Discurso durante a 190ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração do Dia da Criança, com objetivo de se discutir e encontrar meios para inclusão social das crianças do nosso País, e do Dia do Professor.

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. EDUCAÇÃO.:
  • Comemoração do Dia da Criança, com objetivo de se discutir e encontrar meios para inclusão social das crianças do nosso País, e do Dia do Professor.
Publicação
Publicação no DSF de 16/10/2008 - Página 39779
Assunto
Outros > HOMENAGEM. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, PROFESSOR, CRIANÇA, ELOGIO, INICIATIVA, SESSÃO ESPECIAL, ATUAÇÃO, CRISTOVAM BUARQUE, SENADOR, MAGISTERIO, IMPORTANCIA, EXPERIENCIA, RELEVANCIA, CRIAÇÃO, BOLSA FAMILIA, PERIODO, GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • DEFESA, INCENTIVO, EDUCAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, DESENVOLVIMENTO, QUESTIONAMENTO, AMPLIAÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), AUSENCIA, INVESTIMENTO, ENSINO, COMENTARIO, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, DIRETRIZ, MELHORIA, EDUCAÇÃO BASICA.
  • COMENTARIO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), AVALIAÇÃO, INDICE, DESENVOLVIMENTO, EDUCAÇÃO BASICA, DEMONSTRAÇÃO, NECESSIDADE, MELHORIA, EDUCAÇÃO, DEFESA, VALORIZAÇÃO, PROFESSOR, ESCOLARIZAÇÃO, POPULAÇÃO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, PISO SALARIAL, MAGISTERIO, CRITICA, OBSTACULO, DEMORA, GOVERNADOR, PREFEITO, IMPLANTAÇÃO, LEGISLAÇÃO.
  • REGISTRO, PROPOSTA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), IMPLEMENTAÇÃO, SISTEMA NACIONAL, FORMAÇÃO, PROFESSOR, ELABORAÇÃO, ORADOR, REQUERIMENTO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, AVALIAÇÃO, PROJETO, DEFESA, ALTERAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, AMPLIAÇÃO, RECURSOS, EDUCAÇÃO, COMENTARIO, APROVAÇÃO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, EDUCAÇÃO BASICA, CRITICA, INFERIORIDADE, INVESTIMENTO.
  • HOMENAGEM, SINDICATO, LUTA, MELHORIA, VALORIZAÇÃO, PROFISSÃO, PROFESSOR.
  • REGISTRO, VIAGEM, ORADOR, MUNICIPIO, IGARAPE-AÇU (PA), ESTADO DO PARA (PA), COMENTARIO, VISITA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, PRECARIEDADE, SEDE, DIFICULDADE, ENSINO, SOLICITAÇÃO, GRUPO, SENADOR, AVALIAÇÃO, SITUAÇÃO, EDUCAÇÃO, REGIÃO.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, ilustres convidados, professores, professoras, nossas crianças e adolescentes que nos honram com sua presença no plenário do Senado Federal, em primeiro lugar, quero parabenizar o Senador Cristovam Buarque pela brilhante iniciativa de homenagear os professores e as crianças simultaneamente.

            Percebemos no pronunciamento há pouco feito aqui pelo Senador Cristovam Buarque, ao falar do Brasil, da educação, das crianças e de futuro, em cada palavra e em cada gesto, a convicção quanto ao que era dito, porque dito não por dizer, mas dito por fazer, porque o Senador Cristovam Buarque foi professor, reitor da UnB e Governador do Distrito Federal. Portanto, sem dúvida, tudo o que disse aqui não foi por dizer, foi por fazer.

            O Senador Cristovam Buarque, tendo tido a oportunidade de dirigir uma universidade e governar o Distrito Federal, foi capaz de implementar aqui as políticas públicas mais essenciais à construção desse futuro diferente. Aqui nasceu a Bolsa-Escola; foi no Distrito Federal que ela nasceu.

            Não ouvi todo o discurso do Senador Cristovam Buarque, mas, provavelmente, ele não fez referência à Bolsa-Escola, que muitos governos estaduais e municipais adotaram e que o Governo Federal adotou sob a forma de Bolsa-Família com características diferenciadas em relação ao projeto concebido e implementado aqui no Distrito Federal. Talvez o Professor, Senador e Governador Cristovam Buarque não tenha dito aqui, mas a Bolsa-Escola, que nasceu aqui no Distrito Federal, desde aquele primeiro momento, em 1995, foi uma importante declaração do seu compromisso com o futuro deste País.

            A homenagem é para todos os professores, todas as professoras, todos os educadores e todas as crianças do Brasil, mas, neste meu início de pronunciamento, tenho certeza de que conto com a concordância dos meus pares, de todas as Senadoras e de todos os Senadores, quando digo que, neste momento, aqui homenageamos, de verdade, o grande professor e educador Cristovam Buarque.

            (Palmas.)

            A educação é a base mais sólida para qualquer modelo de desenvolvimento que se pretenda sustentável. Infelizmente, o nosso País ainda não enfrentou de forma decidida esse desafio. Nosso País cresceu, o produto interno bruto aumentou, nossa população se multiplicou, mas nossos indicadores educacionais não acompanharam esse crescimento. E o motivo é claro: a educação não é o principal vetor do nosso desenvolvimento.

            Em 2001, o Congresso Nacional aprovou o Plano Nacional de Educação, definindo diretrizes e metas para dar um salto de qualidade na área educacional. Entre as metas, destaco a universalização do ensino fundamental, o aumento expressivo da cobertura da educação infantil e do ensino médio e a elevação dos indicadores de qualidade.

            Os dados divulgados pelo IBGE relativamente à última Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar (PNAD), realizada no ano de 2007, mostram que ainda temos um longo caminho a percorrer. Ainda temos milhões de crianças fora da escola na educação infantil, mais de catorze milhões de analfabetos e dificuldades imensas de acesso de nossa juventude ao ensino médio, especialmente o profissionalizante.

            Mas talvez o aspecto mais preocupante dos indicadores educacionais seja aquele relativo à aprendizagem de nossas crianças. De nada vale garantir o acesso à escola e depois não propiciar o sucesso, ou seja, o direito de aprender corretamente. Nesse quesito, o nosso País está muito atrasado. As notas aferidas pelo Ideb são alarmantes: nossas crianças chegam à antiga quarta série do Ensino Fundamental sem ler corretamente e com enorme dificuldade em matemática.

            Inicio meu pronunciamento com esses dados para falar da importância decisiva dos professores para a superação desse quadro. Não é possível pensar em educação de qualidade sem investimento maciço nos profissionais de educação, especialmente nos professores.

            Recentemente esta Casa aprovou a lei que cria o Piso Salarial Nacional para os profissionais do Magistério. Foi um passo importante. O valor está muito aquém do que os professores merecem e do que o nosso País pode pagar. E a sua implantação gradual também frustrou as expectativas depositadas nessa lei. Preocupo-me com a reação de muitos gestores que se posicionam pelo não cumprimento da lei, o que considero um verdadeiro absurdo. Aliás, quero aproveitar para recordar aos Srs. Prefeitos, eleitos ou reeleitos no último dia 5 de outubro, que eles terão até 31 de dezembro de 2009 para enviar às respectivas Câmaras Municipais e ali aprovar os novos planos de carreira, instrumento essencial para a valorização do Magistério. É bom dizer que essa regra vale também para os nossos Governadores de Estado.

            Recentemente, o MEC disponibilizou para análise da sociedade uma minuta de decreto instituindo o Sistema Nacional Público de Formação de Professores. É uma idéia muito interessante, principalmente diante do dado de que apenas 15% dos professores concluem seus estudos em instituições públicas e muitos nem conseguem completar um curso de nível superior.

            Senador Cristovam Buarque, Sr. Presidente, Senador Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, não sou membro da Comissão de Educação do Senado, mas elaborei um requerimento para que a referida Comissão realize uma audiência pública sobre a idéia de criação desse sistema público de formação de professores. E é claro que, como não posso apresentar o requerimento diretamente, podendo ser apenas o seu co-autor, solicito ao Senador Cristovam Buarque que seja o primeiro subscritor desse requerimento, o qual, tenho certeza, muitos Senadores também terão a satisfação de subscrever.

            Assim, ao apresentar o requerimento e pedir sua aprovação na Comissão de Educação, tenho a convicção de que será uma forma de o Senado Federal ouvir a posição do Governo, dos especialistas e dos gestores estaduais e municipais no sentido de propor sugestões que aperfeiçoem o decreto a ser assinado pelo Senhor Presidente da República.

            Queria deixar registrado, nesta oportunidade, que precisamos alterar os rumos da política econômica para que a educação brasileira possua recursos suficientes para dar um salto para o futuro.

            É verdade que aprovamos o Fundeb no final de 2006 e sua regulamentação no ano de 2007, mas também é verdade que não podemos acreditar que nosso País só tem condições de investir nas suas crianças menos de R$95,00 por mês. É muito pouco! Basta que façamos a conta do que a atual crise financeira está consumindo de nossas reservas, dos recursos direcionados pelo superávit primário para chegarmos à conclusão de que o que foi alocado pela União no Fundeb é uma gota no oceano dos recursos alocados para salvar os banqueiros e os especuladores de plantão.

            Espero que daqui a dez anos, quando estivermos homenageando os professores e professoras e refletindo sobre o futuro de nossas crianças, seja possível anunciar melhores indicadores educacionais e termos mais motivos para comemorar essas duas datas tão importantes.

            Quero homenagear os sindicalistas ligados à área da Educação nos diversos níveis de ensino, tanto em nível municipal como estadual e nacional, que em nosso País são os grandes aliados na luta pela valorização do Magistério, pela valorização da educação e pela valorização das nossas crianças.

            Quero homenagear todos os dirigentes e sindicalistas do Sindicato dos Trabalhadores em Educação, e faço referência, em particular, ao Sintepp (Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Pará) e ao Sinpro (Sindicato dos Professores), mas não posso, como disse, esquecer de homenagear a todos e todas que se dedicam, além da luta sindical, à busca de condições de fortalecimento das políticas educacionais em nosso País.

            Srªs e Srs. Senadores, senhoras e senhores convidados, falando em educação, vou relatar rapidamente a visita que fiz ao Município de Igarapé-Açu, no Estado do Pará.

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Queremos homenagear também as crianças, porque têm muitos oradores inscritos e elas têm fome.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Se V. Exª seguir esse raciocínio, tenho certeza de que futuramente não irá me imitar; também falará menos, Senador Mão Santa.

            Sr. Presidente Mão Santa, sei que V. Exª é sempre condescendente com os seus Pares. Tenho certeza que vai permitir que eu conclua o pronunciamento. Mas muito obrigado a V. Exª, porque, de antemão, sei que vai nos conceder o tempo de mais, pelo menos, cinco minutos.

            Como eu dizia, estive recentemente no Município de Igarapé-Açu, no Estado do Pará, e segundo os dados do Ideb, em 2007, a nota desse Município foi de apenas 2,9 numa escala que vai de zero a dez. A nota do Brasil foi de 4,2 e da rede municipal...

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Em um minuto Cristo fez o Pai-Nosso.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Mas V. Exª não segue quando fala também desta tribuna, por isso peço isonomia.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Cinqüenta e seis palavras e nós saímos daqui ao céu.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Peço isonomia.

            Em 2006, aquele Município possuía 55 escolas municipais, sendo 46 na zona rural. A formação dos professores é sintomática: somente 11% possuem nível superior, e a distorção idade/série é de quase 50%. Tive oportunidade de visitar uma escola na zona rural daquele Município chamada Escola Boa Esperança, e ela é simbólica nas dificuldades enfrentada pelos professores e pelas crianças brasileiras.

            A escola funciona numa casa de taipa, porque a anterior ficava em um pequeno barracão que desabou. Na verdade, naquele local nunca existiu escola; era um local improvisado. Ela funciona na casa de um morador, o Sr. Carlos Antônio, e tem mais ou menos 4m². As carteiras são amontoadas, não há iluminação adequada, as crianças não recebem merenda escolar e, quando a recebem, dá para apenas uma semana. Não há merendeira, não há profissional para fazer a merenda, é a família das crianças que a fazem, para que possam ter o direito à alimentação escolar, quando isso é possível. O acesso é muito difícil, pega-se estrada, atravessa-se córrego, igarapé para chegar à escola. Essa escola nunca foi visitada pelo Prefeito, pelo Secretário de Educação e, segundo disseram, nem por Vereadores - nem em campanha.

            Talvez seja uma das escolas mais pobres do País, mas pudemos perceber ali o gesto de uma família que cedeu a própria casa, Senador Mão Santa, para ser a sede da escola - e o Município não paga aluguel.

            Se não me engano, a cobertura da casa é de palha, não tenho muita certeza disso, mas é um ambiente absolutamente insalubre; não é o local mais apropriado para uma escola. Todavia, a generosidade daquela família permitiu que ali funcionasse uma escola. Eu diria que aquele pai e aquela mãe são os maiores educadores que nós temos naquela comunidade.

            Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu disse àquelas crianças, àqueles professores e àqueles pais ali reunidos que o Brasil ia tomar conhecimento daquela tragédia.

            Nesse sentido, Senador Cristovam Buarque, quero fazer um convite a V. Exª, como Presidente da Comissão de Educação do Senado Federal, para que V. Exª e, quem sabe, uma equipe de Senadores possam fazer uma visita àquela comunidade, que talvez tenha uma das escolas mais pobres do País. Com esse gesto, poderemos incentivar e estimular que outros professores, outras crianças e outras comunidades também denunciem a tragédia de escolas como aquela. Uma das autoridades municipais de Igarapé-Açu, o Prefeito que disputou a reeleição, declarou um patrimônio de R$25 milhões, sendo que a cerca de quinze quilômetros da sede do Município está talvez uma das piores escolas do nosso País.

            Então, acho que deveríamos fazer uma visita pedagógica àquela escola, Senador Cristovam Buarque, para que aquele exemplo de uma comunidade que exigiu seu direito passe a ser exemplo para outras tantas que sofram igual constrangimento.

            Quero reproduzir as palavras do Sr. Carlos Antonio, proprietário da casa-escola, que disse uma frase da qual não posso me esquecer: “Tudo aqui é do coração do povo”.

            Naquela comunidade, Senador Tuma, não tem estrada adequada, não tem escola, não tem energia elétrica. Falta tudo, falta incentivo à produção, não tem ninguém lá financiado pelo Pronaf ou por outros programas de geração de renda.

            Então, a frase “tudo aqui é do coração do povo” expressa bem aquela realidade e a luta daquele povo, à qual nos somamos e com a qual nos solidarizamos.

            Quero, por fim, homenagear o heroísmo dos professores brasileiros, homenageando dois professores daquela localidade: Marcelo e Éderson. Eles continuam trabalhando em condições desumanas e são símbolo de resistência e perseverança.

            Muito obrigado.

            (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/10/2008 - Página 39779