Discurso durante a 169ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Proposta de reunião de emergência da Comissão de Relações Exteriores do Senado para discutir a situação política da Bolívia.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Proposta de reunião de emergência da Comissão de Relações Exteriores do Senado para discutir a situação política da Bolívia.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Sérgio Zambiasi.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/2008 - Página 37455
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • APREENSÃO, OCORRENCIA, GUERRA CIVIL, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, ANALISE, SITUAÇÃO, FRONTEIRA, BRASIL, RISCOS, CORTE, FORNECIMENTO, GAS NATURAL, VIOLENCIA, CONCLAMAÇÃO, ATENÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, BUSCA, COLABORAÇÃO, PAZ, RESPEITO, SOBERANIA.
  • SOLICITAÇÃO, REUNIÃO, EMERGENCIA, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, CONVITE, AUTORIDADE, EXECUTIVO, DEBATE, EFEITO, POSSIBILIDADE, GUERRA CIVIL, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, PROTEÇÃO, CIDADÃO, ANALISE, RISCOS, INTERVENÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, VENEZUELA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).
  • ANALISE, POLITICA INTERNACIONAL, ALTERAÇÃO, HEGEMONIA, MUNDO, GOVERNO ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CRESCIMENTO, PODER ECONOMICO, PAIS ESTRANGEIRO, RUSSIA, CHINA, CRISE, MERCADO INTERNACIONAL, DEMONSTRAÇÃO, FALENCIA, LIBERALISMO, ECONOMIA, IMPORTANCIA, DEBATE, LEGISLATIVO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), BUSCA, PREVENÇÃO, CONFLITO, AMERICA DO SUL.
  • COBRANÇA, TRAMITAÇÃO, PROPOSIÇÃO, AUTORIA, ORADOR, IMPEDIMENTO, BRASIL, RECONHECIMENTO, PAIS, AMERICA LATINA, ORIGEM, DIVISÃO TERRITORIAL.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há algum tempo, aqui mesmo desta tribuna, chamei a atenção de que nós corríamos o risco de ter uma guerra civil na fronteira do Brasil. Creio que não seja mais uma especulação. Hoje está havendo uma guerra civil na nossa vizinha República Boliviana. Não é um País qualquer; é um País com o qual o Brasil tem quilômetros de fronteiras; é um País do qual o Brasil depende no fornecimento de combustível, especialmente de gás. E nós não estamos vendo nem esta Casa, nem o próprio Governo Federal - é possível que estejam agindo - verificando que posição nós podemos tomar para que a tragédia que já está em andamento não se acirre a tal ponto que tenhamos, nos próximos meses, além do corte no fornecimento de gás, a divisão do País boliviano em dois, o fluxo de emigrantes vindos da Bolívia para o Brasil, fugindo da violência, e o risco de assassinatos, tanto de brasileiros lá, como de bolivianos aqui. Como vamos fazer para ocupar um espaço e agir, com todo o respeito, obviamente, à soberania desse querido País vizinho, para que a tragédia seja evitada? Nós não estamos vendo isso.

            Por isso, Sr. Presidente, solicitei ao Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, Senador Heráclito Fortes, que convoque uma reunião de emergência daquela Comissão, para que nós possamos ouvir as autoridades do Poder Executivo e discutir entre nós, se é que podemos fazer alguma coisa, o que fazer para evitar a tragédia e, se não pudermos fazer nada, o que vamos levar em conta para que não soframos as conseqüências de uma guerra civil em um País vizinho.

            De onde virá o fornecimento de gás? Que faremos com os emigrantes que aqui chegarão como refugiados de uma guerra civil na fronteira? Como proteger os brasileiros que moram na Bolívia? Como proteger os bolivianos que moram no Brasil?

            O Senado não pode ficar alheio, alienado a essa realidade que está acontecendo, neste momento, no País vizinho. E isso se agrava, por um lado talvez até positivo, sob o ponto de vista da realidade internacional, pelo fato de que, aparentemente, quem lê jornal percebe que o mundo está saindo da tutela de uma potência única, como foram os Estados Unidos ao longo de 10 ou 15 anos, para uma realidade vácua de poder no mundo internacional.

            A entrada da Rússia na Geórgia e sua permanência lá, apesar de todas as falas dos governantes da Europa, as atuais - ou previstas para breve - operações das frotas da Rússia, em colaboração com a marinha venezuelana, ali nas barbas do Tio Sam, são ações que mostram que a chamada potência única do mundo não é mais potência única. A Rússia voltou ao cenário. Mas não é só isso.

            A gente observa o que acontece na China, não apenas pelo simbolismo das medalhas que, pela primeira vez, talvez, na história moderna, são em maior número para outro País que para os Estados Unidos. Esse simbolismo é importante, mas o poder demonstrado pela China na realização das últimas Olimpíadas é um detalhe.

            Quando a gente analisa que, hoje, a China tem quase meio trilhão de dólares em títulos do governo americano, títulos que se forem colocados, de uma vez, no mercado internacional levarão à quebra dos Estados Unidos, embora também com perdas substanciais da própria China, pela desvalorização do dólar; quando a gente observa que as duas grandes empresas financeiras dos Estados Unidos quebraram e, para sobreviverem, foi fundamental a colocação de US$200 bilhões do governo americano em empresas privadas, praticamente estatizando as grandes empresas do setor financeiro; quando a gente percebe que o chamado neoliberalismo de que o mercado é capaz de regular o funcionamento da economia desapareceu nesta semana, como uma espécie de outro lado da queda do muro de Berlim, porque a queda do muro de Berlim quebrou a visão do estatismo e essa intervenção norte-americana quebrou a visão do mercado como o elemento fundamental, determinante e exclusivo das relações econômicas; quando a gente observa que tudo isso está provocando um vácuo no poder internacional; quando a gente percebe que as Nações Unidas não estão em condições, hoje, de tomar posições a serem respeitadas em nenhum outro País; quando a gente percebe esse vácuo e uma guerra civil na fronteira, e toma consciência de que não vai demorar para que haja intervenção de outros Países na Bolívia, seja defendendo o poder legal, legítimo, constitucional do Presidente Evo Morales, com tropas, por exemplo, venezuelanas, seja defendendo aqueles que querem fazer a secessão na defesa de interesses locais, com apoio, por exemplo, dos Estados Unidos, hoje enfraquecidos porque estão no Iraque e porque estão quebrando a sua economia sob o ponto de vista financeiro; quando a gente imagina que ali pode acontecer o que aconteceu em outras regiões distantes do continente, é surpreendente, Senador Geraldo Mesquita, que a gente esteja calado aqui. É surpreendente que nós não estejamos tomando posição fundamental e, aqui, eu vejo pelo menos três Senadores, três Parlamentares do Mercosul: o Senador Eduardo, o Senador Geraldo e o Senador Sérgio Zambiasi. São quatro comigo.

            O que nós estamos fazendo hoje, aqui no Brasil, e levando para a próxima reunião do Mercosul, no sentido de evitar que a guerra civil que começou nas barbas do Brasil se transforme em uma grande, longa e demorada tragédia bélica, uma guerra civil que a gente não vê no continente há séculos, talvez? O que a gente vai fazer? Esperar que tudo aconteça? Se a gente não tem condições de fazer nada, é preciso dizer ao povo brasileiro: “Estamos impotentes diante dessa realidade em outro País, mas aqui estão as precauções que vamos tomar para que não falte gás nas casas de São Paulo, para que a gente saiba que o País vai continuar funcionando, apesar de que ali, pertinho, haja uma guerra civil que a gente lamenta”.

            Eu ainda acho, Senador Suplicy, que é possível o Brasil tomar alguma posição. Eu ainda acho que não é impossível agirmos para colaborar com o vizinho povo da Bolívia, do qual nós dependemos, nós dependemos - é óbvio que eles dependem mais de nós do que nós deles, provavelmente. O que nós podemos fazer?

            Aqui, está correndo, Senador, um projeto em que eu dei entrada e que eu não vejo avançar, que proíbe o Brasil, constitucionalmente, o Governo, de reconhecer qualquer novo País que surja de uma secessão em algum dos Países da América Latina.

            Esse gesto do Senado, do Congresso, já daria um freio às forças da secessão na Bolívia.

            O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Senador Cristovam.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - A certeza de que o Governo brasileiro não reconhecerá outro País ajudará a fazê-los tomar cuidado, e não é deixando ao Governo a decisão, é colocando na Constituição brasileira: “Não reconheceremos nenhum País que surja de uma secessão dentro do nosso continente”. Mas está parado esse projeto!

            Por isso, sugeri ao Senador Heráclito que convoque uma reunião de urgência, emergencial, para discutirmos na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional o que acontece, hoje, na Bolívia, o que fazer para ajudar aquele povo e o que fazer para nos protegermos caso nada possamos fazer.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Este é o meu discurso, Senador, mas, antes de terminar, eu quero passar a palavra a dois Senadores que pediram o aparte: o Senador Suplicy e o Senador Sérgio Zambiasi.

            Senador Suplicy.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Cumprimento V. Exª, Senador Cristovam Buarque, pela sugestão. Concordo com a mesma e gostaria de reforçar a sugestão de V. Exª.

(Interrupção do som.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Quem sabe o Senador Heráclito Fortes possa convocar, extraordinariamente, ainda para esta tarde, após esta sessão, a reunião proposta por V. Exª, dado a emergência do exame de ações, com o que nós, brasileiros, poderíamos contribuir para que houvesse um melhor entendimento na Bolívia e nas fronteiras da Bolívia com o Brasil e Países vizinhos, todos amigos.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senador. Falarei com o Senador Heráclito Fortes. Eu não tinha a impressão de fazer a reunião ainda hoje, mas creio que o senhor tem toda a razão, se adiantou de maneira positiva à minha preocupação. Tentarei entrar em contato com o Senador Heráclito Fortes para ver a possibilidade de nos reunirmos ainda hoje.

            Concedo o aparte ao Senador Sérgio Zambiasi.

            O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Senador Cristovam, inicialmente, meus cumprimentos por sua manifestação. É importante que o Senado, que o Congresso se manifeste a respeito dessa questão, que é altamente preocupante em nível de América do Sul. Entendo que a proposta de V. Exª, que deve ser examinada com urgência pelo Congresso brasileiro, deve ser levada ao Parlamento do Mercosul, para que ela se estenda a todos os Países do Mercosul, e que não seja apenas uma iniciativa do Brasil, mas que seja uma iniciativa mercosulina, sul-americana, reforçando a nossa solidariedade, a nossa irmandade, de maneira a garantir a integridade territorial, a integridade de cada nação sul-americana, para que não vejamos um conflito num País irmão se estender e se alastrar como um rastilho pela América do Sul. É um momento perigoso. Devemos estar atentos e alertas. Espero, Senador Cristovam Buarque, que, segunda-feira, V. Exª possa levantar essa discussão em Montevidéu, na reunião do Parlamento no Mercosul.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senador.

            Sr. Presidente, antes de encerrar, quero reafirmar o que disse, já que no início do meu pronunciamento a sessão não estava sob a Presidência de V. Exª, que o Senado não pode ficar omisso, calado, silencioso diante do que acontece hoje na Bolívia. As conseqüências podem ser muito graves, não só para aquele País, mas também para o Brasil, que depende do fornecimento de gás deles, que depende deles pela quantidade de brasileiros que ali vivem, que dependem eles pela quantidade de bolivianos que aqui estão.

            Estamos às vésperas de uma guerra civil ampliada, porque ela já começou. A minha sugestão foi que a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional convoque uma reunião de emergência; também solicito ao Presidente Garibaldi, como Presidente do Senado, que fique atento e que tente colocar o Senado agindo, para que não aconteça a tragédia, e se acontecer, que tenhamos os nossos mecanismos de defesa.

            Sr. Presidente, era isso o que eu tinha para falar.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/2008 - Página 37455