Discurso durante a 186ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise do crescimento e desenvolvimento do País. Comemoração de duas décadas da Constituição Cidadã.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE DESENVOLVIMENTO. HOMENAGEM.:
  • Análise do crescimento e desenvolvimento do País. Comemoração de duas décadas da Constituição Cidadã.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 10/10/2008 - Página 39301
Assunto
Outros > POLITICA DE DESENVOLVIMENTO. HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, CRESCIMENTO, DESENVOLVIMENTO, BRASIL, RESULTADO, ESFORÇO, SOCIEDADE, GOVERNO, INICIATIVA PRIVADA, TRABALHADOR, EMPRESARIO, INSTITUIÇÃO PUBLICA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, PROBLEMA, DESIGUALDADE SOCIAL, CONCENTRAÇÃO DE RENDA.
  • SAUDAÇÃO, ANIVERSARIO, PROMULGAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, COMENTARIO, DADOS, MELHORIA, SITUAÇÃO, BRASIL, REGISTRO, RETROCESSÃO, CONTINUAÇÃO, EXPLORAÇÃO, TRABALHO, INFANCIA, ANALFABETISMO, CRIANÇA, ADOLESCENTE, DESEQUILIBRIO, EDUCAÇÃO BASICA, PAIS.
  • REGISTRO, CRISE, MERCADO FINANCEIRO, MUNDO, COMPROMETIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, DEFESA, NECESSIDADE, VALORIZAÇÃO, CAPACIDADE, DESENVOLVIMENTO, POPULAÇÃO, ATIVIDADE, BRASIL, RECONHECIMENTO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA.

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Alvaro Dias, Srªs e Srs. Senadores presentes, o crescimento e o desenvolvimento do Brasil, em que pese continuar encabeçando a lista de campeões de concentração de renda e desigualdade social, é uma realidade, na medida em que resulta do esforço comum da sociedade, dos governos, da iniciativa privada, dos trabalhadores, dos empresários e das instituições nacionais.

            É um processo de acúmulo de iniciativas e ações, acertos e erros verificados em um longo período de tempo e, de forma alguma, podem ser atribuídos com exclusividade àqueles que se consideram ungidos para promover ora os milagres econômicos, ora os espetáculos de crescimento.

            Em nenhum país é diferente, e nós não seríamos uma exceção. Sem dúvida, já vencemos alguns dos nossos mais persistentes desafios.

            Dormir sobre os louros de metafóricos empreendimentos, de promessas que não se materializam, de obras que nunca terminam e de quimeras, por mais bem alardeadas que sejam, pode pôr a perder, como tantas vezes ocorreu na história, as conquistas que quanto têm nos custado em vidas perdidas, em esforços baldados, em sonhos desfeitos. Foi assim no decantado “milagre econômico” de uma fase do regime militar, e não seria diferente na democracia tão duramente restaurada.

            Não podemos nos esquecer, Sr. Presidente, dos danos que a inflação, tão persistente, tão insidiosa, tão ardilosa e tão solerte, nos infligiu durante anos seguidos.

            Devemos lembrar-nos de que a estabilidade econômica, a governabilidade, a moeda, símbolo de todas as nações, a esperança e a crença de algumas gerações foram suas principais vítimas. Isso não ocorreu apenas uma vez em nossa longa evolução histórica Por isso mesmo, sempre que os ventos do ufanismo, de um lado, e as loas da louvação, de outro, se juntam para prestar homenagens, por mais justas e devidas que sejam, aos ícones do dia, temos que ter os olhos postos não só no presente, mas também no passado, útil por suas lições, e no futuro que almejamos. Os pés postos no chão da dura realidade, que tantas peças já nos pregou, são o melhor antídoto contra os arroubos da euforia.

            Devemos estar advertidos para as falácias estatísticas que mascaram nossas mazelas, para a dubiedade dos números que sempre nos deixaram seqüelas e para o entusiasmo dos crédulos que acreditam sempre mais no que ouvem do que no que vêem.

            Nossa Constituição, Sr. Presidente, acaba de completar duas décadas e estamos comemorando-a com justas homenagens. Duas décadas, porém, não são mais do que menos de um terço do que durou nossa primeira Constituição e ainda menos da metade do que sobreviveu a segunda. Sem dúvida é mais, bem mais, muito mais do que a Carta também outorgada mas totalitária do Estado Novo, que durante oito anos foi o signo de nosso martírio.

            A Constituição cidadã está em vias apenas de se igualar em duração à de 1946, que tantas esperanças despertou, tantas expectativas gerou, mas que tão cruelmente marcou nosso destino, com a ditadura que a sucedeu, pela imprevidência de uns, pela empáfia de alguns e pela omissão de muitos. Lembremo-nos, contudo, que ainda é menos do que o sacrifício de mais de duas décadas que separam a que hoje nos rege, da que tantas esperanças despertou e que tantos sonhos sepultou.

            O Brasil, Sr. Presidente, não se fez em uma ou duas décadas. Não deve seu passado, seu presente e não deverá seu futuro a esta ou àquela geração, a este ou àquele governo, nem a um, nem a nenhum dos salvadores da pátria que se arvoraram em arautos do futuro, mas inevitavelmente, como ensinam as sucessivas lições da história, terminaram se transformando em meros espantalhos do passado.

            Equilíbrio, bom senso, austeridade, humildade, serenidade e descortino, moderação e temperança devem ser requisitos essenciais e permanentes de nossa vida pública, se nossa geração quiser cumprir os deveres que tem para com as que nos antecederam e ante as que nos hão de suceder.

            Os perigos que sempre rondaram cada uma das etapas que, cruenta ou incruentamente, vencemos estão sempre presentes, como penhor de nossas vitórias, toda vez que pretendemos transformar as expectativas de nossas crenças no alento de nossas fraquezas.

            Não foram as promessas que construíram o País, que impulsionaram o progresso que conquistamos e menos ainda os sonhos que materializamos. O Senado, Sr. Presidente, algumas vezes fechado, outras vezes dissolvido e tantas vezes cassado, é testemunha, em sua mais que centenária existência, das vaidades que não sobreviveram à verdade.

            Podemos estar orgulhosos das reservas cambiais que amealhamos, mas não nos esqueçamos dos prejuízos que sofremos: R$32,6 bilhões apenas no ano passado, com a desvalorização do dólar nos últimos três anos. É uma conta, Sr. Presidente, que, como as demais, vai ser debitada a todos os brasileiros.

            Nossa dívida externa parou de crescer e continua sendo rolada, fruto dos saldos comerciais obtidos e pelos eventuais resultados em conta-corrente. Mas não esqueçamos de que, em última análise, estamos apenas trocando seis por meia dúzia. A dívida externa que antes nos inquietava foi substituída pela dívida interna, que pode causar-nos inquietação ainda maior. Em julho de 2001, ela somava R$597,280 bilhões. Dobrou em apenas cinco anos, quando chegou a R$1,319 trilhão em setembro de 2008, representando hoje mais de 50% do PIB.

            Festejamos os nossos avanços, mas não nos esqueçamos dos nossos retrocessos e menos ainda dos insucessos.

            O último e mais comemorado aumento da renda média do trabalhador brasileiro, entre 2006 e 2007, foi efetivo, de 3,2%, passando de R$932,00 para R$960,00. Mas não foi substantivo, se considerarmos que é ainda menor do que os R$1,011 mil de dez anos atrás. É o modelo que os humoristas chamam de crescimento “rabo-de-cavalo”.

            A distribuição da riqueza entre os ricos e pobres virtualmente não se alterou nos últimos três anos. A dos 10% mais ricos representava 44,6%, em 2004. Em 2007, caiu para 43,2%; diminuiu 1,4%. A dos mais pobres passou de 1% para 1,1% no mesmo período; aumentou 1%.

            Outra das muitas chagas de nossa realidade é o trabalho infantil. O programa de erradicação dessa doença endêmica e maldita caiu significativamente de 19,6%, em 1992, para 11,7%, em 2003, diminuição de 7,9%. De lá para cá, nos últimos quatro anos, baixou para 10,6%, queda de apenas 1,1%.

            O que mais ameaça jovens e adolescentes, porém, não é apenas o trabalho infantil. A alfabetização e a educação travam uma luta inglória e desigual. O número de analfabetos caiu 0,4% entre os jovens com 15 anos ou mais, entre 2006 e 2007, mas na faixa de 10 a 14 anos, aumentou 0,1%, passando de 3% para 3,1%. Juntos somam 14,1 milhões de brasileiros. Dos 2,4 milhões de crianças entre 7 e 14 anos que hoje estão na escola, nada menos de 2,1% não se alfabetizaram. Não sabem ler nem escrever.

            Podemos orgulhar-nos pelo fato de que 51,3% das residências sejam servidas por redes de esgoto. Mas, Senador Paim, como não lastimar os 48,7% que ainda não desfrutam desse benefício essencial a todos?

            Não devo estender-me em cifras e números, que é área dos especialistas. E, por ser realista, creio que nosso dever é aplaudir os acertos, apontar os excessos, criticar os erros e lastimar os insucessos.

(Interrupção do som.)

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Mas isso não me impede de lembrar que, mais que o julgamento dos ufanistas, dos entusiastas e dos insensatos, mais que o julgamento do presente, manda o bom senso aguardarmos a sentença que, inevitavelmente, há de ser prolatada pelo futuro, a que fica para a história.

            Governos são capazes de muitas proezas, mas felizmente não de todas, e menos ainda de operar milagres, como se não existisse povo trabalhando, economia produzindo, população consumindo, cientistas criando e pesquisando e, acima de tudo, a ordem democrática estabelecida.

            Vivemos um momento de complexa crise financeira da qual o Brasil não restará impune. É hora de avaliarmos se o País realmente amadureceu como precisava. É o momento de valorizarmos a capacidade de superação de todo o povo brasileiro, de todos os recantos, de todas as atividades e de todas as instituições.

            Estou concluindo, Sr. Presidente.

            Para sermos justos, convém reconhecermos que o atual estágio de desenvolvimento e crescimento, mesmo com os seus desníveis sociais e econômicos, é sobretudo fruto do esforço de cada um de nós brasileiros. A contribuição dos governos de plantão, quando positiva, é apenas uma parcela desse esforço e se verifica especialmente quando não atrapalha a sociedade na sua caminhada. Admitir que tudo é fruto da atividade de algum ungido é renunciar à percepção de que somos os agentes da nossa própria história. Aqueles que, pelo ufanismo ou pela manipulação do imaginário coletivo, tentam incutir a idéia de que há um governo como nunca antes houve no País e que ele é o único responsável pelos avanços alcançados são os mesmos que, cegos pela prática obtusa da autolatria, não conseguem enxergar o processo revolucionário da construção coletiva, Senador Paim.

            O povo brasileiro precisa reconhecer-se nos avanços ocorridos no País, alimentando a própria auto-estima, para não correr o risco de acreditar na existência de uma espécie de gente diferente de todos nós, que recebeu do além a missão de salvar o País.

            Para nossa sorte e infelizmente para alguns, Senador Alvaro Dias, a ciência ainda não conseguiu produzir essa espécie de gente geneticamente modificada.

            Se o Presidente autorizar, concedo um aparte a V. Exª, Senador Mão Santa.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Autoriza porque V. Exª está a proferir um dos mais importantes pronunciamentos na história deste Senado. V. Exª é conhecido não só no Acre, mas no Brasil todo. V. Exª encantou o Piauí, quando tive a oportunidade de levá-lo lá, como um jurista extraordinário. Um homem como Abraham Lincoln disse: “Caridade para todos; malícia para nenhum e firmeza no direito”. Você reencarna essa filosofia de Abraham Lincoln. Mas V. Exª traz ao País isso, essa realidade. O País não vai bem de jeito nenhum. Shakespeare já dizia: “To be or not to be, that is the question”. O ser, o acreditar em si, a auto-estima. E o Padre Antônio Vieira dizia: “Palavra sem exemplo é como um tiro sem bala”. O exemplo arrasta. Tem que haver exemplos de acreditar no estudo que leva à sabedoria; tem que haver exemplos de acreditar no trabalho que fez a riqueza. Rui Barbosa está ali, e este Governo que mente não aprendeu com Rui Barbosa. Não sei para que o colocaram ali. Também não há ninguém do PT aqui - só o Suplicy, mas está telefonando - para ouvir e levar à Presidência a síntese da vida de Rui Barbosa: “A primazia tem de ser dada ao trabalho e ao trabalhador. Eles vieram antes; eles fizeram a riqueza”. Este País não está ensinando ninguém a estudar! Pode acompanhar, no seu Acre, no meu Piauí, as escolas públicas, o analfabetismo, a indolência. Fugiu aquele amor ao trabalho e ao estudo. E V. Exª foi profundo quando disse... Está aí o nosso bravo Gilvam Borges, que tem acesso ao Presidente da República. V. Exª falou uma realidade, e eu quero dizer: em 1978, eu era Deputado Estadual e ouvi aquele que foi Senador, João Lobo, dizer - atentai bem! - que “a diferença entre o Norte e Nordeste e o Sul era de duas vezes. E que havia o Nordeste rico e o pobre”. Naquele tempo, o Nordeste rico era só a Bahia e Pernambuco. Eram o dobro do Piauí, do Maranhão, da Paraíba. A diferença de renda per capita era de quatro vezes; hoje é de oito. Aqui nesta ilha, neste paraíso que é Brasília, a maior renda per capita do País, é oito vezes maior do que a renda per capita do Maranhão, do Piauí e da Paraíba. Então, aqueles mecanismos sonhados por Juscelino Kubitschek, de acabar com essas desigualdades, não existem mais: a Sudene e a Sudam. Aumentou a desigualdade econômica no Brasil. Então, é isso. E, para terminar, busco Abraham Lincoln. O Presidente Luiz Inácio deveria aprender isso, aprender conosco, se não quer ler as biografias de Abraham Lincoln - eu já devo ter lido umas 50 biografias dele. Ele diz assim: “Não baseie sua prosperidade com dinheiro emprestado”. Atentai bem! Essa falácia, essa falência da economia nos Estados Unidos é porque muita gente comprou casa de US$200 mil sem ter dinheiro. Os bancos entregaram. E pagar? E aqui, Geraldo Mesquita, neste Governo: esse empréstimo consignado. Estão pagando porque já tiram do aposentado na folha, mas os velhinhos não estão podendo mais existir, estão até se suicidando pelo empréstimo irresponsável. Carros em dez anos. Atentai bem que irresponsabilidade é essa! Você comprar sem poder um carro em dez anos. Então a escravidão do negro, Abraham Lincoln acabou, a Princesa acabou. A maior escravidão da vida moderna é a dívida; estamos todos endividados; está todo mundo endividado. Essa é a realidade. E dizer que não atingiu aqui? Depois da Grande Guerra Mundial, devíamos era à Inglaterra. A Europa se arrasou e passamos a dever aos Estados Unidos, a comercializar... E eles são apenas um quarto da riqueza do mundo. Como é que não estamos sendo atingidos?

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Alvaro Dias. PSDB - PR) - Senador Mão Santa, V. Exª é o próximo orador inscrito.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Eu queria participar porque este discurso do Geraldo Mesquita vai ficar nos Anais, na história, como um dos mais brilhantes a alertar a Presidência da República para o grave momento que vivemos.

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Senador Mão Santa, agradeço, sensibilizado, suas considerações, seu aparte.

            Agradeço a condescendência do Presidente Alvaro Dias.

            Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/10/2008 - Página 39301