Discurso durante a 163ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Manifestação sobre a reação do Ministro Gilmar Mendes diante do episódio dos grampos telefônicos, e questionamento sobre a postura do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto sobre o incidente.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA PENITENCIARIA.:
  • Manifestação sobre a reação do Ministro Gilmar Mendes diante do episódio dos grampos telefônicos, e questionamento sobre a postura do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto sobre o incidente.
Aparteantes
Papaléo Paes, Sergio Guerra.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2008 - Página 36821
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA PENITENCIARIA.
Indexação
  • ELOGIO, CONDUTA, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REPUDIO, ILEGALIDADE, ESCUTA TELEFONICA, AUTORIA, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN), VITIMA, MEMBROS, LEGISLATIVO, JUDICIARIO, EXECUTIVO, COMPARAÇÃO, INSUFICIENCIA, ATUAÇÃO, PRESIDENCIA, SENADO, OMISSÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, COMENTARIO, SIMILARIDADE, OCORRENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PROVOCAÇÃO, RENUNCIA, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, CRITICA, PREVISÃO, IMPUNIDADE, RESPONSAVEL, ATO ILICITO, BRASIL.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN), POLICIA FEDERAL, INFLUENCIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), COMPARAÇÃO, COMPORTAMENTO, GOVERNO FEDERAL, GESTÃO, DITADURA, REGIME MILITAR, UTILIZAÇÃO, ESPIONAGEM, DESRESPEITO, PARIDADE, PODERES CONSTITUCIONAIS, DEMOCRACIA, DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS, EXPECTATIVA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ESCUTA TELEFONICA, SENADO, REPUDIO, ORADOR, OFENSA, DIREITOS, PRIVACIDADE.
  • COMENTARIO, LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, OCORRENCIA, ESCUTA TELEFONICA, MEMBROS, GOVERNO FEDERAL, ADVERTENCIA, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, COMPARAÇÃO, CORRUPÇÃO, MESADA, CONGRESSISTA, RISCOS, DEMOCRACIA, BRASIL.
  • ESCLARECIMENTOS, LEGISLAÇÃO, CRIAÇÃO, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN), DEFINIÇÃO, COMPETENCIA, CONGRESSO NACIONAL, FISCALIZAÇÃO, ATUAÇÃO, POSSIBILIDADE, CONGRESSISTA, COMBATE, ESPIONAGEM, NECESSIDADE, REGULAMENTAÇÃO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO MISTA, CONTROLE, SETOR, SUGESTÃO, HERACLITO FORTES, SENADOR, QUALIDADE, PRESIDENTE, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, CONVOCAÇÃO, REUNIÃO, BUSCA, EFETIVAÇÃO.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, COMPARECIMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONGRESSO NACIONAL, ESCLARECIMENTOS, ESPIONAGEM, AGENCIA BRASILEIRA DE INTELIGENCIA (ABIN), NECESSIDADE, ATUAÇÃO, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, CHEFIA, INVESTIGAÇÃO, MOTIVO, NEUTRALIDADE, NATUREZA POLITICA.
  • SAUDAÇÃO, DESEMBARGADOR, EX PRESIDENTE, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), ELOGIO, ATUAÇÃO, AUTOR, DENUNCIA, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, OCORRENCIA, ILEGALIDADE, PRESIDIO, MULHER, COBRANÇA, AUTORIDADE, SETOR, SOLUÇÃO, PROBLEMA.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi correta a reação do Presidente do Supremo Tribunal Federal nesse episódio dos grampos denunciados pela revista Veja e praticados por arapongas da Abin - Agência Brasileira de Inteligência.

            A reação foi maiúscula. E mais, deixou de ser a reação apenas do Presidente Gilmar Mendes para ser a reação de toda a Suprema Corte, de todos os Ministros, que esqueceram as divergências que porventura possa haver de um para outro, em alguns casos, para falarem em nome da Suprema Corte Brasileira.

            A reação do Congresso deixou a desejar. Houve silêncio na Câmara dos Deputados, por parte do Deputado Arlindo Chinaglia, que já tive ocasião de elogiar inúmeras vezes - mas não tenho nenhum contrato assinado como se eu fosse a Nike e ele o Ronaldinho Fenômeno, para elogiá-lo todas as vezes e, portanto, desta vez não é para elogiá-lo. E houve uma reação pífia do Presidente desta Casa, Senador Garibaldi Alves Filho, reação pífia, inclusive com essa história de trazer para o Senado a possibilidade de o grampo ter partido daqui. E mais ainda, sou informado por setores da segurança do Senado que teria dado um prazo de cinco dias para que eles elucidassem tudo, quando a lei manda 30 dias, prorrogáveis por mais 30, enfim. É muito duro imaginarmos que o Poder que mais fortemente representa a democracia não está sabendo encarná-la e não está sabendo se defender para defendê-la.

            Não é hora de prestarmos serviço ao Palácio do Planalto. É hora de dizermos com clareza que tem um monstro solto, que tem um monstro à solta, o que no começo pode ter parecido muito engraçado: segundo a revista, “relatoriozinho” para as mãos do Presidente da República. Isso é de uma gravidade enorme. Isso nos Estados Unidos daria impeachment. Relatório sobre o Senador Arthur Virgílio, sobre o Senador fulano de tal, sobre o Ministro da Suprema Corte beltrano de tal.

            Mas depois não sei qual seria a reação do próprio Presidente da República ao saber que esse monstro começou a fazer escutas ilegais também do próprio Presidente da República, ouvindo o seu secretário particular Gilberto Carvalho. Gilberto Carvalho é o Presidente, ou seja, quem ouve Gilberto Carvalho está ouvindo o Presidente; quem espiona Gilberto Carvalho está espionando o Presidente, porque o Presidente não tem celular. E, se tem celular, não interessa a ninguém o celular dele. Interessa o celular do seu secretário particular, que, quando fala, supostamente está transmitindo ordens emanadas da decisão presidencial.

            O fato é que estamos vendo uma certa deterioração, uma certa piora do funcionamento de todas as instituições. A Polícia Federal se partidarizou. Outro dia era para ter tomado uma atitude contra determinado dirigente do PT, inventaram mil desculpas, mas não fizeram.

            A Abin não poderia nunca fazer o que fez, nunca ter feito o que fez. A Abin é proibida de fazer escuta telefônica e, no entanto, o Ministro da Defesa diz hoje que a Abin comprou um aparelho guardião para fazer escuta telefônica. Isso é uma agressão ao Estado de Direito, isso é uma agressão à ordem legal, democrática, construída a tanto custo por tantos de nós neste País.

            Lamento muito a pequena mobilização do Congresso, quase como se esta Casa não estivesse disposta a se auto-defender, a se defender, a defender a si própria.

            Mas a própria imprensa se chocou, porque, entre os grampeados, estava o Presidente da Suprema Corte. Passou quase como se fosse natural grampear o senador fulano, o senador beltrano. Meu nome estava na lista dos arrolados como grampeados.

            Eu, como homem público, tenho certeza de que resisto a 200 anos de grampo. E talvez os que me grampearam não resistam a três minutos de escuta. E eu não tenho a menor vontade de escutar as conversas asquerosas que possam praticar. Não tenho a menor vontade! Agora, como cidadão, imaginar que a Abin, do Dr. Paulo Lacerda, pode ter ouvido uma conversa minha com minha família, com minha mulher, com meus filhos. É tão violento como se eu fosse ouvir uma conversa do Dr. Paulo Lacerda com sua esposa, com seus filhos. Eu não tenho a menor vontade de ouvir nada do Dr. Paulo Lacerda. Eu não quero ouvir nada; de ninguém, aliás! Eu não sou araponga, eu não sou fofoqueiro. Eu sou apenas um homem público que diz tudo o que tem de dizer abertamente, como a Casa me conhece de trás para frente e da frente para trás.

            Mas é realmente muito revoltante tudo isso que houve. E a raiz do problema está no Planalto. De perdão em perdão a mensaleiro; de desculpa em desculpa a aloprado; de aparelhamento em aparelhamento de cada repartição deste País, nós chegamos ao retorno aos tempos do Serviço Nacional de Informações, em que a ditadura tinha o direito que a força lhe dava de ouvir pessoas ilegalmente. A ditadura, ela própria, é ilegal. Ela já era a ilegalidade em si mesma.

            Muito bem, Sr. Presidente, nós estamos indo ao Ministro Gilmar Mendes agora. E vamos manter com ele um contato muito forte, muito expressivo, porque nós não podemos deixar que isso fique assim. Essas responsabilidades têm de ser apuradas até o final, doa em quem doer, custe o que custar, dê no que der e haja o que houver.

            A Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara e no Senado... Com certeza, no Senado sai! A CPI está desgastada?

            Eu não sei se os Senadores se permitiriam ficar fazendo brincadeira com a democracia, fazendo jogo de não deixar apurar, enfim. Quero manter a confiança nos meus Pares, porque, se eu perder a confiança nos meus Pares, eu vou perder a confiança nesta Casa e, perdendo a confiança nesta Casa, eu não sei o que pode restar de perspectiva de atuação política para quem leva a sério a atividade que pratica. E eu levo a sério a atividade que pratico.

            Muito bem, Sr. Presidente, o verbo “arapongar” não existe na língua portuguesa. No entanto, a chamada “arapongagem” é uma triste realidade no atual Governo. Realidade nociva, antidemocrática, totalitária, distópica. Faria inveja a George Orwell, pseudônimo do escritor Eric Arthur Blair.

            À época, 1948, veio à lume o romance em que esse indiano retrata o cotidiano numa sociedade totalitária. Com a inversão dos dois últimos algarismos do ano em que foi escrito, o livro ganhou o título de 1984.

            Nele, Orwell retrata o cenário que, em hipótese alguma, a democracia brasileira aceita, ou seja, a onipresença do Estado, com o poder absurdo de alterar a história, a língua, além de oprimir uma sociedade, travando guerra sem fim, com o propósito, também inaceitável, de oprimir e torturar o povo.

            Foi preciso que essa invasão de privacidade atingisse o Presidente de um dos Poderes da República, o Ministro Gilmar Mendes, para acordar o País. Urge uma reação, democrática, do Congresso Nacional, para banir de uma vez por todas essa prática criminosa. A palavra, sim, está com o Congresso Nacional!

            Todas as nações evoluídas acolhem os serviços de inteligência. São órgãos criados legalmente, como no Brasil, e destinados ao controle e fiscalização das atividades de inteligência. Nada de repressão. Muito menos de desprezíveis condutas aos quais se dá essa denominação que, infelizmente, agride uma ave brasileira de som estridente, por sinal em extinção.

            No Brasil, a Agência Brasileira de Inteligência foi criada em 1999. Ela é legal. Tem destinação, objetivos. Nada parecidos com a atividade dos arapongas que invadiram o gabinete do Presidente do Supremo Tribunal Federal.

            Em extinção deveriam estar, isto sim, esses execráveis arapongas contemporâneos. Eles tentam minar a Democracia brasileira, em ação sagaz, manhosa, velhaca.

            Não queremos para o Brasil o “Grande Chefe” de Orwell.

            Nem nada parecido com os propósitos assemelhados, como os descritos não só em 1984, mas também em outras obras literárias, como Fahrenheit 451, Admirável Mundo Novo, Laranja Mecânica e Nós.

            Em Literatura, prefiro, como todos os democratas brasileiros, o nosso Euclides da Cunha. Em seu livro Contrastes e Confrontos, diz ele à página 176: “O político tortuoso e solerte... que faz da política um meio (de existência) e não um fim, supre, com a esperteza criminosa, a superioridade de pensar.”

            O certo em tudo isso, como bem nota em editorial o jornal O Estado de S.Paulo, é que “a questão de fundo que desafia o Planalto não é descobrir quem fez, por que e para que as escutas ilícitas, as quais, segundo a fonte anônima que vazou uma delas - tampouco se sabe com que intenção -, teriam alcançado ainda ministros que despacham na própria sede do Governo, o Chefe de Gabinete do Presidente e um punhado de Senadores de vários partidos.”

            Mais aspas para o Estadão:

            “O delito é apenas um reflexo de algo incomparavelmente mais grave. Trata-se do descalabro em que se encontram mergulhadas as duas principais estruturas de segurança interna do País - além da Abin, o órgão de informação por excelência do titular do governo, a Polícia Federal, responsável pela repressão aos crimes contra o Estado brasileiro.”

            Ambas clamam por reformas amplas e profundas para o desmantelamento dos verdadeiros poderes paralelos nelas enquistados. Disso dependerá um combate eficaz às transgressões cometidas por seus integrantes.

            Insisto: o grampo é incompatível com a democracia que nos custou tanto implantar.

            E temos caminhos para rechaçar quaisquer grampos. Caminhos legais. O caminho está na lei. Ao ser sancionada, em 1999, a Lei nº 9.883, que criou a Abin, estabeleceu também, em seu art. 6º, que “o controle e a fiscalização externos da atividade de inteligência serão exercidos pelo Poder Legislativo, na forma a ser estabelecida em ato do Congresso Nacional.”

            No §1º desse artigo, o caminho que, a ser cumprido, garante a normalidade dessa área. Diz o § 1º:

            Integrarão o órgão de controle externo da atividade de inteligência os Líderes da Maioria e da Minoria na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, assim como os Presidentes das Comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

            Está, pois, em nossas mãos o caminho a ser seguido. O caminho que se impõe ao Congresso Nacional, como, aliás, determina a mesma lei que criou a Abin - art. 6º, §2º.

            O ato, Sr. Presidente, a que se refere o caput deste artigo definirá o funcionamento do órgão de controle e a forma de desenvolvimento dos seus trabalhos, com vistas ao controle e à fiscalização dos atos decorrentes da execução da política nacional de inteligência.

            O que está faltando, e exige poucas providências desta Casa e da Câmara dos Deputados, é apenas o cumprimento de uma expressa determinação do texto da Lei nº 9.883, ou seja, a sua regulamentação.

            Eu leio o trecho da lei: “Na forma a ser estabelecida em ato do Congresso Nacional.”

            Isso significa, em bom português, que é urgente a regulamentação da Comissão Mista de Controle de Atividade de Inteligência. A Comissão existe. Falta a regulamentação.

            Por isso me permito, como Líder, recomendar ao ilustre Senador Heráclito Fortes a convocação imediata de reunião da Comissão Mista por ele presidida para as providências necessárias à sua regulamentação.

            Nessa regulamentação, poderá ser incluída cláusula assemelhada à que existe na Lei de Responsabilidade Fiscal que prevê o comparecimento do Presidente do Banco Central à reunião conjunta de algumas comissões da Câmara e do Senado.

            No Caso da inteligência, dispositivo da regulamentação deve tornar obrigatório, em períodos a serem determinados, o comparecimento do Presidente da Abin à Comissão Mista das Atividades de Inteligência. Aqui, ele prestaria conta de seus atos e das atividades do órgão que dirige.

            Isso já não comporta delongas. Do contrário, o País continuará a assistir episódios, no mínimo, inexplicáveis, como o que está nos jornais de hoje e dos dias passados: um Ministro do Governo, o da Defesa, denuncia que a Abin comprou maleta de grampo.

            Sr. Presidente, o SNI servia à ditadura, ele visava a defender um regime que oprimia a sociedade brasileira. A Abin é um instrumento de assessoramento do Sr. Presidente da República para atuar à luz clara da democracia e não nas trevas de um regime ditatorial. Então, a Abin serve, e precisa servir - apenas para isso -, para prevenir o Sr. Presidente da República sobre um eventual lockout de empresários, que provocaria o desabastecimento da economia brasileira; para prevenir uma greve de caminhoneiros, que levaria igualmente ao desabastecimento; para prevenir uma invasão do MST, embora o Governo não precise de ninguém para avisá-lo dos passos do MST, tamanha a intimidade deste Governo com o MST.

            Serve, enfim, Sr. Presidente, para levar dados sobre, por exemplo, uma greve geral que estaria sendo armada e que poderia prejudicar o País. Mas nada além disso.

            E nós vimos que o aparelhismo, a mancebia de partidos de governo com o Estado, tudo isso está levando a uma situação inconcebível. Chegamos ao ponto em que a Abin, que não pode fazer escuta nem legal e nem ilegal, muito menos ilegal, ela fez escuta, obviamente, ilegal de diversos cidadãos brasileiros.

            E já concedo um aparte a V.Exª

            Não é possível se prosseguir nessa rota. Não é possível. Nós precisamos pôr um cobro nessa situação que é de insegurança e que mereceria uma mobilização maior do Senado. Eu percebo que a nota do Presidente foi pífia. A manifestação do Senado não tem sido forte, não tem sido à altura de uma instituição que precisa defender-se com vigor, com coragem, com generosidade, com instinto de sobrevivência, inclusive.

            Nós estamos vendo, de novo, um certo jogo de empurra, um certo jogo de responsabilidades daqui para acolá. O Presidente Garibaldi Alves, de maneira, talvez até ingênua, admitindo que pode ter havido grampo, aqui, no Senado, enfim. Mais uma vez se tira a responsabilidade do Palácio do Planalto. A vez é do Presidente. 

            Se dependesse de mim... Não quero fazer nenhum gesto espetaculoso, Sr. Presidente. Aliás, eu estou falando quase sem testemunhas, porque... Enfim, estou falando. O que eu disser é como se eu estivesse conversando aqui num confessionário: só estamos eu e um padre, porque estamos aqui V.Exª e o Senador Papaléo Paes apenas. Mas não gostaria de fazer nenhum gesto espetaculoso. Não gostaria de propor nada que fosse meramente para manchetear jornais ou o que fosse.

            Sou parlamentarista. No parlamentarismo, não haveria dúvida. O Primeiro Ministro estaria aqui amanhã para prestar contas disso. Eu não sei se não era hora de o Presidente da República vir aqui, ao plenário do Congresso Nacional, para prestar contas disso, prestar contas do grampo. O Presidente da República em pessoa para dizer o que o seu governo pretende fazer. Primeiro, para manter o compromisso com a democracia. E segundo, para punir quem quer que tenha praticado, em qualquer nível ministerial ou abaixo de ministerial, esse crime de lesa-democracia, esse crime de lesa-liberdade.

            Ouço V.Exª.

            O Sr. Papaléo Paes (PSDB - AP) - Quero, Senador Arthur Virgílio, reconhecer em V. Exª a palavra correta para falar no momento, em nome do PSDB, sobre essa questão, que é uma questão gravíssima para o País. V. Exª foi grampeado. O Presidente do Supremo foi grampeado. O Senador Tasso Jereissati e outros foram grampeados. Não é só por causa desse episódio. Esse episódio é um episódio gravíssimo, que poderia levar até ao impeachment do Presidente da República e que deveria ser tratado, com o conjunto de situações que já ocorreram no nosso País, neste Governo, pela sociedade - no caso, os representantes da sociedade - de maneira extremamente séria. Quero lamentar que esta Casa, que o Presidente da Casa, Senador Garibaldi, por quem temos grande apreço e respeito, tenha agido, como V. Exª definiu bem - ainda há pouco eu não usei essa palavra -, com ingenuidade, querendo demonstrar - vamos dizer assim - sinceridade, coerência, qualquer coisa assim. Mas ele nunca, jamais deveria fazer a opção de mandar fazer uma varredura nos telefones desta Casa - jamais! -, porque ele, com isso, conseguiu desviar a atenção do Poder Executivo, que foi o mandante, ou, se não foi o mandante, saíram do Poder Executivo os grampos nos telefones. Conseguiu hoje dar manchetes e notas, em jornais, dizendo que o Senado é o principal suspeito, que o Presidente suspeitava do próprio Senado. Enfim, desviou essa atenção. Então lamento isso e peço a V. Exª, como Líder, como um cidadão brasileiro que passou pelo regime de ditadura e que foi um lutador pela reabertura à democracia quando V. Exª, pela sua liderança, junto com outros líderes políticos experientes, tomem a iniciativa, que serão apoiados tranqüilamente por todos nós. E queríamos ver, sim, Sr. Líder Senador Arthur Virgílio, por quem tenho uma admiração muito grande pela sua inteligência e pela sua presença nesta Casa, que nós teríamos que ter, sim, o Presidente, que não é só o Presidente do Senado, é o Presidente do Congresso Nacional, reunido com todos os Parlamentares federais para que pudéssemos discutir. Primeiro, ouvir dele o posicionamento pessoal e institucional e, depois, discutirmos e chegarmos a um consenso no sentido de defendermos com muita garra esse que é o Poder Legislativo, que é um dos Três Poderes que compõem autonomamente a democracia. Muito obrigado, Senador.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Muito obrigado, Senador Papaléo Paes. Eu reclamo precisamente isso. O nosso Presidente deveria estar indignado com o que houve. Ele foi violado na sua privacidade, como eu fui violado na minha. O Ministro Gilmar Mendes estava indignado e transmitiu essa indignação para os seus Pares no Supremo Tribunal Federal, e a reação foi fulminante. Diz muito bem a jornalista Dora Kramer, que o Presidente Lula procurou agir de maneira rápida, dando uma satisfação insuficiente, mas dando a satisfação que deu com o afastamento do Sr. Paulo Lacerda - não foi demissão, pois o Governo tem muita dificuldade de demitir -, até para não ser jogado às cordas pela reação fulminante do Supremo Tribunal Federal.

            Minha vida pública está aí às ordens dos meus concidadãos todos; minha vida privada, não. A minha vida privada não pertence a quem quer que seja; pertence a mim, pertence a quem convive comigo. Então, é óbvio que eu me sinto ultrajado de saber que escutaram conversas minhas, que entraram na minha intimidade, na minha vida pessoal. Isso é realmente revoltante.

            Do ponto de vista público, espero, pelo menos, se me escutaram durante meses, que essa horda de celerados tenha, quem sabe, melhorado um pouco por ter convivido, ainda que dessa forma sorrateira, com um homem decente. Eles devem ter dito: “Puxa vida, estamos escutando esse homem há um tempão e ele não rouba, ele não faz tráfico de influência, ele não pede nada escuso a quem quer que seja, ele não pratica negociata de espécie alguma”. Tenho a esperança de ter regenerado um ou dois “arapongas” desses. Tenho muita esperança de que, por me escutar, tenham dito assim: “Puxa vida, estamos trabalhando para ladrões e agora vamos parar de roubar, porque ouvimos um homem de bem, um homem direito”. Mas invadiram a minha privacidade. Volto a dizer: minha vida particular pertence a mim e não a essa gente, como o Dr. Paulo Lacerda. Não tenho a menor vontade de saber se o Dr. Paulo Lacerda dorme de touca, se ele coloca um meião para dormir, se ele dá corda no relógio todos os dias antes de deitar, eu não tenho a menor vontade de saber se ele toma um copo de leite morno ou quente, eu não tenho a menor vontade de saber nada da intimidade dele e ele não tem o direito de saber nada da minha intimidade, nada. Ele não tem direito algum. Então, não podemos conviver com isso.

            Volto a dizer: não quero nada espetaculoso, mas o justo talvez fosse o Presidente da República vir aqui prestar satisfações ao Congresso Nacional, se fosse este um Congresso que se desse o respeito, que se sentisse atingido e afrontado como eu estou me sentindo atingido e afrontado e como deveria estar se sentindo atingida e afrontada a direção desta Casa por inteiro, a começar pelo Presidente da Câmara e pelo Presidente do Senado.

            Mas nós podemos fazer o que estiver em nosso alcance. Estou um pouco cansado dessa fórmula de uma CPI atrás da outra. Vamos fazer a CPI, não há o que discutir. Temos assinatura e nomes para isso. E o que é agora? Vem uma maioria para não deixar investigar coisa alguma? Aí, de desmoralização em desmoralização, o Congresso vai perdendo o vigor, a respeitabilidade e a credibilidade perante a Nação.

            Fico espantado, porque, se nos colocarmos na posição da opinião pública, imaginamos que ela dever estar muito frustrada de não perceber em nós, como conjunto, capacidade de indignação e de reação. Daqui a pouco ficará natural mesmo fazer “arapongagem”. Estamos vivendo um Brasil onde o crime compensa. Estamos vivendo num país onde o delito não é punido, a não ser para quem não tem mesmo como se defender usando as artimanhas e os artifícios que as brechas legais oferecem a quem é capaz de contratar bons advogados para se defender. Mas o Congresso está cada dia mais indefeso.

            Encerro, Sr. Presidente, fazendo uma referência a algo da minha terra. Algumas coisas boas acontecem. O Desembargador Arnaldo Carpinteiro Péres, ex-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado, irmão do nosso querido e saudoso Senador Jefferson Péres, foi outro dia, de maneira muito corajosa, a uma prisão feminina em Manaus e constatou e denunciou, com muita coragem, a situação de promiscuidade em que vivem aquelas mulheres, cobrando atitudes das autoridades competentes do Estado e dando exemplo que deveria ser seguido no País, porque mostrou toda a podridão que se esconde atrás do sistema legal, que pratica, dentro da sua legalidade, as piores iniqüidades com os seres humanos, não oferecendo nenhuma possibilidade de regeneração para quem cai naquelas malhas. Entra de um jeito, sai pior. Se entra pior, sai pior ainda.

            Eu gostaria, portanto, de dizer que estou encaminhando voto de aplauso ao gesto e à campanha deflagrada pelo Desembargador Arnaldo Péres, em muito boa hora, no meu Estado.

            Finalizo voltando ao “grampo”, dizendo que, ao longo de toda essa jornada do Governo do Presidente Lula da Silva, eu nunca vi nada mais grave. Isso é mais grave do que o episódio em torno do “mensalão”, é mais grave do que o episódio do tempo em que se discutia se se faria ou não se faria tentativa de impeachment do Presidente da República. Isso é mais grave do que tudo, porque desta vez está em jogo o cerne da República brasileira, está em jogo a democracia que nós construímos, está em jogo a democracia pela qual Sua Excelência tanto lutou e pela qual foi preso, por um pequeno período, por um curto período, mas pela qual o Senhor Presidente da República foi preso quando era líder operário no ABC paulista. Está em jogo o cerne da democracia, uma democracia que não respeita a Constituição, uma democracia que não respeita os direitos mínimos e básicos da pessoa humana, uma democracia que não respeita a imunidade parlamentar, uma democracia que não respeita a magnitude do cargo de Presidente do Supremo Tribunal Federal. É uma democracia que vai, aos poucos, perdendo o direito a esse nome, porque indefesa diante de um Executivo hipertrofiado, que se afoga nessas brigas de grupos, uns do Governo odiando outros do Governo e todos demonstrando pouco apego às práticas democráticas. Essa é a grande verdade! Nenhum gosta do outro, mas todos demonstram gostar muito pouco da democracia brasileira, porque usam o poder de maneira muito ávida no aparelhamento dos fundos de pensão, no aparelhamento das agências reguladoras, no aparelhamento da máquina pública brasileira como um todo. E como o uso do cachimbo vai fazendo a boca ficar torta, por que quem pratica todos esses gestos não pode fazer escuta? Por que não pegar um líder da Oposição e tentar intimidá-lo? Por que não? Por que não tentar intimidar também o Presidente do Supremo Tribunal Federal? Por que não, se tudo começa a ser possível, já que não há apreço à liberdade e não há punição para quem não tem apreço pela liberdade?

            Temos, Sr. Presidente, que marcar nossa oposição com muita clareza. Tenho muita clareza, Sr. Presidente Sérgio Guerra, do que é o papel e do que é o risco que corre este Parlamento. Tenho muita clareza e estou disposto a cumprir com o meu papel até o final, por entender que não podemos passar para a história como uma geração de medíocres que não foram capazes de fazer do Senado uma expressão efetiva da cidadania brasileira. Não podemos passar para a história com esse nível de baixa respeitabilidade. Os exemplos bons têm que vir daqui e devem vir do comportamento pessoal público, devem vir pela postura de independência diante dos Poderes.

            Eu dizia, há pouco, Sr. Senador Sérgio Guerra, meu Presidente, que não quero nenhum gesto espetacular, nenhum gesto espetaculoso, nada que vise “manchetear” jornais, não, mas eu dizia que a coisa mais justa que poderia acontecer agora era o Senhor Presidente da República, convidado por nós, em combinação com ele, comparecer a esta Casa, sentar aqui nessa cadeira, reunir Senado e Câmara para prestar contas ao Brasil desse atentado que, no seu Governo, foi praticado contra a democracia brasileira.

            Isso caberia, não seria nenhuma capitis diminutio para Sua Excelência. Não seria. Não seria nenhuma afronta ao poder dele porque o poder afrontado foi o nosso. Seria um encontro de contas entre um Presidente que tem o dever de passar o Governo com a democracia consolidada, como ele recebeu do Governo passado, que, por oito anos, fez da normalidade a sua própria norma de vida e seria um belo gesto, seria um belo momento, seria uma bela atitude, seria uma atitude correta, seria uma atitude que a Nação aplaudiria. Não seria um confronto, não, mas algo em que se respeitaria plenamente a presença do Presidente, mas seria Sua Excelência dizendo que respeita a soberania deste Poder, vindo aqui, talvez espontaneamente, para se expor diante da Nação. Não teria forma melhor de fazer isso.

            Concedo a V. Exª o aparte.

            O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - Senador Arthur Virgílio, nosso Líder, cheguei um pouco atrasado para seu discurso, mas ouvi suas últimas palavras. Desde algum tempo, tão logo esses fatos foram conhecidos, uma nota do líder Arthur Virgílio é impecável. Eu disse isso hoje em uma reunião da nossa Executiva Nacional. Ela foi uma bela síntese de todos os fatos, da gravidade dele e dos compromissos envolvidos nele.

            Essa sua idéia de agora: “Por que o Presidente não aparece? Por que o Presidente não faz como fez ontem, acha graça e se diverte, subestima? Por que o Presidente não assume o papel que o Brasil espera dele?” O Presidente não pode ficar iludido, inebriado com a popularidade conjuntural, que tem muitas origens. A primeira no fato da sua própria origem, de ele ser um trabalhador, um nordestino que virou Presidente da República e que, sendo Presidente da República, manteve a responsabilidade fiscal em grande parte, contrariou certos compromissos do seu partido, que eram, na verdade, compromissos inteiramente equivocados, tomou uma decisão, foi Presidente da República, tem acertos, tem erros no seu Governo. Vamos esquecer sua obra administrativa e econômica. Mas a obra política desse Governo é desastrosa. A obra democrática desse Governo é desastrosa. Crises que se sucedem, umas atrás das outras, todas com origem na sua base e no seu Governo. Porque não tem esse negócio de crise no Congresso que não tenha consistência no Governo. O Governo é que tem decisões, recursos, capacidade de desvirtuamento real. Desde quando se instalou o mensalão e a sua cultura, a crise começou a se desenvolver. Estive andando esses dias e encontrei um quadro deplorável no Brasil quase todo: governos de um lado, praticamente sem oposição; prefeituras de um lado, e prefeitos também, praticamente sem oposição. Aqui já não foram poucos os cooptados, foram centenas e centenas, mais de duas centenas de cooptados, e isso produz esse quadro que está aí de falta completa e total de responsabilidade, de democracia e, muitas vezes, de vergonha. Uma crise de ética profunda, um Presidente popular que tinha tudo para enfrentar essa questão, para assumir o papel e, então, virar o que muita gente esperava que ele pudesse ser: o presidente democrático do Brasil, o presidente que ajudou a transferir renda para a pobreza, o presidente que tem acertos importantes e grandes erros. Mas, nesse plano político, os erros são totais. Uma base podre, uma sustentação negativa, uma crise permanente, toda votação é uma desordem, proliferação de medidas provisórias, um governo desorientado, e, agora, dois meses atrás, a Justiça quebrada, quebrada pelo meio: o Supremo de um lado, submetido a vexame, procuradores e juízes de outro lado; Polícia Federal dividida: polícia de um lado, polícia de outro lado; versões para um lado, versões para o outro. Essa eleição que está se dando aí não resiste a dez minutos de fiscalização. É preciso andar para ver. Vá em qualquer cidade brasileira e compare o tamanho, a dimensão, a freqüência da propaganda dos candidatos do Governo e do PT, de uma maneira especial, com os candidatos de partidos que são normalmente de oposição...

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Aliás, a comparação deveria ser entre o tamanho das prestações de conta e o tamanho das campanhas nas ruas.

            O Sr. Sérgio Guerra (PSDB - PE) - ...e depois vai se confirmar sim. Quer dizer, não é preciso isso, não é possível isso. O PT tem uma força real, o Presidente tem uma grande popularidade; por que não dar realidade à democracia? Por que não a fazer funcionar? A gente está assistindo isso. Neste momento, esse negócio dos grampos é uma desmoralização. Fico muito preocupado com o Presidente do Senado. Sempre tive simpatia por ele, pessoal. Mas ele está deste tamanhozinho nesse episódio. O negócio de mandar fiscalizar a gente aqui quando essa crise não é nossa? Vamos trazer para cá uma crise que não é da gente? Está na Abin, está naquele general que chegou fazendo graça na Câmara ontem. Uma cara absolutamente irresponsável. Aquele não pode ser líder de nada, não é líder de coisa nenhuma, não honra nem as estrelas que ele tem como general, de brasileiro. E todo mundo achando graça. O Presidente pedindo ajuda: “Olha, se você pode me dizer alguma coisa, me diga”. Sinceramente, Senador Arthur Virgílio, Sr. Presidente, não estou falando como Senador do PSDB, muito menos como Presidente dele. Estou falando como brasileiro que fez opção pela vida pública e política. Não dá mais para fazer vida pública desse jeito, não dá. Ninguém sabe quem está grampeado, quem não está, quem faz o grampo, quem não faz. De repente, o País foi informado de que o Presidente do Supremo Tribunal Federal está grampeado, e não acontece nada. Afastou esses caras. Afastar não quer dizer nada. Fazem uma comissão de investigação, e daqui a três meses eles voltam de novo. A crise esfria, e eles voltam outra vez. É isso que eles fazem, e têm feito a vida toda. Remetem para o Senado, remetem não sei pra onde, e o Presidente Garibaldi fez errado, porque, na hora em que ele aceitou que essa questão fosse vista aqui dentro, ele equivocou-se; equivocou-se profundamente. Tem que ser vista onde deve ser vista: no Palácio do Planalto. Vista e resolvida no Palácio do Planalto. Por que não vem o Presidente Lula, com a autoridade que ninguém lhe nega, para sentar aqui, falar aqui e explicar isso? Discutir com o Congresso e com a democracia, que ele deveria liderar, mais do que a eleição, e dizer: “Olha, eu estou aqui com vocês, vamos enfrentar esse assunto. Vamos repor a democracia no Brasil. A ordem é mais importante do que os partidos.” Enfrentar isso de uma vez, total, completa e absoluta, para que todos recuperem a confiança e a segurança. Proposta do Senador Arthur com a inteligência, a lucidez e a verdade que ele sempre transmite. E que, infelizmente, não sei se vai ganhar dez centímetros de audiência. E, infelizmente e provavelmente, não terá a aprovação do Presidente da República. Grande idéia. Seguramente, mais uma prova de sua correta vontade política.

            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Obrigado, Senador Sérgio Guerra. A idéia que lanço à análise da Nação e à análise do Senhor Presidente da República não é, nem de leve, qualquer afronta a ele. Até porque é comum, nos Estados Unidos, o Presidente da República comparecer ao Congresso nos momentos graves da vida daquele país. Foi assim que Reagan enfrentou a gravíssima crise Irã versus Contras, e se saiu muito bem, falando para as duas Casas. E, lá, a praxe é, após a fala presidencial, fala o Líder da Maioria, fala o Líder da Minoria, e as televisões informam, de maneira bastante equânime, bastante igual, à sociedade americana. Não é nenhuma afronta, não! Aqui não tem ninguém - como o PT gostava de fazer nos seus tempos mais juvenis - para ficar gritando, com bandeirinha. Seria tratado com o maior respeito por nós, com sobriedade britânica por nós. Agora, seria justo e digno que aqui viesse.

            Eu digo a V. Exª, Senador Sérgio Guerra, algumas coisas. Primeiro, não me venha o Governo do Presidente Lula com essa história de que vai haver uma investigação interna na Abin, porque isso é ridicularizar o País. Não me venha dizer que a Polícia Federal vai fazer a investigação sozinha. Depois do episódio do dirigente petista que a Polícia Federal não conseguiu investigar, está faltando, pelo menos da parte do Departamento de Polícia Federal, a isenção necessária para tocar as investigações.

            Então, é fundamental que, havendo investigação, para que seja séria, seja entregue ao comando do Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando de Souza.

            Sobre o Presidente da República, gostaria de dizer algumas palavras, com muita sinceridade. Comparo-me com ele. Considero sinceramente, Senador Papaléo, Senador Sérgio Guerra, Senador Gilvam Borges, que o Presidente da República é melhor do que eu. Sou uma pessoa de classe média, de média para alta. Nasci assim. Estudei onde quis, nas melhores escolas do País, estudei fora quando precisei. Nunca tive problemas de sobrevivência. Saí muito na frente do Senhor Presidente da República. Mas ele foi muito além da minha perspectiva política. Revelou, portanto, mais qualidades pessoais do que as que eu possa ter, e digo isso de público; é um reconhecimento. Seria tolo da minha parte dizer o contrário. Reconheço que o Presidente da República, como político, é bem melhor do que eu, foi muito além do que eu poderia ir e do que eu jamais poderia sonhar. Como é que ele poderia imaginar desperdiçar todo esse potencial, toda essa sua história bonita de vida, deixando como saldo político a piora, a deterioração de todas as instituições brasileiras; a agressão ao Supremo Tribunal Federal; a desmoralização do Poder Legislativo; as práticas do aparelhismo no interior do Poder Executivo, em mancebia com grupelhos do Legislativo; a deterioração do conceito de um órgão que deveria servir ao Estado, e que não serve ao Estado porque está servindo a grupelhos; igualmente a Abin; a partidarização de parte da Polícia Federal? Ao final e ao cabo, o Presidente terá deixado um saldo negativo de ter ele piorado todas as instituições que encontrou sólidas, funcionando e em normalidade.

            Digo isso com pesar, porque reconheço ser ele um animal político. Fiz a comparação comigo, e não seria grosseiro fazer com qualquer um dos senhores, mas o Presidente da República é um político melhor do que qualquer um que tenha assento nesta Casa, haja vista a sua trajetória bonita, de alguém que sobreviveu à fome e se tornou Presidente da República, reeleito; alguém que, enfim, sob esse aspecto, merece todos os elogios de quem quer que o possa analisar, seja um crítico dele, como é o meu caso muitas vezes, seja qualquer adepto do seu Governo.

            Um homem como ele não poderia permitir que estivesse acontecendo, hoje, isso. Alguém que chegou ao poder porque a democracia brasileira se consolidou a ponto de permitir que um operário como ele chegasse ao poder não poderia permitir que, à sombra do seu poder, se conspirasse contra a liberdade, se conspirasse contra a democracia. Não poderia permitir isso! Não poderia achar interessante ler um relatório a meu respeito. Não poderia! Não poderia achar interessante ler um relatório a respeito de qualquer Senador. Não poderia! Não poderia achar interessante e normal que escutassem o Presidente da Suprema Corte. Não poderia! Não poderia! E agora não sei se pode evitar que continuem escutando a Ministra Dilma Rousseff, que é seu braço direito, ou que escutem a ele próprio, quando escutam o seu secretário particular, Gilberto Carvalho. Não poderia! Digo isso com pesar, porque esse contraste a mim me choca.

            Quem vê essa luta que travo aqui diariamente deve pensar que tenho uma relação de animosidade em relação ao Presidente. Não tenho nenhuma. Ao contrário, tenho uma relação pessoal de amizade com ele muito antiga, do tempo em que seus atuais bajuladores o evitavam; do tempo em que enfrentávamos juntos as baionetas da ditadura militar; do tempo em que, eu repito, bajuladores de hoje - que são bajuladores de ontem e vão ser bajuladores amanhã, porque bajulador é bajulador; essa é uma doença incurável - o evitavam. Tenho uma relação de apreço pessoal por ele e lamento que a resposta do seu Governo a essas crises seja sempre a da tergiversação; sempre a de empurrar as responsabilidades com a barriga; sempre a de empurrar para os outros aquilo que deveria ser decisão sua de debelar o mal pela raiz.

            O Presidente está com a palavra. Eu fiz aqui uma proposta muito clara: que ele demonstre boa vontade e respeito pelo povo brasileiro, vindo ao Congresso Nacional para - já não digo sequer debater conosco, pois ele seria ouvido em silêncio - ser ouvido em silêncio! E ninguém mais falaria. Só ele falaria. Só o Presidente da República falaria, e, após, nós comentaríamos de acordo com o que nos requisitasse a imprensa brasileira. Mas o ouviríamos em silêncio. E ele, aqui, diria tudo o que tivesse que dizer a esse respeito, levando em conta tudo o que já ouviu de cada um de nós, para que nós tivéssemos a certeza de que teríamos, no Palácio do Planalto, um guardião da liberdade, e não um algoz da democracia que possibilitou a sua própria ascensão política.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2008 - Página 36821