Discurso durante a 191ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com o reduzido número de registro de arma de fogo no País, seu uso indiscriminado, e considerações sobre o Estatuto do Desarmamento.

Autor
César Borges (PR - Partido Liberal/BA)
Nome completo: César Augusto Rabello Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Preocupação com o reduzido número de registro de arma de fogo no País, seu uso indiscriminado, e considerações sobre o Estatuto do Desarmamento.
Aparteantes
Sérgio Zambiasi.
Publicação
Publicação no DSF de 16/10/2008 - Página 39824
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), INSUCESSO, CAMPANHA, GOVERNO FEDERAL, REGISTRO, ARMA DE FOGO, RECADASTRAMENTO, APRESENTAÇÃO, DADOS, RESULTADO, GASTOS PUBLICOS, PUBLICIDADE.
  • CRITICA, EXECUTIVO, AUSENCIA, APLICAÇÃO, ESTATUTO, DESARMAMENTO, NEGLIGENCIA, PUNIÇÃO, ILEGALIDADE, PORTE DE ARMA, FAVORECIMENTO, CRIMINOSO, AUMENTO, VIOLENCIA, MORTE, PROTESTO, FALTA, CONTROLE, COMERCIO, ARMA, DEFESA, AMPLIAÇÃO, CAMPANHA, RECOLHIMENTO, ESPECIFICAÇÃO, JUVENTUDE, IMPORTANCIA, COMBATE, CONTRABANDO, FISCALIZAÇÃO, PRODUÇÃO, ESTOQUE, DESTRUIÇÃO, EXCEDENTE.
  • QUESTIONAMENTO, AUMENTO, ARMAMENTO, AGENTE, INSTITUIÇÃO PUBLICA, CONCLAMAÇÃO, RESPEITO, APLICAÇÃO, ESTATUTO, DESARMAMENTO.

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Srªs Senadoras, Srs. Senadores, venho a esta tribuna manifestar a minha preocupação, Sr. Presidente, com o reduzido número de registro de arma de fogo no País.

O jornal Folha de S.Paulo de ontem traz matéria que atesta que, um mês depois de o Ministério da Justiça lançar campanha publicitária de R$6 milhões para estimular o registro de arma de fogo, a Polícia Federal contabilizou o registro de apenas 5.602 armas e o recadastramento de outras 12.706. Muito pouco, Sr. Presidente.

Aqui está o ex-Presidente desta Casa Renan Calheiros, que foi um dos idealizadores do chamado Estatuto do Desarmamento, que, lamentavelmente, na prática, na sua aplicação, não tem alcançado aquilo que se imaginava, porque tem que haver vontade política, recursos para aplicação.

Nós fizemos a nossa parte, o Legislativo, mas quem faz a aplicação da lei é o Executivo, é o Judiciário.

O problema, Sr. Presidente, é que o prazo para registro de arma na Polícia Federal já se esgotou por duas vezes desde a sanção do Estatuto do Desarmamento em 2003, e atualmente esse registro deve ser efetuado até o dia 1º de janeiro de 2009. Ou seja, leniência e morosidade para efetivar as punições que estão previstas no Estatuto do Desarmamento no tocante ao porte de armas ilegais: criminalização do porte e detenção de um a três anos, além da multa.

Veja bem, Sr. Presidente, é a arma ilegal. Ninguém está falando daquela arma que está registrada, que está legalizada. Não é nem o desarmamento do cidadão; é a arma ilegal. E a arma ilegal está, na sua grande maioria, na mão dos criminosos. E a violência em todo o País, lamentavelmente, só tem feito aumentar nos últimos anos, em especial, nos grandes centros urbanos.

Sr. Presidente, as conseqüências para a população são extremamente nefastas. Todos os dias, cem brasileiros perdem a vida por causa de uma arma de fogo. São 19 mortes por ano, para cada grupo de 100 mil habitantes. No Brasil, as armas de fogo matam mais do que doenças respiratórias, cardiovasculares, câncer, Aids e acidentes de trânsito.

O elevado número de armas em circulação, somado ao pouco controle sobre quem vende, quem compra, e como elas são utilizadas, e a uma cultura que valoriza a arma como instrumento de poder e defesa, contribui, lamentavelmente, para essa tragédia cotidiana. Segundo pesquisa da ONG Viva Rio, existem cerca de 8,4 milhões de armas ilegais no País.

O Estatuto do Desarmamento representou importante avanço sobre o uso indiscriminado de arma de fogo, e os resultados foram sentidos. De acordo com dados do Ministério da Saúde, o número de mortes provocadas por essas armas reduziu-se mais de 10% entre os anos de 2003 e 2006. No entanto, a aprovação do Estatuto do Desarmamento, esse dispositivo legal, não foi suficiente para poupar os milhares de vítimas que a cada ano se acumulam, gerando perdas irreparáveis para as suas famílias.

É preciso, Sr. Presidente, Srs. Senadores, atuar em várias frentes. Primeiro, é necessário intensificar as campanhas publicitárias, os instrumentos educacionais que alertam sobre os riscos e as conseqüências do uso de armas de fogo. Um bom referencial é a grande variedade de mecanismos de combate, por exemplo, ao cigarro, ao tabagismo, que hoje o País utiliza de forma intensa e que tem tido excelentes resultados, poupando milhares de vidas de brasileiros. Nós também conseguimos, no Brasil, praticamente debelar a poliomielite, o sarampo e outras doenças com campanhas de vacinação duradouras e persistentes. Portanto, se fizermos de forma idêntica e aplicarmos recursos idênticos, o País vai reduzir também a demanda por arma de fogo e poupar muitas vidas de brasileiros, principalmente da nossa juventude, pois a incidência se dá principalmente nos jovens de 18 a 24 anos.

Por outro lado, também é preciso agir no âmbito da oferta, fazendo o combate ao contrabando. É preciso fiscalizar a produção, a venda, a exportação, a importação de armas e de munições para que não haja desvios. Além disso, é preciso efetuar o controle de estoques, que pode ser eficaz com a destruição dos excedentes de armas e com o impetuoso programa de entrega voluntária e mesmo de fiscalização, para que o Governo possa, somando esforços dos entes federativos - Governo Federal, Governos Estaduais e até Municipais - fazer a verificação de quem está circulando com arma ilegal, arma que não foi registrada e que normalmente - volto a repetir - não é usada pelo cidadão de bem. O cidadão de bem quer sua autodefesa, tem sua arma registrada, tem seu porte de arma. É diferente de quem tem arma ilegal. Normalmente, está na mão da criminalidade. E, pelo Estatuto do Desarmamento, a pessoa pode ser criminalizada imediatamente pelo uso da arma de forma ilegal, sem registro, sem porte.

Por outro, também é preciso agir pelo lado da oferta. Nesse sentido, defendo que a campanha do Governo Federal seja sempre uma campanha de fiscalização, de recolhimento de armas ilegais, que a campanha não deixe a ilegalidade fazer mais vítimas, seja prorrogada e seja intensificada.

Além disso, é preciso retomar os exemplos bem-sucedidos feitos pela própria propaganda oficial, que mostrou que o destino das munições, das armas sempre vai de encontro às vidas humanas, não vai em salvamento de vidas humanas, mas sim em perdas de vidas humanas. E são pais de família, são filhos, são jovens, são arrimos de família. São perdas irreparáveis. Uma vida humana não é recuperada nunca mais. Muitas vezes, perde-se uma vida humana por um motivo fútil. Há uma estatística de que os homicídios por arma de fogo se dão no final de semana, aos sábados, aos domingos, porque, às vezes, a população está no seu lazer, desprotegida da criminalidade que está armada, e há uma incidência maior do homicídio por arma de fogo.

Diante do número de vítimas e do problema social que é gerado, advogo, Sr. Presidente, que o Governo Federal, pelo Ministério da Justiça, deve e pode alocar mais recursos para as campanhas educativas e mesmo para as indenizações, para compensar a entrega das armas ilegais. Desde 2004, essas indenizações somaram apenas R$ 41 milhões, o que é muito pouco, com uma média anual de pouco mais de R$ 8 milhões.

Portanto, Sr. Presidente, o controle do uso de armas passa pelo fortalecimento do Estatuto do Desarmamento, impedindo, inclusive, Sr. Presidente, a proliferação de agentes públicos ou privados que possam ter acesso ao porte de armas. É estranha a quantidade de agentes públicos hoje que querem ter o porte de arma. São pessoas que nunca o tiveram, mas hoje todos querem andar armados. Chego a dizer, Sr. Presidente, que querem transformar o Estatuto do Desarmamento em “Estatuto do Armamento” e que parece que a saída para combater a violência no País seria todos andarem armados. Pelo amor de Deus, isso não é saída! Não pode ser! A segurança é um direito do cidadão e um dever do Estado.

O Estado tem que investir para combater a violência, que está muito na arma de fogo que tira a vida humana.

Portanto, Sr. Presidente, reafirmo essa minha posição. Estive nesta tribuna no dia 24 de setembro e fiz um pronunciamento da mesma forma que faço hoje, porque fui o Relator do Estatuto do Desarmamento. Vi uma aprovação belíssima nesta Casa e na Câmara dos Deputados; praticamente por unanimidade, Senador Jefferson Praia, foi aprovado o Estatuto do Desarmamento. Mas a implementação não depende do legislador. Fizemos a nossa parte; era uma aspiração da sociedade nacional. Depois a coisa cai no esquecimento, não há a devida aplicação da legislação. E, então, o que nós temos? A sociedade de sobressalto e as mortes dos nossos jovens, dos nossos filhos, dos arrimos de família.

O Senador Sérgio Zambiasi quer usar da palavra. Com muito prazer, concedo um aparte.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Senador César Borges, comungo com V. Exª da preocupação em relação ao problema das armas. Porém, o problema das armas ilegais.

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA) - É disso que estamos tratando.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - O problema do contrabando, Senador César Borges. Eu pertenço a um Estado fronteiriço. O Rio Grande do Sul faz fronteira com o Uruguai e com a Argentina. Semanalmente, a polícia apreende contrabandos que vêm daquelas regiões. Piores são as outras fronteiras, com o Paraguai e a Bolívia. Eu estou chamando a atenção para que possamos discutir com mais intensidade os nossos problemas de fronteira. O Brasil possui 15.600Km de fronteira com 10 países sul-americanos. A fiscalização, por mais que a Polícia Federal e o Exército se esforcem, não é suficiente para conter especialmente o contrabando de armas e de drogas, porque uma coisa está ligada à outra. A droga vendida lá nos morros do Rio ou nos morros de Porto Alegre é a que entra pelas nossas fronteiras. Boa parte das armas usadas pelos bandidos, seja das periferias da capital gaúcha ou da capital baiana ou do Rio de Janeiro, também entra nos contrabandos das fronteiras. Então, penso que temos de encontrar medidas para combater este que é um dos mais graves e sérios problemas, o problema das nossas fronteiras, que, por mais esforço que a nossa Polícia Federal ou o próprio Exército faça, ainda assim há verdadeiras vastidões disponíveis para o contrabando, permitindo que esse problema avance. A Senadora Marisa Serrano e eu propusemos no Parlamento do Mercosul e na Comissão Mista do Mercosul do Congresso Nacional um amplo estudo sobre a questão de fronteiras. E, enquanto não trouxermos para este Plenário, para o Plenário do Congresso, para a pauta do Governo Federal, do Executivo, a questão de fronteiras, vamos ficar com esse problema latente, seja das drogas ou das armas, porque, como disse, os que mexem com as armas são os que mexem com as drogas, e vice-versa, e infelizmente o problema se acentua. Vemos pessoas inocentes morrendo todos os dias, crianças vítimas das ditas balas perdidas e por aí vai. Esse é um tema que tem de ser trabalhado em plenário constantemente, para que tenhamos a questão na Ordem do Dia, de maneira que nós, Parlamentares, nos conscientizemos ainda mais, e o Governo e o Executivo também. Cumprimento V. Exª, mais uma vez, pelo pronunciamento, porque ele traz a questão para a Ordem do Dia, o que é muito importante.

O SR. CÉSAR BORGES (Bloco/PR - BA) - Agradeço pelo aparte de V. Exª, Senador Sérgio Zambiasi, que vem ao encontro do meu pronunciamento. Estamos tratando aqui exatamente das armas ilegais, até porque, se a arma é comercializada legalmente, ela terá de passar por um protocolo, por uma burocracia, pelo registro, o que vai exigir uma série de documentos de comprovação de idoneidade de quem vai usá-la.

Houve um referendo e a população disse que a comercialização deve persistir, mas a comercialização da arma legal. Estamos tratando da arma ilegal. Essa arma está, em sua grande maioria, de posse de marginais e, como disse V. Exª, vem por contrabando. Onde há droga, há arma e vice-versa. É preciso que o aparato policial brasileiro, seja ele federal, estadual e, eventualmente, municipal, das guardas municipais, possa dar segurança à nossa população.

É isso que nós estamos pedindo. Votamos aqui, inclusive, uma permissão constitucional para que as Forças Armadas pudessem participar de operações nas fronteiras de combate à criminalidade, ao crime organizado, ao contrabando de armas, de drogas. Mas, lamentavelmente, essas coisas são faladas, são conversadas, volta-se ao Estatuto do Desarmamento. Então o avanço é lento e, enquanto o avanço é lento, são milhares de vidas perdidas, de jovens, de cidadãos brasileiros.

É esse o meu pronunciamento, Sr. Presidente. E o encerro, dizendo que é preciso regular rigorosamente a circulação de armas de fogo, que deve estar sempre atrelada ao desestímulo do uso por parte da população, em especial o uso ilegal. E há hoje um diploma legal, que é o Estatuto do Desarmamento.

Se não for colocado em prática, não será por culpa do Parlamento, mas porque faltou vontade política do Executivo ou do Judiciário.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/10/2008 - Página 39824