Discurso durante a 208ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à utilização indiscriminada do Forte de Copacabana para realização de eventos festivos.

Autor
Paulo Duque (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RJ)
Nome completo: Paulo Hermínio Duque Costa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS. POLITICA CULTURAL.:
  • Críticas à utilização indiscriminada do Forte de Copacabana para realização de eventos festivos.
Publicação
Publicação no DSF de 08/11/2008 - Página 44497
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS. POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • PROTESTO, UTILIZAÇÃO, FORTE, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DIVULGAÇÃO, MARCA DE COMERCIO, OBTENÇÃO, LUCRO, REGISTRO, IMPORTANCIA, MONUMENTO, CONTRIBUIÇÃO, CONSTRUÇÃO, HISTORIA, BRASIL, COMENTARIO, ANTERIORIDADE, TENTATIVA, GRUPO, TENENTE, IMPEDIMENTO, POSSE, ARTHUR BERNARDES, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETIVO, DERRUBADA, GOVERNO.
  • COMENTARIO, LIVRO, AUTORIA, CORONEL, HISTORIA, DIVERSIDADE, FORTE, FORTIFICAÇÃO, BRASIL, DEFESA, IMPORTANCIA, FIXAÇÃO, PLACA, MONUMENTO.
  • EXPECTATIVA, POSIÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA DEFESA, COMANDANTE, CHEFE, EXERCITO, REVISÃO, CRITERIOS, AUTORIZAÇÃO, UTILIZAÇÃO, FORTE, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), SIMBOLO, TRADIÇÃO, LUTA, BRASILEIROS, INICIO, REPUBLICA, CRITICA, ORADOR, FALTA, INTERESSE, AUTORIDADE, CONSERVAÇÃO, PATRIMONIO HISTORICO.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente que ora dirige os nossos trabalhos, Senador Raimundo Colombo, representante ilustre de Santa Catarina, uma das grandes iniciativas do ex-Presidente Sarney, nosso colega Senador, foi criar, neste Senado, a TV Senado, que leva a voz, a experiência, os pronunciamentos e os discursos para milhões e milhões de pessoas.

Por isso, esse cenário que quero inicialmente pintar aqui é de milhares, de milhões de pessoas do Brasil inteiro que estão nos assistindo, que ouviram e estão ouvindo todos aqueles que ocupam, nesta sexta-feira, a tribuna deste Plenário.

O que me traz hoje exatamente à tribuna deste Senado, Sr. Presidente, foi uma notícia de um jornal do meu Estado, com uma fotografia, anunciando que, ontem, estaria sendo realizado um desfile de moda masculina no Forte de Copacabana. No Forte de Copacabana, no Posto Seis, do meu Estado, da minha cidade do Rio de Janeiro. Desfile de moda. Ora, não hesitei em reler um livro editado pela Biblioteca do Exército, que tem uma grande editora lá, com mais de 300 publicações, e essa é antiga, de 1955, o autor é o coronel Anibal Barreto, sobre fortificações no Brasil. Aqui é a Casa onde estão presentes homens representantes de todos os Estados brasileiros. Aqui é a Casa que representa, de fato, não a população, mas a figura jurídica do Estado brasileiro. São 27 Estados, são 81 Senadores, Estados em igualdade de condições, cada Estado com 3 representantes. Não importa se o Estado é poderoso, se o Estado é rico, se o Estado é pobre, se o Estado é recente, se o Estado é antigo, o que importa é que existe uma igualdade de tratamento absoluta aqui entre todos os Estados. Este livro, Fortificações do Brasil, escrito por um Coronel que serviu durante longos anos na região amazônica, na Amazônia, no Pará, em toda aquela região, ele se impressionou muito com as fortificações, os fortes, os fortins, as fortalezas e fez um trabalho alentado, grandioso e patriótico. O livro foi prefaciado por Gustavo Barroso, que foi um dos grandes historiadores brasileiros. Ficamos sabendo que o Brasil, nesses últimos 400 anos, teve construídos mais de 350 fortes, fortificações, ou fortalezas, ou fortins, e que hoje já estão quase todos abandonados. Hoje em dia, a guerra não se faz mais com fortalezas ou com tiros de canhões, a guerra hoje se faz de maneira sofisticada. Apertando um botão liquidam um assunto, liquidam um conflito ou, então, não liquidam quando se quer estimular a continuidade dessas mesmas guerras, como as que ocorrem, atualmente, no Iraque e no Irã.

Mas quero dizer que o forte sempre foi estímulo para a conquista, tanto que não foi só o português, nosso colonizador, nosso descobridor, quem construiu essas fortificações a que estou me referindo. Existem, no Brasil, fortes construídos pelos ingleses, pelos franceses, pelos holandeses e pelos espanhóis. Isso significa que o Brasil sempre foi cobiçado pelos estrangeiros. Não se trata de radicalismo, mas, sim, de historiar, de relembrar o esforço daqueles que defenderam o território brasileiro durante muitos e muitos anos. Tanto é verdade que tivemos durante 60 anos, praticamente, o domínio do holandês em nosso País.

Houve duas invasões, uma na Bahia e outra em Recife, das frotas holandesas, que permaneceram aqui durante muito tempo, até que foram expulsas pelos próprios colonizadores iniciais, os portugueses. Quero ratificar aqui. Não sei. Quero fazer justiça. Colombo de Souza? Raimundo Colombo de Souza?

O SR. PRESIDENTE (Raimundo Colombo. DEM - SC) - Não. É João Raimundo Colombo. O “de Souza” é uma homenagem.

O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Perdoe-me se errei quando o nomeei “Colombo de Souza”. É João Raimundo.

O SR. PRESIDENTE (Raimundo Colombo. DEM - SC) - Colombo.

O SR. PAULO DUQUE (PMDB - RJ) - Colombo. Paro aí. João Raimundo Colombo. Desculpe-me V. Exª. Perdoe esta omissão, este engano, este equívoco.

Feita a necessária retificação, quero dizer, Presidente, que, quando vi essa publicação, praticamente não acreditei que fossem utilizar o Forte de Copacabana para esse ato tão festivo, tão leviano, tão bobo. Utilizar o Forte de Copacabana para um desfile de modas? Ora, lá já se joga o carteado; lá já se permitiu instalar um restaurante, uma casa de chás de uma confeitaria famosa; lá no Forte de Copacabana já se permitiu colocar uma garrafa enorme de quase 50 metros de altura de um refrigerante com publicidade; lá, nesse forte, já se permitiu colocar um carrossel para faturar dinheiro, como se fosse divertimento.

Eu tive ocasião, quando estiveram reunidos aqui nesta sala, neste plenário, oficiais das nossas Forças Armadas, de fazer o meu protesto oficial, como representante daquele Estado, sobre o desvirtuamento que se impôs, a troco de pecúnia, ou de forma comercial, daquela edificação, que teve tantas glórias no passado.

Construído no Governo Hermes da Fonseca, sua construção teve início no Governo Afonso Pena. Meu Deus! O Forte de Copacabana tem uma história das mais brilhantes; teve uma epopéia das mais interessantes da nossa história militar, da nossa história Pátria.

Quando ocorreu o episódio dos Dezoito do Forte, em 5 de julho de 1922, quando os oficiais que ali estavam, comandando aquele Forte, Eduardo Gomes, Siqueira Campos, Mário Carpenter, Nilton Prado, e os sargentos, e os soldados, e os cabos. Esses oficiais lideraram uma revolta em que ficaram sozinhos, em que deveria haver a participação do 3º Regimento de Infantaria, que não entrou na guerra, no movimento, e da Escola dos Regimentos da Vila Militar, que também não se manifestou. E esse Forte ficou sozinho com aqueles patriotas que se rebelaram contra o Governo de Epitácio Pessoa, porque queriam impedir que Epitácio Pessoa desse posse ao seu sucessor legítimo, o grande Presidente Artur Bernardes, diga-se de passagem.

         O que pensavam esses homens que ali estavam no Forte de Copacabana e que se insurgiram contra o Governo de Epitácio Pessoa? O que fazer? Eles eram bravos, eles eram corajosos. O que fazer com esses homens fortes e corajosos que queriam derrubar o Governo? Meia dúzia de militares, alguns oficiais, grande maioria de praças. Eles se rebelaram, prepararam-se ali para enfrentar uma guerra dentro do País, dentro de Copacabana. E o fizeram com o sacrifício da própria vida.

         O Comandante do Forte então era Siqueira Campos. Siqueira Campos reuniu todos os oficiais, todos os soldados, todos os sargentos e disse: “Vamos derrubar o Governo, estamos contra esse Governo. Aqueles que tiverem família, aqueles que tiverem qualquer problema pessoal, aqueles que não quiserem, aqueles que não concordarem, estão livres para sair. Ninguém vai criticar ninguém. Podem sair”.

O Forte ficou com mais ou menos vinte e oito a trinta pessoas apenas: quatro oficiais, sargentos, soldados. Imaginaram inicialmente explodir o forte, o paiol, mas desistiram do intento com receio de prejudicar os civis. Um deles retirou a bandeira do Brasil, dividiu-a em dezoito pedacinhos e cada um daqueles dezoito recebeu um fragmento da bandeira. E saíram armados em direção ao Catete, quando já havia quatro mil soldados, no mínimo, na Praça Serzedelo Correia para debelar aquele movimento. Mas não importava, havia o ideal, havia um vigor mental impulsionando aqueles homens chefiados, então, por Siqueira Campos.

E começaram a caminhar armados, quando se aproximou um civil, um gaúcho que estava no Rio de Janeiro, muito bem vestido, com um chapéu - naquela época se usava muito chapéu -, e perguntou a eles: “Aonde vocês vão? Por que vocês estão fazendo assim?”

Eles disseram: “Nós vamos derrubar o governo”.

“Mas como? Só vocês? Então, eu também vou”.

E lá se foi o gaúcho junto.

“Me dê uma arma”.

E o Siqueira Campos entregou a ele uma espingarda. Continuaram a caminhada. E as forças do governo prontinhas para atacar. Foi dada, finalmente, a ordem do ataque. E o civil Otávio Correia - que hoje tem nome de rua em várias praças, inclusive no bairro da Urca - foi o primeiro a tombar. E foram tombando um a um. Já eram mais ou menos oito. E todos caíram. Não houve ninguém que não tivesse sido ferido, incluindo-se aí Eduardo Gomes e Siqueira Campos, que dos quatro oficiais foram os que conseguiram sobreviver.

Então, quando vi isso aqui, meu caro Senador “Mozart”, essa notícia, esse espetáculo de dois pândegos que fizeram um desfile de moda masculina no Forte de Copacabana, eu disse: “Não é possível, não é possível que estejam permitindo este tipo de agressão à História brasileira”.

           E como podem aqueles bravos que defenderam a Pátria, um ideal, o Forte e que uma vez saíram...podem misturar-se hoje com esse tipo de leviandade? Daí o meu protesto hoje. Não é o meu primeiro. É o segundo, é o segundo protesto que faço contra o mau uso de uma fortificação, de uma História. Estão elencados aqui neste livro, Fortificações no Brasil, mais de 350 fortificações, fortes, fortins, fortalezas que existem em nosso País, alguns abandonados, a maioria esquecida. E lembra o Coronel que no mínimo deveria ser colocada uma placa explicando o que era ali - do Amazonas ao Rio Grande do Sul.

           Daí o meu pronunciamento até meio desanimado hoje, porque é o segundo que faço sobre o Forte de Copacabana. Virou bagunça. Não podia. Sabe V. Exª, Sr. Presidente, qual foi o último tiro que o Forte de Copacabana deu? Foram 12 contra o navio, o grand destroyer Tamandaré, que saía pela Barra levando o Presidente Carlos Luz, o Almirante Pena Boto, o Almirante Sílvio Heck e vários e vários e vários políticos, inclusive Carlos Lacerda, grande Governador do Estado da Guanabara, em demanda a São Paulo, na época da deposição do Presidente Carlos Luz. Foi a última vez que o Forte disparou: 12 tiros contra o Cruzador. Felizmente, nenhum acertou o alvo.

Ao deixar a tribuna na tarde de hoje, espero, sinceramente, que o atual Ministro da Guerra ou Comandante Militar do Leste reveja esta posição de permitir que aquela Repartição do Exército, que guarda tanta tradição, que tem um significado enorme para o nosso País... Esse tipo de coisa, de apresentação não combina com o seu passado, com as suas finalidades. Ele não é mais empregado na guerra, não é mais usado nos conflitos, mas guarda a memória de heróicos brasileiros, de homens que lutaram por um ideal muito sério. Dificilmente, existirá uma história tão épica no Exército, como essa dos 18 do Forte.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/11/2008 - Página 44497