Discurso durante a 155ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem de pesar pelo falecimento do Dr. Olavo Egydio Setubal.

Autor
José Sarney (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: José Sarney
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem de pesar pelo falecimento do Dr. Olavo Egydio Setubal.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2008 - Página 35346
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, OLAVO SETUBAL, ENGENHEIRO, EMPRESARIO, BANQUEIRO, EX PREFEITO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), EX MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), MANDATO, ORADOR, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, DEPOIMENTO, COLABORAÇÃO, INICIO, NEGOCIAÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).

            O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado.

            Sr. Presidente, eu também encaminhei à Mesa um voto de pesar pelo falecimento de Olavo Setúbal.

            Confesso a V. Exª que, nestes últimos anos e com os anos que Deus nos dá, temos essa tristeza de, de tempos em tempos, lamentar tantas perdas.

            Hoje eu quero também, aqui no Senado Federal, prestar minha homenagem à memória de Olavo Setúbal e juntar às minhas saudades o testemunho do excelente homem público que foi. Juntava as qualidades de político, de empresário e também de um homem que se dedicava à administração.

           Como político, foi prefeito de São Paulo, foi Ministro das Relações Exteriores e exerceu uma atividade partidária dentro do Partido Popular, ao lado de Tancredo Neves, na fundação do partido, bastante importante.

            Mas eu quero ressaltar também a figura do administrador, do homem de empresa que ele foi, construindo um grande império econômico e ao mesmo tempo um banco exemplar, com uma tradição de tecnologia, que era fruto do pensamento de Olavo Setúbal.

            Olavo Setúbal teve como destino ser filho de Paulo Setúbal. O pai dele foi membro da Academia Brasileira de Letras, era um grande intelectual, poeta, romancista e também historiador. Publicou alguns livros que foram marcantes na sua época e que até hoje são representativos na história da literatura brasileira. Como historiador, o seu pai escreveu A Marquesa de Santos; como poeta, tem um livro chamado Alma Cabocla; e, como romancista, tem um romance bastante conhecido que se chama Os Irmãos Leme.

            E ele herdou dessa família, da família Prado, da família Setúbal o gosto pela cultura e o gosto pela inteligência. Desse modo, ele também era um pensador, Olavo Setúbal. Ele gostava de falar sobre os problemas nacionais.

            E eu quero recordar que, há alguns meses, talvez três ou quatro meses atrás, eu fui visitá-lo. Ele já estava com a saúde debilitada, mas o tempo todo que ele conversou comigo, mais de uma hora, era sobre o que ele estava pensando sobre os destinos do Brasil, qual era a vocação brasileira para o País participar da globalização e qual era o caminho, em que setor... um grande país industrial, um grande país agrícola... Então, eu ouvi Olavo Setúbal com aquele encantamento, vendo um homem da sua idade, com a saúde debilitada, mas com aquele sentimento de homem público, pensando no Brasil, nos problemas nacionais.

            Também era uma criatura, sob o ponto de vista pessoal, encantadora, um amigo afetuoso, um cidadão exemplar, um patriota. E eu tive a sorte também de tê-lo como Ministro de Estado, Ministro de Relações Exteriores quando fui Presidente da República.

            Quero recordar que Tancredo Neves, com aquele seu jeito bom e gentil, homem educado que era, podia ter convidado Olavo Setúbal diretamente - o Olavo já sabia que ia ser Ministro -, mas ele me chamou e me disse: Sarney, você me faz o favor de convidar o Olavo Setúbal para que ele seja Ministro das Relações Exteriores. Eu disse: Tancredo, por que você não o convida pessoalmente? Ele disse: não, eu queria que você transmitisse a ele o convite. Assim, eu liguei para o Olavo Setúbal, ele veio aqui, nos reunimos no gabinete do vice-presidente, que era no antigo Banco do Brasil, e transmiti a ele o convite. Coloquei-o com Tancredo no telefone, e ele então teve a conversa, que praticamente já sabia, mas foi uma gentileza que o Tancredo quis fazer. Não sabia eu que o destino ia levar-me a ser o Presidente e ele, o Ministro das Relações Exteriores.

            Quero dizer que ele foi um excelente Ministro das Relações Exteriores. Primeiro, ele marcou a sua presença, porque eu levava a idéia de que nós devíamos fazer a integração latino-americana. E, logo naqueles primeiros dias, em meio àquelas greves que o Brasil inteiro acompanhava, o Presidente que assumia e tinha aquelas dificuldades, eu disse ao Olavo: Olavo, eu tenho a idéia de nós, neste Governo, aproveitarmos para acabar com as divergências entre o Brasil e a Argentina. Era o embrião daquilo que hoje é o Mercosul.

            Eu então lhe disse: Eu queria que você marcasse com o governo argentino uma visita sua a Buenos Aires, de modo a que você pudesse transmitir a eles essa vontade, e começasse logo a trabalhar entre o Ministério das Relações Exteriores do Brasil e o Ministério das Relações Exteriores da Argentina sobre esse projeto. Não há nada que justifique essas hipotecas históricas que separam o Brasil e a Argentina. Nós devemos é fazer aquilo que Saenz Peña dizia - “tudo nos une, nada nos separa” -, crescer juntos e acabar com essa idéia, que não existia, de que quem dominasse o Prata dominava a América do Sul. Essa é uma hipoteca do passado e nós devemos acabar com ela.

            Olavo Setúbal também empolgou-se com a idéia; deslocou-se para Buenos Aires, e de lá voltou já com a estrutura dos primeiros acordos que nós devíamos fazer entre as duas Chancelarias e os dois países. Esse trabalho eu devo deixar registrado nos Anais do Senado, porque é o testemunho que trago sobre a forma como ele marcou a sua presença no Ministério das Relações Exteriores. Ele foi acompanhado do Embaixador Rubens Barbosa e, portanto, fez esse trabalho, que depois se desdobrou. Marcamos a Ata de Iguaçu e ele junto, o Olavo, trabalhou naqueles primeiros tempos.

            Depois, ele foi seduzido por aquilo por que todos nós somos seduzidos, que é a sedução da política. E, então, teve uma grande decepção, porque lhe ofereceram ser candidato a Governador de São Paulo, ele deixou o Ministério para ser candidato, e lá o seu Partido não o escolheu como candidato a Governador de São Paulo. Isso foi uma frustração para ele. E, de certo, como homem público, ele queria realizar o que tinha começado. Ele era um executivo. Tinha feito na Prefeitura também, quando Paulo Egídio o escolheu, em que, já com aquela cabeça de intelectual, disse aquela frase: “Eu estou sendo convidado para governar Suíça e Biafra” - quer dizer, duas coisas: São Paulo, que era um país rico e, ao mesmo tempo, um país tão pobre.

            Então, é esse homem que desaparece, mas desaparece deixando, como eu disse, as saudades com que ficamos e a marca do grande brasileiro que ele foi, do notável brasileiro que ele foi, um homem correto, um homem sério, um homem decente, um homem inteligente, um homem que pensava no Brasil e que morreu pensando no Brasil.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2008 - Página 35346