Discurso durante a 189ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Referência à conceituação de analistas sobre a atual crise, como a mais grave da economia capitalista mundial, especialmente no que se refere às perdas das bolsas de valores. Considerações sobre a situação do Brasil, as suas linhas e as suas possibilidades, diante da crise.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Referência à conceituação de analistas sobre a atual crise, como a mais grave da economia capitalista mundial, especialmente no que se refere às perdas das bolsas de valores. Considerações sobre a situação do Brasil, as suas linhas e as suas possibilidades, diante da crise.
Aparteantes
Adelmir Santana, Arthur Virgílio, Casildo Maldaner, Eduardo Suplicy, Mão Santa, Tasso Jereissati.
Publicação
Publicação no DSF de 15/10/2008 - Página 39551
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, PARECER, ESPECIALISTA, PREVISÃO, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, ORIGEM, MERCADO IMOBILIARIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SUPERIORIDADE, PARTICIPAÇÃO, MERCADO INTERNACIONAL, COMPARAÇÃO, HISTORIA, QUEBRA, BOLSA DE VALORES, COMENTARIO, IMPORTANCIA, SANEAMENTO, SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL, PUNIÇÃO, ENTIDADE, PROMOÇÃO, EXCESSO, ESPECULAÇÃO IMOBILIARIA, VIABILIDADE, REGULAMENTAÇÃO, SETOR, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA.
  • PREVISÃO, RENOVAÇÃO, ECONOMIA INTERNACIONAL, POSTERIORIDADE, CRISE, COMENTARIO, IMPORTANCIA, COORDENAÇÃO, PAIS INDUSTRIALIZADO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, BUSCA, ALTERNATIVA, MELHORIA, SITUAÇÃO, EXPECTATIVA, REUNIÃO, CHEFE DE ESTADO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), DIALOGO, ASSUNTO, DEFESA, ORADOR, ADOÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, GRÃ-BRETANHA, SIMILARIDADE, LEI DE FALENCIAS, BRASIL, INTERESSE, GARANTIA, MANUTENÇÃO, EMPRESA, EMPREGO.
  • ADVERTENCIA, AUSENCIA, ESTABILIDADE, BOLSA DE VALORES, FALTA, CONFIANÇA, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, IMPEDIMENTO, ACESSO, CREDITOS, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, IMPORTANCIA, INTERVENÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, DIVERSIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, ESPECIFICAÇÃO, EUROPA, TENTATIVA, GARANTIA, RECURSOS.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, PARTICIPAÇÃO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, RUSSIA, CHINA, INDIA, LIDERANÇA, BRASIL, MOTIVO, SISTEMA DE GOVERNO, DEMOCRACIA, RELEVANCIA, PRODUÇÃO AGRICOLA, PREVISÃO, PRODUÇÃO, PETROLEO, NECESSIDADE, BUSCA, ENTENDIMENTO, COMBATE, CRISE, ESPECIFICAÇÃO, RESPONSABILIDADE, CRESCIMENTO ECONOMICO, ECONOMIA INTERNACIONAL.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, CRISE, BRASIL, ELOGIO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, SUPERIORIDADE, RESERVAS CAMBIAIS, PROMOÇÃO, LIQUIDEZ, ECONOMIA NACIONAL, CONTROLE, ALTERAÇÃO, TAXAS, CAMBIO, DOLAR, INFLAÇÃO, VALORIZAÇÃO, MERCADO INTERNO, MANUTENÇÃO, EMPREGO, DIVERSIFICAÇÃO, PRODUTO EXPORTADO, IMPORTANCIA, CONFIANÇA, BANCOS, AMBITO NACIONAL, RECONHECIMENTO, AMBITO INTERNACIONAL.
  • COMENTARIO, DESVALORIZAÇÃO, REAL, REDUÇÃO, DIVIDA PUBLICA, BENEFICIO, NATUREZA FISCAL, ADVERTENCIA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, FALTA, LIQUIDEZ, ECONOMIA NACIONAL, EMPRESA, EXPORTADOR, ESPECULAÇÃO, DOLAR, SUPERIORIDADE, PREJUIZO, IMPORTANCIA, BUSCA, MELHORIA, LEGISLAÇÃO, PROTEÇÃO, EMPRESA NACIONAL, DEFESA, REFORMA TRIBUTARIA, DESNECESSIDADE, URGENCIA, INVESTIMENTO, FUNDO DE INVESTIMENTO.
  • IMPORTANCIA, REDUÇÃO, DIFERENÇA, PAIS INDUSTRIALIZADO, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, ELOGIO, CONDUTA, GOVERNO FEDERAL, RELEVANCIA, ATUAÇÃO, ANTERIORIDADE, GESTÃO, CONGRATULAÇÕES, RECONHECIMENTO, QUALIDADE, ECONOMIA NACIONAL, AMBITO INTERNACIONAL.
  • ANUNCIO, REALIZAÇÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, AUDIENCIA PUBLICA, PRESENÇA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), ESCLARECIMENTOS, ATUAÇÃO, GOVERNO, SITUAÇÃO, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a ampla maioria dos analistas já considera esta crise, que ainda está em evolução, como a mais grave crise da economia capitalista internacional desde 1929. Já há, inclusive, alguns analistas que apresentam dados que demonstram que, em alguns aspectos, esta crise já é maior que a de 29. Por exemplo, no que se refere às perdas das Bolsas de Valores, entre o melhor momento de 29 e o pior momento, nós tivemos perdas da ordem de 42%. Nesta crise, as perdas já superam 46%, quando analisamos o conjunto das bolsas na economia internacional.

No entanto, naquela ocasião, a grande crise da Bolsa de Valores deflagrou um processo de depressão econômica, de estagnação econômica, de deflação e, hoje, com toda a experiência teórica e histórica acumulada, seguramente nós temos instrumentos e capacidade de ação para não repetirmos os erros e a tragédia de 1929.

Crise, no chinês antigo, escrevia-se com dois caracteres: um significa perigo, e o outro, oportunidade. Eu diria que nada é mais apropriado para descrever esta crise: os perigos e os riscos são imensos, mas também nós termos oportunidades que vão se abrir ao longo desse processo.

Essa é uma crise sistêmica, é uma crise da economia globalizada, é uma crise que tem como estopim e epicentro a economia americana, a mais importante economia do planeta. E as crises financeiras são recorrentes, elas são da natureza da sociedade capitalista e elas têm um papel saneador. A crise pune os imprudentes, pune os que especularam sem lastro e premia os prudentes, os precavidos. Fortalecem-se os mais fortes, são eliminados os mais fracos. Portanto, as crises são da natureza do processo, e não será diferente com esta. Nações pagarão preços altos, empresas desaparecerão, bancos já desapareceram, mas aqueles que foram prudentes, aqueles que se prepararam, seguramente encontrarão grandes oportunidades que esse processo irá patrocinar.

As crises de Bolsas de Valores são mais curtas e menos profundas do que as crises imobiliárias na história econômica. As crises imobiliárias tendem a durar mais tempo e a se aprofundar. E esta crise tem um agravante, porque não é apenas imobiliária; é uma crise que esteve associada ao mecanismo dos derivativos, da alavancagem, de empresas que elevaram seu capital 60, 65 vezes.

Portanto, além da crise das hipotecas imobiliárias, temos a crise dos derivativos, que significam sombras no sistema financeiro. Não havia regulação, não havia controle, não havia supervisão, não havia transparência. É por isso que, a cada dia, a cada semana, nós verificamos que a crise veio evoluindo e apresentando contas novas, cada vez mais caras a vários países e ao sistema financeiro como um todo.

Essa crise já atingiu grandes bancos. Só nos Estados Unidos, quatro dos seis maiores bancos foram duramente atingidos. Os bancos de investimentos praticamente acabaram na economia americana. Era um setor sem nenhuma regulação, controle ou fiscalização. Na Europa, dois dos quatro maiores bancos também já foram duramente atingidos. Isso demonstra que a ausência de regulação, a ausência de mecanismos de transparência, de prudência bancária, de supervisão bancária, de regras e limites não pode continuar na economia internacional.

Se é verdade que estamos diante agora de um grande incêndio e a tarefa primeira é apagar o fogo - e nós precisamos de bombeiros para essa tarefa. No segundo momento, teremos de chamar os arquitetos e engenheiros para reconstruir o sistema. E nós teremos um novo sistema financeiro.

Aquele sistema financeiro da alavancagem sem limites, da especulação sem qualquer regra ou transparência acabou. Nós estamos vivendo o nascimento de uma nova economia, de um novo tempo, de um novo sistema financeiro e o fim de uma era.

Agora, se há esperança nesse processo, haverá dor, muita dor, porque essa crise atingirá os mais pobres e atingirá todos os países, ainda que com profundidade diferenciada.

A resposta a essa crise tem que ser, necessariamente, uma resposta global. E não há, na história do capitalismo, nenhum momento em que tivéssemos tanta coordenação de política econômica como estamos tendo nestes dias, não só a redução sistêmica organizada das taxas de juros, mas também a construção de importantes pacotes de socorro financeiro que estamos vendo nas últimas horas.

A reunião do G7, a reunião do Banco Mundial e do FMI e a reunião do G20, que foi iniciativa do Governo brasileiro - por sinal muito apropriada, porque temos que estar no fórum das grandes decisões - permitiram o início de uma coordenação macroeconômica muito importante para amenizar a evolução da crise.

Precisamos discutir que o socorro financeiro às instituições deve ter como referência o padrão que a Inglaterra lançou ao debate. Eu disse, em Portugal, na semana passada, que é muito difícil, num congresso como o congresso americano, imaginar que um parlamentar vote pelo socorro das instituições bancárias e financeiras de 700 bilhões de dólares enquanto, no mesmo dia da votação, um senhor de 90 anos dá um tiro no peito, porque a casa dele estava sendo tomada pelo banco - o banco que estava sendo socorrido com dinheiro público do imposto que ele pagou. É muito difícil. O custo dessa decisão é muito alto politicamente. Mas é muito maior o custo de não tomar essa decisão.

Agora, o modelo que a Inglaterra lança, em que os aportes de recursos significam participação de capital do Estado na empresa é muito mais adequado, porque há oportunidade de se resgatarem esses recursos no futuro, quando as economias melhorarem. É o mesmo exemplo da mudança que fizemos na Lei de Falências.

Temos que salvar as empresas, não os acionistas e os controladores. Temos que salvar os empregos, a capacidade de produção, o sistema econômico, e não aqueles que se aventuraram pela irresponsabilidade e pela imprudência.

Neste momento, há ainda uma grande aversão ao risco. A cada novo fato, o pânico toma conta, e o pânico leva à irracionalidade, perdem-se os fundamentos. A economia não tem preço e não tem capacidade de resposta.

Houve travamento completo da liquidez - a clássica armadilha da liquidez. O sistema bancário não consegue destravar seus mecanismos, há crise de confiança, há empoçamento da liquidez. Para isso, era preciso governabilidade sistêmica, e as medidas que começam a ser tomadas contribuíram decisivamente, especialmente as últimas medidas da Europa. Dezesseis dos vinte e sete países da Europa se reuniram, estabeleceram um pacote de 1,8 trilhão de euros - estamos falando em US$ 2,5 trilhões -, um socorro financeiro de grandes proporções; e é importante que se destaque: com mecanismos de garantia ao interbancário. Só na Alemanha, são 580 bilhões de euros que foram destinados para assegurar o interbancário. Quer dizer, os bancos podem emprestar a outros bancos que o Governo assegura as operações em até 580 bilhões de euros. A mesma coisa ocorreu nos pequenos países, como Portugal, onde vi que havia uma grave crise de liquidez, e receberam garantias no interbancário de até 30 bilhões de euros.

Precisamos entender que, no ano passado, 75% do crescimento da economia mundial se deu nos países emergentes, especialmente no BRIC: China, Índia, Rússia e Brasil. São esses países que têm grandes mercados de consumo de massas; que sustentaram, prioritariamente, o crescimento do ano passado, e, este ano, mais de 80% do crescimento, seguramente, virá dessas economias.

Como está o Brasil nesse cenário? Quais são nossos desafios e nossas possibilidades? O Brasil construiu importantes linhas de defesa para enfrentar essa grave crise. A primeira linha de defesa: temos reservas cambiais de mais de US$ 200 bilhões. Não sei exatamente os valores pelas últimas operações do Banco Central, mas chegamos a ter US$208 bilhões de reserva. Esse é um instrumento fundamental neste momento.

Em segundo lugar, o Brasil e o Governo vêm administrando com competência as reservas, porque ele tenta prover a liquidez do sistema, especialmente o câmbio; busca contribuir para amenizar a desvalorização da taxa de câmbio - e está conseguindo, com eficiência -, sem perder o estoque de reservas, porque não sabemos como é que vamos ver o cenário econômico evoluir.

Em terceiro lugar, nossa inflação está sob controle dentro da meta. O Brasil é o único país com regime de meta de inflação que manteve a inflação dentro da meta. Isso dá margem de liberdade e ação, porque nosso Banco Central se antecipou à crise, monitorou-a e, como o preço das commodities cedeu, a desvalorização do câmbio não tem o impacto que tinha no passado, e não é preciso aumentar a taxa de juros brutalmente, como aconteceu em outras situações.

Então, primeiro: reservas; segundo: inflação sob controle; terceiro: a situação fiscal do País.

Praticamente, não temos mais dívida indexada ao dólar. Portanto, essa forte desvalorização da moeda não implica deterioração da dívida pública. Ao contrário, como o Governo é credor líquido em dólar - tem US$208 bilhões -, a desvalorização do real trouxe um grande ganho fiscal para o Estado brasileiro, mais de R$70 bilhões. E, como o Banco Central comprou dólar barato e vendeu caro, ele está tendo ganho fiscal no fluxo. Isso também é uma liberdade que passamos a ter. A dívida pública caiu nessa crise para 38% do PIB, reduziu o estoque da dívida e melhorou o fluxo circunstancialmente. Então, temos alguma liberdade na política monetária e alguma liberdade na política fiscal, o que não tivemos em outras situações históricas.

O nível de atividade da economia brasileira é em torno de 6%. Seguramente, vai-se desacelerar nesses próximos meses, mas o País cresce prioritariamente movido pelo mercado interno. Por isso, nossa exposição às exportações é menor do que era no passado, e o mercado americano, que era 25% das exportações brasileiras há cinco anos, hoje é apenas 14%. Diminuímos nossa dependência ao mercado interno, diversificamos as exportações, e o carro-chefe da economia brasileira, do crescimento, é o mercado interno, é o consumo de massas, é o aumento do emprego, do salário, da renda e do crédito. Por isso, também é uma linha de defesa.

Então, as reservas cambiais, a inflação sob controle, a melhora nas contas públicas - inclusive na crise, porque somos credores em dólares, diminuímos o estoque da dívida para 38% do PIB -, o nível de atividade em torno de 6%, movido pelo crescimento interno, a diversificação do comércio exterior e um outro fator decisivo - e, neste ponto, eu queria apresentar alguns dados para demonstrar isto -, a solidez do sistema financeiro brasileiro.

Vivemos graves crises, impulsionadas pelo sistema financeiro brasileiro, e fomos superando-as ao longo da história. Fomos o País que conviveu com a mais longa hiperinflação da história documentada, houve fortíssimos ataques especulativos e desvalorizações num passado recente. Os bancos se fortaleceram nessas crises. Nossa estrutura do sistema financeiro é extremamente sólida. Temos, hoje, uma carteira de crédito de R$1,1 trilhão em mercado. Só que 76% desse crédito, 77% dos ativos e 89% dos depósitos à vista estão em nove bancos - apenas nove bancos. Portanto, mais de 2/3 dos depósitos das operações de crédito e 89% dos depósitos à vista estão em nove bancos.

O sistema financeiro é altamente concentrado e, por isso, sólido: três bancos estatais, três bancos nacionais privados e três bancos estrangeiros, que têm 14%. O Estado tem 34% entre esses nove bancos, que detêm 2/3 da carteira de crédito do País. Portanto, o risco sistêmico é muito baixo, e temos um sistema financeiro com baixa alavancagem, extremamente concentrado, com baixo risco sistêmico.

Outro elemento importante, Sr. Presidente, é que temos um alto nível de reservas de depósitos compulsórios. O Brasil tinha, em agosto deste ano, R$259 bilhões de depósitos compulsórios. Temos a maior alíquota de depósito compulsório da economia internacional: 50%. Cinqüenta por cento dos depósitos à vista ficam como depósito compulsório - nos Estados Unidos, apenas 10%; na União Européia, 2%; na Índia, 7,5%; no Chile, 4,6%. Ou seja, no Brasil, 50%.

Como o depósito compulsório é extremamente alto no Brasil, 50% - nos Estados Unidos, 10% -, estamos utilizando com inteligência essa condição.

O Banco Central tem dois grandes desafios neste momento. Temos duas vulnerabilidades importantes. Temos todas aquelas linhas de defesa, mas temos duas vulnerabilidades. A primeira vulnerabilidade: a liquidez do sistema. Não há mais fontes de crédito no mercado internacional como havia. Precisamos, rapidamente, prover a liquidez. O pânico, a aversão ao risco faz com que os bancos não emprestem uns aos outros.

O Governo tomou duas medidas importantes: primeiro, medida provisória, estimulando os grandes bancos a adquirirem carteira dos pequenos e dando como garantia a liberação dos depósitos compulsórios; segundo, disse que podem liberar até R$ 100 bilhões, provendo de liquidez o sistema. Isso já trouxe repercussões muito positivas para a taxa de juros, para a Bolsa de Valores, que teve a melhor reação de toda a economia internacional, o que ajudou bastante.

Mas eu queria fazer uma advertência: acho que também teríamos que assegurar garantias ao interbancário, como está fazendo a União Européia. Não há segurança total de que os pequenos bancos, as pequenas carteiras serão compradas pelos grandes bancos. Para assegurar que isso seja efetivamente feito, o Governo deveria dar um passo a mais, no meu ponto de vista, e estabelecer mecanismos de garantia no interbancário, como fez a Europa.

A segunda vulnerabilidade que temos são empresas brasileiras, especialmente exportadoras, endividadas em dólar, mas sobretudo empresas que especularam com derivativos de câmbio. Elas tentaram se proteger da apreciação do real, mas adquiriram alguns instrumentos de derivativos de altíssimo risco. Na desvalorização abrupta da moeda, ficaram muito expostas a esses mecanismos ...

(Interrupção do som.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Sr. Presidente, peço um pouco mais de tolerância para eu tentar concluir o raciocínio.

Para isso, o Banco Central vem fazendo um esforço muito grande de estabilização da taxa de câmbio.

O câmbio chegou a 2,45% no momento de pânico e está chegando hoje a um patamar de 2%, mostrando que as operações de swap cambial e as medidas que o Banco Central vem tomando de oferta de câmbio no mercado spot sem comprometer as reservas foram muito importantes para estabilizar a taxa de câmbio.

É evidente que vai haver certa desvalorização, e é positivo que isso aconteça para estimular as exportações brasileiras em um mundo onde a concorrência vai ser muito maior. Isso vai proteger o mercado das importações predatórias em que isso vai acontecer. Temos que aperfeiçoar os mecanismos de defesa comercial, mas essa evolução na taxa de câmbio, diria, que é bastante providente se estabilizarmos o câmbio e não tivermos uma desvalorização muito acentuada.

Eu queria terminar porque já falei além do meu tempo. Apesar de esse ser um debate bastante complexo, só queria chamar a atenção de V. Exªs para dois argumentos: comecei dizendo, e tantos analistas o fazem hoje, que essa crise tem as proporções da crise de 1929, mas em 1929 o Brasil teve uma saída criativa. Éramos, até então, durante mais de quatro séculos, um país primário, exportador, que vivia da exportação de matérias-primas, basicamente o café, que representava mais de 60% da nossa pauta exportadora. Vínhamos, há uma década, estocando um terço do estoque de café, e os preços desabaram no mercado mundial no período de três meses. O que o Brasil fez? Queimou os estoques de café, aumentou o gasto público para manter o setor cafeeiro, mas foi obrigado a substituir importações. Em 1934, quatro anos depois da crise, éramos um país predominantemente industrial. Substituímos importações na crise de 1929, e o Brasil saiu maior do que entrou na crise, com outro lugar.

Ali começa o grande projeto industrializante do Brasil não só a modernização do Estado, como também a CLT regulando as relações de trabalho, a criação do salário mínimo e, sobretudo, mais tarde, a Companhia Nacional de Álcalis, Volta Redonda, que hoje é a CSN, e a Vale do Rio Doce. Tudo isso nasce da mudança do padrão de desenvolvimento deflagrada pela crise de 1929.

Com a crise atual - e é importante que as pessoas se dêem conta disso -, a distância entre os países ricos e pobres diminuiu como nunca, infelizmente não pelo progresso dos países em desenvolvimento, mas pela crise profunda, estrutural e duradoura das principais economias capitalistas internacionais.

A riqueza... Só na Bolsa de Valores, US$20 trilhões viraram pó - vinte trilhões de dólares! Aquela economia da especulação desenfreada, dos papéis atrás de papéis, sem regulação, sem controle, sem transparência, sem fiscalização, acabou. Estamos iniciando um novo mundo, um mundo em que vai nascer um novo sistema financeiro, um mundo em que os países em desenvolvimento terão um papel decisivo. E todos os analistas hoje olham para a China, Rússia, Índia e Brasil com essa perspectiva histórica.

Termino apenas dizendo o seguinte: hoje a China é inegavelmente a grande locomotiva da economia mundial, mas é uma ditadura. A Índia é extremamente importante, porque tem um mercado de um bilhão de pessoas, mas é uma sociedade de castas. A Rússia é extremamente importante pelas grandes reservas de gás, mas é uma burocracia autoritária. O Brasil é um país que tem o Estado de Direito Democrático, a separação dos Poderes, a democracia consolidada. Somos o país que, nos últimos cinco anos, mais aumentou a produção e a exportação de alimentos na economia mundial. Somos um país que tem as matérias-primas decisivas para esse novo ciclo da economia mundial. E somos um país que vai se transformar em uma grande potência exportadora de petróleo, com as reservas do pré-sal.

Portanto, nunca na História recente nós enfrentamos uma crise desse tamanho, mas também nós nunca tivemos linhas de defesa tão sólidas para enfrentar a crise e uma perspectiva tão favorável para superar os desafios que aí estão.

Termino como comecei: acho que é um tempo da História de dor e de esperança; é um tempo da História de perigo e de oportunidades. Tenho absoluta convicção de que nós saberemos construir com maturidade as respostas deste momento. É um momento em que o Governo precisa ter diálogo com a Oposição. Precisamos ter uma atitude construtiva para a solução dos nossos problemas, temos de preparar o Brasil para enfrentar esses desafios com sugestões criativas, com inovações, com as experiências que nós acumulamos no passado e preparar o Brasil para que ele saia na frente no momento que se aproxima, porque os ciclos são da natureza da sociedade capitalista, e os mais providentes, os mais precavidos e os mais criativos sempre aproveitam melhor as oportunidades da História.

Senador Mão Santa, ouço V. Exª.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mercadante, nós sempre aprendemos muito com V. Exª, mas eu queria fazer uma interrogação. V. Exª é economista; eu, cirurgião, mas estou há seis anos como seu aluno na CAE. Eu queria fazer-lhe uma pergunta. O cirurgião tem uma percepção muito exata. O importante não é onde operar, nem como operar; é quando, quando operar. Acho que o fundo soberano...

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Eu pediria a V. Exª que não demorasse, Senador.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - O fundo soberano, que está aí, é uma medida proposta pelo Governo antes da crise. Foi um sonho anterior. Acho que devemos dar marcha a ré e centralizar nossa atenção sobre essas medidas. V. Exª está trazendo com muito clarividência o problema que enfrentamos.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Mão Santa, nós marcamos uma audiência na CAE à qual vão comparecer o Presidente do Banco Central e o Ministro da Fazenda. Eu conversei com o Ministro Henrique Meirelles, Presidente do Banco Central do Brasil, que estará quinta-feira, depois de amanhã, às 10h da manhã, na Comissão de Assuntos Econômicos, para fazermos uma audiência pública sobre a crise, termos informações mais detalhadas sobre a evolução do cenário, bem como sobre as providências que estão sendo tomadas e ouvirmos a satisfação que as autoridades devem ao Congresso Nacional. Essa é uma oportunidade de nós interagirmos com as autoridades econômicas nessa perspectiva.

Eu concordo que a evolução da crise coloca uma nova agenda tal como a reforma tributária e o debate de mudanças microeconômicas que nós podemos fazer. O Fundo Soberano na Noruega foi construído seis anos antes de ser utilizado. Então, nós temos tempo para amadurecer esse tema. Acho que nós poderemos, com tranqüilidade, discuti-lo para construir a moldura institucional, mas a aprovação dele não é urgente; é necessário, mas não é urgente. Concordo integralmente com V. Exª.

Ouço o Senador Suplicy.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Eu pediria que fosse bem rápido, porque o tempo do orador já se esgotou.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Antes de fazer o aparte, eu queria usar da palavra pela ordem. Na semana passada...

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Há orador na tribuna. Depois, V. Exª...

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Sim, mas é sobre o tempo do orador. Na semana passada, o Senador Tasso Jereissati, Presidente do PSDB, fez um pronunciamento sobre a crise econômica. Foi dito, então, pelo Senador que presidia a sessão que se todos estivessem de acordo poderia ser dado um tempo maior ao orador. Eu próprio, como Líder da Base de Governo, avaliei que seria oportuno e próprio termos um espaço maior. Então, quem sabe, V. Exª possa, sem prejuízo para os demais oradores, também dar igual tempo à Oposição, a um dos líderes que aqui se inscreve para falar, a fim de que possamos, pelo menos, ter a oportunidade de apartear o Senador Aloizio Mercadante, para que então possamos ter um prolongamento do debate...

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Senador Suplicy.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - V. Exª...

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - ...de maneira semelhante ao que aconteceu na semana passada.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - O senhor permite uma explicação?

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Pois não.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Sr. Presidente, antes que V. Exª possa responder ao Senador Suplicy, eu gostaria de dizer que S. Exª obra bem. Eu, aliás, estaria mesmo reivindicando tempo semelhante para pronunciamento que farei após o Senador Suplicy. Estou plenamente de acordo, que fale o tempo inteiro.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Senador, desde que cheguei a esta Presidência eu jamais cortei a palavra de um orador. Concedo-lhe o tempo que for necessário.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - É um prazer ouvir o Senador Mercadante e imagino que S. Exª toleraria o desprazer de me ouvir a seguir.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Se V. Exª analisar, ele disse que estava encerrando o discurso quando pediram os apartes.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Sem dúvida, mas concordo que fale o tempo necessário, assim como eu gostaria de falar o tempo necessário para expender os meus pontos de vista.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Eu quero ouvir também.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Aqui da Mesa nós temos o privilégio de ver a reação dos Senadores durante um debate, durante uma discussão. Então, eu também quero ouvir. Eu tenho dificuldade em interromper um assunto tão importante como esse que o Senador Mercadante traz à tribuna. Na Comissão de Assuntos Econômicos ficou combinado, com todos os presentes, que ele daria continuidade ao assunto aqui. Eu jamais vou... Sei que tem aqui, por exemplo, o Senador Jayme Campos...

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - V. Exª preside com magnanimidade e com equilíbrio a Casa. Obrigado, Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Eu não terei nenhuma dúvida, Senador Suplicy, só que tem de combinar com o Presidente e fazer.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Então, vamos ser bem objetivos.

Senador Suplicy.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - O aparte a V. Exª.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Aloizio Mercadante, o economista Paul Krugman, ontem laureado com o Prêmio Nobel de Economia, ao longo desses últimos anos do Governo George Walker Bush, vinha chamando atenção para o fato de que a política de procurar desenvolver a economia norte-americana, sobretudo através de benefícios àqueles que já detêm grande riqueza, iria, muito provavelmente, levar a economia a uma situação de dificuldade crescente. Ele também chamou a atenção para como isso poderia ter sido agravado em função da Guerra do Iraque; ele procurou advertir. Trata-se, portanto, de um dos maiores críticos da política do Governo George Walker Bush. A análise que ele fez certamente contribui muito para podermos fazer um diagnóstico melhor. Mas eu quero cumprimentar V. Exª pela análise que aqui faz, sobretudo, porque mostra como o Governo do Presidente Lula vem tomando as medidas necessárias para enfrentar a crise, que V. Exª diagnosticou como muito mais de liquidez. Já se nota que hoje, ontem e na sexta-feira, começou a haver uma recuperação dos valores, por exemplo, na Bolsa de Valores e uma perspectiva de maior otimismo por parte de todos aqueles que acompanham e percebem que a situação brasileira está longe de ser grave e que nós poderemos sobrepujar essas condições de dificuldades. E é importante que possam as autoridades, como o Ministro Guido Mantega e o Ministro Henrique Meirelles, por exemplo, presidirem o G-20. Agora mesmo, o Presidente Lula, ali com os Chefes de Estado da Índia, da Rússia, da África do Sul, se reúnem para ver como é que os países em desenvolvimento podem também tomar as medidas necessárias para enfrentar esta crise de natureza internacional. Assim, cumprimento V. Exª por seu pronunciamento.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador Suplicy. Concordo integralmente. Eu acho que o Prêmio Nobel foi muito merecido a Paul Krugman, que foi um dos pensadores críticos a essa idéia de desregulação, falta de supervisão, falta de mecanismo de controle do sistema financeiro internacional. E ele vinha fazendo advertência da bolha imobiliária já há algum tempo.

A dívida pública, ao longo dessa crise americana, já passou, de US$9 trilhões para US$10.200 trilhões. A dívida pública americana já é 74% do PIB americano e se deteriorou bastante a situação fiscal daquele país, ao contrário da nossa, porque não tínhamos, praticamente, dívida indexada ao dólar. O Banco Central é credor em dólar e teve um ganho tanto no estoque da dívida quanto no fluxo, e a dívida pública cai para 38% do PIB e dá alguma margem de manobra, porque nós vamos ter uma perspectiva de queda de receita tributária, de austeridade fiscal, mas melhor perfil da dívida pública.

Senador Adelmir Santana.

O Sr. Adelmir Santana (DEM - DF) - Senador Aloizio Mercadante, ouvi atentamente V. Exª fazendo referência aos instrumentos de defesa do País com relação à crise. E me chamou a atenção - e gostaria de ressaltar - a questão dos depósitos compulsórios. V. Exª fez uma relação entre o Brasil, os Estados Unidos e outros países, mostrando claramente o volume de recursos que está dentro do sistema bancário. Aqueles nove bancos a que V. Exª fez referência...

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Os nove bancos têm 89% dos depósitos à vista.

O Sr. Adelmir Santana (DEM - DF) - Exatamente. Eu queria chamar a atenção, Senador Mercadante, para o fato de que está na hora de se pensar na devolução desses depósitos compulsórios, como vem sendo feito, mas também de pensarmos no setor produtivo, especialmente nas micro e pequenas empresas. Sabemos que essa crise hoje, no Brasil, atinge diretamente a questão creditícia. É importante que busquemos que esses recursos, ao retornarem ao sistema bancário, efetivamente cheguem na ponta, não apenas aos consumidores individuais, aos exportadores, mas também às micro e pequenas empresas e, portanto, a todo o setor produtivo, para que efetivamente se traduza esta crise em uma oportunidade para os pequenos negócios no País.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - V. Exª tem toda razão, mas o primeiro desafio é o seguinte: como temos um sistema financeiro extremamente concentrado - como eu disse, com dois terços da carteira de crédito e 89% dos depósitos à vista estão nas mãos de nove bancos -, o primeiro momento é de destravar o interbancário. A Europa, por exemplo, como eu disse, deu garantias ao interbancário. Nós estamos reduzindo o deposito compulsório, porque há um estoque de R$259 bilhões. É a mais alta alíquota de toda a economia internacional: o nosso é 50%, nos Estados Unidos, é de 10%; na União Européia, é de 2%, para termos exemplos. Então, essa é uma massa de recursos que está indo, em um primeiro momento, para prover a liquidez ao sistema.

Acho que será necessário, no caso do Brasil, dar garantia ao interbancário, como fez a União Européia. Eu dei os dados. Só na Alemanha, são €568 bilhões de provimento no interbancário; Portugal, mais €30 bilhões. Quer dizer, todos os países europeus tiveram garantias no interbancário.

Agora, o segundo momento é exatamente negociar com esses bancos linhas de crédito, para que os recursos cheguem na ponta, especialmente ao setor produtivo - agricultura, micros e pequenas empresas, a indústria - para, assim, mantermos o nível de atividade e podermos amenizar o impacto da crise na economia brasileira.

Assim, nós encerramos, dessa forma, a nossa intervenção. Agradeço a participação...

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Senador Mercadante.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Pois, não.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Senador Mercadante, serei bem rápido. Eu estou atentamente ouvindo o discurso de V. Exª. Uma preocupação me surge às vezes em relação ao fato de que as pessoas correm para aplicar; vão aqui, vão ali, que nem manada, por assim dizer. Eu acho que é o momento de se analisar como se poderia controlar, por meio talvez dos bancos centrais mundo afora, e encontrar mecanismos de aferir quando há uma corrida para aplicar nisso ou naquilo; em certas commodities, por exemplo. Aí eu diria que há uma inflação extraordinária de valores reais. Muitas vezes até motivada pelo marketing que existe, a pessoa vai e depois vão duas, vão em manada, aplicando, corre todo mundo e não se sabe ou não há limite para aplicação. Isso, quando se vê, cria uma bolha inflacionária, que, quando estoura, dá um prejuízo enorme, para os fundos de previdência ou mesmo para as pessoas físicas, que correm com a propaganda, com o marketing, com indução, no caso de algumas commodities. Então, tem que haver, creio, algum mecanismo de alerta, que diga: “Vamos parar, porque isso aqui já não tem mais garantias, não é recomendável”. É o momento de se pensar e encontrar caminhos para orientar as pessoas físicas, os menos abastados, as pessoas em geral. Nós tivemos, aqui no Brasil, muitas vezes, até a aplicação de recursos do próprio Fundo de Garantia. Ou pessoas, por indução, buscam as bolsas. Mas eu acho que nós tínhamos que criar mecanismos para aferir, para ver se não vai haver...

(Interrupção do som.)

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - (...) Senador Mercadante, grandes prejuízos à coletividade.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Nós tínhamos no sistema bancário as cláusulas de Basiléia que estabelecem limites. Agora, os bancos de investimentos não tinham essas exigências e o mercado de derivativos não tinha esses limites. E isso foi o principal fator de vulnerabilidade da crise internacional.

Felizmente, o Brasil não está exposto diretamente à crise do subprime; mas, como eu disse, os pequenos bancos têm problema de liquidez. Busca-se solucionar com essas medidas - medidas provisórias, redução do compulsório -, dando mais liquidez ao sistema, estimulando a compra dessas carteiras. E, temos, de outra parte, as empresas exportadoras expostas a derivativos. Por isso, a estabilização do câmbio é fundamental para amenizar essas duas vulnerabilidades. São as duas diretrizes fundamentais do Banco Central neste momento.

Senador Tasso Jereissati, ouço V. Exª.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Senador Mercadante, infelizmente, eu não estive aqui desde o início do seu pronunciamento.

(Interrupção do som.)

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Na semana passada, eu tive a oportunidade de falar um pouco sobre o tema, preocupado que eu estava com a atitude do Presidente da República, principalmente em relação à crise. Até a semana passada, o Presidente da República dizia que o Brasil não tinha nada a ver com a crise, levando, de certa maneira, na brincadeira, no deboche, com algumas piadas, dizendo “é marola, é problema do Bush, o Bush que se cuide etc, etc”. Preocupou-me profundamente a postura do Governo diante de uma crise que já havia chegado fortemente ao Brasil e cuja gravidade, ao que parecia, o Governo não estava percebendo. Graças a Deus, o Governo agora mudou a atitude. Agora está enfrentando e reconhecendo a gravidade da crise. No entanto, gostaria, para fazer justiça - e até porque, hoje, se vive um momento em que se vai recorrer a mecanismos semelhantes -, de dizer que o sistema financeiro brasileiro é um dos mais sólidos e um dos mais bem regulamentados. Não existe nenhum organismo financeiro que atue no mercado que não seja regulamentado, seguido por um sistema montado durante o Governo Fernando Henrique principalmente. Ainda mais: toda a limpeza e reforma feita no sistema financeiro brasileiro se deu graças ao tão famoso e atacado Proer, que, hoje, é praticamente um exemplo de como se faz a reformulação do sistema financeiro no mundo inteiro. E, de uma maneira ou de outra, evidentemente com características diferentes, eu chamo agora, aqui, para alegria do Senador João Pedro, que estava aqui naquele dia, do Proer do Lula, que está sendo feito e que vai vir ao Congresso na forma de medida provisória. Então, é fundamental reconhecer hoje a importância do Proer, a importância da intervenção do Estado quando existem riscos sistêmicos. Contudo, ainda me preocupa um fator: a economia real. Ainda não dá para sentir com toda a profundidade as conseqüências na economia real, e não vejo preocupação nem do Governo, nem desta Casa em relação à questão de gastos, porque nós devemos ter - tudo indica que devemos ter, não dá para prever ainda - uma forte desaceleração da economia mundial e no Brasil também.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Tasso Jereissati, primeiro destaquei muito isso na minha intervenção: o sistema brasileiro é muito sólido. Primeiro porque ele se concentrou muito ao longo dos últimos anos. Quer dizer, como nós vivemos a mais longa hiperinflação da história, o processo de estabilização e as vulnerabilidades, as instabilidades que a economia brasileira atravessou nas últimas décadas levou a uma situação em que hoje 89% dos depósitos à vista e dois terços da carteira de créditos e dos ativos - 76% do crédito, 77% dos ativos - estão em nove instituições financeiras. As três públicas representam 34%; as três internacionais, bancos estrangeiros, 14%; e, depois, temos três nacionais importantes aí nesse processo. E, como o sistema bancário brasileiro é pouco alavancado, o risco sistêmico é muito baixo. Eu identifico neste momento que algumas pequenas instituições bancárias estão com problema de liquidez. A liberação do depósito compulsório, que é muito alta no Brasil, como eu disse - R$259 bilhões -, ajudou a melhorar a liquidez do sistema, mas acho que o País vai ter que discutir garantias no interbancário exatamente para reverter isso o mais rapidamente possível.

O primeiro momento de enfrentamento da crise é estabilizar o sistema financeiro...

(Interrupção do som.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Não será uma tarefa muito difícil no Brasil porque o sistema é muito sólido, está muito sólido, muito capitalizado, com baixa alavancagem. São pequenos ajustes, mas que precisam ser feitos. E acho que houve, sim, um trabalho muito importante de regulação do sistema financeiro brasileiro. Nós somos muito mais regulados, controlados e supervisionados, exatamente pela nossa história de crise bancária, do que outros países, que embarcaram na tese da desregulamentação total, como os bancos de investimentos americanos. Nós estamos vivendo um momento em que bancos com mais de cem anos como de J.P. Morgan, o Goldman Sachs Bank e o Lehman Brothers Bank não existem mais. É uma moratória de US$613 bilhões. É uma moratória dez vezes maior que a Argentina, e eram exatamente os bancos que ditavam regras, na época da crise, sobre o que deveríamos fazer para ajustarmos a economia. Agora, eram bancos que não tinham nenhum controle ou regulação. Os que sobreviverem terão que se transformar em bancos comerciais e se adaptar à Basiléia.

Onde está a sombra do sistema financeiro no planeta e aqui também? Nos derivativos. Nós tivemos a alavancagem de mais de 65 vezes, e esses mecanismos, que não estão sob a supervisão bancária, terão de passar a estar. Inclusive, no Brasil, não estão - nem na CVM, nem no Banco Central. É por isso que algumas empresas exportadoras se aventuraram... Não era um hedge; era uma operação de derivativo especulativo para tentar se defender da apreciação do real. Mas, quando há desvalorização abrupta, essas empresas ficam muito expostas. Por isso, o controle da taxa de câmbio.

Mas eu, verdadeiramente, Senador Tasso Jereissati, acho que, neste momento da história, nós precisamos fazer o debate que nós estamos fazendo, com essa qualidade, neste Plenário: debater com profundidade, buscar as alternativas, reconhecer o que foi feito de positivo no Brasil, no passado - e muita coisa foi feita; do que está sendo feito nesta crise, com muita competência. Vejam hoje que as principais autoridades financeiras internacionais estão destacando o Brasil como exemplo, o Brasil como referência, o Brasil como tendo os fundamentos macroeconômicos sólidos, o Brasil como tendo um sistema financeiro sólido, o Brasil como potencial de futuro. Isso seguramente é uma obra deste Governo, mas é uma obra do Governo anterior, é uma obra da democracia brasileira.

Os chamados BRICs são, hoje, a grande esperança da economia mundial e serão a grande locomotiva da economia mundial. O Brasil, entre os BRICs, é o único país verdadeiramente democrático, plural, com liberdade, com separação dos poderes, com transparência total das instituições. É exatamente a virtude da democracia que vai nos ajudar a dar a melhor resposta à crise. O que vale, neste momento, é proposta, é solução, é sugestão para que saiamos fortalecidos, com criatividade, desses imensos desafios.

Muito obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância e peço desculpas aos meus Pares.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/10/2008 - Página 39551