Discurso durante a 184ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica à posição inicial do Presidente Lula diante da crise econômica internacional. Comentário sobre a edição de MP conferindo poderes ao Banco Central para enfrentamento da crise.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Crítica à posição inicial do Presidente Lula diante da crise econômica internacional. Comentário sobre a edição de MP conferindo poderes ao Banco Central para enfrentamento da crise.
Aparteantes
Gilberto Goellner.
Publicação
Publicação no DSF de 08/10/2008 - Página 38931
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, DEMORA, RECONHECIMENTO, GRAVIDADE, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, ALEGAÇÕES, INFERIORIDADE, POSSIBILIDADE, COMPROMETIMENTO, ECONOMIA NACIONAL.
  • COMENTARIO, EDIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MEDIDA PROVISORIA (MPV), AMPLIAÇÃO, COMPETENCIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), LIBERAÇÃO, CREDITOS, PRODUTOR, PRODUTO EXPORTADO, LEILÃO, MOEDA ESTRANGEIRA, TRANSFERENCIA, RECURSOS, TESOURO NACIONAL, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), CONCESSÃO, EMPRESTIMO, BANCOS, TENTATIVA, REDUÇÃO, RISCOS, CRISE.
  • COMENTARIO, SIMILARIDADE, SITUAÇÃO, CRISE, PERIODO, GESTÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, VITIMA, CRITICA, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), CONTRADIÇÃO, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUALIDADE.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, ECONOMISTA, GANHADOR, PREMIO, ECONOMIA, IMPORTANCIA, AMBITO INTERNACIONAL, ADVERTENCIA, POSSIBILIDADE, CRISE, EXCESSO, EMPRESTIMO, SETOR, AGRICULTURA, BRASIL.
  • MANIFESTAÇÃO, INTERESSE, BANCADA, OPOSIÇÃO, APOIO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ATENDIMENTO, SITUAÇÃO, RELEVANCIA, URGENCIA, BUSCA, SOLUÇÃO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Governo agora recua e considera a crise grave. É claro que o Governo tardou a reconhecer a gravidade da crise econômica internacional. No início, tentou minimizá-la. O Presidente Lula procurou descolar o Brasil da crise internacional, como se isso fosse possível.

            Num primeiro momento, nos reportamos a opiniões credenciadas, como a do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, que alertava: “Não é desesperador, mas é preocupante. O Governo tem de agir rapidamente, adotando providências administrativas”. Lembrei opinião mais pessimista e radical do economista Carlos Lessa, que afirmava ser a crise de extrema profundidade, alegando que US$200 bilhões se transformariam em pó, a exemplo do que ocorrera em um passado distante no Japão.

            O ex-Presidente do Banco Central Armínio Fraga afirmava ser uma crise sistêmica; portanto, da maior gravidade.

            O Ministro Mantega, ao contrário, não cansou de alardear, para audiências qualificadas, que a crise não traria maiores conseqüências ao nosso País, não proporcionaria maiores danos ao Brasil. E foi taxativo também quando afirmou que a crise não alcançaria os pequenos bancos brasileiros. Agora, o tom do Ministro e o do próprio Governo mudam radicalmente. Afirmou o Ministro: “Trata-se da mais grave crise, desde 1929”. Até então, o Ministro vinha menosprezando a gravidade desse cenário financeiro internacional.

            Na reunião do Conselho Político, o Presidente Lula adotou outro discurso. Desde o primeiro momento, minimizava e até debochava da crise. Ele dizia, por exemplo: “Perguntem ao Bush”.

            Portanto, o Presidente Lula imaginava que o Brasil estava descolado do globo. Porque, com a globalização, não há como evitar conseqüências financeiras quando a crise abala a maior economia do mundo. O Presidente Lula agora recuou e diz: “A gravidade da crise tem de ser mostrada para a população”.

            Nós também achamos, Presidente. A Oposição também entende que o Governo tem de ser transparente num momento como esse e mostrar a gravidade da crise para a população, e não afirmar que cabe ao Bush oferecer respostas. Cabe ao Governo brasileiro, no que diz respeito ao nosso País, oferecer respostas às indagações que são resultantes da preocupação nacional. Os nossos investidores, os nossos produtores, os alicerces da economia deste País, aqueles que pagam impostos, aqueles que dependem do sistema financeiro nacional, todos estão desejosos de obter respostas a suas apreensões, que só podem ser oferecidas pelo Presidente da República e sua equipe econômica.

            O Governo editou ontem medida provisória, conferindo poderes ao Banco Central para enfrentar os efeitos da crise. Eu reconheço e creio que praticamente toda Oposição brasileira reconhece no Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, um homem lúcido do Governo Lula no que diz respeito à área econômica. Certamente, ele é o grande responsável pela manutenção dessa estabilidade econômica conquistada em governos anteriores.

            Portanto, se o Presidente confere mais poderes a Henrique Meirelles, até nos sentimos aliviados, porque, certamente, do Banco Central não teremos notícias decepcionantes sob o ponto de vista de medidas incorretas que possam ser adotadas no enfrentamento da crise. Portanto, para enfrentar os efeitos da crise, mais poderes ao Banco Central!

            As ações que não podem ser denominadas de pacote. O Governo também respondeu de certa forma com deboche a questões que foram suscitadas quando inclusive o Ministro do Planejamento dizia: “Pacote é coisa do passado. Com este Governo não há hipótese de pacote”. Mas essa medida provisória é um pacote.

            Aliás, o Ministro debochava do Governo dos Estados Unidos quando dizia: “Não. O Brasil não precisa de pacote”. Esse foi o Ministro Mantega. S. Exª afirmou: “Não. O Brasil não precisa de pacote. Quem precisa de pacotaço é o Governo dos Estados Unidos”.

            Mas essa medida provisória, Senador Demóstenes Torres, não é outra coisa. Esse é um pacote que vem apelidado de medida provisória. O Governo não admite, mas é obrigado a lançar mão do pacote.

            Não sei se é um pacotão do tamanho do pacote dos Estados Unidos. Evidentemente, não o é. Lá é um pacotaço de US$850 bilhões, inicialmente US$700 bilhões. Mas o Governo norte-americano teve que fazer concessões para que os Deputados, os Legisladores - além do Senado, a Câmara -, os Parlamentares aprovassem as medidas de salvação da economia norte-americana, iniciativa do Presidente da República.

            Eu vou conceder um aparte a V. Exª, antes, porém, dizendo que o Governo, com essa medida provisória, objetiva assegurar crédito aos exportadores brasileiros e evitar a quebra de bancos de pequeno e médio porte, que, há pelo menos dez dias, não conseguem financiar no mercado.

            Portanto, desmentem a afirmação do Ministro Guido Mantega de que os pequenos bancos não viveriam dificuldades. Eles estão vivendo neste momento sérias dificuldades. E o PT, o próprio Presidente Lula, que tanto combateu o Proer, é obrigado a lançar mão de medidas que podem ser assemelhadas àquelas medidas do Proer, para salvar os pequenos bancos brasileiros.

            Concedo a V. Exª o aparte com satisfação.

            O Sr. Gilberto Goellner (DEM - MT) - Senador Alvaro Dias, dentro dessas medidas, também está aquinhoado teoricamente o setor agrícola, o setor produtivo, que V. Exª mencionou. Porém, não é essa a realidade. Sabemos que a situação é caótica. A safra, cujo plantio se inicia agora, a safra de primavera/verão, está abalada em todos os sentidos; os créditos ainda pendentes; a necessidade de créditos complementares é muito grande, não há um dimensionamento atualizado de toda essa demanda de recursos necessários. Diria que, da forma como foi concebido, colocando os recursos em bancos oficiais que atendam aos produtores pelo CPF, por tamanho, não atendendo produtores da agricultura empresarial que fazem pela área plantada, está deixando a intranqüilidade no campo. Há uma situação em que o produtor não recebe pelos ativos, pelos produtos que tem; ele vende e não recebe; as empresas não estão aceitando comprar produtos como soja e milho. Há uma retração geral de todo o mercado. Há uma situação imediata, atual, de vencimento e renegociação de dívidas para as quais o produtor não dispõe de recursos financeiros para saldar dentro da renegociação que foi feita, de pagar 40% da parcela do investimento. Eu diria que há necessidade, sim, da suspensão desse pagamento, para irrigar o sistema e dar condições ao produtor de realizar o plantio de sua safra. Então, vejo que precisamos discutir o assunto suficientemente, porque, agora, estamos às vésperas do pagamento de dívidas, mas os produtores estão alijados do sistema financeiro e vêem com muita dificuldade a realização do plantio. Então precisamos, Senador, continuar com esse debate aqui na Casa, amanhã e nos dias seguintes, para ver se o Governo realmente dá melhores condições a que a agricultura brasileira consiga se desenvolver este ano. Obrigado.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - O Senador Gilberto é do Mato Grosso, um Estado eminentemente agrícola, e conhece muito bem essa realidade. Quando o Governo anuncia a liberação de recursos para empréstimos, muitos festejam, mas quem milita na área produtiva, no campo, sabe que, do anúncio do Governo até a boca do cofre, há uma distância enorme, a burocracia atrapalha, muitos agricultores ficam impedidos de se valerem dos créditos oferecidos pelo Governo em razão da lentidão dos procedimentos burocráticos. V. Exª tem toda razão quando alerta o Governo em relação à situação da agricultura e dos agricultores, especialmente agora diante da crise iminente.

            Sr. Presidente, peço mais um pouco de tempo para que possa dissertar sobre as medidas desse pacote que o Governo chama de medida provisória.

            O Banco Central direcionará parcela das reservas internacionais, o mercado estima em US$20 bilhões, para que os bancos possam dar crédito aos exportadores. Segundo o Presidente do Banco Central, a instituição fará leilões de dólares no exterior, que serão arrematados pelos bancos e repassados às empresas em forma de empréstimos. Os bancos, por sua vez, poderão usar uma série de títulos, inclusive de emissão do Governo brasileiro, para comprar os dólares.

            A segunda medida será a transferência de R$5 bilhões do caixa do Tesouro Nacional para o BNDES. Esse dinheiro reforçará o financiamento de pré-embarque das exportações.

            O Governo é obrigado a capitalizar o BNDES com recursos do Tesouro Nacional e não interrompe os procedimentos que nós condenamos aqui inúmeras vezes: aqueles procedimentos que levam o País a repassar para outras nações recursos que poderiam fomentar o nosso desenvolvimento aqui.

            O BNDES, ao invés de financiar estimulando o crescimento econômico do Brasil, financia lá fora e, agora, diante da crise, o Governo é obrigado a repassar mais cinco bilhões do Tesouro Nacional ao BNDES.

            As outras três ações foram tomadas via medida provisória. O Banco Central, a partir de agora, fica autorizado a conceder empréstimos em dólar a bancos brasileiros que serão lastrados em títulos em moeda estrangeira. Os recursos poderão ser usados livremente pelos bancos. A medida provisória igualmente amplia poderes para que o Banco Central possa comprar carteiras de créditos de bancos através de uma linha de redesconto. Vale ressaltar que nem mesmo as grandes instituições financeiras, inclusive o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, estão arrematando as carteiras dos pequenos bancos, em que pese a recente liberação de R$23,5 bilhões em depósitos compulsórios para lastrear tais operações.

            Portanto, a crise chega primeiro no sistema financeiro e, obviamente, não pára nele. Atingirá certamente o núcleo da economia nacional.

            Não podemos deixar de mencionar que um dos mais fervorosos críticos do Poer no Governo de Fernando Henrique Cardoso foi o então Presidente do PT, Lula. Agora o Governo lança mão das mesmas medidas para atender os pequenos bancos.

            A tradução literal das medidas está na declaração do próprio Presidente Henrique Meirelles: “O Banco Central do Brasil está seguindo os passos de outros bancos centrais, obrigados a assumir riscos para evitar o colapso do sistema financeiro mundial”.

            Há previsões e opiniões de especialistas que devem ser analisadas com total isenção.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Já estou concluindo, Sr. Presidente.

            O Prêmio Nobel de Economia, Joseph Stiglitz, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, edição desta terça-feira, faz um alerta importante. Segundo ele, “podemos ter uma bolha na agricultura brasileira”. Como destaca Stiglitz, um contingente expressivo de investidores estrangeiros colocou dinheiro nas commodities, fugindo do dólar.

            Portanto, esse é um alerta da maior importância: podemos ter uma bolha na agricultura brasileira.

            Nesse contexto, ressalta o Prêmio Nobel de Economia, a crise impacta diretamente os créditos e os investimentos. As dívidas contraídas podem gerar sérios problemas no campo, sem falar na possibilidade dos preços das commodities caírem. A bolha no Brasil pode estar no campo. Ele afirma ainda: “Ninguém está imune à crise. O Brasil por mais preparado que esteja não está imune”.

            É fato: a falta de crédito e recursos para o plantio da safra atual é preocupante. A antecipação de R$5 bilhões para o crédito rural pode ser insuficiente.

            A desaceleração do crescimento é um dado incontestável para todos os países emergentes. O Diretor-Geral do FMI, Dominique Strauss-Khan, alertou ontem que teme que as reservas acumuladas pelos bancos centrais não sejam suficientes em caso de contágio. A propósito, vale lembrar que antes do ataque especulativo ao Real no primeiro Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, chegamos a ter reservas de US$80 bilhões. Portanto, os US$ 200 bilhões atuais são relativos.

            A crise se aprofundou pela Europa. Na Alemanha, o quadro de pânico se instalou; países como Portugal, Suécia, Áustria e Dinamarca foram compelidos a anunciar garantia total dos depósitos para conter uma corrida aos bancos.

            Portanto, a crise é profunda, sim, atinge violentamente...

            O SR. PRESIDENTE (José Nery. PSOL - PA) - Senador Alvaro Dias, solicito a V. Exª que conclua o pronunciamento, tendo em vista que já prorroguei o tempo de V. Exª por oito minutos.

            Agradeço a V. Exª.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Sim, Sr. Presidente, agradecendo os oito minutos, aliás, tenho sido tão generoso que oito minutos é pouco.

            O SR. PRESIDENTE (José Nery. PSOL - PA) - Estou só retribuindo a generosidade com que V. Exª sempre me trata.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Agradeço a V. Exª.

            Essa crise é uma hecatombe no sistema financeiro internacional e não pode ser diferente no Brasil. O Governo tem que ter mão forte agora. A Oposição não se recusará a aprovar medidas emergenciais. Nós combatemos duramente medidas provisórias, mas neste caso há exceção, relevância e urgência. Portanto, neste caso, a Oposição as aceita. O Presidente da República pode contar conosco para enfrentar esta crise.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/10/2008 - Página 38931