplos sejam seguidos e, sobretudo, a clandestina. A escuta clandestina é que precisa ser apurada para que o agente público que a promoveu - o nosso projeto é nesse sentido - tenha a sua pena agravada, aumentada. Ele deve ter a pena maior do que uma pessoa comum que faça uma escuta clandestina.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, agradecendo a benevolência de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/09/2008 - Página 36684